Título da página eletrónica: Rede de Lugares de Memória da América Latina e Caribe
Notas da redação
Revisto por Ana Sofia Veloso e Alina Timóteo
Texto integral
1A página da Rede de Lugares de Memória da América Latina e Caribe, criada no ano de 2008, vem desempenhando um papel importantíssimo no processo de recuperação e construção de memórias coletivas de grupos, instituições e pessoas vítimas de regimes totalitários e da violência do Estado. O objetivo maior da Rede é tornar possível a reunião, divulgação e acesso a um número cada vez maior de informações sobre a violência do Estado, a fim de subsidiar com documentos e testemunhos de vítimas e parentes de vítimas nas lutas contra o esquecimento e por justiça e reparação.
2É sabido que, a partir de meados do século xx, os processos democráticos de inúmeros países da América Latina e Caribe foram interrompidos na sequência de golpes de Estado que instauraram governos ditatoriais. Crimes contra os direitos humanos, contra a liberdade de imprensa, contra as instituições políticas e partidárias, contra instituições de ensino e demais instituições civis, bem como sequestros e assassinatos de pessoas, foram a tônica desse período. Mesmo após inúmeras denúncias encaminhadas para as Nações Unidas, estas poucos efeitos tiveram na retomada da democracia. Foram necessárias quase três décadas para que as sociedades latino-americanas e caribenhas retomassem seus regimes democráticos e encerrassem o período sombrio da violência dos Estados ditatoriais.
- 1 Pollak, Michael (1989), “Memória, esquecimento e silêncio”, Revista de Estudo Histórico do Rio de J (...)
3A partir da década de 1990 foram surgindo as comissões da verdade e grupos lutando por justiça e reparação. Inúmeros movimentos sociais, instituições universitárias e de pesquisa e organizações não governamentais iniciaram uma busca por documentos e testemunhos de sobreviventes e de familiares de vítimas que denunciassem os crimes cometidos pelos governos ditatoriais. Isso levou a América Latina a uma onda revisionista na qual memórias até então subterrâneas, como teoriza Michel Pollak,1 fossem relembradas e trazidas ao conhecimento público.
4Nos últimos 20 anos, em paralelo às comissões da verdade, diversos movimentos sociais de defesa dos direitos humanos foram forjando redes de instituições de memória e luta por justiça, que deram origem a museus, lugares de memórias, monumentos e instituições de pesquisa, consolidando um importante acervo documental. Em cada país da América Latina e Caribe foram promovidos encontros, seminários e congressos, levando à multiplicação de documentos, testemunhos, artigos acadêmicos e vídeos sobre esse período – o que permitiu o redescobrimento da história recente desses países e forneceu subsídios às comissões da verdade para os processos de julgamento dos crimes de Estado. Diante desse movimento progressivo, os centros de memória, os grupos e movimentos sociais de defesa dos direitos humanos e as instituições de pesquisa vinculados à luta por justiça e pela memória buscaram compartilhar seus arquivos e testemunhos de experiências traumáticas, bem como suas conquistas e lutas vindouras. É a partir desse interesse comum de compartilhamento que surge a Rede de Lugares de Memória da América Latina e Caribe.
5Hoje, esta Rede conta com a participação de 40 instituições de 12 países, que por sua vez fazem parte da Coalizão Internacional de Sítios de Consciência. Esta última é uma organização formada por sete redes regionais: África; Ásia; Europa; América Latina; América do Norte; Oriente Médio e Norte da África; e Rússia.
6O interesse maior das instituições que compõem a Rede de Lugares de Memória da América Latina e Caribe é a recuperação e construção da memória coletiva de grupos e pessoas que sofreram e ainda sofrem graves violações dos direitos humanos. Na página da Rede fica evidente que o seu propósito é estimular a resistência contra a violência e contra o terrorismo do Estado, buscando impedir a continuidade da impunidade dos crimes cometidos. Além disso, a Rede se preocupa com as lutas camponesas, indígenas, de movimentos de mulheres e de grupos subalternizados na região, e se dedica à instituição de garantias democráticas e constitucionais para evitar a repetição de períodos ditatoriais. Assim, a Rede mantém ativo o desenvolvimento de projetos, iniciativas e treinamentos conjuntos na busca de maior fortalecimento entre instituições com perspectivas similares. Em anos recentes, com o retorno de partidos de extrema-direita aos governos de alguns países da região da América Latina – como o Brasil, o Chile e o Peru –, é cada vez mais relevante o compartilhamento e a integração do conhecimento e das práticas da Rede nesse contexto.
Notas
1 Pollak, Michael (1989), “Memória, esquecimento e silêncio”, Revista de Estudo Histórico do Rio de Janeiro, 2(3), 3‑15.
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Referência do documento impresso
Rogério Ferreira de Souza, «Título da página eletrónica: Rede de Lugares de Memória da América Latina e Caribe», Revista Crítica de Ciências Sociais, 121 | 2020, 197-198.
Referência eletrónica
Rogério Ferreira de Souza, «Título da página eletrónica: Rede de Lugares de Memória da América Latina e Caribe», Revista Crítica de Ciências Sociais [Online], 121 | 2020, publicado a 15 abril 2020, consultado a 16 fevereiro 2025. URL: http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/rccs/10507; DOI: https://0-doi-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/10.4000/rccs.10507
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