Navegação – Mapa do site

InícioNúmeros77ArtigosLiteratura política portuguesa do...

Artigos

Literatura política portuguesa do século XVII: António Moniz de Carvalho e a soberania do interesse

Seventeenth-Century Portuguese Political Literature: António Moniz de Carvalho and the Sovereignty of Interest
Littérature politique portugaise du XVIIe siècle : António Moniz de Carvalho et la souveraineté de l’intérêt 
José María Iñurritegui Rodríguez e David Martín Marcos
p. 61-81

Resumos

Este artigo apresenta uma leitura da obra Francia interessada con Portugal en la separación de Castilla, publicada por António Moniz de Carvalho em 1644, como uma peça de intersecção entre duas poderosas linhagens textuais: a literatura política concebida no contexto da desagregação de Portugal da Monarquia de Espanha e o modelo analítico inovador que, seguindo o De l’Intéret des princes et états de la chrestienté do duque de Rohan, situou o interesse dos estados como soberano efectivo de uma ordem política europeia. Defende-se que a obra de Henri de Rohan foi o referente discursivo que inspirou Moniz de Carvalho na composição do texto. O seu autor não só enriqueceu o registo retórico da literatura implicada na defesa da causa dos Bragança, estreitamente ligada à linguagem jurídica, mas formalizou também um dos capítulos iniciais e mais singulares da história da receção europeia da obra do duque de Rohan.

Topo da página

Notas do autor

A investigação para este estudo foi financiada pelo Ministério de Ciência e Inovação de Espanha (projeto PGC2018-095007-B-I00) e pelo Programa ‘Ramón y Cajal’ (RYC-2016-20947).

Texto integral

  • 1 Doravante referenciada como Carvalho 1644a.
  • 2 Ver Prestage (1925), Brazão (s. d.), Coelho (1940), Cardim (1998) e Galbarro García (2017).

1Corria o ano de 1644 quando António Moniz de Carvalho (1610-1654), secretário da embaixada portuguesa em Paris, na altura dirigida pelo conde da Vidigueira, publicava nessa mesma cidade a obra Francia interessada con Portugal en la separación de Castilla, con noticias de los intereses comunes de los príncipes y estados de Europa.1 Editado na imprensa de Michel Blageart, o tratado, escrito em castelhano e com um título muito expressivo, seria considerado um dos exemplos mais apurados da literatura política portuguesa destinada a congregar cumplicidades no processo de desagregação de Portugal da Monarquia Hispânica. A partir do momento em que, em meados do século XIX, o visconde de Santarém (1843, IV/1, 111-18) comentou o seu conteúdo, um grande conjunto de estudos tem-se ocupado do texto, do seu autor e do seu contexto.2 Apesar de ser uma pièce d’occasion, a obra teve um percurso sólido – contando com, pelo menos, duas edições em Barcelona (Carvalho 1644b e 1647a) – sendo que o seu objeto seria ainda alvo de nova publicação pelo autor, em 1647, com Esfuerzos de la razon para ser Portugal incluido en la paz general de la christiandad, conformes a las obligaciones, intereses, y empeños de Francia (Carvalho 1647b).

  • 3 As únicas contribuições historiográficas que vinculam Moniz de Carvalho ao duque de Rohan devem-s (...)

2Em contrapartida, pode afirmar-se que a semântica utilizada na composição da obra não tem tido a atenção devida. Nestas páginas, defende-se que, a partir da sua análise, pode falar-se de um momento de marcada especificidade no itinerário discursivo de Moniz de Carvalho, se se tiver em conta que Francia interessada se distancia significativamente da linguagem jurídica que até então o secretário tinha utilizado na defesa e propaganda do Portugal de D. João IV. Na verdade, a sua nova linguagem, longe de ser a do direito, era a do interesse dos estados. Esta conferiu, ao mesmo tempo, uma segunda especificidade a Francia interessada ao adotar abertamente um registo retórico que não era comum no contexto das letras consagradas à causa que este pretendia mobilizar. Na verdade, é de assinalar que mantinha uma estreita relação com a novidade que, poucos anos antes, tinha significado para a semântica política europeia a publicação, por parte do duque huguenote Henri de Rohan, da obra De l’Intérêt des princes et états de la chrestienté (Rohan 1638), um tratado que proclamava o interesse dos estados como soberano de facto na ordem política global e a que o secretário português tinha tido provavelmente acesso em Paris.3

  • 4 Para uma contextualização na literatura política portuguesa do período, cf. os trabalhos clássico (...)

3Neste sentido, este artigo procura estabelecer dois pontos historiográficos principais: (1) que a linguagem do interesse dos estados, reformulada pelo duque de Rohan, esteve também presente no discurso político dos diplomatas portugueses de meados do século XVII;4 e (2) que, consequentemente, se deve incluir o nome de Moniz de Carvalho no cânone de autores com que se analisa a receção de De l’intérêt, compreendendo a sua obra como um episódio significativo desse processo, tanto pela data de publicação de Francia interessada como pelos termos nos quais esta foi concebida e escrita. Para isso, nestas páginas, se procederá, primeiramente, ao estudo da trajetória intelectual de Moniz de Carvalho para a poder relacionar com a organização discursiva plasmada na Francia interessada. Em segundo lugar, o objetivo será o de estabelecer um paralelismo com a argumentação e a semântica utilizada no De l’intérêt e indagar da sua intertextualidade. Seguidamente, reconstruir-se-á o contexto político e intelectual desde o momento em que, em Paris, o secretário português pôde ter acesso à linguagem do interesse dos estados. Por último, refletir-se-á sobre o significado que a assimilação e o uso por parte deste jurista representa na complexa história da leitura e receção da obra do duque de Rohan.

1. O jurista e a linguagem do interesse dos estados

4Não deixa de ser um detalhe a ter em conta que as primeiras páginas de Francia interessada se ocupem de uma dedicatória à regente Ana de Áustria, em que se condensava a atmosfera de incertezas e expectativas próprias do início de um reinado. À frente do governo de Paris desde a morte de Luís XIII em 1643, Ana de Áustria tinha como divisa, lembrava o secretário português, uma “águila real con manos armadas y alas extendidas”. Segundo Moniz de Carvalho essa disposição alada representava a vontade da França “para conservar, defender y amparar a sus aliados”. A justiça da causa de D. João IV de Portugal, assegurava o autor, era motivo mais do que suficiente para mobilizar a nobreza da águia. No entanto, havia outro fator mais relevante: o facto de que no processo de separação de Portugal também se fortalecessem os “intereses de Francia”, na medida em que um triunfo de Portugal com o apoio da França poderia garantir a própria estabilidade do reino que então era governado por Ana de Áustria (Carvalho 1644a, s. p.).

  • 5 Alguns dados biográficos em Machado (1741, I, 333-34), Amzalak (1930) e Carvalho (1642).
  • 6 Carvalho (1641a), que é a tradução do seu Brevis assertio et apologia acclamationis, et justitiae (...)
  • 7 Carvalho (1641b e 1641c). Também o embaixador Francisco de Sousa Coutinho se dedicou ao assunto – (...)

5A dedicatória, assim sendo, poderia ser interpretada como uma declaração preocupante para a regente. E frise-se que quem a tinha pronunciado não era na altura um recém-chegado à causa da defesa escrita da chamada Restauração. Natural de Viana do Castelo e fidalgo da Casa Real, Moniz de Carvalho tinha-se doutorado em Leis na Universidade de Coimbra e tinha ocupado um cargo de desembargador da Relação do Porto. Antes de chegar a Paris, além do mais, já tinha servido como secretário da embaixada da Dinamarca e da Suécia dirigida por Francisco de Sousa Coutinho.5 Em 1641, encontrando-se em Estocolmo, onde a delegação tinha conseguido a assinatura de um tratado de paz, publicava em latim uma asserção em defesa dos direitos de D. João IV ao trono português,6 assim como um texto em que denunciava o cativeiro imposto pelos imperiais ao irmão do rei, o infante D. Duarte de Bragança, perante a sua detenção em consequência do levantamento de Portugal.7 Cobrindo, assim, dois dos grandes temas que ocupavam os restauracionistas – a justiça que assistia aos Bragança e o escândalo da prisão do irmão do rei –, Moniz de Carvalho dava testemunho do seu envolvimento na propaganda política portuguesa do ponto de vista do direito. No entanto, é precisamente esta circunstância, a do apego inicial a uma linguagem jurídica, que concede uma maior importância à nova semântica do interesse que o autor adotaria na Francia interessada, dando uso a um recurso pouco comum no contexto discursivo da literatura política bragantina, ainda que não fosse pouco frequente naquele tempo.

  • 8 Para a história do conceito, cf. Ornaghi e Colletessa (2000, 21-75) e a Introdução de Christian L (...)
  • 9 Ver Meinecke (2014, 67-198 e concretamente p. 71 para a citação de Botero). Para a insistência ne (...)

6Na época de Moniz de Carvalho, em meados do século XVII, o conceito de interesse gozava já, de facto, de uma história considerável. Remetia-se à ideia de utilitas publica da Antiguidade clássica e caracterizava-se por uma acentuada condição polissémica, na qual afloravam tanto a sua utilização pela escolástica na abordagem da usura como nas análises renascentistas sobre a complexidade das aspirações e motivações humanas. Aliás, tinha-se visto enriquecido pela fratura confessional da Cristandade, na altura em que o entendimento clássico da política ressuscitada pelo humanismo cívico ia dando lugar à literatura da razão de estado.8 A este respeito, Giovanni Botero tinha chegado a cunhar o sintagma ‘interesse de estado’ sob uma estrita equivalência com a razão: “ragion di stato è pochi altro che ragion de interesse”, como escreveu o pensador piamontês no início do século XVII.9 No entanto, só nas vésperas da publicação de Francia interessada, e especialmente depois da edição do De l´intérêt do duque de Rohan na década de trinta, se identificou o interesse dos estados como um princípio infalível, tendo em conta que era infalsificável, e como um elemento político racionalmente objetivável que seria imprescindível para conseguir a plenitude da soberania (Salmon 1975, 121-40; Keohane 1980, 155 e 174; Thuau 2000, 312).

  • 10 Sobre a importância que pode ter tido neste aspeto a sua precoce ligação literária em Paris a Fer (...)

7Era aí que radicava o novo pensamento de Moniz de Carvalho. Fazendo gala de um posicionamento que reclamava o desterro das paixões, o secretário advogava pelo seu abandono, não já em nome de princípios morais e religiosos, mas por considerá-las responsáveis pelas deficientes operações de exegese do interesse que povoavam a história (Hirschman 2014, 56-59; Force 2003, 135-40; Dewald 2015, 71). Por essa razão, em Francia interessada, uma obra que mal superava a centena de páginas, despojada de anotações e paratextos, e que utilizava um argumento simples e claro, estruturado em sete Demostraciones, o autor aspirava a demonstrar que, se França e os demais estados da Cristandade analisassem desapaixonadamente os seus interesses, teriam de fazer sua a causa de Portugal (explicando, além disso, que esta proporcionava uma oportunidade política única para restabelecer de forma duradoura um novo equilíbrio europeu). Se “en la balanza de poderes opuestos pesaba mucho el de España por la unión de reinos y conquista de Portugal”, teria de se convir que “quedando sin Portugal [a Monarquia de Espanha] tendr[ía] sus intereses de Estado en Estado que no [foram] de escrúpulo o recelo a sus vecinos”, podia ler-se na obra (Carvalho 1644a, 23r). Consequentemente, mesmo que os topoi da história da união das coroas e do direito de resistência frente à tirania tivessem ainda o seu espaço no texto, eles já não ocupavam uma posição dominante na sua estrutura, ao contrário do que sucedia com as obras escritas por Moniz de Carvalho durante a sua estadia na Suécia ou por parte de outros juristas portugueses contemporâneos (Cardim 2014, 219-34).10

8Por comparação, eram os interesses que surgiam numa posição preponderante na Francia interessada. Assim, se em primeiro lugar figurava o “verdadero interés de Francia”, que Moniz de Carvalho entendia como “siempre uno y perpetuo” e identificava com a necessidade de evitar que “la Casa de Austria llevase el peso de la balanza”, havia depois lugar para todos os restantes: o dos príncipes de Itália, o de Inglaterra, o das Províncias Unidas, o dos Cantões suíços, o da República de Veneza, o da Suécia, o da Dinamarca, ou o do Papado, como principal interessado em ter “contrapesados entre sí” os “poderes de reyes católicos y príncipes soberanos”, como especificava o secretário (Carvalho 1644a, 23v e 39r). Os príncipes e estados citados não ocupavam todos o mesmo lugar na estrutura argumentativa do livro. As Províncias Unidas e a Suécia aparecem sobretudo na Demostración II, dedicada às alianças, no momento em que Moniz compara as diferentes alianças da França, para demonstrar que a de Portugal era a mais vantajosa. E os demais aparecem numa sequência em que o autor analisa os seus respectivos interesses na manutenção da separação de Portugal da monarquia hispânica. Mas sempre, e em todos esses casos, sob o argumento da necessidade de restabelecer o equilíbrio de poderes recorria-se a uma linguagem do interesse de estado, sendo antes definida em relação ao seu enquadramento na ordem política europeia. Tal sucedia quando, em nome da importância das alianças, se referiam “los intereses que ligan a Francia y Suecia”, e também quando, ao apelar ao “verdadero interés” de cada estado se apelava, por exemplo, ao “interés propio de Gran Bretaña” (Carvalho 1644a, 22-25, 28-30 e 42).

9Nesta medida, Moniz de Carvalho adotava um quadro analítico semelhante ao empregado pelo duque de Rohan. Essa semelhança não se materializava na estrutura formal ou na disposição argumentativa. O duque de Rohan convertia os interesses de cada estado e de cada príncipe da Cristandade em unidades analíticas extremamente reduzidas, às quais dedicava uma série de capítulos específicos. Perante essa opção, Moniz de Carvalho articulava a sua obra através de Demostraciones de natureza temática, começando pelas alianças ou a paz. Era a partir destas demonstrações que o autor ia desenvolvendo as suas considerações sobre os interesses de cada um desses sujeitos políticos, considerando, além disso, fora de discussão a maneira como esses interesses eram afetados pela nova situação política de Portugal. No entanto, outro ponto distinto era o enfoque empregado em ambos os textos e a sua intencionalidade ao usar esses termos. Nesse sentido, a marca da obra de Rohan – o seu entendimento da análise dos interesses dos estados como um ramo autónomo do conhecimento político – estava bem presente na exposição de Moniz de Carvalho. Antes de mais, porque o que pretendia com a sua Francia interessada era justamente interpelar a França e os outros poderes da Europa a assumirem com coerência os postulados do interesse com os quais Rohan tinha pretendido acabar com a pretensão universalista que se imputava à Monarquia de Espanha.

2. O duque de Rohan e a soberania do interesse

  • 11 Mercure Français, 20 (Paris, 1937), 46-126. Cf. Lazzeri (1995, 129 e 152) e Salmon (1987, 108).
  • 12 Para a definição do momento do seu percurso biográfico no qual se concretiza a publicação, e para (...)

10A obra de Rohan, que tinha visto a luz pela primeira vez nas páginas do Mercure Français em 1637,11 tinha partido de um princípio básico: a posição que se reservava ao interesse na dimensão externa das formações políticas era a mesma que ocupava a soberania no seu interior; razão pela qual se defendia que uma incorreta assimilação da lógica do interesse resultaria sempre numa soberania imperfeita. É necessário dizer que essa correlação era, em si mesma, um axioma. No entanto, curiosamente, para a defender, o seu autor, recorrendo a uma arquitetura argumentativa clara, rejeitava o valor de qualquer máxima política extraída do passado. O saber transhistórico, como tinha referido o duque na dedicatória a Richelieu presente na edição de 1638, carecia de valor: “On ne peut etablir une norme inmutable dans le gouvernement des états [porque] ce qui cause la revolution des affaires de ce monde, cause aussi le changement de maximes fondamentales pour bien regner” (Rohan 1639).12

11A chave mestra do governo político, recordava ele a Richelieu, consistia na capacidade em encontrar o verdadeiro interesse de um estado e saber preservá-lo. Ainda que a razão para tal – a infalibilidade desse interesse e a sua condição soberana – se definisse melhor na introdução da primeira parte da obra: “Le Prince se peut tromper, son Conseil peut etre corrompu; mais l´intérêt seul ne peut jamais manquer; selon qu’il est bien ou mal entendu, il conserve ou ruine les Estats”. Nessa mesma introdução, além disso, antecipava-se com clareza que a catalogação do interesse se baseava numa comprovação empírica da dimensão externa do interesse de estado. Esta tornava-se evidente de uma forma extremamente plástica quando se afirmava que na Cristandade existiam duas potências, França e Espanha, que se comportavam como polos opostos que condicionavam a situação de paz e guerra sobre os outros príncipes, os quais se atacavam mutuamente segundo os interesses daqueles (Rohan 1639, 104-06).

  • 13 Ver Krieger (1965, 170-201), Bartelson (2018, 45-59) e Sedler (2011).
  • 14 Para a identificação de uma dualidade de tradições – a do direito público da Europa continental e (...)

12Ao contrário do que sucederia com outros tratados, como Einleitung zu der Historie der vornehmsten Reiche und Staaten so itziger Zeit in Europa sich befinden, de Samuel Pufendorf, que podem radicar-se na nova via traçada pelo huguenote, no De l’intérêt não se encontrava evidência dos debates sobre as formas de governo ou sobre sociabilidade política. Pufendorf entendia que as sociedades políticas, nas quais o homem conseguia superar um estado de natureza marcado pela amoralidade e a ignorância, só poderiam fazê-lo quando estavam dotadas de estruturas bem definidas e contavam com uma soberania perfeita que lhes permitia uma maior compreensão do seu próprio interesse em relação a outros estados.13 Rohan, por outro lado, tinha evitado abordar o terreno do direito natural.14 O seu campo de atuação tinha-se delimitado a uma dupla tarefa: por um lado, estabelecer o verdadeiro interesse de cada príncipe (com um capítulo específico, por esta ordem, para Espanha, França, os príncipes de Itália, Roma, Alemanha, Províncias Unidas e Inglaterra); e, por outro, relatar os acontecimentos que tinham afetado a Cristandade nos últimos anos para comprovar a incompatibilidade do interesse com desejos desregrados e paixões violentas (Rohan 1639, 132-33).

13Como era o caso em Moniz de Carvalho, o duque de Rohan não circunscrevia, assim, a sua análise ao interesse de um único estado. Incorporando os pressupostos científicos da mathesis universalis cartesiana (os princípios epistemológicos da ciência de conhecimento, comparação e ordenação definidos em 1636 por Descartes nas Regulae), uma das vias narrativas principais traduzia-se no empenho na comparação e no estabelecimento de tabulações. As suas páginas apresentavam toda uma taxonomia de agentes políticos em função da sua capacidade específica em operar de acordo com o princípio do interesse (Bartelson 1996, 137-85); e, não tendo a necessidade de definição, o saldo final da sua análise não resultava, consequentemente, em nenhuma teoria, para além dos princípios definidos pelo duque. Assim sendo, sob a pauta marcada pelo De l’intérêt, aquilo que se apresentava era um exercício analítico de dupla projeção: (1) a constatação das diferenças com que os estados atuavam segundo a avaliação dos seus verdadeiros interesses; (2) a tomada de consciência, a partir da exegese do interesse, dos erros cometidos por alguns soberanos e pelos seus ministros quando sucumbiam ao influxo das paixões.

  • 15 Para a centralidade do conceito de monarquia universal no imaginário político do tempo, cf. Bosba (...)

14Deste modo, tornava-se necessária uma atualização constante da análise, o que explica a série de títulos que, ao longo de quase um século, se sucederiam em França, na sequência do trabalho do duque de Rohan. Nouvelles intéréts des princes de l´Europe (1685), de Gatien Courtliz de Sandras (Haffemayer 2011, 137-62), e Les intéréts présents des puissances de l´Europe fondez sur les traitez depuis ceux d´Utrecht inclusivement (1731), de Jean Rousset de Missy, são dois bons exemplos deste fenómeno. Era o imperativo derivado da revalorização inovadora da história do tempo recente que estava implícito na decisão adotada pelo duque de Rohan de circunscrever a sua exposição ao passado mais próximo. Como proclamaria com solenidade Pufendorf, da mesma forma que se entendia que tinha chegado o momento de romper amarras com a forma de conhecimento renascentista estruturado pelas semelhanças e pelos exempla, também se entendia que tinha chegado a altura de acabar com a lógica cultural que assumia que a leitura de Tácito, Tito Lívio ou Quinto Cúrcio tinha uma aplicação política prática. Em todo o caso, se havia uma marca renascentista naquela nova literatura política, esta obedecia à aplicação dada pelos humanistas à análise histórica na conceção de uma forma de ordenação política territorial que desafiava os poderes universais da Igreja e do Império (Devetak 2014). No horizonte de Rohan, o saber que se extraía da história era aliás mais preciso que em Bruni ou Sarpi. Era o conhecimento do interesse, sendo que o ídolo universalista que se aspirava a derrotar com esse saber não era um Império ou uma Igreja, mas uma monarquia como a espanhola, à qual se imputava uma vocação de domínio irreconciliável com as liberdades da Europa.15

3. A descoberta de um horizonte discursivo para além de Caramuel

15É provável que ninguém lesse com mais antecipação que Moniz de Carvalho o que a nova retórica política personificada no duque de Rohan podia contribuir para a situação de Portugal, apesar de não haver na obra do francês uma única cumplicidade com a causa dos Bragança. Na verdade, De l’intérêt não problematizava o tema da união das coroas ibéricas nem vinculava esse episódio à consolidação da hegemonia da casa de Áustria. Só havia lugar na obra a uma referência a Portugal, a propósito do trágico destino de D. Sebastião, desaparecido em 1587 na batalha de Alcácer-Quibir. Neste contexto, a figura do rei surgia como um expoente de uma cultura falida pela sua adesão à paixão e à sua impermeabilidade à razão. D. Sebastião não tinha tido junto a ele um “autre Aristote” que o convertesse em um “autre Alexandre”, pelo que se constituía como um paradigma de desejo desregulado (Rohan 1639, Preface). Portugal, neste sentido, figurava como um contramodelo em relação à linguagem do interesse dos estados, não havendo no escrito de Rohan nenhuma argumentação sobre o aumento do poder hispânico a partir da agregação de Portugal em 1580, apesar de ser desejo do duque que os príncipes europeus se levantassem contra a ameaça universalista do cetro hispânico.

  • 16 Como mostra o cultivar dessa cumplicidade com Richelieu, cf. Vila Real (1641).

16Moniz de Carvalho, no entanto, não parecia ter necessidade de nenhuma referência concreta ao caso português para vislumbrar o potencial discursivo que a obra do francês podia conter para os interesses da dinastia que, no extremo ocidental da península Ibérica, se tinha levantado contra os Áustrias. Distanciando-se da semântica técnica de juristas e teólogos e assumindo o enfoque de Rohan, o notável é que Moniz de Carvalho não pretendia elaborar um argumento que levasse a conclusões diferentes das que se encontravam em De l’intérêt. Com a sua forma de enunciação, ao falar de uma Francia interessada, Moniz revelava-se um leitor ágil e audaz que descobria as possibilidades retóricas de uma forma de expressão política, com convenções e estilo próprios, para recordar Paris que a aritmética fundamentada dos interesses passava necessariamente pelo seu apoio a Portugal. Mas, além disso, fazia notar-se nessa disposição a sensibilidade política e literária do contexto em que ele se tinha começado a mover desde a sua chegada a Paris, mantendo sempre uma certa proximidade a Richelieu, primeiro, e a Mazarino depois.16

  • 17 Ver Carvalho (1646) e Macedo (1642, Prólogo).

17Por isso, não é despiciendo chamar a atenção para os paratextos das Rimas varias y tragicomedia del Mártir de Etiopía do gongórico Miguel Botelho de Carvalho, publicadas em Rouen em 1646 graças ao cônsul português Manuel Fernandes Vila Real, onde se reuniriam peças do próprio Moniz de Carvalho, de António Henriques Gomes ou de António de Sousa Macedo, secretário da embaixada portuguesa em Londres, que em 1642, no prólogo do seu Caramuel convencido, já citava diretamente De l´intérêt.17 Essa citação da versão original francesa, quando na altura o texto já tinha sido traduzido para inglês em 1640, serve para contextualizar a Francia interessada de Moniz de Carvalho, na medida em que acredita que no seu círculo intelectual a obra do duque de Rohan não só era conhecida e lida, mas também começava, ainda que timidamente, a ser instrumentalizada pela propaganda portuguesa. Talvez fosse esta a razão pela qual Sousa Macedo, na sua crítica a Juan Caramuel Lobkowicz, também tivesse recusado o seu método de escrita, cheio de citações e referências, ao ponto de converter o seu livro em “un laberinto tan intrincado que no hay hilo que pueda servir de guía” (Macedo 1642, Prólogo).

  • 18 Para a inclusão da obra na literatura atraída então pelo tema da monarquia universal, cf. Schmidt (...)

18Neste sentido, o acesso à leitura de De l’intérêt estaria, muito possivelmente, a propiciar uma mudança de paradigma. Pouco antes, Fernandes Vila Real (1641, 114, 185 e 197), no seu Epítome genealógico dedicado a Richelieu, tinha considerado que tanto o “interés de estado” como “la regla de las pasiones” eram próprios de “príncipes ambiciosos”. O repúdio de Vila Real era provavelmente provocado pela desconfiança, e condenação, de que a “mudanza de intereses” implicasse uma “mudanza de alianzas”. No entanto, agora, o esforço contra a literatura política hispânica, que Caramuel representava, podia ser redimensionado, graças a Moniz de Carvalho, seguindo exatamente a linguagem e a disposição discursiva de Rohan. A partir de ambos os elementos inferidos da Francia interessada, podia transmitir-se uma ideia muito concreta da atitude que deviam seguir os estados perante a rutura portuguesa de 1640, cuja assimilação produziria as desejadas consequências políticas. Enfim, quando Moniz de Carvalho referia que o desígnio de Espanha tinha sido “ser en todo superior para formar de ajenos una Monarchia; que siendo toda suya, fue la universal de toda Europa” e que tinha encontrado a sua oportunidade em Alcácer-Quibir, não estava a escrever história. Nem sequer procurava um reconhecimento teórico para uma leitura do levantamento português como um momento oportuno para demolir o “edificio imaginario, que [os monarcas espanhóis] nunca le tuvieron por efectuado, ni seguro, sino después de la muerte del Rey Don Sebastián”. Pelo contrário, o que o secretário pretendia era promover a mobilização no combate contra um “monstruo y universal gigante de su grandeza”. Considerando desta forma que o regresso de Portugal ao seu “natural y legítimo heredero” – a chave para a recuperação de “la libertad pública de Europa” – só poderia fazer-se com eficácia se se pudesse contar com outro gigante, o qual, desta vez, seria formado por alianças (Carvalho 1644a, 3 e 5-6).18

  • 19 Sobre a intencionalidade da explicação do duque de Rohan nesse sentido concreto, cf. Bonnet (2019 (...)

19Exaltar o estatuto dos pactos como garantes de equilíbrio e a balança de poderes era o tópico que mais interessava a Moniz de Carvalho (1644a, 25r): “Son las alianzas de las Coronas y Príncipes los vigores de los brazos y poderes de guerra, son las columnas, y apoyos para la seguridad y quietud de la paz”, razão pela qual “procuró siempre la Casa de Austria, dividir y separar de Francia a todos los interesados y aliados con ella”. Provavelmente, nessa aposta, o desapego do ambiente intelectual do secretário pelo rigorismo confessional tinha um papel fundamental, uma vez que tal atitude incorporava a receção e a assimilação da transversalidade religiosa que tinham sido apresentadas como requisitos pelo duque de Rohan para se efetivarem as alianças.19

  • 20 Sobre o mesmo, ver Cardim (2015).

20Claro que Francia interessada também incluía outros registos. Moniz de Carvalho não inovava quando utilizava, por exemplo, a história para demonstrar que um Portugal independente não haveria de constituir qualquer ameaça à preservação de um equilíbrio cuja restauração parecia possível. Destacar que o reino nunca tinha tido qualquer ambição de apropriar-se de terras alheias, nem de provocar qualquer conflito na Europa, era reincidir no que já se tinha dito no Manifiesto del Reyno de Portugal (“Portugal estabelecia a sua grandeza sobre a paz na Europa e Castela ambiciosamente afectava consegui-la pela guerra”) contra o qual escrevera Caramuel Lobkowicz. No entanto, por outro lado, detetar na obra do duque de Rohan uma via de diálogo que não necessitava de esgotar toda a energia discursiva que se utilizava na frente contra Caramuel Lobkowicz já era em si uma novidade. Sem ir mais longe, em Ecco polytico, publicado em Lisboa em 1645, Francisco Manuel de Melo já fazia uma referência direta aos “intereses y querellas de los Príncipes de Europa”, como caixa de ressonância da retórica política de Moniz de Carvalho e do duque de Rohan. Fazia-o quando afirmava que era “indubitable cosa” que “en los intereses de Europa son los mayores el de España y Francia, de donde emanan, casi comúnmente, los de otros Príncipes”. Assim como quando assegurava que “disminuida en parte su grandeza, la potencia del rey Catholico cedería de sus intereses de tal suerte que la concordia universal que ella propia impedía (o por sospecha o por justificada) habr[ía] de tener ahora más fácil ejecución” (Melo 1645, 63v e 69v). Por sua vez, Braz da França (1645) daria um passo adiante ao expor que, na realidade, a própria Monarquia hispânica devia rever os seus interesses, chamando a atenção que os mesmos tinham estado historicamente submetidos aos interesses dinásticos da Casa de Áustria.20

4. Moniz de Carvalho e o cânone da receção de De l’intérêt

  • 21 Antes da publicação da Francia interessada em 1644, o De l´intérêt já tinha alcançado ao menos ci (...)
  • 22 A Treatise of the Interest of the Princes and States of Christendome. Paris, 1640; Interesse Der (...)

21Quando Moniz de Carvalho adotou o De l’intérêt como referência para Francia interessada, o texto do duque de Rohan, que tinha tido um sucesso editorial imediato em França e na Europa, continuava a gozar de uma vigência plena. Não só continuava a ser reeditado, ora de forma autónoma ora em conjunto com outros textos, como o Parfait Capitaine, como, à margem da sua passagem pela imprensa, mantinha uma sólida circulação manuscrita.21 Além do mais, tinha conhecido desde muito cedo uma série de traduções, muitas delas publicadas significativamente na própria França, que tinham facilitado a sua difusão pelo continente: para inglês (1640), para alemão (1641), para latim (1644), para italiano (1646) e para holandês (1654), tendo motivado em muitos destes casos diversas iniciativas de reedição.22 Não se contaria, é verdade, nem com versões em português nem em castelhano, o idioma escolhido por Moniz de Carvalho para escrever Francia interessada, mas a existência desta obra é suficiente para comprovar que a receção de um texto nem sempre requer a mediação da tradução.

22Em todo o caso, o esquema analítico desenhado pelo duque de Rohan sobre o modelo do interesse imprimiu uma marca profunda em contextos como o inglês ou o holandês, que tinham antes traduzido o seu texto. Isso mesmo o ilustra bem Marchamont Nedham, autor de um pamphlet intitulado Interest will not lie, or a view of England´s true interest, assim como Pieter de la Court, que escreveu Interest van Holland. Nem um nem outro são casos isolados. Em Inglaterra, o nome de Nedham é acompanhado pelos de Henry Ireton, James Harrington ou Charles Herle; e o de Pieter de la Court está ladeado pelo de Petrus Valkenier. Ora, para além de outras especificidades nada insignificantes que as distanciavam entre si, a maioria dessas obras modelava uma forma de receção muito específica da semântica do interesse que guiava a escrita do duque de Rohan. Em textos como o Interest will not lie, de Nedham, o prisma do interesse não se aplicava, nem epistemológica nem pragmaticamente, ao estudo do ajuste entre princes e états na cena europeia, mas a uma avaliação alternativa do England´s true interest a partir das diferentes possibilidades de composição dos interesses internos do corpo político inglês (Gunn 1968; Pincus 1998; Houston 2001; Walker 2015). Porém, a particular forma de receção que desta forma se modulava não seria exclusiva do universo inglês. Entrelaçando-se com o discurso do republicanismo e com a lógica do comércio, a compreensão correta do Interest van Holland que, em 1662, propunha De la Court consagrava boa parte da sua composição à disposição política interna, irreconciliável tanto com o despotismo como com o belicismo, considerada a que serviria melhor para a identificação e preservação do seu interesse (Weststeijn 2012; Scott 2002).

23Nessa mesma década de 1660, a história da receção do De l’intérêt enriquecia-se com uma nova interpretação que situava a ameaça da monarquia universal na própria França. Desde a publicação de Bouclier d´etat (Lisolá 1667), no contexto da Guerra de Devolução (1667-1668), que se tornava evidente que a regra da indispensável atualização da identificação do interesse na determinação das políticas europeias podia estimular a aplicação do esquema de De l´intérêt em sentido dinástico inverso ao que tinha inspirado a sua composição (Levillain 2015). A sua utilização no combate contra Luís XIV em nome das liberdades da Europa e da balança de interesses converter-se-ia num lugar-comum de boa parte da literatura política europeia de finais de Seiscentos. Seria tão frequente que, inclusivamente, a Monarquia de Espanha, colocada na mira do duque de Rohan, pôde então acabar por adotar com naturalidade esse discurso em obras como Verdad política, publicada em Bruxelas em 1694 por Francisco Miguel de Salvador (Fernández Albaladejo 2019; Iñurritegui 2015).

24Num sentido dificilmente imaginável para Henri de Rohan, a vocação expansionista de Luís XIV seria o que acabaria por dar verdadeira estabilidade a boa parte da sua proposta discursiva sobre o interesse dos estados no debate político europeu. No entanto, justamente, a própria possibilidade desse exercício de apropriação do quadro conceptual da semântica do interesse era já o que meio século antes, sem a inversão da intencionalidade dinástica pelo meio, tinha vislumbrado Moniz de Carvalho no que, em termos maquiavélicos, se entenderia como occasione. Não sabemos, com certeza, quando terá lido o texto do duque de Rohan, mas sabemos que, nos primeiros tempos do reinado de Luís XIV, quando a receção da obra, ao contrário da sua leitura, ainda estava longe de estar consolidada, Moniz de Carvalho tinha já dedicado à rainha regente um texto no qual se apropriava implicitamente de alguns elementos discursivos essenciais do De l´intérêt. Desde a própria disposição literária do discurso do interesse como retórica da persuasão até à assunção da subordinação da conduta política dos príncipes e dos estados ao interesse. Desde a sua consideração, não como critério atemporal, alheio às mudanças e mutações políticas e religiosas, mas como elemento dinâmico e performativo, cuja identificação dependia, de facto, das variações da situação específica de cada estado e dos estados que o rodeiam até ao recordar de que um observador racional podia estar mais capacitado do que qualquer autoridade política para determinar quais seriam os interesses de um estado num momento determinado. Esse género de pressupostos de escrita, sem necessidade de justificação, determinavam o modo como os argumentos eram expostos, permitindo a Moniz de Carvalho apresentar a rutura de 1640 como uma variável inesperada que obrigava a reajustar a aritmética do interesse. Além disso, por sua vez, tinham-no eximido de procurar argumentos mais precisos para legitimar uma intervenção, na qual um diplomata português se propunha educar a França, assim como os demais estados e príncipes da Cristandade, tendo em vista a natureza dos seus verdadeiros interesses.

5. Epílogo

25Um dos primeiros intuitos da diplomacia de D. João IV, a partir do momento em que se deu o levantamento de 1640, foi conseguir estabelecer uma aliança com a França. Os primeiros embaixadores portugueses enviados a Paris em 1641, Francisco de Mello e António Coelho de Carvalho, já tinham sido instruídos no sentido de demonstrar, entre outros assuntos, que todo o apoio concedido à guerra de Portugal contra a Monarquia Hispânica seria vantajoso para a coroa francesa. Quando o conde da Vidigueira ocupou o seu cargo um ano depois, e converteu Paris num polo fundamental para a diplomacia lusa – através da gestão da informação e da propaganda que haveria de circular por toda a Europa (Carvalho 2013) –, esse objetivo estava mais do que definido. Assim sendo, não é surpreendente que tenha sido nessa cidade, e sob o ascendente do conde, que o secretário Moniz de Carvalho deu corpo em 1644 a Francia interessada.

  • 23 Conde de Vidigueira a Francisco de Sousa Coutinho. [París], 16 de janeiro de 1644. Biblioteca Nac (...)

26Tinha sido o próprio Vidigueira quem, pouco antes, em janeiro desse mesmo ano, tinha já concebido, em termos de interesse, as possibilidades que para a independência de Portugal se abriam com os múltiplos e cada vez mais numerosos confrontos que povoavam o continente.23 Havia, nesse sentido, uma coincidência plena entre o enfoque com que Vidigueira analisava a realidade política e os termos que, ao mesmo tempo, Moniz de Carvalho mobilizava para compor a sua obra. Se Vidigueira tinha apontado o contexto bélico europeu como um momento oportuno para consolidar a separação de Portugal, Moniz de Carvalho tinha apostado em explicitar que a desagregação portuguesa era um momento de grande oportunidade política para França e para a Europa. O seu compromisso, explicara o secretário, não podia ser abstrato. Ao contrário, requereria pró-atividade, tendo em conta que aquilo que se debatia na querela portuguesa era também do seu próprio interesse.

  • 24 Vicente Nogueira ao marquês de Niza. Roma, 8 de março de 1649. Cit. em Serafim (2011, 231).
  • 25 Para o controlado processo de erosão da política cristã durante a chamada “Restauração” em conseq (...)

27Nesta reflexão de Moniz de Carvalho sobressaía o facto de este usufruir de um círculo intelectual forte que, no seu pensamento sobre a política e sobre a arte de governo, tinha sido capaz de não se circunscrever aos limites e à dogmática da política católica. As iniciativas que, no seio deste círculo, se chegaram a esboçar a propósito dos Discorsi de Maquiavel (Albuquerque 2004, 55-56), ou as apologias que se fizeram às Mémoires do duque de Rohan, logo depois da publicação da obra de Moniz de Carvalho, consideradas sagazmente por Vicente Nogueira como um “pedaço de ouro”,24 num texto epistolar dirigido, a partir de Roma, a Vidigueira em 1649, são dois bons exemplos disso mesmo. O lúcido exercício de leitura e a apropriação discursiva que Moniz de Carvalho operava a partir do texto do duque de Rohan usufruía desse contexto intelectual particular, ao mesmo tempo que contribuía para defini-lo. Só a partir dele se poderá entender a determinação para dar o passo transcendental que Moniz de Carvalho tinha dado com a publicação de Francia interessada. Colocar um novo registo discursivo ao serviço da causa dos Bragança não só passava por assumir a identificação dos interesses dos estados como regra de atuação do sujeito, mas também como critério epistemológico de leitura política do ponto de vista do observador. Obrigava a interiorizar uma forma de exposição pública e racional da política que acabava com o véu de secretismo que tradicionalmente cobria os arcana imperii. Mas, para além disso, obrigava a romper com os postulados da teologia política católica, irreconciliáveis com a organização de qualquer tipo de aliança supra-confessional.25

28Uma vez assumida essa postura de escrita, tudo se tornou uma espécie de jogo de espelhos particular, não em relação à estrutura textual, ou à literalidade da obra do duque de Rohan, mas relativamente à sua exposição e enquadramento: se, na sua cruzada contra a monarquia universal, Rohan apelava aos estados europeus, desde França e em nome do interesse, Moniz de Carvalho usava um motivo político idêntico para reabilitar essa convocatória a partir de Portugal, dirigindo-a, em primeiro lugar, à própria França. Não era, no entanto, um jogo banal. Talvez não houvesse uma forma mais elegante de moldar uma estratégia de captação de cumplicidades – e que, ao mesmo tempo, fosse um convite efetivo à ação – do que recordar à França os seus verdadeiros interesses e o facto de ter chegado o momento de ela se mostrar soberana em relação aos mesmos. Não é, assim, de estranhar que a obra de Moniz de Carvalho tivesse tido eco também na Catalunha, com duas edições em Barcelona em 1644 e em 1647. Afinal, era na Catalunha levantada em armas contra a Monarquia Hispânica que Moniz de Carvalho tinha um dos interlocutores habituais da sua correspondência, sendo também aos seus deputados e conselheiros que Vidigueira escrevia para dar-lhes testemunho do afeto que D. João IV nutria por eles. Francia interessada, pela sua marcada singularidade, e pela atenção particular que dedicava a retratar de forma traumática a atuação francesa na Catalunha, podia assim revestir-se da mesma condição de modelo e estímulo que para o seu autor tinha tido a leitura do duque de Rohan.

  • 26 “França interessada com Portugal na separação de Castela. Por António Moniz de Carvalho”. Academi (...)

29Podemos afirmar com certeza que é improvável que essa singularidade tivesse tido alguma influência, mais tarde, na tradução para português a que, em finais do século XVIII, se dedicou o erudito Ignacio de Sousa de Menezes e que não chegou a ser impressa. A lacónica confissão do seu motivo, que o franciscano Vicente Salgado incluiu numa cópia conservada na Biblioteca da Academia das Ciências, cingia-se mais à sua vontade de evitar a perda da memória de um texto que nessa altura já era “muito raro”.26 Do mesmo modo, também não há nenhum indício de que fora essa especificidade que teria induzido o historiador António Cruz a incluir Francia interessada no plano inicial do projeto editorial que desenhou na década de 1960, sob o título Papéis da Restauração, ainda que a obra de Moniz de Carvalho acabasse por não aparecer em nenhum dos seus dois tomos publicados (Cruz 1967-1969). Não parece, no entanto, que a singularidade de que se ocupou este artigo se torne por isso insignificante, nem no contexto das coordenadas do discurso político do Portugal restaurado, nem na história da assimilação e receção da linguagem de Rohan sobre o interesse dos estados.

Topo da página

Bibliografia

Albuquerque, Martim de (2004). “Biblos” e “Polis”: bibliografia e ciência política em D. Vicente Nogueira. Lisboa: Nova Vega.

Amzalak, Moses Bensabat (1930). A embaixada enviada pelo rei D. João IV à Dinamarca e à Suécia. Notas e documentos. Lisboa: Instituto Superior de Comércio de Lisboa.

Bartelson, Jens (1996). A Genealogy of Sovereignty. Cambridge: Cambridge University Press.

Bartelson, Jens (2018). War in International Thought. Cambridge: Cambridge University Press.

Bonnet, Pierre (2019). “L’exil de Henri de Rohan et le devoir d’écrire: recherche d’une légitimation de soi, entre désir de réhabilitation et poursuite cryptée du combat”. La Licorne, 90, pp. 231-259.

Bosbach, Franz (1988). Monarchia Universalis. Ein Politischer Leitbegriff der frühen Neuzeit. Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht.

Brazão, Eduardo (s. d.). A Restauração. Relações diplomáticas de Portugal de 1640 a 1668. Lisboa: Bertrand.

Cardim, Pedro (1998). “‘Portuguese Rebels’ at Münster. The diplomatic self-fashioning in the mid-17th century European Politics”, in H. Duchhardt (ed), Der Westfälische Friede. Munich: Oldenbourg, pp. 79-113.

Cardim, Pedro (2014). Portugal unido y separado. Felipe II, la unión de territorios y el debate sobre la condición política del Reino de Portugal. Valladolid: Ediciones de la Universidad de Valladolid.

Cardim, Pedro (2015). “História, política e reputação no Discurso del duque de Alba al Catolico Felipe IV sobre el consejo, que se le diò en abril passado, para la recuperación de Portugal... (1645), de Braz da França”, in D. Martín Marcos, J. M. Iñurritegui, P. Cardim (eds), Repensar a identidade. O mundo ibérico nas margens da crise da consciência europeia. Lisboa: CHAM, pp. 91-130.

Carvalho, António Moniz de (1641a). Traduçam de huma breve conclusão e apologia da Justiça del Rey N. Senhor, & dos motivos de sua felice acclamação, que fez em Latim o Doutor Antonio Moniz de Carvalho... impressa em a Cidade, & Corte de Esthocolmia do mesmo Reyno de Suecia. Lisboa: Jorge Rodriguez, a custa de Lourenço de Queirós Livreiro do Estado de Bragança.

Carvalho, António Moniz de (1641b). Dolor fidei publicae Castellae Astri in Alemania violatae pro retentione injustissima Serenissimi Domini D. Eduardi Portugalliae Infantis. s.l.

Carvalho, António Moniz de (1641c). Sentimento da Fe publica quebrantada em Alemanha por industria de Castella no retençao... do Serenissimo Senhor Infante D. Duarte. Lisboa.

Carvalho, António Moniz de (1642). Memoria da jornada e sucessos que houve nas duas embaixadas que Sua Magestade mandou aos reinos de Suécia e Dinamarca. Lisboa: Officina de Domingos Lopes Rosa.

Carvalho, António Moniz de (1644a). Francia interessada con Portugal en la separación de Castilla, con noticias de los intereses comunes de los príncipes y estados de Europa. Paris: Michel Blageart.

Carvalho, António Moniz de (1644b). Francia interessada con Portugal en la separación de Castilla, con noticias de los intereses comunes de los príncipes y estados de Europa. Barcelona: Sebastián de Cormellas y a su costa.

Carvalho, António Moniz de (1647a). Francia interessada con Portugal en la separación de Castilla, con noticias de los intereses comunes de los príncipes y estados de Europa. Barcelona: Sebastián de Cormellas y a su costa.

Carvalho, António Moniz de (1647b). Esfuerzos de la razon para ser Portugal incluido en la paz general de la christiandad: Conformes a las obligaciones, intereses, y empeños de Francia: Con memoria de lo representado con ellos, a la Magestad Christianissima de la Reyna Regente: Solo comunicados a los ministros superiores del Consejo de Francia, y Portugal. Paris.

Carvalho, Daniel Pimenta Oliveira de (2013), “O conflito político português na Europa em meados do século XVII: diplomacia, informação e imprensa”. Nuevo Mundo, Mundos Nuevos Colloques, consultado 2/11/2020. URL: http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/nuevomundo/65837.

Carvalho, Miguel Botelho de (1646). Rimas varias y tragicomédia del mártir de Etiopía. Rohan: Lorenzo Maurry.

Clarke, Jack Alden (1966). Huguenot warrior: the life and times of Henri de Rohan, 1579-1638. Haia: Martinus Nijhoff.

Clavero, Bartolomé (1979). “Interesse. Traducción e incidencia de un concepto en la Castilla del siglo XVI”. Anuario de Historia del Derecho Español, 49, pp. 39-97.

Coelho, Possidónio M. Laranjo (ed) (1940). Cartas de El-Rei D. João IV ao conde da Vidigueira (marquês de Niza) embaixador em França, 2 vols. Lisboa: Academia Portuguesa de História.

Coutinho, Francisco Sousa (1641). Manifesto, e protestaçam sobre a liberdade do Infante D. Duarte. Lisboa: Iorge Rodriguez.

Cruz, António (1967-1969). Papéis da Restauração, 2 vols. Porto: Faculdade de Letras.

Devetak, Richard (2014). “Historiographical Foundations of Modern International Thought”. History of Ideas, 41 (1), pp. 62-77.

Dewald, Jonathan (2015). Status, power, and identity in Early Modern France: the Rohan family (1550-1715). Philadelphia: Penn State University Press.

Fernández Albaladejo, Pablo (2019). “Intereses de Indias, dominio del rey: Indicios de un debate en la Monarquía de España, 1680-1715”, in F. Andrés, M. Hernández, S. Martínez (eds), Mirando desde el puente. Estudios en homenaje al profesor James S. Amelang. Madrid: UAM, pp. 471-482.

Ferrari, Ángel (1942). “Fernando el Católico en la teoría antiespañola de los intereses de Estados”. El Escorial, 23, pp. 315-364.

Force, Pierre (2003). Self-Interest before Adam Smith. Cambridge: Cambridge University Press.

França, Braz da (1645). Discurso del duque de Alba al Catolico Felipe IV sobre el consejo, que se le diò en abril passado, para la recuperación de Portugal, con su parecer en la misma matéria. s. l.

Galbarro García, Jaime (2013). “Manuel Fernández de Villarreal y Antonio Enríquez Gómez en la propaganda de la “nação portuguesa”. Versants: revue suisse des littératures romanes, 60, pp. 131-142.

Galbarro García, Jaime (2017). “Manuel Fernandes de Vila Real: la difusión de las letras castellanas y lusitanas en la corte de Ana de Austria”. e-Spania, 27, em linha, consultado em 11 de junho de 2020. URL: http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/e-spania/26862.

Gil Pujol, Xavier (2000). “La razón de estado en la España de la Contrarreforma. Usos y razones de la política”, in S. Rus Rufino (ed), La Razón de Estado en la España Moderna. Valencia: Sociedad Económica de Amigos del País, pp. 355-374.

Gunn, John A. W. (1968). “’Interest will not lie’, A Seventeenth-Century Political Maxim”. Journal of the History of Ideas, 29 (4), pp. 551–564.

Haffemayer, Stéphane (2011). “Politique Européenne et conduite de l’État chez Courtilz de Sandras (1644-1712)”, in P. Bonnet (ed), Littérature de contestation: Pamphlets et polémiques du règne de Louis XIV aux Lumière. Paris: Le Manuscrit, pp. 137-162.

Haran, Alexandre Y. (2000). Le Lys et le Globe. Messianisme dynastique et rêve imperial en France aux XVIe et XVIIe siècles. Seyssel: Champ Vallon.

Hirschman, Albert (2014). Las pasiones y los intereses. Argumentos políticos en favor del capitalismo previos a su triunfo. Madrid: Capitán Swing.

Houston, Alan (2001). “Republicanism, the politics of necessity, and the rule of law”, in A. Houston, S. Pincus (eds), A Nation Transformed. England after the Restoration. Cambridge: Cambridge University Press, pp. 241-271.

Iñurritegui, José María (2015). “A Verdade Política e a razão do interesse dos estados”, in D. Martín Marcos, J. M. Iñurritegui, P. Cardim (eds), Repensar a identidade. O mundo ibérico nas margens da crise da consciência europeia. Lisboa: CHAM, pp. 245-262.

Keene, Edward (2005). International Political Thought. A historical introduction. Cambridge: Cambridge Polity Press.

Keohane, Nannerl O. (1980). Philosophy and the State in France. The Renaissance to the Enlightenment. Princeton: Princeton University Press

Koskenniemi, Martti (2009). “The advantage of treaties: International Law in the Enlightenment”. Edinburgh Law Review, 13 (1), pp. 27-67.

Krieger, Leonard (1965). The politics of discretion. Pufendorf and the acceptance of natural law. Chicago and London: Chicago University Press, pp. 170-201.

Lazzeri, Christian (1995), “Introduction”, in Henri de Rohan, De l’intérêt des princes et les Etats de la Chrétienté. Paris: Presses Universitaires de France.

Levillain, Charles-Édouard (2015). Le Procès de Louis XIV. Diplomatie et discours d’opposition à l’époque moderne. Le cas François-Paul de Lisola (1667-1674). Paris: Tallandier.

Lisolá, François-Paul de (1667). Bouclier d’Estat et de justice contre le dessein manifestement découvert de la Monarchie Universelle, sous le vain prétexte des pretentions de la Reyne de France. Bruxelles: François Foppens.

Macedo, António Sousa de (1642). Juan Caramuel Lobkowitz religioso de la Orden de Cister Abad de Melrosa, Convencido en su libro intitulado, Philippus prudens Caroli V. imper. Filius, Lusitania & legitimu Rex demostratu, impreso en el año de 1639 y en su Respuesta al Manifiesto del Reyno de Portugal impreso en este año de 1642. London: Ric. Herne.

Machado, Diogo Barbosa (1741). Bibliotheca Lusitana Historica, Critica, e Cronologica. Lisboa: António Isidoro da Fonseca.

Marques, João Francisco (1989). A parenética portuguesa e a Restauração – 1640-1668: a revolta e a mentalidade. Porto: Instituto Nacional de Investigação Científica.

Meinecke, Frederick (2014). La idea de la razón de Estado en la Edad Moderna. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales.

Melo, Francisco Manuel de (1645). Ecco polytico, responde en Portugal a la voz de Castilla y satisface a un papel anónimo, ofrecido al Rey D. Felipe el Quarto, sobre los intereses de la Corona Lusitana, y del Occeánico, Índico, Brasílico, Ethyópico, Arábico, Pérsico y Africano Imperio. Lisboa: Paul Craesbeck.

Oliveira, António de (1991). Poder e Oposição Política em Portugal no Período Filipino (1580-1640). Lisboa: Difel.

Ornaghi, Lorenzo; Colletessa, Silvio (2000). Interesse. Bolonia: Il Mulino

Pincus, Steve (1998). “Neither Machiavellian Moment nor Possessive Individualism: Commercial Society and the Defenders of the English Commonwealth”. The American Historical Review, 103 (3), pp. 705-736.

Prestage, Edgar (1925). The Diplomatic Relations of Portugal with France, England, and Holland from 1640 to 1668. Watford: Voss & Michael.

Rohan, Henri (duque de) (1638). De l’Intérêt des princes et états de la chrestienté. A Monsieur le Cardinal de Richelieu. Paris: Pierre Margat.

Rohan, Henri (duque de) (1639). De l’Intérêt des princes et états de la chrestienté. A Monsieur le Cardinal de Richelieu, Dernière edition, jouxte la copie imprimée à Paris. Leiden: Elsevier.

Salmon, John H. M. (1975). “Rohan and Interest of State”, in R. Schnur (ed), Staatsräson. Studien zur Geschichte eines politischen Begriffs. Berlin: Duncker und Humblot, pp. 121-140.

Santarém, Visconde de (1843). Quadro elementar das relações políticas e diplomáticas de Portugal com as diversas potencias do mundo desde o principio da Monarchia Portugueza até aos nossos dias, tomo IV, parte 1. Paris: J. P. Aillaud.

Schmidt, Peer (2001). Spanische Universalmonarchie oder “teutsche Libertet”: das spanische Imperium in der Propaganda des Dreißigjährigen Krieges. Stuttgart: Franz Steiner Verlag.

Scott, Jonathan (2002). “Classical Republicanism in Seventeenth-Century England and the Netherlands”, in M. van Gelderen, Q. Skinner (eds), Republicanism: A Shared European Heritage. Volume I, Republicanism and Constitutionalism in Early Modern Europe. Cambridge: Cambridge University Press, pp. 61-81.

Sedler, Michael J. (2011). “Introduction”, in An Introduction to the History of the Principal Kingdoms and States of Europe, by Samuel Puffendorf, Counsellor of State to the Present King of Sweden, Made English from the Original, London, Gilliflower and Newborough, 1695. Indianápolis: Liberty Found.

Serafim, João Carlos Gonçalves (ed) (2011). Um diálogo epistolar. D. Vicente Nogueira e o marquês de Niza (1615-1654). Porto: CITCEM; Porto: Afrontamento.

Thomaz, Luís Filipe; Alves, Jorge Santos (1987). “Da Cruzada ao Quinto Imperio”, in F. Bethencourt, D. R. Curto (eds), A memória da nação. Lisboa, Sá da Costa, pp. 81-168.

Thuau, Étienne (2000). Raison d’État et pensée politique à l’époque de Richelieu. Paris: Éditions Albin Michel.

Torgal, Luís Reis (1981-1982). Ideologia política e teoria do Estado na Restauração. 2 volumes. Coimbra: Biblioteca Geral da Universidade.

Vila Real, Manuel Fernandes (1641). Epítome genealógico del Eminentísimo Cardenal Duque de Richelieu y discursos políticos sobre algunas acciones de su vida. Pamplona: Juan Antonio Berdún.

Walker, Ryan (2015). “Slingsby Bethel’s Analysis of State Interests”. History of European Ideas, 41 (4), pp. 489-506.

Weststeijn, Arthur (2012). Commercial Republicanism in the Dutch Golden Age. The Political Thought of Johan & Pieter de la Court. Leiden: Brill.

Topo da página

Notas

1 Doravante referenciada como Carvalho 1644a.

2 Ver Prestage (1925), Brazão (s. d.), Coelho (1940), Cardim (1998) e Galbarro García (2017).

3 As únicas contribuições historiográficas que vinculam Moniz de Carvalho ao duque de Rohan devem-se a Ferrari (1942, 319-20) e Gil Pujol (2000).

4 Para uma contextualização na literatura política portuguesa do período, cf. os trabalhos clássicos de Torgal (1981-1982), Marques (1989) e Oliveira (1991).

5 Alguns dados biográficos em Machado (1741, I, 333-34), Amzalak (1930) e Carvalho (1642).

6 Carvalho (1641a), que é a tradução do seu Brevis assertio et apologia acclamationis, et justitiae Serenissimi, et Potentissimi Portugalliae Regis.

7 Carvalho (1641b e 1641c). Também o embaixador Francisco de Sousa Coutinho se dedicou ao assunto – ver Coutinho (1641).

8 Para a história do conceito, cf. Ornaghi e Colletessa (2000, 21-75) e a Introdução de Christian Lazzeri (1995) à edição de Henri de Rohan. Como exemplo da sua condição polissémica, e sobre a dificuldade da sua tradução para vernáculo na literatura do Ius commune do século XVI, ver Clavero (1979).

9 Ver Meinecke (2014, 67-198 e concretamente p. 71 para a citação de Botero). Para a insistência nessa identificação, ver Edward Keene (2005, 107) ao afirmar que “Rohan captured the central thrust of a new way of thinking about international politics which took the ´interest´ or ´reason of states´ as its central concept”.

10 Sobre a importância que pode ter tido neste aspeto a sua precoce ligação literária em Paris a Fernandes Vila Real, cf. Galbarro García (2013, 131-42).

11 Mercure Français, 20 (Paris, 1937), 46-126. Cf. Lazzeri (1995, 129 e 152) e Salmon (1987, 108).

12 Para a definição do momento do seu percurso biográfico no qual se concretiza a publicação, e para contextualizar a sua dedicatória A Monsieur le Cardinal de Richelieu na recomposição de uma relação complexa, devida à intervenção de Rohan como figura principal da fação huguenote no contexto das confrontações confessionais da década de vinte, cf. Clarke (1966).

13 Ver Krieger (1965, 170-201), Bartelson (2018, 45-59) e Sedler (2011).

14 Para a identificação de uma dualidade de tradições – a do direito público da Europa continental e a do ius naturae et gentium – na conceção de uma international law, cf. Koskenniemi (2009).

15 Para a centralidade do conceito de monarquia universal no imaginário político do tempo, cf. Bosbach (1988) e Haran (2000).

16 Como mostra o cultivar dessa cumplicidade com Richelieu, cf. Vila Real (1641).

17 Ver Carvalho (1646) e Macedo (1642, Prólogo).

18 Para a inclusão da obra na literatura atraída então pelo tema da monarquia universal, cf. Schmidt (2001, 221-23).

19 Sobre a intencionalidade da explicação do duque de Rohan nesse sentido concreto, cf. Bonnet (2019).

20 Sobre o mesmo, ver Cardim (2015).

21 Antes da publicação da Francia interessada em 1644, o De l´intérêt já tinha alcançado ao menos cinco reedições conjuntas com Le parfait capitaine, em 1639 (Leiden: Balthasar e Abraham Elseviver), 1640 (Paris: Augustin Courbé), 1641 (Paris: Jean Houzé), 1642 (Leiden: Balthasar e Abraham Elsevier) e 1643 (Paris: Jean Houzé, 1643); e pelo menos duas impressões distintas, ambas publicadas em Leiden, em 1640 e 1641 (Balthasar e Abraham Elsevier).

22 A Treatise of the Interest of the Princes and States of Christendome. Paris, 1640; Interesse Der Potentaten vnd Stãnde. s.l, s.a [1641]; Trutina statum europea sive principum christiani orbis interesse. Leiden: Justus Livius, 1644; Dell´interesse dei principi e stati della christianita. Orleans, 1646; Den Interest der Princen ende Staten van Christenrijck. Amsterdam, 1654.

23 Conde de Vidigueira a Francisco de Sousa Coutinho. [París], 16 de janeiro de 1644. Biblioteca Nacional de Portugal, Reservados, cod. 2669, fols. 16r-16v.

24 Vicente Nogueira ao marquês de Niza. Roma, 8 de março de 1649. Cit. em Serafim (2011, 231).

25 Para o controlado processo de erosão da política cristã durante a chamada “Restauração” em consequência da necessidade de fortalecer a posição de Portugal na cena europeia, cf. Thomaz e Alves (1987) e Cardim (2014, 234-41).

26 “França interessada com Portugal na separação de Castela. Por António Moniz de Carvalho”. Academia das Ciências de Lisboa, Série Vermelha, cód. 487.

Topo da página

Para citar este artigo

Referência do documento impresso

José María Iñurritegui Rodríguez e David Martín Marcos, «Literatura política portuguesa do século XVII: António Moniz de Carvalho e a soberania do interesse»Ler História, 77 | 2020, 61-81.

Referência eletrónica

José María Iñurritegui Rodríguez e David Martín Marcos, «Literatura política portuguesa do século XVII: António Moniz de Carvalho e a soberania do interesse»Ler História [Online], 77 | 2020, posto online no dia 30 dezembro 2020, consultado no dia 24 janeiro 2025. URL: http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/lerhistoria/7322; DOI: https://0-doi-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/10.4000/lerhistoria.7322

Topo da página

Autores

José María Iñurritegui Rodríguez

Universidad Nacional de Educación a Distancia, España

jinurritegui@geo.uned.es

David Martín Marcos

Universidad Nacional de Educación a Distancia, España

dmartinmarcos@geo.uned.es

Artigos do mesmo autor

Topo da página

Direitos de autor

CC-BY-NC-4.0

Apenas o texto pode ser utilizado sob licença CC BY-NC 4.0. Outros elementos (ilustrações, anexos importados) são "Todos os direitos reservados", à exceção de indicação em contrário.

Topo da página
Pesquisar OpenEdition Search

Você sera redirecionado para OpenEdition Search