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Artistas portugueses em trânsito: bolsas de viagem e de estudo no estrangeiro, 1918-1939

Portuguese Artists in Transit: Scholarships for Travelling and Studying Abroad, 1918-1939
Artistes portugais en transit : bourses de voyage et d’études a létranger, 1918-1939
Joana Baião
p. 205-227

Resumos

Consideradas um elemento fundamental na formação dos artistas, as viagens e estadias no estrangeiro foram promovidas pelas instituições artísticas portuguesas através de bolsas de viagem e de estudo. Neste artigo sistematiza-se pela primeira vez a informação relativa à atribuição oficial destas bolsas, entre 1918 e 1939. Esta cronologia abarca importantes transformações na vida político-cultural do país – fim da Primeira República, Ditadura Militar, Estado Novo –, que por sua vez tiveram consequências no enquadramento e ação dos organismos sucessivamente responsáveis pela gestão dos subsídios artísticos (Conselhos de Arte e Arqueologia, Junta de Educação Nacional, Instituto para a Alta Cultura). Fundamentando-se na análise do enquadramento legislativo e interpretação das resoluções dos organismos decisores, e referenciando alguns casos concretos da sua aplicação, este texto visa contribuir para a reflexão sobre a ação das instituições oficiais portuguesas no fomento da formação e especialização artística no estrangeiro.

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Notas do autor

Este estudo faz parte do projeto de pós-doutoramento “Study trips and artistic emigration: Portuguese artists in Paris, 1918-1976”, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia [SFRH/BPD/109490/2015]. A autora agradece às suas orientadoras, professoras Béatrice Joyeux-Prunel e Raquel Henriques da Silva. Os conteúdos deste texto foram apresentados parcialmente no I Colóquio luso-brasileiro ARTE ENTREMUNDOS – Histórias da Arte em Viagem: circulação de ideias, formas, objetos (Universidade de Évora, 4 julho 2018) e no encontro Circulation et transferts artistiques entre le Portugal et la France, XIXe et XXe siècles (Fondation Calouste Gulbenkian, Paris, 16 outubro 2018).

Texto integral

  • 1 Os pensionatos de belas-artes no estrangeiro, financiados pelo estado, foram instituídos em 1865. (...)

1O deflagrar da Primeira Guerra Mundial interrompeu um ciclo de circulação artística portuguesa pela Europa, cuja génese remonta ao século XVIII e que foi fortemente impulsionado a partir de 1865, com o estabelecimento dos pensionatos artísticos no estrangeiro promovidos pelas Escolas de Belas-Artes de Lisboa e do Porto e, mais tarde, em 1902, com a regulamentação das bolsas de estudo concedidas através do legado Valmor.1 Destas décadas de transição entre séculos, a historiografia da arte portuguesa não só tem abordado os contextos institucionais que enquadraram a circulação de artistas portugueses no estrangeiro – refira-se o estudo elaborado por Maria Helena Lisboa (2007, 162-167), em que são analisados os processos de instituição oficial dos pensionatos do estado e do Legado Valmor, listados sistematicamente os artistas que beneficiaram desses apoios, e referenciados os casos de estudantes de belas-artes e artistas que complementaram a sua formação fora de Portugal com o apoio de mecenato privado, entre 1836 e 1910 –, como também tem interpretado os contextos culturais e artísticos que enquadraram estas movimentações, sintetizados por Fernando Rosa Dias (2013, 51-54), que verifica a importância das viagens de estudo ao estrangeiro (principalmente a Roma e a Paris) na formação dos principais representantes do romantismo, do naturalismo e do primeiro modernismo português.

2Este artigo tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento desta questão, abordando uma cronologia específica – o período entre-guerras (1918-1939) – e dando enfoque ao papel das instituições do estado no apoio à deslocação de artistas portugueses além-fronteiras. Apesar de o trânsito de artistas portugueses pela Europa nos anos que intercalaram os dois conflitos mundiais estar referenciado na historiografia da arte portuguesa, quer em monografias de artistas que circularam neste período, quer em evocações mais genéricas – por exemplo, Raquel Henriques da Silva (1994, 382-386, 390-392) menciona as “reactualizações” estéticas que os pintores e escultores trouxeram das suas estadas em Paris, Berlim ou Roma na década de 1920; José-Augusto França (2000, 25-26) refere “o êxodo dos jovens mais válidos” ao longo desse decénio, sinalizando os percursos individuais de alguns deles –, verificam-se algumas lacunas no que diz respeito a abordagens mais sistemáticas que tenham como tema central estas deslocações. Essas lacunas resultam principalmente da falta de um levantamento metódico dos artistas que migraram ou se deslocaram ao estrangeiro no âmbito da sua formação ou atividade profissional, com indicação dos contactos e interações estabelecidas fora de Portugal, e análise dos respetivos contextos artístico-institucionais. Abordados em conjunto, estes elementos podem contribuir para uma leitura mais ampla da circulação artística portuguesa neste período, fornecendo a base para a avaliação do seu impacto no panorama cultural nacional ou mesmo internacional.

3Neste estudo sistematiza-se pela primeira vez a informação relativa à atribuição oficial de bolsas de viagem e de estudo entre 1918 e 1939, no domínio das belas-artes. Esta cronologia corresponde a momentos-chave na atividade institucional relacionada com a atribuição das bolsas: em 1918 é publicada legislação que regula as bolsas do estado e do Legado Valmor, constituindo um marco de retoma e renovação dos pensionatos após um período de suspensão devido à Grande Guerra; o ano de 1939 marca nova pausa no apoio a viagens nas áreas das belas-artes, devido ao deflagrar da 2ª Guerra Mundial. Para além disso, este arco cronológico abarca importantes transformações na vida político-cultural do país – fim da Primeira República, Ditadura Militar, Estado Novo –, que por sua vez tiveram consequências no enquadramento e ação dos organismos sucessivamente responsáveis pela gestão dessas bolsas – Conselhos de Arte e Arqueologia (CAA), Junta de Educação Nacional (JEN), Instituto para a Alta Cultura (IAC). Tendo como base investigação realizada nos arquivos da Academia Nacional de Belas-Artes e do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua, I.P., onde se encontra registada a atividade destas instituições, serão analisadas a evolução legislativa e as resoluções dos organismos decisores, e referenciados alguns casos concretos da sua aplicação.

4O primeiro ponto foca os pensionatos do estado e do Legado Valmor após a publicação da legislação de 1918, verificando-se a falência deste modelo ao longo da década de 1920; no segundo ponto é analisado o modo como as reformas políticas nos contextos de administração da Ditadura Nacional (1928-1933) e nos primeiros anos do Estado Novo (1933-1939) conferiram um novo enquadramento à promoção da formação artística no estrangeiro, num movimento dicotómico de rutura e continuidade face ao modelo anterior; por fim, sendo a ação cultural uma via de difusão de ideários e narrativas, no terceiro ponto questiona-se em que medida os processos de atribuição de subsídios se integram dentro de uma discursividade oficial e, sobretudo, dentro do quadro das políticas artísticas estatais. Não sendo possível, face ao atual estado da investigação, apresentar conclusões inequívocas acerca deste tema, concluímos este artigo com algumas considerações e linhas de reflexão em torno da estratégia e concretização, ou não, dos objetivos que pautaram a ação das instituições oficiais na área da formação e especialização artística no estrangeiro no período em análise, complementando assim os estudos sobre a atuação da JEN e do IAC no campo do fomento científico e cultural em Portugal (Rollo et al. 2012; Lopes 2017; Mineiro 2017).

1. Depois de 1918: os pensionatos do Estado e o Legado Valmor

  • 2 Decreto nº 1, de Reorganização do Serviços Artísticos e Arqueológicos, Secção V, Cap. III. Diário (...)
  • 3 Decreto nº 4.012, Diário do Governo, I Série, nº 65, 1 de abril de 1918, 319-322.

5Os anos da guerra foram marcados pela suspensão da atribuição das pensões e bolsas do estado e do Legado Valmor, desde as reformas republicanas de 1911 conferidas mediante concursos públicos “a estudantes e artistas por tempo não superior a tres annos”.2 Neste período, apesar de a legislação prever que a gestão dos concursos deveria ser feita por um Conselho de Arte Nacional a que se submeteriam os Conselhos de Arte e Arqueologia das três circunscrições (Lisboa, Coimbra e Porto), na prática verifica-se que esta responsabilidade estava concentrada no Conselho de Arte e Arqueologia de Lisboa (CAAL) que, durante os anos que durou o conflito mundial, não deixou de defender a abertura de futuros concursos e de discutir os moldes em que eles deveriam ser anunciados. De facto, as atas das reuniões da sua Comissão Executiva entre 1915 e 1917 testemunham discussões regulares em torno da elaboração de um novo regulamento para as pensões e bolsas de viagem, que viria a ser aprovado em sessão de 30 de abril de 1917 e publicado em Diário de Governo no ano seguinte.3

  • 4 Ibidem, Artº 62º.

6A legislação de 1918 regula as bolsas do estado e do Legado Valmor, atribuindo ao CAAL a gestão dos respetivos concursos e a mediação do contacto dos organismos estatais com os pensionistas, disposição que vinha no fundo regularizar a prática anterior. Embora seja omisso na distinção entre o financiamento do estado e o financiamento do Legado Valmor, o novo decreto faz essa diferenciação ao prever a concessão de dois tipos de financiamento: as pensões de estudo, destinadas a estudantes recém-formados nas escolas de belas-artes do país (Lisboa e Porto) para complemento da sua formação, nas áreas de arquitetura, pintura, escultura e gravura, por um período máximo de três anos (Legado Valmor); e os subsídios para viagens de estudo destinados a artistas, por um período máximo de dois anos (pensão do estado). Para além disso, havia agora a possibilidade de abertura de concurso para atribuição de um subsídio de viagem de curta duração (até sessenta dias) a artistas professores da Escola de Belas-Artes de Lisboa (EBAL), opção centralizadora justificada com a necessidade de se aperfeiçoar o ensino ministrado naquela instituição e com a intenção de o CAAL – do qual faziam parte vários professores da EBAL – acompanhar mais diretamente os pensionistas durante as suas estadias no estrangeiro.4

  • 5 Ibidem, Artº 23º, 30º, 36º e 40º, 48º e 53º.

7Em moldes semelhantes aos regulamentos anteriores, aos pensionistas de estudo era exigida a frequência obrigatória da Escola Nacional de Belas-Artes de Paris “ou qualquer dos melhores ateliers da mesma capital” durante um período mínimo, variável consoante a sua área de especialização, após o qual os formandos deveriam realizar uma viagem de estudo a outros destinos europeus, de acordo com um itinerário aprovado pelo CAAL. Por sua vez, dos artistas com subsídio de viagem só aos arquitetos se impunha a obrigatoriedade de um estágio mínimo de um ano em Paris, deixando-se aos pintores, escultores e gravadores total liberdade na escolha dos “países onde pretenderem fixar residência”.5 A obrigatoriedade de fixação em Paris para quase todos os tipos de bolseiros reflete o facto de a Cidade Luz ser considerada pelos membros do CAA – vários deles antigos pensionistas em Paris – como a “capital das artes”, posição consolidada internacionalmente ao longo do século XIX com a crescente afluência de artistas estrangeiros, dos mais académicos aos vanguardistas, que procuravam inspiração nos seus monumentos, museus e boulevards, conhecimento e treino nas escolas, academias e ateliês, e promoção e reconhecimento nas múltiplas galerias e salons (Dios 2002). Para além disso, Paris seria um destino lógico para os artistas portugueses, devido à relativa proximidade física e psicológica, num período em que “Portugal falava francês”, expressão recuperada do título de um ensaio do historiador Rui Ramos (2015), que verifica a importância e influência da cultura francófona no meio cultural português até meados do século XX.

  • 6 Requerimento coletivo apresentado ao CAAL, 10 de maio de 1918. Digitarq, Fundo ANBA, Documentação (...)
  • 7 Ofício do cônsul-geral de Portugal em Paris, Armando Navarro, para o CAAL. Paris, 9 de maio de 19 (...)
  • 8 Digitarq, Fundo ANBA, Atas da Comissão Executiva do CAAL, Livro 22. Ata nº 83 (20 de maio de 1918 (...)

8Após a publicação do regulamento em Diário de Governo, em 1 de abril de 1918, o CAAL começa a sentir a pressão por parte dos estudantes de belas-artes, que reivindicam a abertura de um concurso em breve, independentemente da situação europeia.6 Sensível à situação dos jovens artistas e pretendendo abrir concurso rapidamente, o CAAL já havia oficiado ao cônsul de Paris em Portugal, pedindo informações quanto às condições de vida e de estudo naquela cidade. As notícias chegam rapidamente, e dão conta de que “funcionam regularmente n’esta cidade a Escola de Bellas-Artes, e os ateliers particulares”, e que “apesar do encarecimento da vida, é possível viver actualmente, uma só pessoa, com 400 francos mensaes, em Paris”.7 O CAAL avança então com a abertura de procedimento para a concessão de pensões a “três estudantes, um de arquitectura, um de esculptura e um de pintura, e a um artista arquitecto”, ainda que mantivesse a reserva de permitir ou não a sua imediata partida, “segundo as circunstancias a aconselharem”.8

  • 9 Tirando partido de uma lacuna na portaria que suspendia a sua pensão, Dordio Gomes colocou o est (...)

9O concurso decorreu entre junho de 1918 e março de 1919. Do Legado Valmor, foram atribuídas bolsas a Luís Cristino da Silva (arquitetura) e Carlos Bonvalot (pintura). Não tendo concorrido nenhum estudante escultor, esta verba foi atribuída ao segundo classificado em pintura, Ricardo Bensaúde. O artista arquiteto selecionado para pensão do estado foi Edmundo Tavares. Da Escola de Belas-Artes do Porto seguiriam para o estrangeiro Heitor Cramez (pintura) e Manuel Marques (arquitetura) que, respetivamente agraciados com pensões do estado em 1914 e 1916, tiveram de protelar a viagem devido à guerra na Europa. Para além destes novos contratos, foram atribuídos subsídios extraordinários, pagos pelo estado, a três antigos bolseiros – Simão Dordio Gomes, Francisco Franco de Sousa e José Ferreira Campas –, cujas pensões haviam sido suspensas em 1911 após a instauração de um processo disciplinar devido a procedimento desrespeitoso para com as instâncias superiores, e que viriam a retomar os trabalhos em Paris em 1921.9

10Após este período de vitalidade, segue-se um momento de acalmia. A longa duração das pensões em curso, aliada à descida dos juros do rendimento do Legado Valmor, às elevadas taxas de câmbio e ao elevado custo de vida na capital francesa, levavam à protelação da abertura de novos concursos. Por outro lado, verifica-se nestes anos a progressiva redução da dotação orçamental que o estado previa para o pagamento de pensões, situação que é denunciada em 1925 pelo CAAL à Direção-Geral de Belas-Artes (DGBA):

  • 10 Ofício da Secretaria do CAAL para a DGBA. Lisboa, 4 de setembro de 1925. Digitarq, Fundo ANBA, Co (...)

O depreciar-se a moeda, anulou, por assim dizer por completo, as intenções do benemérito Visconde de Valmor, que legou a importância com cujo juro se pensionavam estudantes e artistas, legado que concorreu para que fosse eliminado do orçamento a verba que o estado destinava a idêntico fim, para estudantes da Escola de Belas-Artes de Lisboa.10

  • 11 Cf. Ofício da Secretaria do CAAL para a DGBA. Lisboa, 18 de novembro de 1925. Digitarq, Fundo ANB (...)
  • 12 Escritura de contrato de Leopoldo Neves de Almeida, 24 de fevereiro de 1926. Digitarq, Fundo ANBA (...)
  • 13 Ofício da Secretaria do CAA de Lisboa para a DGBA. Lisboa, 10 de fevereiro de 1926. Digitarq, Fun (...)

11Nesta mesma missiva o CAAL pede que seja inclusa no orçamento para o ano de 1926 uma verba para financiamento de um novo pensionista do estado na área de escultura, selecionado em concurso. A documentação revela que a insistência na abertura deste concurso se prendia com a intenção explícita de conceder uma pensão a Leopoldo de Almeida, que se havia destacado na Escola de Belas-Artes de Lisboa com a classificação final de 20 valores e cujo currículo contava já com colaborações nos ateliês de vários mestres, para além de trabalhos individuais cujo mérito era largamente reconhecido pelos membros do CAAL.11 Concorrente único do concurso finalmente aberto em 1926 – oito anos depois do último – Leopoldo de Almeida partiria para Paris em junho desse ano, seguindo para Roma três meses depois. Um dos aspetos mais curiosos no processo deste pensionista prende-se com o financiamento da sua bolsa. Embora Leopoldo de Almeida tenha assinado contrato como pensionista “por conta do estado”,12 a previsão de atrasos no pagamento das suas mensalidades, devido à escassa dotação orçamental e às burocracias na libertação da verba, levou o CAAL a propor à DGBA que a pensão deste artista fosse assegurada pela escassa verba do Legado Valmor “tanto quanto as disponibilidades do rendimento desse legado o consentirem”, obrigando-se, no entanto, “o estado a manter […] uma subvenção mensal”.13 Efetivamente, esta pensão acabou por ter uma origem mista – estado e Valmor –, pois só assim se conseguiria assegurar a verba necessária à sua manutenção. Leopoldo de Almeida foi o único artista subvencionado oficialmente na segunda metade da década de 1920, e o último artista pensionista nos moldes previstos pelas legislações de 1911 e 1918.

  • 14 Ibidem.

12Ao longo da década de 1920 tornou-se evidente a falência do modelo de pensões até então em vigor. Por um lado, o Legado Valmor deixou de ser sustentável, devido à quebra dos juros e desvalorização do seu rendimento; por outro lado, precisamente apoiado na existência do Legado Valmor, o estado reduziu significativamente, tornando-a impraticável, a dotação orçamental destinada às pensões para artistas. A situação agravou-se de tal modo que, no seio do CAA de Lisboa, mais uma vez se lamentaria que “o legatário [Visconde de Valmor], mal poderia calcular, que para além de ter efeito nulo a sua generosidade, ainda iria concorrer para a extinção das pensões que o estado mantinha”.14 O panorama apresentava-se cada vez mais desolador, vindo a ser parcialmente solucionado pelas reformas artísticas e culturais elaboradas nos contextos de administração da Ditadura Nacional (1928-1933) e nos primeiros anos do Estado Novo (1933-1939).

2. Um novo paradigma: as bolsas artísticas da JEN e do IAC

  • 15 Decreto nº 20.985. Diário do Governo, I Série, nº 57, 7 de março de 1932, 431.

13Embora o curto período de administração da Ditadura Nacional tenha sido marcado, no que diz respeito às matérias culturais, pela gestão corrente dos dispositivos já existentes, houve movimentações no sentido de uma reforma estrutural mais significativa, que viria a ter repercussões no campo do estímulo à circulação de artistas portugueses no estrangeiro. Importa então destacar os dois decretos publicados em 1932 (decretos nº 20.985 e nº 20.977), que previam a extinção dos Conselhos de Arte e Arqueologia das três circunscrições e a consequente criação da Academia Nacional de Belas-Artes (ANBA) e de um novo Conselho Superior de Belas-Artes (CSBA). A legislação de 1932 distribuía pelos novos CSBA, ANBA e Direção-Geral do Ensino Superior e das Belas-Artes (DGESBA) as funções do antigo Conselho Superior de Belas-Artes e dos extintos CAA. A DGESBA passaria a coordenar os trabalhos “de carácter artístico dos serviços públicos e a guarda e conservação do património artístico e arqueológico do País” e o novo CSBA concentraria as “funções técnicas e administrativas que estavam dispersas”, ficando reservados à ANBA – cujos membros transitaram dos antigos CAA – “os trabalhos especulativos, puramente académicos, que o estudo da nossa riqueza artística possa merecer”.15

  • 16 Decreto nº 20.977, Diário do Governo, I Série, nº 55, 5 de março de 1932, 420.
  • 17 Cf. Atas nº 4 (19 de novembro de 1932), nº 5 (4 de março de 1933), nº 6 (11 de abril de 1933) e n (...)
  • 18 Ata nº 43 (15 de dezembro de 1938). AANBA, Livro de Atas Nº 2, 49.
  • 19 Ata nº 58, 28 de setembro de 1939. AANBA, Livro de Atas Nº 2, 67.

14A legislação de 1932 era omissa em relação aos pensionatos subsidiados pelo estado, mas indicava que à ANBA caberia “administrar as próprias dotações e bem assim o rendimento dos legados instituídos para a concessão de bolsas de viagem e prémios aos estudantes, artistas, eruditos ou críticos de arte, nomeando os júris dos respectivos concursos”16 – ou seja, a ANBA herdava do CAAL a responsabilidade de gerir o Legado Valmor, com relativa autonomia. Na prática, as permanentes dificuldades financeiras na gestão do rendimento Valmor impediriam sistematicamente a abertura de um novo concurso, apesar da vontade dos vários académicos. Assim, se nas sessões de 1932 e 1933 o assunto ainda é abordado, chegando a ser apresentado um projeto de programa para um novo concurso –, nos anos seguintes esta matéria praticamente deixa de ser discutida.17 A questão é retomada em 1938, altura em que se resolve a abertura de concurso para uma pensão Valmor no ano seguinte.18 Contudo, mais uma vez os acontecimentos político-sociais mundiais viriam a gorar o projeto, determinando-se que “em virtude do estado de coisas na Europa, será preferível aguardar melhor oportunidade para dar realização ao assunto”.19 Em suma, as pensões do Legado Valmor chegaram, neste período, a uma fase de estagnação que ditou o seu fim.

  • 20 Decreto nº 16.381, Diário do Governo, I Série, nº 13, 16 de janeiro de 1929. Um estudo acerca da (...)
  • 21 Refiram-se como exemplo, entre 1929 e 1931, os requerimentos, todos indeferidos, feitos por Alber (...)
  • 22 Ata da 7ª sessão da Comissão Executiva da JEN, 30 de setembro de 1929. Arquivo Histórico Camões, (...)

15Por sua vez, as pensões subsidiadas pelo estado acabariam por ser enquadradas dentro da atividade de um novo organismo, a Junta de Educação Nacional (JEN). Instituída em 1929 com o objetivo de estimular uma política de investigação e propaganda científica, à JEN cabia, entre outras competências, organizar e fiscalizar um serviço de bolsas de estudo em Portugal e no estrangeiro, destinadas ao aperfeiçoamento de métodos pedagógicos, desenvolvimento da investigação científica e aquisição de conhecimentos técnicos.20 Numa primeira fase não lhe foi atribuída a função de estimular a atividade artística, uma vez que os decretos anteriores à sua criação, que regulavam a concessão de bolsas para estudos de arte fora do País através de outras vias, não haviam sido revogados (Relatório dos trabalhos… 1930, 21). Porém, ciente da situação de falência das bolsas geridas pela ANBA, e confrontada por vários requerimentos feitos por artistas que pretendiam desenvolver a sua formação no estrangeiro21 – a que não podia responder positivamente por não lhe competir a atribuição de subsídios dessa natureza –, a JEN resolveu apelar às instâncias superiores a resolução do problema.22 Este organismo foi então incumbido de estudar as condições em que “se poderia encarregar também do fomento artístico” (idem, 20-21), do que resultou a publicação, em 1 de abril de 1931, do Decreto nº 19.552, que finalmente atribuía a este organismo a possibilidade de atuar nessa área.

  • 23 Decreto nº 20.352, Diário do Governo, I Série, nº 223, 26 de setembro de 1931, capítulo XII, artº(...)
  • 24 Nomeados no Diário do Governo, II Série, nº 130, 6 de junho de 1931.

16A regulamentação das novas competências instituiu no seio da JEN um Serviço de Educação Artística (SEA) responsável, entre outros pontos, pela concessão de bolsas de aperfeiçoamento artístico e subsídios para visitas a museus e outros centros de cultura artística, aos quais podiam concorrer artistas de mérito reconhecido, estudantes que tivessem concluído os seus estudos no país, professores do ensino artístico, historiadores e críticos de arte.23 O novo SEA seria gerido por uma Comissão de Educação Artística (CEA), nestes primeiros anos presidida por Júlio Dantas e composta por personalidades que representavam os vários domínios artísticos: Francisco de Lacerda, José Viana da Mota e Luís Costa (música), Aarão de Lacerda, João Barreira, José de Figueiredo e Virgílio Correia Pinto da Fonseca (crítica e história de arte), José Marques da Silva, Raul Lino, Adriano de Sousa Lopes, João da Silva e José Veloso Salgado (arquitetura e artes plásticas e decorativas) e José Júlio Marques Leitão de Barros (teatro e cinema).24

  • 25 Ata da 1ª reunião da Comissão de Educação Artística da JEN (doravante, CEA/JEN), 31 de novembro d (...)
  • 26 Conforme previsto nas alíneas b), c) e d) do artº 99º do Decreto 20.352. Cf. ata da 2ª sessão da (...)
  • 27 Ata da 3ª reunião da CEA/JEN, 29 de fevereiro de 1932. AHC, ibidem.

17O Serviço de Educação Artística iniciou a sua atividade em 13 de novembro de 1931, debatendo logo na primeira sessão de trabalho “a vantagem de atender os artistas que durante o largo período de anos, que agora termina, em que não foram concedidas bolsas pelo Governo, não puderam completar fora de Portugal a sua preparação artística”.25 Deste debate resultou a deliberação de principiar os trabalhos de preparação de um concurso para a atribuição de duas bolsas de longa duração (uma para artes plásticas e uma para artes musicais). Porém, na sessão seguinte foi decidido que, ao invés destas bolsas, fossem antes facultados subsídios de curta duração para investigações em história da arte, visitas a museus e outros centros de cultura artística, e para representação da arte portuguesa em certames, congressos e outras demonstrações artísticas estrangeiras.26 A substituição das bolsas de longa duração pela atribuição mais regular de subsídios de viagem, e a posterior aprovação da proposta feita por Leitão de Barros, para que “em regra fosse dada preferência aos artistas de mérito que nunca tivessem visitado os centros estrangeiros de cultura”,27 revela, como veremos, a intenção de otimização dos parcos recursos disponíveis.

18Neste contexto, interessa ainda referir que alguns membros da CEA, representados por José Marques da Silva, arquiteto e diretor da Escola de Belas-Artes do Porto, entendiam que os apoios artísticos concedidos pela JEN deveriam complementar o modelo de atribuição de pensões artísticas anteriores, não o substituindo. Ou seja, idealmente o estado deveria continuar a prever na dotação orçamental das Escolas de Belas-Artes de Lisboa e do Porto uma verba para a concessão de pensões aos seus estudantes:

  • 28 Ata da 4ª reunião da CEA/ JEN, 4ª sessão, 19 de março de 1932. AHC, ibidem.

Tendo sido manifestado na sessão de instalação desta Comissão deverem as Escolas manter nos seus orçamentos privativos as verbas destinadas a instituição dos seus pensionistas no estrangeiro, que lhes foram retiradas com o fim desse serviço pertencer à Junta de Educação Nacional […], proponho: que a Comissão de Educação Artística da Junta de Educação Nacional represente a S. Ex.ª o Ministro da Instrução expondo-lhe a conveniência de serem inscritas nos orçamentos próprios das Escolas, presentemente em organização, as verbas necessárias a manterem as pensões de estudo no estrangeiro aos estudantes pensionistas.28

  • 29 O próprio secretário da JEN, Luís Robertes Simões Raposo, seria perentório em lembrar que o Servi (...)
  • 30 Integrado na 7ª secção da nova Junta Nacional da Educação, cf. Decreto-lei 26.611, Diário do Gove (...)

19Ressalta nesta proposta – que não viria a ser aprovada – a consciência (ou desconfiança) de que o novo modelo de bolsas jamais se iria assemelhar, na sua estrutura, ao anterior. E, de certo modo, estes receios podiam justificar-se, não só devido à nova prevalência de bolsas de curta duração, mas principalmente no que diz respeito aos seus destinatários, pois ao contrário dos antigos pensionatos e bolsas Valmor, as novas bolsas agora não visavam especificamente o estímulo aos estudantes e artistas recém-formados, sendo, como já mencionámos, mais abrangentes. Note-se que as diferenças face aos moldes das antigas pensões de belas-artes não eram necessariamente negativas, no quadro geral do apoio artístico: por um lado, agora abria-se a possibilidade de subsidiar uma formação complementar no estrangeiro, formal ou informal, a um maior leque de interessados;29 por outro lado, apesar da irregularidade dos concursos, verifica-se que a estratégia de apoio através de viagens de curta duração permitiu, de facto, aumentar a quantidade de beneficiários. Vejam-se as diferenças, no campo das belas-artes: no período 1918-1931, ao abrigo dos antigos pensionatos e subsídios Valmor, foram atribuídas 9 bolsas; por sua vez, entre 1932 e 1939 foram subsidiadas dentro do novo modelo instituído pela JEN – a partir de 1936, substituída pelo Instituto para a Alta Cultura (IAC)30 – 25 viagens de artistas ao estrangeiro, entre as quais 5 bolsas de longa duração (ver anexo 1).

  • 31 Decreto nº 19.760, artº 151º e 153º, Diário do Governo, I Série, nº 116, 20 de maio de 1931.
  • 32 Na sequência do procedimento de 1931 foram atribuídas bolsas de longa duração a João Guilherme Fa (...)
  • 33 Tal como já aludido por Fernanda Rollo et al (2012, 79), os concursos das áreas artísticas destac (...)

20Apesar das reticências demonstradas por Marques da Silva, verifica-se um efetivo esforço legislativo em conferir às Escolas de Belas-Artes de Lisboa e do Porto um papel ativo na orientação dos concursos para a atribuição de bolsas de estudo de longa duração, numa clara estratégia de aliar o antigo modelo ao novo paradigma. De facto, o decreto que em 1931 reorganizou aqueles estabelecimentos conferia-lhes o direito de indicar à JEN, anualmente, os alunos que estivessem em melhores condições para receber as bolsas de estudo no estrangeiro.31 Para além disso, as escolas estavam representadas na Comissão de Educação Artística através dos seus diretores ou professores mais eminentes, e teriam um papel relevante na preparação e execução dos concursos. Nos dois concursos para atribuição de bolsas de longa duração, decorridos em 1933 e 1938,32 as escolas de Lisboa e do Porto não só foram responsáveis por indicar os alunos que consideravam elegíveis, como também se mantiveram como consultoras durante todo o procedimento, sendo igualmente responsáveis por organizar as provas práticas de seleção, “conforme é tradição” (Costa 1934, 20).33 Deste modo, apesar das diferenças na sua atribuição e gestão, e do novo contexto político-social em que foram concebidas, podemos considerar que as bolsas de estudo da JEN, de longa duração, conseguiram cumprir o objetivo de substituição dos antigos pensionatos, enquanto elemento estimulador da formação especializada no estrangeiro.

3. Formação no estrangeiro: que estratégia para as artes ?

21A regulamentação dos pensionatos artísticos publicada em 1918 tinha como base a legislação artística de 1911, em cujo relatório introdutório as viagens de estudo e estadias no estrangeiro são mencionadas como elementos fundamentais para a formação dos artistas que, através do contacto com outros sistemas de ensino, mestres e obras de arte, podiam libertar-se de eventuais vícios adquiridos em contexto escolar ou decorrentes do contacto prolongado com determinado professor:

  • 34 Relatório que antecede o Decreto nº 1, de Reorganização do Serviços Artísticos e Arqueológicos. D (...)

A pratica universal tem mostrado que, uma vez o artista feito, o contacto excessivo com um mestre é antes prejudicial que vantajoso. Chegado ao momento em que começa a possuir o seu métier, um artista deve fazer-se com impressões de todos, e só as muitas suggestões, variadas e boas, podem evitar-lhe, pela comparação cuidada e reflectida, o deixar-se absorver inteiramente pelo mestre que segue e que o enthusiasma.34

  • 35 Digitarq, Fundo ANBA, Atas da Comissão Executiva do CAA de Lisboa, Livro 19. Ata nº 49 (30 de mar (...)

22Os estímulos a um necessário desenvolvimento dos artistas em contexto internacional deveriam contribuir simultaneamente – e quase paradoxalmente – para o processo de “nacionalização da arte”, aclamado no mesmo relatório. As tensões entre a necessidade de uma ‘internacionalização formativa’ (individual) e os objetivos de uma ‘nacionalização artística’ (coletiva) foram tema debatido no meio intelectual português no início do século XX (Rosmaninho 2018), e mantém-se presente no processo de preparação da legislação de 1918. De facto, chega a ser defendida no seio do CAA de Lisboa a necessidade de substituir as pensões pelas bolsas de viagem, de modo a evitar a “larga permanência do estudante ou do artista em qualquer dos grandes centros artísticos europeus, e contribuindo-se d’esse modo para que a nossa arte mantenha uma feição própria e se não desnacionalize”.35

23Na prática, e verificando-se a continuidade da atribuição de subsídios de longa duração no âmbito da lei de 1918, seria complicado encontrar um ponto de equilíbrio entre os dois objetivos (nacional/internacional), até porque dificilmente se poderiam controlar os percursos e opções estéticas de cada artista durante o seu estágio no estrangeiro – ainda que fossem dadas aos bolseiros algumas diretrizes nesse sentido. A reação aos trabalhos enviados como prova de aproveitamento por Cristino da Silva, arquiteto subsidiado pelo Legado Valmor em Paris entre 1919 e 1923, é um claro exemplo:

  • 36 Ofício do CAA de Lisboa para Luís Cristino da Silva, 26 de abril de 1921. Digitarq, Fundo ANBA, C (...)

Apreciou a Comissão Executiva, as provas de aproveitamento, enviadas por V. Exª, que lhe agradaram, pois representam acentuada aplicação e progresso, embora lhe tivesse sido mais grato, que o estilo escolhido para o principal dos trabalhos enviados, fosse menos eivado de exotismos que bem pouco se coadunam, com o nosso meio, pois não é fora do razoável que os esforços de V. Ex.ª convirjam em não se desnacionalizarem artisticamente.36

  • 37 Ofícios enviados pelo CAA de Lisboa para Simão Dordio Gomes, 20 de abril de 1923, e para Francisc (...)

24Os documentos consultados não revelam o que é que os membros do CAA de Lisboa – quase todos eles futuros elementos da Comissão de Educação Artística da JEN/IAC e/ou da Academia Nacional de Belas-Artes – entendiam como “arte nacional” ou de características eminentemente portuguesas. Porém, não será difícil relacionar essa conceção à ideia de um “portuguesismo” vinculado a um gosto de tradição naturalista, que se manifestava na captação ou encenação de uma portugalidade de temas castiços, através da “repetição frouxa de receituários adquiridos” (Silva 1994, 353). Daí as reticências face a alguns dos trabalhos enviados por artistas que depressa se vinculariam a uma atualização estética, ainda que dentro da “ordem” que caracterizou o panorama artístico europeu do entre-guerras: a Dordio Gomes seriam criticados alguns desenhos, “abstrações, que nada a interessaram [à Comissão Executiva do CAA de Lisboa] e até, talvez, tivesse sido útil não lhos ter remetido”; e Francisco Franco seria informado de que os seus trabalhos revelavam uma certa “desorientação”, que era necessário corrigir.37 Curiosamente, estes dois bolseiros, que cedo revelaram uma “atitude modernista” (França 1984, 58-59) que não atraía os membros do CAA de Lisboa – em especial os pintores e escultores professores na Escola de Belas-Artes de Lisboa, praticamente todos vinculados a um gosto de tradição naturalista –, viriam a ser muito reconhecidos e extremamente bem integrados no sistema artístico nacional, a partir da década de 1930: Dordio Gomes foi um dos mais eminentes professores da Escola de Belas-Artes do Porto, onde lecionou entre 1934 e 1960; Francisco Franco viria a ser um dos autores mais solicitados para a realização de estatuária durante o Estado Novo.

  • 38 “Relatório do Bolseiro da J. de Educação Nacional Lauro Corado”, 27 de agosto de 1933. AHC, cota (...)

25Já em período JEN/IAC, deve ser assinalada a prevalência, na seleção dos bolseiros de curta e longa duração, de artistas que nunca renovaram ou atualizaram as suas referências estéticas, mesmo com as possibilidades que as viagens pelo estrangeiro lhes davam. Por exemplo, Lauro Corado, bolseiro de viagem em 1933, relata que após “longa peregrinação por museus e exposições, a impressão que colhi foi a de que atravessamos um período de decadência”, criticando quer as expressões artísticas mais atuais (o bolseiro menciona “os futuristas exibindo os maiores disparates”, o que revela, de facto, uma desatualização e incompreensão face aos movimentos artísticos contemporâneos), quer “os clássicos, com a sua pintura monótona que já marcou uma época e que por isso não tem razão de continuar a viver a nossa, senão nas paredes dos museus como relíquias do passado !”.38 Mas o exemplo mais notável de resistência são os comentários de Severo Portela Júnior, pintor bolseiro da JEN, aos quadros que pudera ver no Museu do Luxemburgo, em Paris:

É fatigante este modernismo standarisado, feito em série, made in France como as bugigangas de lata. É tudo igual n’esta sala. Não ha pior nem melhor, parece tudo do mesmo autor, sem uma nota pessoal que singularise um quadro, que o destaque d’aquela pluralisação enervante e estúpida. (Portela Júnior 1936, 23)

26Defensor de uma “nova mística nacionalista” que deveria estender-se à pintura, à escultura e à arquitetura, e de uma exploração plástica de “motivos nacionais” que contribuíssem “quanto possível para que a Arte seja a expressão grandiosa da Nação” (ibidem, 23), Portela Júnior não hesita em conferir uma narratividade profundamente nacionalista ao papel da arte e do artista na sociedade contemporânea:

A época da arte pela arte passou. Hoje o artista tem uma responsabilidade social enorme, e o seu papel, a sua função tem de ter como finalidade o engrandecimento espiritual da Nação. […] O artista tem necessariamente de ser o reflexo do seu povo, cantando com beleza, a beleza do seu espírito heroico, traduzindo com elevação a grandeza das suas virtudes, dando-nos sempre com virilidade os sentimentos grandiosos da sua Raça. (ibidem, 23)

27Embora a sua linha de pensamento se alinhasse com a missão artística do estado, nomeadamente com a “política do espírito” proclamada em 1932 por António Ferro, que tinha por objetivo a defesa de uma arte nacionalista e o aprimoramento dos padrões estéticos da sociedade (Ó 1999, 103-105), Portela Júnior (1936, 23) defende um caminho conceptual e esteticamente mais conservador, apartado das “salgalhada[s] de tintas, de troca tintas sem lógica, sem originalidade, sem significação” que pudera observar em Paris, afastando-se assim do posicionamento do próprio Ferro, mais sensível às manifestações do modernismo e das vanguardas artísticas europeias, e para quem os objetivos artísticos nacionais deveriam ser alcançados através de uma via estética mais moderna e voltada para o futuro (Ferro 1935, 13).

  • 39 Ofício do CAA de Lisboa para a DGBA, 6 de novembro de 1928. Digitarq, Fundo ANBA, Copiador de Cor (...)

28A par da missão nacionalizadora da arte portuguesa, aos subsídios artísticos para formação no estrangeiro foram conferidos outros objetivos, mais concretos, no quadro da estratégia de desenvolvimento do meio artístico nacional, relacionados com o incremento das coleções de arte nacionais e, já no âmbito da ação da JEN/IAC, com a formação dos futuros professores e quadros técnicos, nas áreas artísticas. A legislação de 1918 previa que os trabalhos de maior mérito realizados no contexto dos pensionatos pudessem ser distinguidos com a sua aquisição e incorporação no Museu Nacional de Arte Contemporânea (MNAC). Deste modo, não só era dada continuidade ao estímulo individual dos melhores artistas, como também se contribuía para o incremento das coleções de arte nacionais, assim enriquecidas com produção contemporânea atualizada. Entre 1920 e 1928 foram incorporados no MNAC, na sequência direta dos pensionatos no estrangeiro, apenas trabalhos de Francisco Franco (Busto de Manuel Jardim, 1921) e de Leopoldo de Almeida (Fauno, 1927), o último dos quais adquirido como “homenagem às brilhantes qualidades que demonstrou durante todo o seu pensionato, e com o justo fim de firmar o seu nome ao lado dos Mestres da Estatuária em Portugal”.39

  • 40 Ata da 15ª reunião da CEA da JEN, 15 de fevereiro de 1932. AHC, cota 0382/02, “Livro de Actas da (...)

29Por sua vez, no início da atividade da Comissão de Educação Artística da JEN uma das questões em debate foi se haveria vantagem em substituir o relatório trimestral de atividade exigido aos bolseiros pelo envio de obras de arte. Para o presidente da comissão, Júlio Dantas, a abolição do relatório e a sua substituição, pura e simples, por obras plásticas ou musicais que atestassem o progresso dos bolseiros nas suas áreas de especialidade não eram medidas que devessem ser adotadas com carácter absoluto. Porém, os restantes membros da comissão consideravam vantajoso o envio de obras de arte, pois elas permitiriam de facto avaliar os desenvolvimentos de cada bolseiro – mais uma vez, à semelhança da prática nos antigos pensionatos. Assim, no início de 1935 resolveu-se não apenas que os relatórios fossem substituídos pelo envio de obras de arte, mas também: (1) que os artistas pintores e escultores realizassem cópias de grandes mestres, e os bolseiros arquitetos “trabalhos de reprodução, reconstituição ou integração dum monumento notável da arte arquitectónica”; (2) que, após o exame dos envios, os trabalhos fossem incorporados nas coleções da Escola onde o artista se tenha diplomado ou, “se forem dignos disso”, num Museu Nacional.40

  • 41 José Contente, “Relatório do meu aproveitamento no estrangeiro, a apresentar ao Instituto para a (...)

30A execução de cópias havia sido obrigatória nos antigos pensionatos de belas-artes, pois era entendida como exercício académico fundamental para o desenvolvimento da prática em torno de técnicas de composição, desenho e cor. Por outro lado, as cópias poderiam ser a base para o enriquecimento das coleções didáticas, ao serviço da formação teórica e prática dos alunos das escolas artísticas, na mais pura tradição oitocentista (Lisboa 2007, 278-285). Apesar de não ser elemento imposto nos pensionatos realizados entre 1919 e 1928, na documentação do CAA de Lisboa há notícia de cópias executadas pelos bolseiros José Campas e Dordio Gomes. Dos bolseiros da JEN/IAC, só encontrámos registos da execução de cópias feitas por José Contente no Museu do Louvre, “mas só uma consegui acabar, que é o Retrato d’um jovem músico do genial pintor Prud’hon”.41 Quanto a incorporações de trabalhos nas coleções escolares ou em museus nacionais, na sequência das bolsas de longa duração da JEN/IAC, não encontrámos quaisquer registos relativos ao assunto, no período em análise. À luz da documentação consultada, podemos afirmar que no que concerne à intenção de enriquecer as coleções artísticas através do aproveitamento artístico dos bolseiros, seja à luz dos antigos pensionatos ou dos novos modelos de subsídios, o balanço não poderá ser considerado positivo – mesmo com a ressalva de que se encontra por fazer um estudo aprofundado das incorporações de obras de arte naqueles estabelecimentos, e tendo em consideração o reduzido número de bolsas de longa duração então atribuídas.

  • 42 Currículo Confidencial, 8 de fevereiro de 1934. AHC, cota 1307/13, Processo “Bernardo Marques”.
  • 43 Requerimento apresentado por Jaime Martins Barata à JEN, 14 de fevereiro de 1935. AHC, cota 0457/ (...)
  • 44 Ofício da JEN para o engenheiro administrador da Casa da Moeda e Valores Selados, J. Perestrello, (...)
  • 45 Ibidem.

31Por fim, ainda no que diz respeito ao papel das bolsas artísticas no quadro geral do fomento artístico nacional, importa destacar a maior novidade do modelo proposto pela JEN e mais tarde desenvolvido pelo IAC: mais do que estimular o desenvolvimento artístico individual de cada bolseiro, interessava agora investir na especialização do “pessoal docente ou técnico dos estabelecimentos oficiais de ensino” e dos diplomados por escolas portuguesas (ou seja, destacava-se agora a missão de complementar a formação cultural e técnica dos atuais e futuros funcionários do estado, conforme previsto no Decreto nº 19.552, de 1931). No período em análise, para além da atribuição de subsídios de viagem a alguns artistas professores do ensino artístico e técnico, é relevante o relativo investimento na área da gravura e das artes gráficas: destaquem-se, por exemplo, os subsídios dados a Bernardo Marques, que na sua candidatura menciona querer “utilizar os conhecimentos adquiridos em proveito das artes gráficas portuguesas, contribuindo para o seu ressurgimento”;42 a Jaime Martins Barata, professor no Liceu Gil Vicente, a quem foi dada equiparação a bolseiro para estudar no estrangeiro “a organização do ensino do Desenho e a aplicação dos modernos processos de reprodução artística ao mesmo ensino”;43 e ainda a dois artistas gravadores da Casa da Moeda.44 Este investimento, que era fruto da vontade de “procurar criar no País uma melhoria de condições do ensino da cultura da Gravura Artística”,45 e de contrariar a já mencionada “crise” que se fazia sentir nesta área de especialização, pode ainda ser relacionado com o desenvolvimento, naquela época, de uma ação propagandística oficial apoiada na criação de uma “imagem nacional”, entre outros meios difundida e consolidada através de suportes gráficos (emissões filatélicas, postais, cartazes, mapas, roteiros, manuais escolares, revistas e outras publicações ilustradas).

4. Considerações finais

Uma bolsa é uma missão, e não gozo: missão prévia lá fora, para aprender a ser mais útil; missão definitiva cá dentro, para empregar com a máxima utilidade colectiva a aprendizagem individual que se obteve. A aceitação ou obtenção de um subsídio representa portanto antes mais uma obrigação que se contrai do que uma regalia que se alcança. (Relatório dos trabalhos... 1930, 33)

32Nos anos entre-guerras, o quadro institucional ligado à atribuição e gestão de subsídios de estudo e viagem no campo das belas-artes foi marcado por fortes mudanças, entre as quais o fim dos pensionatos do estado e do Legado Valmor em meados da década de 1920, substituídos por um novo modelo de atribuição de bolsas, coordenado numa primeira fase pela Junta de Educação Nacional e, a partir de 1936, pelo Instituto para a Alta Cultura. Este novo modelo foi marcado pela flexibilidade de gestão da dotação orçamental, que permitia uma otimização na distribuição das verbas, já não apenas destinadas a bolsas de longa duração – mais dispendiosas e, por isso, mais raras –, mas também passíveis de serem atribuídas em forma de subsídios para viagens de curta duração. Outra diferença face ao paradigma anterior foi o enquadramento destes subsídios numa nova missão e tentativa de alargamento das suas repercussões: o objetivo já não era apenas estimular o desenvolvimento artístico individual de cada bolseiro, mas também – e sobretudo – contribuir mais amplamente para a formação e/ou renovação dos saberes de professores, técnicos e mestres artistas, que no seu regresso deveriam aplicar os novos conhecimentos ao serviço da nação.

33Apesar das diferenças, não houve uma efetiva rutura do modelo JEN/IAC com o modelo de atribuição e gestão de bolsas artísticas anteriores, devendo ser assinalada alguma continuidade conceptual e funcional nestes processos. De facto, a nova legislação e regulamentação sustentava-se nas normativas anteriores, ao que não é decerto alheio o conjunto de personalidades que integrava ou colaborava com a Comissão de Educação Artística da JEN/IAC, quase todas provenientes das antigas estruturas artísticas do país. Assim se justifica, por exemplo, o papel fundamental dado às Escolas de Belas-Artes de Lisboa e do Porto como instituições consultoras durante os concursos e nos debates acerca da estratégia de atuação da Comissão de Educação Artística, ou a adoção de procedimentos concursais com provas práticas, na tradição dos antigos pensionatos.

  • 46 Cf. Quadro 18 – Bolsas de estudo entre 1929 e 1950 (Rollo et al. 2012, 169).

34As 25 bolsas atribuídas pela JEN/IAC entre 1932 e 1939, no domínio das belas-artes, correspondem sensivelmente a 7 % do número total de bolsas atribuídas no conjunto das suas áreas de atuação naquele período, valor que sugere uma falta de investimento oficial no apoio à formação e desenvolvimento artísticos.46 Porém, importa referir que o apoio do estado aos artistas, e o estímulo da sua atividade e promoção no estrangeiro, conheceu neste período outras manifestações, entre as quais a sua integração nas equipas responsáveis pelos programas decorativos dos pavilhões em exposições nacionais e internacionais (Neto 2017), e nas atividades relacionadas com a propaganda externa (Acciaiuoli 2013). Em investigações futuras, será importante analisar de que modo a ação da JEN/IAC no campo do estímulo às artes plásticas se relacionou com a atividade de outros órgãos que tiveram interferência neste domínio, nomeadamente com o Secretariado de Propaganda Nacional / Secretariado Nacional de Informação, e qual o posicionamento dos artistas, principalmente os bolseiros.

35Será importante, também, proceder a uma análise da formação e produção dos artistas portugueses em circulação, bolseiros e não bolseiros, das consequências da sua experiência no estrangeiro, e da sua receção crítica no seio das instituições oficiais e no espaço público. Refira-se que estamos a falar de um contexto marcado por antagonismos estéticos: por um lado, verifica-se uma vontade em continuar a inovar e a apresentar novas propostas plásticas, na senda das vanguardas anteriores; por outro lado, assiste-se a um movimento de “regresso à ordem”, constituído como clara reação a essas mesmas experiências vanguardistas e à sua matriz “internacionalizante”, e que defendia o resgate moderno de modelos e linguagens extraídos do classicismo, o gosto por um novo naturalismo e a reabilitação da tradição e dos valores culturais “nacionais” (Buillon 1996, 200 ss.). Finalmente, fica também por avaliar o papel dos subsídios de estímulo à formação no estrangeiro dentro do contexto mais alargado da missão científica e cultural da JEN/IAC, incluindo as suas repercussões na organização do ensino artístico nacional, no seio de uma missão nacionalizadora global, baseada na ideia de uma identidade construída a partir de um determinado território-nação (Portugal e o seu império), num tempo histórico marcado pela evocação do passado e vontade de progressão para o futuro.

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Bibliografia

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Rosmaninho, Nuno (2018). A Deriva Nacional da Arte. Portugal, Séculos XIX e XX. Vila Nova de Famalicão: Edições Húmus.

Silva, Raquel Henriques da (1994). “Romantismo e pré-naturalismo” e “Sinais de ruptura: Livres e humoristas”, in P. Pereira (dir), História da Arte Portuguesa, vol. 3. Lisboa: Temas e Debates, resp. pp. 329-353 e 369-405.

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Anexo

Anexo 1. Bolseiros de Belas-Artes no Estrangeiro, 1918-1939

Nome

Área

Ano

Observações

Luís Cristino da Silva

(1896-1976)

Arquitetura

1919-1923

Legado Valmor. Paris, Roma.

Ricardo Bensaúde

(1894-1974)

Pintura

1919-1922

Legado Valmor. Paris.

José Campas

(1888-1971)

Pintura

1919-1924

Pensionista do estado. Paris. Viagens à Bélgica, Holanda, Alemanha e Itália.

Heitor Cramez

(1889-1967)

Pintura

1919-1925

Pensão do estado atribuída em 1914. Paris. Devido à Grande Guerra, só partiu em 1919.

Manuel Marques

(1890-1956)

Arquitetura

1918-1925

Pensão do estado atribuída em 1916. Paris. Devido à Grande Guerra, só partiu em 1918.

Carlos Bonvalot

(1893-1934)

Pintura

1920-1922

Legado Valmor. Paris, Roma.

Simão César Dordio Gomes

(1890-1976)

Pintura

1921-1925

Pensionista do estado. Paris, Roma.

Francisco Franco de Sousa

(1885-1955)

Escultura

1921-1923

Pensionista do estado. Paris, Roma.

Leopoldo Neves de Almeida

(1898-1975)

Escultura

1926-1928

Pensão mista (estado e Legado Valmor). Paris (3 meses), Roma.

Ruy Roque Gameiro

(1906-1935)

Escultura

1932

JEN – bolsa de viagem, c. 2 meses. Madrid, Paris e Berlim.

Mário Augusto dos Santos

(1895-1941)

Pintura

1932

JEN – bolsa de viagem, c. 2 meses. França (28 dias em Paris), Inglaterra, Bélgica e Holanda.

Bernardo Marques

(1898-1962)

Gravura

1933

JEN – bolsa de viagem, Paris - 5 meses, somente dois dos quais como bolseiro JEN.

Lauro da Silva Corado

(1908-1977)

Pintura

1933

JEN – bolsa de viagem, Espanha, França, Itália.

Luís Varela Aldemira

(1895-1975)

Pintura e Desenho

1933

JEN – bolsa de viagem, c. 4 meses. França e Itália.

Salvador Barata Feyo

(1899-1990)

Escultura

1933

JEN – bolsa de viagem, Itália.

Severo Portela Júnior

(1898-1985)

Pintura

1933

JEN – bolsa de viagem, c. 3 meses. Madrid, Paris, Roma. Publicou o relatório de viagem.

David Moreira da Silva

(1909-2002)

Arquitetura

1933-1937

JEN – bolsa de estudo, Paris.

João Guilherme Faria da Costa

(1906-1971)

Arquitetura

1934-1937

JEN – bolsa de estudo, Paris.

António Ventura Porfírio

(1908-1998)

Pintura

1934-1937

JEN – bolsa de estudo, Bélgica. Viagens a França, Holanda e Itália.

Luís Reis Santos

(1898-1967)

Artes gráficas

1934

JEN – bolsa de viagem, c. 2 meses. França, Alemanha, Bélgica, Inglaterra.

Joaquim Lopes

(1886-1956)

Pintura

1934

JEN – bolsa de viagem. Espanha, França, Itália, Bélgica, Holanda. Concedida por 4 meses, durou apenas 33 dias porque o pintor não pôde deixar as suas funções letivas.

Roberto Araújo Pereira

(1908-1969)

Ilustração

1934

JEN – bolsa de viagem. França, Bélgica e Inglaterra. Concedida para 1 mês, foi prorrogada por 5 meses.

Raquel Roque Gameiro

(1880-1970)

Pintura

1934

JEN – bolsa de viagem, Londres.

Ricardo Bensaúde

(1894-1974)

Ensino artístico

1934

JEN – bolsa de viagem, França.

Abel Manta

(1888-1882)

Pintura

1934

JEN – bolsa de viagem, Itália. Concedida por 4 meses, durou apenas 35 dias porque o pintor não pôde deixar as suas funções letivas.

Jorge Nicholson Barradas

(1894-1971)

Pintura decorativa

1934

JEN – bolsa de viagem, c. 3 meses. Paris.

Maria Adelaide Lima Cruz

(1908-1985)

Pintura

1934

JEN – bolsa de viagem, Paris. Foi sendo prorrogada até c. de 1 ano.

Baltazar da Silva Castro

(1891-1967)

Arquitetura

1937

IAC – bolsa de viagem, vários países.

Fernando Pamplona

(1909-1999)

Pintura (teoria)

1937

IAC – bolsa de viagem, c. 2 meses. Itália, Alemanha, Bélgica, Holanda, França.

Arnaldo Ressano Garcia

(1880-1947)

Desenho

1937-1938

IAC – bolsa de viagem, Paris. Foi sendo prolongada, até total de 7 meses.

Albano Portocarrero

de Almeida

(1897-1952)

Pintura

1938

IAC – bolsa de viagem, c. 2 meses, Paris.

Jaime Martins Barata

(1899-1970)

Ensino artístico

1938-1939

IAC – bolsa de viagem, c. 4 meses. Paris, Roma, Colónia, Bruxelas, Londres

Estrela Faria

(1910-1976)

Pintura

1938-1939

IAC – bolsa de estudo, Paris.

José Contente

(1907-1957)

Gravura

1938-1940

IAC – bolsa de estudo, Paris.

Fonte: Arquivo da Academia Nacional de Belas-Artes; Arquivo do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua, I.P.

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Notas

1 Os pensionatos de belas-artes no estrangeiro, financiados pelo estado, foram instituídos em 1865. O Legado Valmor, regulamentado em 1902, foi instituído por disposição testamentária de Fausto Queirós Guedes (1837-1898), 2º visconde de Valmor, que legou à Academia Real de Belas-Artes de Lisboa uma verba que, colocada em rendimento, seria destinada à concessão de bolsas para artistas ou estudantes de belas-artes, e à aquisição de obras para o Museu Nacional de Belas-Artes.

2 Decreto nº 1, de Reorganização do Serviços Artísticos e Arqueológicos, Secção V, Cap. III. Diário do Governo, I Série, nº 124, 29 de maio de 1911, 2246.

3 Decreto nº 4.012, Diário do Governo, I Série, nº 65, 1 de abril de 1918, 319-322.

4 Ibidem, Artº 62º.

5 Ibidem, Artº 23º, 30º, 36º e 40º, 48º e 53º.

6 Requerimento coletivo apresentado ao CAAL, 10 de maio de 1918. Digitarq, Fundo ANBA, Documentação relativa a pensionistas. URL: http://digitarq.dgarq.gov.pt/viewer?id=4612188.

7 Ofício do cônsul-geral de Portugal em Paris, Armando Navarro, para o CAAL. Paris, 9 de maio de 1918. Digitarq, Fundo ANBA, Documentação relativa a pensionistas. URL: http://digitarq.dgarq.gov.pt/viewer?id=4612188. Sublinhado no original.

8 Digitarq, Fundo ANBA, Atas da Comissão Executiva do CAAL, Livro 22. Ata nº 83 (20 de maio de 1918). URL: http://digitarq.dgarq.gov.pt/details?id=4611684.

9 Tirando partido de uma lacuna na portaria que suspendia a sua pensão, Dordio Gomes colocou o estado em tribunal. Na sequência desta ação foi decidido o pagamento das pensões em dívida ao pintor. Informado desta decisão, o CAAL propõe que, ao invés da indemnização, se restabelecesse o pensionato, reintegrando também os restantes bolseiros envolvidos (Comissão Executiva do CAAL, ata nº 57 (4 de janeiro de 1916). Digitarq, Fundo ANBA, Livro 19. URL: http://digitarq.arquivos.pt/viewer?id=4611681).

10 Ofício da Secretaria do CAAL para a DGBA. Lisboa, 4 de setembro de 1925. Digitarq, Fundo ANBA, Copiador de correspondência expedida (1925). URL: http://digitarq.dgarq.gov.pt/details?id=4611830.

11 Cf. Ofício da Secretaria do CAAL para a DGBA. Lisboa, 18 de novembro de 1925. Digitarq, Fundo ANBA, Copiador de correspondência expedida (1925). URL: http://digitarq.dgarq.gov.pt/details?id=4611830.

12 Escritura de contrato de Leopoldo Neves de Almeida, 24 de fevereiro de 1926. Digitarq, Fundo ANBA, Pensionistas 1864-1926. URL: http://digitarq.dgarq.gov.pt/viewer?id=4612180.

13 Ofício da Secretaria do CAA de Lisboa para a DGBA. Lisboa, 10 de fevereiro de 1926. Digitarq, Fundo ANBA, Copiador de correspondência expedida (1926). URL: http://digitarq.dgarq.gov.pt/viewer?id=4611831.

14 Ibidem.

15 Decreto nº 20.985. Diário do Governo, I Série, nº 57, 7 de março de 1932, 431.

16 Decreto nº 20.977, Diário do Governo, I Série, nº 55, 5 de março de 1932, 420.

17 Cf. Atas nº 4 (19 de novembro de 1932), nº 5 (4 de março de 1933), nº 6 (11 de abril de 1933) e nº 7 (6 de maio de 1933). Arquivo da ANBA, Lisboa (doravante AANBA), Livro de Atas Nº 1.

18 Ata nº 43 (15 de dezembro de 1938). AANBA, Livro de Atas Nº 2, 49.

19 Ata nº 58, 28 de setembro de 1939. AANBA, Livro de Atas Nº 2, 67.

20 Decreto nº 16.381, Diário do Governo, I Série, nº 13, 16 de janeiro de 1929. Um estudo acerca da génese, atividade e desenvolvimento deste organismo foi feito por Rollo et al (2012).

21 Refiram-se como exemplo, entre 1929 e 1931, os requerimentos, todos indeferidos, feitos por Alberto Lacerda (ensino artístico), António Manuel da Saúde, Mário Eloy, Rita Guiot de Azevedo e Basto e Jorge Barradas (pintura) e Henrique Bettencourt (escultura). Neste período foram também apresentadas várias candidaturas espontâneas na área da música, igualmente indeferidas por não estarem previstas nas competências da JEN.

22 Ata da 7ª sessão da Comissão Executiva da JEN, 30 de setembro de 1929. Arquivo Histórico Camões, Lisboa (doravante, AHC), cota 2657/1, Livro de Atas da Comissão Executiva da JEN, 1929-1935.

23 Decreto nº 20.352, Diário do Governo, I Série, nº 223, 26 de setembro de 1931, capítulo XII, artº 99º e 100º.

24 Nomeados no Diário do Governo, II Série, nº 130, 6 de junho de 1931.

25 Ata da 1ª reunião da Comissão de Educação Artística da JEN (doravante, CEA/JEN), 31 de novembro de 1931. AHC, cota 0382/02, “Livro de Actas da Comissão de Educação Artística da JEN. 13 Novembro 1931-10 Setembro 1935”.

26 Conforme previsto nas alíneas b), c) e d) do artº 99º do Decreto 20.352. Cf. ata da 2ª sessão da CEA/JEN, 26 de janeiro de 1932. AHC, cota 0382/02, “Livro de Atas da Comissão de Educação Artística da JEN, 1931-1935”.

27 Ata da 3ª reunião da CEA/JEN, 29 de fevereiro de 1932. AHC, ibidem.

28 Ata da 4ª reunião da CEA/ JEN, 4ª sessão, 19 de março de 1932. AHC, ibidem.

29 O próprio secretário da JEN, Luís Robertes Simões Raposo, seria perentório em lembrar que o Serviço de Educação Artística “não tem de atender apenas ao aperfeiçoamento dos alunos das Escolas de Belas-Artes”. (Ata da 4ª reunião da CEA/JEN, 19 de março de 1932. AHC, ibidem).

30 Integrado na 7ª secção da nova Junta Nacional da Educação, cf. Decreto-lei 26.611, Diário do Governo, I Série, nº 116, 19 de maio de 1936, artº 22º a 24º. O início da atividade do IAC não trouxe alterações substanciais ao funcionamento interno do Serviço de Educação Artística.

31 Decreto nº 19.760, artº 151º e 153º, Diário do Governo, I Série, nº 116, 20 de maio de 1931.

32 Na sequência do procedimento de 1931 foram atribuídas bolsas de longa duração a João Guilherme Faria da Costa (arquitetura de jardins), David Moreira da Silva (arquitetura) e António Ventura Porfírio (pintura). No concurso de 1938 foram agraciados Estrela Faria (pintura) e José Contente (gravura), sendo ainda determinado que a alguns dos restantes candidatos fossem concedidos subsídios para breves missões no estrangeiro.

33 Tal como já aludido por Fernanda Rollo et al (2012, 79), os concursos das áreas artísticas destacavam-se dos restantes por serem os únicos sujeitos a programação e provas prévias.

34 Relatório que antecede o Decreto nº 1, de Reorganização do Serviços Artísticos e Arqueológicos. Diário do Governo, I Série, nº 124, 29 de maio de 1911, 2245.

35 Digitarq, Fundo ANBA, Atas da Comissão Executiva do CAA de Lisboa, Livro 19. Ata nº 49 (30 de março de 1915). URL: http://digitarq.arquivos.pt/viewer?id=4611681.

36 Ofício do CAA de Lisboa para Luís Cristino da Silva, 26 de abril de 1921. Digitarq, Fundo ANBA, Copiador de Correspondência Expedida (1921). URL: http://digitarq.dgarq.gov.pt/details?id=4611826.

37 Ofícios enviados pelo CAA de Lisboa para Simão Dordio Gomes, 20 de abril de 1923, e para Francisco Franco, 17 de fevereiro de 1923. Digitarq, Fundo ANBA, Copiador de Correspondência Expedida (1923). URL: http://digitarq.dgarq.gov.pt/details?id=4611828.

38 “Relatório do Bolseiro da J. de Educação Nacional Lauro Corado”, 27 de agosto de 1933. AHC, cota 1308/22, Processo “Lauro da Silva Corado”.

39 Ofício do CAA de Lisboa para a DGBA, 6 de novembro de 1928. Digitarq, Fundo ANBA, Copiador de Correspondência Expedida (1928). URL: http://digitarq.dgarq.gov.pt/viewer?id=4611833.

40 Ata da 15ª reunião da CEA da JEN, 15 de fevereiro de 1932. AHC, cota 0382/02, “Livro de Actas da Comissão de Educação Artística da JEN. 13 Novembro 1931-10 Setembro 1935”.

41 José Contente, “Relatório do meu aproveitamento no estrangeiro, a apresentar ao Instituto para a Alta Cultura (13 de Dezembro de 1940)”. AHC, cota 1257/6, Processo “José de Campos Contente”, 2º volume. Desconhecemos o paradeiro atual desta obra.

42 Currículo Confidencial, 8 de fevereiro de 1934. AHC, cota 1307/13, Processo “Bernardo Marques”.

43 Requerimento apresentado por Jaime Martins Barata à JEN, 14 de fevereiro de 1935. AHC, cota 0457/4, Processo “Jaime Martins Barata”.

44 Ofício da JEN para o engenheiro administrador da Casa da Moeda e Valores Selados, J. Perestrello, 21 de junho de 1938. AHC, cota 1270/16 – “Instituto de Alta Cultura: Concurso para concessão de bolsas de estudo artísticas em 1938”.

45 Ibidem.

46 Cf. Quadro 18 – Bolsas de estudo entre 1929 e 1950 (Rollo et al. 2012, 169).

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Para citar este artigo

Referência do documento impresso

Joana Baião, «Artistas portugueses em trânsito: bolsas de viagem e de estudo no estrangeiro, 1918-1939»Ler História, 75 | 2019, 205-227.

Referência eletrónica

Joana Baião, «Artistas portugueses em trânsito: bolsas de viagem e de estudo no estrangeiro, 1918-1939»Ler História [Online], 75 | 2019, posto online no dia 12 janeiro 2020, consultado no dia 18 janeiro 2025. URL: http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/lerhistoria/5978; DOI: https://0-doi-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/10.4000/lerhistoria.5978

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Joana Baião

Universidade Nova de Lisboa e Instituto Politécnico de Bragança, Portugal

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