
Imagem: Ana Carvalho
Está aberta chamada para propostas de artigos para o dossier temático “Museus de Arte Moderna/Contemporânea do Século XXI: Territórios, Políticas e Transformação Social”, a ser publicado em 2025. O dossier é coordenado por Elisa Noronha (CITCEM, Universidade do Porto) e María del Mar Flórez Crespo (Universidad de León).
Os artigos serão selecionados pelas coordenadoras do dossier e seguem o processo de arbitragem por pares.
As propostas de artigos devem ser enviadas até 16 de setembro de 2024 para revistamidas@gmail.com
Os artigos não devem ultrapassar as 6 000 palavras (sem bibliografia incluída). Deve ser seguida a estrutura clássica de um artigo académico.
Mais informações sobre as normas de publicação da MIDAS: https://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/midas/361
Nas últimas décadas, temos assistido a um impulso significativo na criação de instituições e espaços dedicados à arte moderna/contemporânea, tanto na Península Ibérica como para além destas fronteiras (Rolland e Murauskaya 2008). No que diz respeito aos museus espanhóis e portugueses, estes têm sido objeto de estudo em diferentes projetos de investigação (Lomba 2001; Layuno 2004; Barranha 2008; Grande 2009; Marzo e Mayayo 2015; Roigé 2016; Noronha 2017; Gilabert 2018) onde foi possível observar certas dinâmicas nas relações estabelecidas entre estas instituições especializadas em arte contemporânea e o contexto artístico, social ou cultural urbano.
No final do século passado, grandes cidades ibéricas, como Madrid e Barcelona, mas também outras de menor escala urbana, como Porto, Bilbau ou Valência, tornaram-se sedes de museus, sobretudo de arte moderna/contemporânea, que serviram de modelo para as novas infraestruturas construídas em Espanha e Portugal durante as primeiras décadas do século XXI. Da sua análise, derivaram estudos mais delimitados sobre o tema, principalmente dos casos paradigmáticos. Entre eles, o chamado “efeito Guggenheim” (Baudelle, Krauss e Polo 2015) é bem conhecido e tem sido um dos exemplos representativos, recentemente abordado em Espanha (Lorente e Juan 2022), que demonstrou a relação particular entre a criação de instituições museológicas e a gestação de distritos culturais.
Os museus têm sido considerados, com alguma frequência, no contexto de operações mediáticas e como agentes de revitalização económica do território, alinhando-se com a noção de “cidade criativa” proposta por teóricos como Charles Landry (2000) e Richard Florida (2009). Neste contexto, os museus e os centros culturais dedicados à arte contemporânea surgiram como elementos-chave, reflexo dessa criatividade humana e pedra angular do desenvolvimento económico e social, promovendo a renovação e a reabilitação do tecido urbano. Embora alguns casos possam ser mais bem-sucedidos do que outros, e as suas consequências mais ou menos positivas, os museus e centros culturais converteram-se numa parte, se não no epicentro, de tais campanhas de recuperação de bairros e, ao mesmo tempo, de influência na estrutura económica das cidades. Além disso, estas experiências estão também a ser realizadas em zonas periféricas para fazer face ao desafio do despovoamento, especialmente nos meios rurais.
É neste domínio que consideramos que os museus de arte moderna/contemporânea estão a demonstrar, especialmente, a sua capacidade de produzir efeitos no meio envolvente imediato, enquanto espaços de transformação, a partir do potencial criativo dos profissionais que trabalham na ou para a instituição, desenvolvendo práticas contextualizadas e situadas. Isto engloba diferentes facetas, como já demonstraram outros estudos de modelos museológicos internacionais que se desenvolveram paralelamente a esta situação, tanto numa perspetiva arquitetónica (Mack e Szeemann 1999), como na sua relação com o meio envolvente (Costanzo 2007; Gómez de la Iglesia 2007; Weibel e Buddensieg 2007; Zuliani 2009) ou na sua maior abertura ao contexto social (Domingues et al. 2003; Bonito Oliva et al. 2004). Este fenómeno não é isolado e está interligado com as mudanças na forma como os museus têm sido entendidos nas últimas décadas, que levaram à recente atualização da definição de museu pelo Conselho Internacional de Museus (ICOM):
Um museu é uma instituição permanente, sem fins lucrativos e ao serviço da sociedade, que pesquisa, coleciona, conserva, interpreta e expõe o património material e imaterial. Abertos ao público, acessíveis e inclusivos, os museus fomentam a diversidade e a sustentabilidade. Com a participação das comunidades, os museus funcionam e comunicam de forma ética e profissional, proporcionando experiências diversas para educação, fruição, reflexão e partilha de conhecimento. (ICOM 2022)
É neste contexto dinâmico que os museus de arte moderna/contemporânea se revelam como locais de incerteza, como instituições sensíveis não só às transformações nos modos de produção artística, mas também às mudanças sociais, económicas e culturais. Têm de equilibrar as suas funções tradicionais de colecionar, preservar, interpretar ou expor com uma capacidade de adaptação às mudanças, se pretendem participar plenamente no presente, facilitando zonas de negociação. É a partir deste contexto que valorizamos o facto de poderem surgir modelos alternativos através de práticas culturais e artísticas contemporâneas.
Assim, consideramos necessário dar maior visibilidade a estes museus de onde emanam diferentes formas de investigar, colecionar, conservar, interpretar ou expor o património. Não esquecendo também que os museus são centros de reflexão, de troca de conhecimento, de socialização e de entretenimento, procurando ser acessíveis, inclusivos e promover a participação das comunidades.
À luz destas circunstâncias, consideramos oportuno compreender melhor o panorama dos museus de arte moderna/contemporânea nas primeiras décadas do séc. XXI, considerando o crescimento particular dos últimos 25 anos. Esse enfoque permitir-nos-á explorar a forma como estas instituições estão a influenciar a vitalidade do ecossistema cultural a partir de perspetivas disciplinares heterogéneas. Com este dossier temático, procuramos também dar maior visibilidade ao trabalho, muitas vezes subvalorizado e insuficientemente conhecido, tanto pela sociedade como pelas diferentes esferas profissionais do sistema artístico, de museus localizados fora das grandes cidades.
Assim, interessam-nos estudos que abordem estas questões em museus de arte moderna/contemporânea com coleção própria e vocação museológica, independentemente da sua localização, privilegiando propostas com uma abordagem comparativa entre diferentes exemplos à escala internacional, com especial consideração pelos museus espanhóis e portugueses. Valorizamos a análise de modelos que marcaram tendências ou criaram um cânone, incluindo contra-modelos ou exemplos inovadores. São também bem-vindos estudos de caso significativos pelas suas boas práticas, estudos comparativos sobre as questões enunciadas, incluindo os elaborados na perspetiva do género, das comunidades LGTBIQ e de grupos minoritários, com base nas seguintes linhas temáticas:
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O impacto urbano e territorial do museu, estudo dos aspetos arquitetónicos, incluindo a localização ao ar livre ou ambiente natural;
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Modelos de gestão, política de coleções e/ou exposições, nomeadamente a construção de outras narrativas e imaginários ligados ao território;
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Agência e responsabilidade social, seu valor e impacto positivo na comunidade, educação e ação cultural, educomunicação, políticas de acesso e/ou inclusão através de práticas artísticas contemporâneas.
Com base nas ideias enunciadas, podem ser desenvolvidas novas investigações originais e necessárias para documentar e analisar a situação a partir de múltiplos pontos de vista, incentivando o debate sobre a evolução histórica do atual contexto museológico ligado à arte contemporânea.
Elisa Noronha
Investigadora Auxiliar Contratada no Centro de Investigação Transdisciplinar «Cultura, Espaço e Memória» (CITCEM) da Universidade do Porto (Portugal). Professora Auxiliar Convidada na área da Museologia na mesma Universidade. Doutora em Museologia pela Universidade de Porto. Membro do projeto de I+D+i “Museos de Arte Contemporáneo en España: su Engarce Territorial e Internacional” financiado pelo Ministerio de Ciencia e Innovación de Espanha (2023-2026). Os seus interesses atuais de investigação centram-se na relação entre arte contemporânea, património e envolvimento comunitário; e as suas implicações nas narrativas e discursos museológicos. Desenvolve também um trabalho mais autoral, que se concretiza com a curadoria de exposições e outras produções artísticas/culturais.
María del Mar Flórez Crespo
Professora Contratada no Departamento de Patrimonio Artístico y Documental da Universidad de León (Espanha). Doutora em História da Arte pela Universidad de León. Membro do projeto de I+D+i “Museos de Arte Contemporáneo en España: su Engarce Territorial e Internacional” financiado pelo Ministerio de Ciencia e Innovación de Espanha (2023-2026). Os seus interesses de investigação incluem a proteção do património cultural, a museologia, os estudos de cultura visual e a inovação educativa e pedagógica.