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Dossier: Emigração e Imigração
Imigração

Quarenta anos de imigração africana: um balanço

Quarante années d’immigration africaine: un bilan
Forty years of African immigration: a balance
Fernando Luís Machado
p. 135-165

Resumos

Depois da caracterização da imigração africana em termos de volume, evolução e fases, analisam-se as dinâmicas sociodemográficas, socioprofissionais, socioculturais e identitárias associadas ao processo de sedentarização dos imigrantes africanos. Numa perspectiva sociológica e recorrendo a dados empíricos de várias fontes, dá-se atenção a aspectos como a formação de uma terceira geração, o envelhecimento, a emigração para outros países europeus, a mobilidade social, os casamentos mistos, a socialização linguística e a aquisição de nacionalidade portuguesa.

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Introdução

  • 1 Na data em que este texto é publicado, passam vinte anos sobre o primeiro texto científico publicad (...)

1A imigração africana, a mais antiga das migrações laborais para Portugal, já fez quarenta anos1. Foi na segunda metade da década de 1960 do século XX que chegaram à região de Lisboa os primeiros imigrantes caboverdianos, que vieram colmatar as necessidades de mão-de-obra geradas pela emigração portuguesa para países europeus mais desenvolvidos e pela saída de muitos milhares de homens para as guerras coloniais de Angola, Moçambique e Guiné-Bissau.

2É uma imigração-protótipo. Foi a primeira a sedentarizar-se, no sentido em que grande parte das pessoas que a constituem se fixou de forma virtualmente definitiva em Portugal. Sendo a mais antiga e volumosa, foi também a primeira a desdobrar-se em três «gerações» e a primeira a começar a envelhecer no destino, dando origem ao fenómeno novo dos imigrantes idosos. É também a primeira a aportuguesar-se, por via das naturalizações crescentes, das socializações secundárias dos mais novos, dos casamentos mistos e de outros processos de assimilação cultural.

  • 2 Em 2007, os não-PALOP eram 11 265 e representavam apenas 8% do total de imigrantes africanos. Seneg (...)

3Neste texto faz-se um balanço sobre estes quarenta anos de imigração africana, que já foi mais intensa do que é hoje, mas continua a aumentar gradualmente os seus efectivos. Como desde o início, continua a ser uma imigração constituída quase só por indivíduos e famílias oriundos dos países africanos de língua oficial portuguesa, que representam mais de 90% do total dos africanos residentes em Portugal2.

4Como evoluíram os fluxos migratórios a partir desses cinco países? Como se situa presentemente o fluxo africano no quadro geral da imigração para Portugal? Que tendências se desenham para o futuro? Por outro lado, olhando para os imigrantes e não só para a imigração, quais as modalidades de integração desses imigrantes na sociedade portuguesa? O que se pode dizer sobre os seus trajectos e condição actual, em termos económicos, sociais, culturais e políticos? Como é que a sociedade de acolhimento se posiciona face a eles, sabendo-se que muitos desses imigrantes se tornaram, entretanto, objectivamente, cidadãos portugueses como quaisquer outros, embora, subjectivamente, possa não ser necessariamente assim?

Dimensão, evolução e fases da imigração africana

5Podem distinguir-se quatro fases na imigração africana para Portugal.

6A primeira fase, a dos pioneiros, é a que começa em meados dos anos 60 do século passado e termina em 1975, com os processos de descolonização dos actuais países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP). Sabe-se pouco sobre esses anos iniciais. Conhecem-se as razões da vinda dos trabalhadores caboverdianos, destinados a preencher vazios no mercado de trabalho; sabe-se que vieram trabalhar para a construção civil, por exemplo, nas obras do metro de Lisboa; mas desconhece-se, por exemplo, o dado básico que é o número de pessoas envolvidas nesse fluxo inicial. Por se tratar, na altura, de uma migração «interna», entre colónia e metrópole, não houve registo estatístico desse movimento.

  • 3 Entre esses estudantes contavam-se os que vieram a tornar-se líderes de movimentos de libertação da (...)

7Apenas indirectamente se pode estimar a sua dimensão. Pires (1999) fá-lo mostrando, através dos dados do Recenseamento Geral da População de 1981, que 30% dos imigrantes dos PALOP residentes em Portugal nessa data tinham imigrado antes de 1973, percentagem que sobre para 43% no caso dos caboverdianos. Além dos trabalhadores braçais, que constituíam a maioria desse contingente, havia outra componente da imigração africana, formada por jovens das várias ex-colónias que vieram para Portugal frequentar cursos universitários, parte dos quais acabou por se fixar definitivamente desde essa altura3.

8A segunda fase, a partir de 1975 e até finais dos anos 80, corresponde aos novos fluxos gerados pela descolonização dos antigos territórios portugueses em África. É a fase da diversificação. Com as independências da Guiné-Bissau (1974), Moçambique, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Angola (todas em 1975), aumenta o número de imigrantes africanos, mas sobretudo diversificam-se as suas origens. Os caboverdianos deixam de ser o único grupo com uma presença numérica significativa, formando-se contingentes de imigrantes de todas as cinco ex-colónias.

  • 4 Sobre o regresso dos portugueses das ex-colónias africanas ver Rui Pena Pires, Maria José Maranhão, (...)

9Os novos imigrantes chegam ao mesmo tempo, e no mesmo movimento, que os mais de 500 mil portugueses e seus descendentes que residiam nas ex-colónias, nomeadamente em Angola e Moçambique, na altura designados «retornados», nome que entretanto passou à história4. Os africanos que chegam nessa fase são como que retornados negros e mestiços. São pessoas que, no contexto da descolonização, por razões familiares, profissionais, políticas, optam ou são obrigados a vir para Portugal.

  • 5 Sobre esses primeiros contingentes de africanos ver Saint-Maurice e Pires (1989). Sobre os luso-afr (...)

10Entre eles contam-se pessoas de famílias mistas, de portugueses e africanos; antigos funcionários de vários serviços da administração portuguesa nas ex-colónias; ou ainda homens que fizeram a guerra colonial do lado do exército português, especialmente na Guiné-Bissau, e que vieram para escapar à perseguição política, quando não à morte. Por todas estas razões, mais do que imigrantes laborais propriamente ditos, os protagonistas destes fluxos pós-descolonização podem ser mais adequadamente designados «luso-africanos»5.

11A terceira fase começa em finais dos anos 80 e é a fase da intensificação dos fluxos migratórios. É uma fase de imigração laboral «pura», que, do lado de Portugal, é suscitada pelo surto de desenvolvimento económico do país, subsequente à adesão à então Comunidade Económica Europeia. O programa de construção generalizada de grandes infraestruturas púbicas, bem como a expansão da construção civil, atrai dezenas de milhar de imigrantes africanos, que fogem a situações de guerra ou de dificuldade económica nos seus países. Se os caboverdianos continuam na linha da frente dos que chegam, destaca-se também a imigração angolana, bem como a imigração guineense, que desde essa altura passam a figurar entre as numericamente mais importantes. O caso guineense é particularmente notório, já que até aí tinha uma expressão quantitativa muito reduzida.

12Neste período há dois processos de regularização de imigrantes ilegais, em 1993 e 1996, que se saldam, respectivamente, em cerca de 25 000 e 35 000 atribuições de título de residência, sobretudo a africanos. Esta fase prolonga-se até aos dois primeiros anos do século XXI, quando se assiste a uma alteração substancial do quadro imigratório em Portugal. No processo de regularização de imigrantes de 2001, o que mais pessoas abrangeu, se bem que se contabilize um número considerável de novos imigrantes dos cinco PALOP, eles são largamente ultrapassados pelos surpreendentes ucranianos, romenos, moldavos e russos, bem como por uma segunda vaga de brasileiros. Entre os beneficiários das mais de 183 mil autorizações de permanência concedidas ao abrigo desse processo, entre 2001 e 2003, os africanos representavam apenas 13%.

13A quarta fase é a que se inicia após esses anos de recomposição global da imigração e prolonga-se até à actualidade. É uma fase de abrandamento do número de entradas e de mudança do perfil daqueles que entram. Mais do que novas chegadas de imigrantes laborais propriamente ditos, há sobretudo processos de reagrupamento familiar. Esse abrandamento corresponde também a um período de estagnação da economia portuguesa, com a consequente redução da atractividade sobre novos candidatos à imigração. É claro que uma eventual recuperação da economia, por exemplo, uma nova vaga de construção de grandes infraestruturas, pode alterar rapidamente o estado dos fluxos migratórios africanos (e outros), voltando a acelerá-los. Os factores de repulsão dos países de origem mantêm-se, em vários casos, e as redes sociais co-étnicas de acolhimento de novos migrantes estão aí, disponíveis e variadas.

14Vejamos agora como evoluiu quantitativamente a imigração africana dos PALOP (Quadro 1) e qual a parte dessa imigração no total de imigrantes estrangeiros (Quadro 2).

Quadro 1. Evolução numérica da imigração africana dos PALOP (1980-2007)*

Ano

Número

de imigrantes

Ano

Número

de imigrantes

1980

23 776

1994

68 945

1981

23 835

1995

75 316

1982

24 590

1996

77 114

1983

27 633

1997

77 600

1984

29 998

1998

78 291

1985

32 719

1999

85 200

1986

36 799

2000

93 506

1987

37 665

2001

116 966

1988

38 900

2002

130 562

1989

41 114

2003

135 709

1990

43 297

2004

139 072

1991

45 795

2005

142 321

1992

49 713

2006

139 379

1993

52 883

2007

136 694

Fontes: Serviço de Estrangeiros e Fronteiras; Rocha-Trindade (2001) para os anos de 1980 a 1985.
* Para os anos de 1980 a 1985 não estão incluídos os efectivos de imigrantes santomenses. O seu peso era, no entanto, quase negligenciável. Em 1986, primeiro ano em que aparecem isolados nas Estatísticas Demográficas do INE, eram apenas 1 563 indivíduos.

15­

Quadro 2. Evolução numérica da imigração em geral e da percentagem de imigrantes africanos dos PALOP (1986-2007)*

Ano

Número de imigrantes

% de africanos dos PALOP

Ano

Número de imigrantes

% de africanos dos PALOP

1980

50 750

46,8

1994

157 073

43,9

1981

54 414

43,8

1995

168 316

44,7

1982

58 674

41,9

1996

172 912

44,6

1983

67 484

40,9

1997

175 263

44,3

1984

73 365

40,9

1998

178 137

43,9

1985

79 594

41,1

1999

191 143

44,6

1986

86 982

42,3

2000

207 607

45,0

1987

89 778

42,0

2001

350 898

33,3

1988

94 694

41,1

2002

413 487

31,6

1989

101 011

40,7

2003

433 650

31,3

1990

107 767

40,2

2004

447 155

31,1

1991

113 978

40,2

2005

414 659

34,3

1992

123 612

40,2

2006

420 189

33,2

1993

136 932

38,6

2007

435 736

31,4

Fonte: Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
* Para os anos de 1980 a 1985 não estão incluídos no cálculo das percentagens de imigrantes dos PALOP os santomenses. O seu peso era, no entanto, quase negligenciável. Em 1986, primeiro ano em que aparecem isolados nas Estatísticas Demográficas do INE, eram apenas 1 563 indivíduos.

16Desde o ano mais antigo de que se conseguiu registo, 1980, até 2007 vê-se que há um aumento praticamente contínuo do número de imigrantes, ano após ano, número que atinge o valor máximo em 2005, verificando-se uma quebra ligeira nos dois anos posteriores. Entre 1980 e 1990 o total de africanos quase duplica, entre 1990 e 2000 mais do que duplica e ainda aumenta consideravelmente depois disso. Nos anos que se seguem aos três processos de regularização de imigrantes ilegais (1993, 1996 e 2001) há, como era de esperar, incrementos mais significativos.

17Que significado atribuir à quebra de 2006 e 2007, que coloca o efectivo de africanos perto do valor de 2003? É crível que esteja a diminuir, de facto, o número de imigrantes? Há duas razões para pensar que essa redução não está a acontecer.

18A primeira razão tem a ver com os tipos de título legal de que são portadores os imigrantes (africanos e outros) e o modo com eles têm evoluído nos últimos anos. Se analisarmos isoladamente as autorizações de residência, o título mais estável de todos, verificamos que continuaram a crescer em 2006 e 2007. A redução global no efectivo de africanos deve-se, então, ao facto de as autorizações de permanência e os vistos de longa duração, os outros títulos legais existentes, diminuírem nesses anos. Mais rigorosamente, o que se verifica é que as prorrogações desses dois outros títulos, mais precários, são em menor número do que os pedidos iniciais. Depreender daqui que há uma efectiva redução do número de imigrantes africanos (por exemplo, por estarem a regressar aos seus países) é precipitado.

19Não é de excluir que algum retorno esteja a haver, nomeadamente a Angola e Moçambique, países cujos processos de recuperação económica e social os tornará atractivos. Também poderá haver alguma reemigração para outros destinos dentro da União Europeia, ponto que abordaremos à frente. Mas em muitos outros casos existirá apenas atraso nos pedidos de prorrogação ou outras razões circunstanciais para que as prorrogações não tenham sido pedidas, entretanto. Mesmo os eventuais casos de reemigração serão provavelmente temporários.

20A segunda razão que leva a crer que não há uma efectiva redução do número de africanos residentes em Portugal é que as concessões de nacionalidade portuguesa aumentaram muito, justamente nos últimos anos. Como veremos adiante, 2006 e 2007 foram os anos em que mais africanos adquiriram a nacionalidade portuguesa, mais de seis mil e cinco mil pessoas, respectivamente. Ora, essas pessoas, agora que se tornaram cidadãos nacionais, continuarão provavelmente a viver em Portugal. Se somarmos esses milhares de pessoas ao efectivo de africanos estrangeiros de 2006 e 2007 deixamos de ter diminuição e passamos a ter aumento.

21Diga-se, aliás, que se juntarmos também a esse efectivo todos aqueles africanos que ao longo dos últimos trinta anos foram obtendo a nacionalidade portuguesa ou que não chegaram a perdê-la porque por ela optaram logo a seguir à descolonização e antes da mudança restritiva da lei da nacionalidade em 1981 (os já mencionados luso-africanos), a presença africana torna-se ainda mais volumosa. No caso particular dos caboverdianos, os mais antigos, mais numerosos e os que mais têm obtido nacionalidade portuguesa, a soma dos que permanecem estrangeiros e dos que se têm tornado cidadãos portugueses faz deles o maior grupo de imigrantes, destacado de qualquer outro, incluindo o dos brasileiros, hoje o mais numeroso se contarmos apenas os imigrantes estrangeiros. Diga-se que só na imigração africana, por ser a mais antiga, é que o processo de naturalização de ex-imigrantes já atingiu uma expressão notória.

22Relativamente à proporção de africanos dos PALOP no total dos imigrantes, o que o Quadro 2 mostra é que essa proporção é expressiva ao longo de todo o período. O valor mínimo registado, o do ano de 2004, fica acima dos 30%. De 1980 a 1992 mantém-se sempre acima dos 40%, cai pontualmente abaixo desse valor em 1993, e volta a ficar bem acima dele até ao ano 2000. O ano seguinte é de viragem. Os novos fluxos de imigrantes de países do leste da Europa e o grande aumento da imigração brasileira fizeram diminuir consideravelmente o peso relativo da imigração africana, que desce para valores pouco acima dos 30%. É claro que não estamos a considerar nestas contas o já referido segmento de imigrantes africanos que se tornaram portugueses. Se o considerássemos, a proporção de africanos subiria alguns pontos percentuais.

23Ao longo do período em análise, as posições relativas das cinco populações em causa – angolanos, caboverdianos, guineenses, moçambicanos e santomenses – também se alteraram, estabilizando depois (Quadro 3). Na primeira fase da imigração africana, como se disse, os caboverdianos constituíam o único grupo com expressão quantitativa. Na segunda fase, pós-descolonização, as restantes populações tomaram algum volume, mas os caboverdianos continuaram a ser os mais numerosos.

Quadro 3. Número de imigrantes dos PALOP em Portugal (1980-2007)

1980

1990

1995

2000

2007

Caboverdianos

21 022

28 796

38 746

47 093

63 925

Angolanos

1 482

5 306

15 829

20 416

32 728

Guineenses

678

3 986

12 291

15 941

23 733

Santomenses

n.d.

2 034

4 082

4 809

10 627

Moçambicanos

594

3 175

4 368

4 502

5 681

Total

23 776

43 297

75 316

92 761

136 694

Fontes: Serviço de Estrangeiros e Fronteiras; Rocha-Trindade (2001) para os anos de 1980, 1990 e 1995; Estatísticas Demográficas para os santomenses, em 1990 e 1995.

24Depois disso, duas mudanças maiores tiveram lugar. A primeira é que a partir de meados dos anos 90 os guineenses passaram a ser um dos maiores grupos de imigrantes, o terceiro entre os africanos e o quinto na ordenação geral. A segunda mudança é que os santomenses ultrapassaram e já dobraram os moçambicanos, que continuam a constituir um pequeno grupo de menos de seis mil pessoas. Por o sistema emigratório moçambicano estar historicamente orientado para outros destinos, nomeadamente a África do Sul, Moçambique, o mais populoso dos cinco PALOP, é o que tem menos migrantes em Portugal.

25A recomposição já referida da imigração no início deste século fez com que o lugar relativo das populações imigrantes dos PALOP na ordenação geral das populações imigrantes se alterasse (Quadro 4).

26Tendo formado desde sempre a população mais numerosa, os caboverdianos perdem a primeira posição da lista a favor dos brasileiros, nos últimos anos. Por sua vez, angolanos e guineenses mantêm-se entre os grupos maiores, mas perdem uma posição, passando respectivamente para o 4.º e 5.º lugares, pela interposição dos ucranianos na terceira posição. Os santomenses, que não figuravam entre os dez primeiros, chegam ao 10.º lugar em 2000 e descem para 11.º em 2007, lugar que já tinham ocupado antes. Finalmente, os moçambicanos, que durante muito tempo ocuparam a 10.ª posição, caem para o 15.º lugar nesse mesmo ano. Em todo o caso, os imigrantes dos PALOP, globalmente considerados, continuam a ter uma presença destacada no panorama da imigração em Portugal: entre as cinco populações mais numerosas, três provêm desses países.

Quadro 4. Número de ordem dos imigrantes dos PALOP no conjunto dos imigrantes em Portugal (1980-2007)

Quadro 4. Número de ordem dos imigrantes dos PALOP no conjunto dos imigrantes em Portugal (1980-2007)

Fonte: Serviço de Estrangeiros e Fronteiras; Rocha-Trindade (2001) para os anos de 1980, 1990 e 1995.

Dinâmicas sociodemográficas: novas faces da imigração africana

27Além da evolução numérica, outras dinâmicas sociodemográficas se desenvolvem na imigração africana ao longo do período em análise. Algumas delas tornam-se mais visíveis apenas em anos recentes e constituem novíssimas faces dessa imigração, praticamente ainda por estudar.

28O pano de fundo em que essas novas realidades emergem é o da sedentarização dos imigrantes. Passadas estas quatro décadas, uma das principais conclusões que se retira quando se faz um balanço da imigração africana é que a maioria dos indivíduos e famílias que a constituem se fixaram em Portugal, em termos virtualmente definitivos.

29Quais são os factos da sedentarização? Podem destacar-se três.

30O primeiro é o não-regresso. Não se verificou até agora, nem se vislumbra que possa vir a verificar-se, um regresso numericamente significativo dos imigrantes dos PALOP aos seus países de origem. Podemos admitir que mudanças em curso em alguns desses países levem uma parte dos imigrantes deles oriundos a ponderar regressar. É o caso de angolanos e moçambicanos, após os processos de pacificação de Angola e Moçambique e perante o desenvolvimento económico a que presentemente se assiste nesses dois países. No que se refere aos moçambicanos, o número de imigrantes é tão pequeno que o efeito quantitativo desse eventual regresso seria sempre marginal. Já no caso dos angolanos, muito mais numerosos, não seria assim. Mas é difícil saber se uma tal mudança fará realmente parte das estratégias individuais e familiares desses imigrantes. É algo a que só tempo responderá.

31O segundo facto da sedentarização é a progressiva recomposição sexual da imigração africana, que ano após ano se tem afastado do perfil predominantemente masculino típico da primeira fase do ciclo migratório e tem adquirido uma feição mais equilibrada. A taxa de masculinidade, que esteve sempre acima dos 60% até finais da década de 90 do século passado, tem caído rapidamente em anos mais recentes, cifrando-se em 55,8% em 2007. É uma evolução ditada pelo reagrupamento familiar, que favorece mais a fixação dos imigrantes do que o seu retorno à origem. Acrescente-se que a taxa de masculinidade conhece variações internas significativas, desde o caso santomense, em que as mulheres até são mais do que os homens (taxa de masculinidade de 47,8%) até ao caso guineense com a taxa de masculinidade mais elevada de todas, mas também em queda. Era de 71,9% em 2000 e de 65,5% em 2007.

  • 6 Machado, Abranches, Matias e Leal (2007).

32O terceiro e mais importante facto da sedentarização é a formação de uma vasta geração de crianças e jovens descendentes de imigrantes africanos, que se pode estimar hoje em muitas dezenas de milhar de indivíduos6.

33Se falar de sedentarização é falar do ponto de não retorno atingido pelas populações imigrantes no seu processo de inscrição societal nos países receptores, quando se trata de descendentes de imigrantes, o ponto de não retorno é quase um automatismo, com a eventual excepção daqueles que regressem à origem com os seus pais ainda em crianças. Em rigor, a própria noção de regresso à «origem» é inaplicável aos muitos que já nasceram nos países de acolhimento. Para esses o ponto de não retorno é o próprio momento do nascimento.

34É neste contexto que emergem novas dinâmicas sociodemográficas, ainda pouco visíveis e pouco conhecidas: entre elas está a emergência de um segmento de imigrantes africanos idosos; o surgimento de uma geração de descendentes de descendentes de imigrantes, vulgarmente designada «terceira geração»; e a emigração de imigrantes africanos ou seus descendentes para outros destinos europeus, a partir de Portugal.

35Vejamos alguns dados sobre cada uma dessas novas faces da imigração africana.

  • 7 Sobre o envelhecimento de imigrantes na Europa ver o n.º 8 de 2006 do Journal of Ethnic and Migrati (...)

36As quatro décadas de imigração africana em Portugal trouxeram consigo um desdobramento progressivo de gerações, seja «para baixo» («segunda geração», «terceira geração») seja «para cima», dando origem a uma primeira geração de imigrantes idosos (Quadro 5). Pode pensar-se que, atingida a fase pós-vida activa profissional, se tornam mais prováveis os regressos à origem. É verdade, em teoria. Mas também se sabe, pela experiência dos países europeus de imigração mais antiga, que muitos desses imigrantes idosos não regressam, optando por ficar nos países onde vivem, por razões familiares, de bem-estar social ou outras7.

Quadro 5. Imigrantes africanos com 65 ou mais anos, por país de origem, em 2006

Número absoluto

% sobre o total de imigrantes do país

Angola

660

2,3

Cabo Verde

2 518

4,4

Guiné-Bissau

230

1,1

Moçambique

261

5,1

São Tomé e Príncipe

228

2,6

Total

3 897

3,2

Fonte: Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Os números apresentados só incluem titulares de autorizações de residência

37Em Portugal está presentemente a atingir-se a fase do ciclo migratório em que os imigrantes idosos começam a emergir como uma nova categoria social (Quadro 5). Não admira que, por agora, só entre a população caboverdiana, justamente a mais antiga, esse segmento idoso tenha alguma expressão. De acordo com os dados disponíveis, havia, em 2006, 2 518 caboverdianos com 65 ou mais anos a residir em Portugal, que representavam 4,4% do total dos imigrantes desse país. Nas outras populações os idosos ainda são em pequeno número.

38Está-se longe, portanto, do que acontece na população receptora onde a faixa dos 65 ou mais anos tem um peso relativo muito maior (17%, em 2007), e que não pára de crescer, até porque há, ao mesmo tempo, envelhecimento na base, algo que de todo não acontece com as populações imigrantes, que incluem um grande número de crianças e jovens. Já a composição sexual é semelhante. Tal como na população portuguesa em geral, em todos os grupos de imigrantes africanos, sem excepção, há mais idosas do que idosos. A percentagem de mulheres nessa faixa etária dobra, e por vezes quase triplica, a de homens.

39Em suma, podemos dizer que há imigrantes idosos, mas não se pode falar de populações imigrantes envelhecidas. Mas esses imigrantes serão cada vez mais no futuro e isso colocará novas questões, seja às próprias populações imigrantes, seja à sociedade de acolhimento.

40Na base da pirâmide etária das populações imigrantes dos PALOP outro fenómeno sociodemográfico emergente é a formação de uma geração de filhos de descendentes de imigrantes, uma «terceira geração». É fácil percebê-lo se pensarmos nos imigrantes caboverdianos que chegaram a Portugal entre os anos 60 e os anos 70 do século passado, na casa dos vinte ou trinta anos. Trazendo já filhos com eles ou tendo esses filhos nascido cá, ainda nos anos 70 ou mais provavelmente nos anos 80, muitos desses filhos estão hoje, por sua vez, na casa dos vinte anos ou a chegar a ela, e uma parte já tem filhos nascidos em Portugal, netos, portanto, dos primeiros imigrantes.

  • 8 O projecto intitulou-se «Jovens Descendentes de Imigrantes Africanos: Transição para a Integração o (...)

41Dados de um estudo extensivo sobre jovens descendentes de imigrantes africanos realizado em 2004, que incluiu um inquérito por questionário a 1000 desses jovens, com idades entre os 25 e os 29 anos, mostram que essa «terceira geração» já está aí, com uma dimensão significativa (Quadro 6)8.

Quadro 6. Jovens descendentes de imigrantes africanos com filhos, por escalão etário

15-19 anos

20-24 anos

25-29 anos

Total

Tem filhos

4,8

13,7

42,0

14,1

Não tem filhos

95,2

86,3

58,0

85,9

Total

100,0

100,0

100,0

100,0

Fonte: Projecto JODIA, CIES-ISCTE, 2004, n=1000.

42Desses mil inquiridos, 14% declararam ter filhos e, desses, 28% disseram ter mais do que um. Se isolarmos o escalão dos 25-29 anos, a percentagem dos que já entraram na paternidade sobe para 42%. Este escalão etário não tem, por enquanto, um peso estatístico muito grande. Os descendentes de imigrantes concentram-se mais nos escalões mais jovens, especialmente na faixa dos 15-19 anos, porque ainda não há tempo médio suficiente nos calendários migratórios das várias populações dos PALOP para que as faixas de idade imediatamente acima dessa tenham tomado volume.

  • 9 Machado, Abranches, Matias e Leal (2007).

43Em todo o caso, o facto de 14% dos descendentes, independentemente da idade, terem filhos significa que a «terceira geração» contará já hoje vários milhares de crianças. Se tomarmos a estimativa de 50 000 descendentes de imigrantes africanos entre os 15 e os 29 anos como boa9, estamos a falar de 7 000 novos pais e mães, alguns deles com mais do que um filho, o que aponta para um valor que já não ficará muito longe dos dez mil indivíduos. O potencial de crescimento deste número é alto. Se é verdade que a maioria dos descendentes de imigrantes ainda está na faixa dos 15 aos 19 anos, os dados do estudo também mostram que 40% dos que foram pais o foram antes dos 20 anos.

44Sobre esta primeira geração de netos de imigrantes far-se-ão as perguntas que se fazem sobre a geração dos seus pais, só com a diferença de que o questionamento terá agora de ser feito a três gerações. Serão os seus trajectos escolares e profissionais (quando entrarem no mercado de trabalho) diferentes dos seus pais e avós? Estarão globalmente melhor em termos sociais do que as gerações anteriores? Ou manterão um quadro de vida semelhante?

45A terceira e última das novíssimas dinâmicas sociodemográficas que quero destacar é a da emigração de imigrantes africanos e seus descendentes, que para alguns será reemigração, para outros destinos dentro da União Europeia.

46Nesse mesmo estudo sobre jovens descendentes de imigrantes dos PALOP, perguntou-se-lhes se tinham familiares noutros países europeus. Não foi sem surpresa que se verificou que 73% disseram que sim (Quadro 7). Muitos países são referidos, com destaque para França (mencionada por 34% dos inquiridos), Inglaterra (19%), Holanda (15%) e Espanha (10%). Os jovens de origem caboverdiana têm mais frequentemente familiares noutros países europeus do que quaisquer outros: 87% responderam afirmativamente à questão. O que estes números mostram é que os imigrantes dos PALOP e os seus filhos dispõem de um conjunto muito alargado de redes sociais espalhadas por todo o espaço europeu ocidental, que representam um recurso mobilizável em qualquer momento. E, portanto, a análise das estratégias migratórias destas famílias não pode fazer-se apenas por referência a dois espaços – países de origem e Portugal –, mas deve ter necessariamente em conta um espaço terceiro, que é o dos outros países da União Europeia.

47E não restam dúvidas de que esse recurso é utilizado. Entre os jovens entrevistados no estudo, 8% já tinham vivido noutro país, que não Portugal e o país de origem da família, valor que sobe para 19% se considerarmos apenas os jovens dos 25 aos 29 anos. Viveram justamente nos países onde mais têm familiares, por períodos que na maioria das vezes são relativamente curtos, entre os seis meses e os dois anos. Em suma, a novidade é que os imigrantes dos PALOP e os seus descendentes se europeizaram, no que respeita aos seus movimentos geográficos reais ou virtuais. Quem já viveu fora, pode voltar a fazê-lo, quem não o fez pode tentá-lo.

Quadro 7. Familiares de imigrantes dos PALOP a residirem noutros países europeus e principais países de residência

Tem familiares que residem noutros países europeus

72,6

Não tem

27,4

Total

100,0

Principais países de residência

França

33,9

Inglaterra

19,4

Holanda

15,3

Espanha

10,0

Itália

7,1

Luxemburgo

6,4

Alemanha

4,6

Bélgica

3,9

Fonte: Projecto JODIA, CIES-ISCTE, 2004, n=1000.

48Para finalizar este balanço sociodemográfico, a referência a outra característica da imigração dos PALOP, que, ao contrário das que acabámos de destacar, não é novidade, antes permanece igual desde a primeira hora. Há quarenta anos era uma imigração lisboeta e continua a sê-lo hoje. Ao fim de quatro décadas os imigrantes dos PALOP conservaram, no essencial, os seus territórios de fixação.

49Em meados dos anos 80 do século passado, mais exactamente em 1986, 85% desses imigrantes vivam na região de Lisboa (NUT II). Em 2007, a percentagem homóloga é de 83%. Não se trata de um dado totalmente surpreendente. É sabido que a região lisboeta é a que exerce maior atracção sobre todas as migrações laborais. Se considerarmos o total de estrangeiros residentes em Portugal, vemos que a maioria, 55%, está nessa região. Mas a diferença de trinta pontos percentuais nos graus de concentração é grande. Se outras zonas do país se tornaram entretanto mais atractivas e absorveram parte das migrações mais recentes, como a dos brasileiros ou a dos ucranianos, a imigração africana fixou-se quase inamovivelmente na zona da capital.

50Para isso contribuem as modalidades de inserção no mercado de trabalho da população africana, com uma presença muito forte no sector da construção civil, do lado masculino, e nos serviços e restauração, do lado feminino, sectores com oferta duradoura de emprego na região da capital, as modalidades de acesso à habitação, que começaram pela ocupação de bairros de barracas no concelho de Lisboa e concelhos limítrofes, a que se seguiram processos de realojamento sensivelmente nas mesmas zonas; e o funcionamento das redes familiares de acolhimento dos imigrantes que foram chegando e levaram à sua permanência dentro da mesma área geográfica.

Dinâmicas socioprofissionais: que promoção social?

51Outro domínio que um balanço sobre a imigração africana não pode ignorar é o da composição socioprofissional dos imigrantes e suas transformações no curso do ciclo migratório. A principal questão que se pode colocar a este propósito é a da mobilidade social dos imigrantes e seus descendentes.

52Ao fim de quatro décadas de imigração, quando uma parte considerável dos imigrantes já vive em Portugal há quinze ou vinte anos, e outros há mais tempo ainda, será que a sua situação social melhorou? Os que vieram para trabalhar progrediram em termos socioprofissionais ou mantiveram a condição social que tinham nos primeiros anos? E os descendentes de imigrantes? Como se posicionam relativamente aos seus pais e à sociedade portuguesa em geral?

53Estas são das perguntas mais pertinentes que se podem fazer hoje sobre a imigração dos PALOP, dado que já passou tempo suficiente para avaliarmos se essa promoção social ocorreu. E são perguntas pertinentes para os próprios imigrantes africanos, portadores, como qualquer imigrante laboral, de expectativas de melhoria das suas condições de vida. Se este é o tempo certo para perguntar, não há, infelizmente, dados abrangentes e sistemáticos onde procurar respostas cabais. Nem as fontes estatísticas oficiais portuguesas incluem elementos sobre mobilidade social, seja de imigrantes seja de autóctones, nem os investigadores das ciências sociais se têm dedicado suficientemente a este tema.

54Os elementos de pesquisa empírica que a seguir se apresentam constituem tentativas parcelares de responder a estas questões. Têm a vantagem de terem sido produzidos através de metodologias extensivas de inquérito por questionário a amostras representativas de imigrantes africanos; mas têm a desvantagem de não abrangerem sempre todas as populações em causa e de só conterem um conjunto restrito de indicadores.

  • 10 Tratou-se do projecto europeu LIMITS (Immigrants and Ethnic Minorities in European Cities: Life-Cou (...)

55São dados que resultam de duas pesquisas sociológicas desenvolvidas entre 2002 e 2005. A primeira procurava caracterizar as trajectórias socioprofissionais de 300 imigrantes caboverdianos com um mínimo 35 anos de idade e quinze anos de residência, pelo menos, em Portugal10. A segunda é a já referida pesquisa sobre jovens descendentes de imigrantes africanos, entre os 15 e os 29 anos de idade, que inquiriu 1000 desses jovens sobre diversos tópicos, incluindo a composição social das suas famílias e as suas próprias trajectórias escolares e profissionais. Esta pesquisa tem a vantagem de ter inquirido jovens de famílias oriundas de todos os cinco PALOP.

  • 11 A análise aprofundada destes e de outros dados dessa pesquisa pode ver-se em Machado e Abranches (2 (...)

56No Quadro 8 podemos ver quais eram as condições perante o trabalho e as categorias socioprofissionais dos imigrantes caboverdianos em três momentos de referência: um ano após a chegada a Portugal, no ano de aplicação do inquérito, 2004, e no ponto intermédio correspondente ao meio percurso11.

Quadro 8. Trajectórias socioprofissionais de imigrantes caboverdianos em Portugal

Um ano após a chegada

No ano

de meio percurso

Em 2004

Condições perante o trabalho

Trabalhador com contrato

38,9 (51,6)

59,2 (66,0)

41,4 (61,3)

Trabalhador precário (sem contrato)

28,5 (37,8)

18,2 (20,2)

14,2 (21,1)

Trabalhador a tempo parcial

6,6 (8,8)

6,2 (6,9)

4,1 (6,0)

Trabalhador por conta própria

1,0 (1,4)

2,7 (3,1)

4,1 (6,0)

Patrão

0,3 (0,5)

3,4 (3,8)

3,7 (5,5)

Desempregado

1,0

7,1

Inactivos

24,6

9,2

25,4

Total

100,0

100,0

100,0

(n=288)

(n=292)

(n=295)

Categorias socioprofissionais

Quadros superiores, prof. intelectuais

2,3

7,6

12,6

e científicas, prof. intermédias

Pessoal administrativo

1,4

3,4

3,5

Pessoal dos serviços e vendedores

12,9

20,6

19,1

Empregadas de limpeza

8,8

12,2

15,1

Empregadas domésticas

25,8

16,8

14,6

Agricultores e pescadores

1,4

1,1

0,5

Operários

7,4

8,0

3,0

Trabalhadores da construção civil

40,1

30,2

31,7

Total

100,0

100,0

100,0

(n=217)

(n=262)

(n=199)

Fonte: Projecto LIMITS, CIES-ISCTE, 2004 N=300. As percentagens entre parênteses, no primeiro bloco do quadro, foram calculadas apenas sobre o total dos activos com profissão.

57Quanto à condição perante o trabalho, e falando dos economicamente activos, destaca-se pela positiva a redução sensível da percentagem de trabalhadores precários, sem contrato, que cai de 29% para 14% entre o ano inicial e a data do inquérito. Se os caboverdianos permanecem numa situação generalizada de assalariamento – apenas 4% se tornaram patrões – a natureza do assalariamento muda, torna-se mais formalizada, o que não terá deixado de se reflectir positivamente na condição social dos envolvidos.

58O reverso da medalha é que, após um tempo de estadia longo – recorde-se que os inquiridos tinham, no mínimo, 15 anos de residência em Portugal, e alguns bastante mais do que isso –, um em cada cinco caboverdianos com profissãocontinuavaemregimedeprecariedadelaboral.Também a percentagem de desempregados regista uma evolução negativa. Se nos dois primeiros momentos essa percentagem era insignificante ou nula, em 2004 era de 7,1%, mostrando que a conjuntura de desemprego elevado dos últimos anos não poupa os imigrantes caboverdianos, muito dependentes do trabalho por conta de outrem.

59Os profissionalmente inactivos, por seu lado, têm uma evolução em «V»: eram mais no momento inicial, caem muito no ponto intermédio e voltam a subir no momento mais recente. Mas conhecem uma importante recomposição interna. No primeiro momento de referência havia muitos estudantes, que depois se inseriram no mercado de trabalho, ao passo que no terceiro momento a subida dos inactivos se deve em boa parte ao aumento da percentagem de reformados, os tais imigrantes idosos de que falámos atrás.

60No que se refere à distribuição dos inquiridos por categorias socioprofissionais, também ocorreram mudanças importantes.

61Mas, antes de as mencionar, importa chamar a atenção para o facto de nos depararmos nos três momentos de referência com distribuições de categorias profissionais que configuram estratificações sociais completas. Temos, assim, desde os quadros dirigentes, profissões intelectuais e científicas e profissões intermédias, até aos operários industriais e dos transportes e aos trabalhadores da construção civil, passando pelo pessoal administrativo, pessoal dos serviços e vendedores – do qual foram autonomizadas, por razões analíticas, as empregadas de limpeza e as empregadas domésticas –, e agricultores e pescadores. O que mostra que, longe de serem socialmente homogéneas, as populações dos PALOP têm a sua própria estratificação interna, desde a primeira hora.

62Uma das alterações mais importantes foi o recuo da proporção de trabalhadores da construção civil entre o início da estadia e o ano de meio percurso (de 40% para 30%). Daí para cá, a situação manteve-se idêntica, tendo até havido um crescimento ligeiro do número relativo de inquiridos nessa categoria. Não só esse continua a ser, portanto, ao fim de muitos anos de residência em Portugal, o grupo profissional quantitativamente mais expressivo, como parecem entretanto ter-se esgotado as oportunidades de transição para outros segmentos do mercado de trabalho.

63Outro movimento importante foi a redução gradual da percentagem de empregadas domésticas em paralelo com o crescimento também gradual do número de empregadas de limpeza em empresas da especialidade. Trata-se de fluxos protagonizados, no essencial, pelas mesmas pessoas. Não constituindo obviamente um exemplo de mobilidade social ascendente, não deixa de ser uma alteração digna de nota, na medida em que representa para estas imigrantes a passagem para situações laborais formalizadas e, por isso, mais vantajosas. Na mesma linha, pode interpretar-se o aumento até meio do percurso, e posterior estabilização, do pessoal dos serviços e vendedores, em parte alimentado também por ex-empregadas domésticas.

64Finalmente, destaque-se o crescimento progressivo da percentagem de quadros dirigentes, profissões intelectuais e científicas e profissões intermédias até um valor de 13% em 2004. São quase todos indivíduos que atingiram níveis de escolaridade elevados já em Portugal, mas que no início do seu trajecto no país desempenharam transitoriamente profissões pouco qualificadas.

  • 12 Sobre as modalidades de inserção dos imigrantes nos mercados de trabalho dos países receptores ver (...)

65Em síntese, pode dizer-se que, à excepção dessa pequena minoria de estatuto social médio e alto, inserida no mercado de trabalho das profissões qualificadas, garantidas e bem remuneradas, as alterações verificadas no perfil profissional dos caboverdianos, apesar de positivas, mas não os afastaram do chamado «mercado de trabalho secundário», menos qualificado, menos garantido, mais mal pago e com menos oportunidades de mobilidade social12. É verdade que, ao longo dos anos, houve um número razoável de imigrantes que se libertaram de situações de total precariedade, sem contrato de trabalho, e encontraram outras mais estáveis e formalizadas. Mas esses não são movimentos para fora do mercado secundário de trabalho. São apenas movimentos da periferia desse mercado para as suas zonas mais centrais.

66E quanto aos descendentes de imigrantes? Que padrões de mobilidade social intergeracional podem observar-se? Como ficam os filhos em relação aos pais, em termos escolares e socioprofissionais?

67Como se pode ver no Quadro 9, enquanto perto de 80% dos pais e das mães não passaram do básico, tendo a maioria deles ficado mesmo pelo que é hoje o 1.º ou o 2.º ciclo desse nível de ensino, 48% dos jovens atingiram o secundário e 18% o superior, sendo que metade dos inquiridos ainda estudava no momento do inquérito.

68Para além da diferença nos montantes de recursos escolares em si, estes números revelam descontinuidade de experiência entre gerações. Enquanto os filhos, tal como os jovens em geral, vivem duradouramente uma condição social de estudante, para a maioria dos pais ter sido estudante representou um momento relativamente fugaz da sua vida, esgotado ainda na infância ou, quando muito, na pré-adolescência. Do ponto de vista da socialização, e das aspirações, expectativas e projectos por ela geradas, faz toda a diferença.

Quadro 9. Nível de escolaridade atingido pelos filhos de imigrantes africanos e pelos seus pais e mães

Filhos

Pais

Mães

Não sabe ler nem escrever

3,0

6,3

Ensino básico

33,5

72,7

73,4

Ensino secundário

48,1

11,4

10,2

Ensino superior

18,3

13,0

10,1

Total

100,0

100,0

100,0

Fonte: Projecto JODIA, CIES-ISCTE, 2004, n = 1000.

  • 13 Sobre este assunto ver Fernando Luís Machado e outros (2003). António Firmino da Costa, Rosário Mau (...)

69Veja-se também que a percentagem de jovens que atingiu o ensino superior é maior do que a dos pais e mães que chegaram a esse mesmo patamar, pais e mães estes que são os imigrantes de classe média e alta a que aludimos atrás. Entre os jovens que chegaram ao superior estão muitos dos filhos destes pais e mães, em concreto. Mas não só eles. Há outros jovens, oriundos de famílias com pequenos capitais económicos e culturais, que chegam ao ensino superior percorrendo trajectos de mobilidade escolar de longo alcance semelhantes aos de muitos outros estudantes universitários em Portugal13.

  • 14 A comparação referida encontra-se em Machado, Matias e Leal (2005) e Machado (2007).

70Uma avaliação mais completa da situação escolar dos descendentes de imigrantes africanos implica que os comparemos também com os jovens em geral. Tendo essa comparação sido feita minuciosamente noutro lugar, basta dizer aqui que os perfis escolares de uns e outros não são muito diferentes14. O nível de ensino mais habitualmente completado é o 3.º ciclo do básico e as percentagens dos que terminaram o secundário são semelhantes. Só nos extremos da distribuição há diferenças sensíveis, mas, como têm sentido contrário, acabam por se anular. Os filhos de imigrantes africanos completam menos o ensino superior, mas também são menos os que se ficaram pelo 1.º ciclo do básico ou não chegaram sequer a completá-lo.

  • 15 Para esta comparação e outras análises sobre a escolaridade dos portugueses ver Almeida e Vieira (2 (...)

71Os descendentes de imigrantes africanos não estão, portanto, especialmente pior do que os jovens portugueses. E isso seria uma boa notícia se os jovens portugueses estivessem bem, no que à escolaridade diz respeito. Mas não estão. O seu nível médio de escolaridade fica claramente abaixo do registado em qualquer outro país da União Europeia. Em suma, os jovens filhos de imigrantes africanos e os jovens autóctones aparecem irmanados na distância a um padrão europeu de qualificações escolares bem mais elevado do que o português15.

72E no que respeita à composição socioprofissional?

  • 16 Uma análise aprofundada da situação e trajectos dos filhos de imigrantes africanos em Portugal pode (...)

73Analisando as categorias profissionais dos 34% de jovens que, no momento do inquérito, exerciam profissão e comparando essas categorias, por sexos, com as ocupadas, no mesmo momento, pelos respectivos pais e mães, vê-se que eles têm um perfil bastante diferente do dos progenitores (Quadro 10). Numa leitura agregada, podemos dizer que os descendentes de imigrantes têm um perfil terciário de execução, ao passo que o da geração anterior é um perfil proletário, no sentido mais literal (construção civil) ou mais abrangente (também limpezas e similares) do termo16.

Quadro 10. Categoria profissional dos filhos de imigrantes africanos, segundo o sexo, e dos seus pais e mães

Jovens do sexo masculino

Pais

Jovens do sexo feminino

Mães

Directores e quadros dirigentes

0,5

5,6

-

1,5

Profissões intelectuais e científicas

2,0

6,4

3,6

6,9

Técnicos e profissionais intermédios

8,1

3,1

4,1

2,0

Pessoal administrativo

10,1

2,7

23,6

7,6

Pessoal dos serviços e vendedores

14,5

3,8

55,6

25,6

Trab. não qualificados dos serviços

10,6

6,1

10,1

49,0

Trab. industriais e dos transportes

12,9

18,3

3,0

5,7

Trab. da construção civil

20,7

48,8

Trab. não qualificados da construção civil

19,8

1,3

Outras profissões

0,8

3,9

1,8

Total

100,0

100,0

100,0

100,0

Fonte: Projecto JODIA, CIES-ISCTE, 2004, n = 393 (jovens), n = 951 (pais), n = 895 (mães).

74Nas duas categorias profissionais que compõem o terciário de execução, requerendo algumas qualificações – «pessoal administrativo» e «pessoal dos serviços e vendedores» –, encontramos 79% das filhas de imigrantes contra 33% das mães e 25% dos filhos contra 7% dos pais. Os filhos são mais do que os pais também nos serviços não qualificados (11% contra 6%).

75Filhos e filhas de imigrantes têm, contudo, localizações profissionais diferentes entre si, que tornam as filhas mais diferentes das mães do que os filhos dos pais. Com efeito, 41% dos rapazes têm actividades ligadas à construção civil, menos do que os pais (50%), mas em desvantagem face a eles, já que muitas são actividades desqualificadas dentro do sector, algo que só residualmente os pais fazem.

76O retrato-robô profissional dos imigrantes dos PALOP que diz «homens constroem, mulheres limpam» não se aplica aos seus filhos e filhas. Mas, pelo que os dados mostram, aplica-se ainda menos às filhas.

77Dois factores contribuem para que a diferença de género seja tão marcante: um prende-se com a composição e o funcionamento do mercado de trabalho terciário, ao nível dos empregos administrativos, do comércio e dos serviços, mais propenso a contratar mulheres do que homens; outro é o facto de as filhas de imigrantes serem mais escolarizadas do que os seus pares masculinos, tal como acontece, de resto, com as jovens em geral, o que parece permitir-lhes escapar mais facilmente aos empregos mais desqualificados.

78Para terminar a análise do Quadro 10, atente-se no que se passa no topo da hierarquia das categorias profissionais. Contando as três primeiras categorias da lista, genericamente caracterizadas pelas qualificações elevadas e pela autoridade profissional, encontramos mais pais (15%) do que filhos (11%) e mais mães (10%) do que filhas (8%). Trata-se aqui dos pais e mães pertencentes às classes média e alta. A desvantagem dos jovens justifica-se, no essencial, pelo tempo médio de chegada àquelas categorias, que é um tempo mais longo do que aquele que eles têm, tanto em idade como em trajecto profissional.

79O Quadro 10 dá-nos apenas uma imagem fotográfica das localizações profissionais de pais e filhos no momento do inquérito. Mas importa também analisar os trajectos percorridos pelos jovens desde a entrada no mercado de trabalho, para saber se houve alterações significativas de posição nos poucos anos que levam de vida economicamente activa.

80No Quadro 11 comparam-se as distribuições dos inquiridos por categorias profissionais em dois momentos: o do inquérito e o relativo à primeira profissão.

Quadro 11. Primeira profissão e profissão em 2004 dos filhos de imigrantes africanos, segundo o sexo

Primeira profissão

Profissão no momento do inquérito

H

M

Total

H

M

Total

Directores e quadros dirigentes

0,5

0,3

Profissões intelectuais e científicas

1,7

1,3

1,5

2,0

3,6

2,8

Técnicos e profissionais intermédios

3,4

1,8

2,6

8,1

4,1

6,1

Pessoal administrativo

4,7

19,6

12,0

10,1

23,6

16,8

Pessoal dos serviços e vendedores

14,0

54,5

33,8

14,5

55,6

34,9

Trab. não qualificados dos serviços

9,4

20,1

14,6

10,6

10,1

10,4

Trab. industriais e dos transportes

7,7

2,2

5,0

12,9

3,0

7,9

Trabalhadores

da construção civil

3,4

1,7

20,7

10,4

Trab. não qualif. da construção civil

55,3

0,4

28,5

19,8

9,9

Outras profissões

0,4

0,2

0,8

0,5

Total

100,0

n = 235

100,0

n = 224

100,0

n = 459

100,0

n = 198

100,0

n = 195

100,0

n = 393

Fonte: Projecto JODIA, CIES-ISCTE, 2004.

81Vê-se que ocorreram mudanças importantes nesse intervalo de tempo. Concretamente, houve um movimento geral de profissões menos qualificadas para profissões mais qualificadas. Por um lado, as três categorias de topo, sem excepção, aumentaram o seu peso relativo. Por outro lado, nas categorias de perfil executante, crescem, em número, o pessoal administrativo, o pessoal dos serviços e vendedores, os trabalhadores industriais e dos transportes e os trabalhadores da construção civil e diminuem os trabalhadores não qualificados dos serviços (de 15% para 10%) e da construção (de 29% para 10%).

82Diga-se também que a mudança para localizações profissionais mais qualificadas é acompanhada por uma melhoria global das condições de trabalho, com o regime de ocupação, o tipo de contrato e o acesso aos subsídios de férias, Natal e refeição, a evoluírem de forma positiva. Os inquiridos a trabalhar a tempo inteiro passam de 47% para 83%, os que trabalham sem contrato diminuem de 46% para 13%, aumentando os contratados a título permanente de 5% para 33%, e o grau de cobertura dos três subsídios cresce substancialmente.

83Os números apresentados são inequívocos quanto à ocorrência frequente de mobilidade profissional, entre o momento de entrada no mercado de trabalho e os anos subsequentes. Para muitos, uma primeira profissão desqualificada é meramente transitória, conseguindo melhorar a sua situação em pouco tempo. Não se trata, é claro, de mobilidade social ascendente no sentido forte da palavra. Mas a transposição da fronteira entre trabalho não qualificado e trabalho com alguma qualificação, entre condições mais perto da precariedade e condições mais perto da estabilidade, não é, tão-pouco, um facto sem importância.

84O balanço das dinâmicas socioprofissionais das populações de imigrantes dos PALOP não ficaria completo sem uma referência às situações de pobreza e risco de exclusão social que afectam estas populações.

  • 17 Sobre este tema ver Capucha (2005).

85Em Portugal, entre a população considerada pobre à luz de critérios internacionalmente aceites, contam-se muitos imigrantes africanos e seus descendentes. A chamada linha de pobreza relativa diz que, em 2006, 18% da população residente era pobre. A maioria desses mais de 1,8 milhões de pessoas não é formada por imigrantes. Estes são, pelo contrário, uma minoria entre os pobres. Mas a incidência da pobreza nos imigrantes, em particular os oriundos dos PALOP, é forte, o que faz deles uma das categorias sempre identificadas nos estudos sobre a matéria17.

  • 18 Cf. Estatísticas da Segurança Social, 2005.

86Em 2005, último ano para o qual estão disponíveis dados desagregados por nacionalidade, os imigrantes dos PALOP beneficiários do Rendimento Social de Inserção eram 1900, correspondentes a 1,3% do total de beneficiários, valor sensivelmente igual ao peso dos imigrantes dos PALOP no conjunto da população portuguesa, na mesma data18.

  • 19 Cf. Estatísticas de 2008, Direcção-Geral dos Serviços Prisionais.
  • 20 Ver Seabra e Santos (2006).

87Outro indicador que se pode convocar, porque ilustra igualmente dinâmicas sociais negativas e défices de integração social, é o da população prisional. No primeiro trimestre de 2008, os cidadãos dos PALOP detidos em cadeias portuguesas eram 1166 e representavam 10,4% do total de reclusos, estando portanto fortemente sobre-representados por comparação com o peso percentual dos imigrantes desses países em Portugal19. Os estudos sobre o tema relativizam, no entanto, estes números, chamando pertinentemente a atenção para o perfil das populações imigrantes, predominantemente constituídas por jovens adultos, de sexo masculino e de condição social desfavorecida, todas elas características que aumentam a probabilidade de entrada no sistema prisional. Dito de outro modo, se se comparasse estrangeiros, dos PALOP ou outros, e portugueses, para perfis sociodemográficos e socioprofissionais iguais, as diferenças nas taxas de encarceramento desapareceriam20.

88A evolução destes e de outros indicadores de pobreza e de exclusão social vai depender das dinâmicas socioprofissionais mais gerais que analisámos antes, em particular dos padrões de mobilidade social.

89Vimos, a partir do exemplo caboverdiano, que os imigrantes de primeira geração conhecem alguma melhoria de condição socioprofissional ao longo das suas trajectórias laborais. A essa melhoria podemos juntar os benefícios, ao nível das condições de habitação, trazidos pelos processos de realojamento que abrangeram muitos desses imigrantes. Mas não houve propriamente um processo alargado de mobilidade social ascendente, que tenha posto os imigrantes dos PALOP ao abrigo de riscos sociais. Vimos, por outro lado, que está a emergir um segmento de imigrantes idosos, parte dos quais, por via de salários baixos ou de trajectórias contributivas irregulares, ou pela acumulação das duas coisas, virá a ter pensões de reforma magras, ficando, portanto, do ponto de vista dos rendimentos, e por via dos mesmos processos, na situação social vulnerável de muitos idosos autóctones.

90Mas é na geração dos descendentes desses primoimigrantes que a questão da integração social se joga mais. Quanto a isso, encontrámos atrás alguns resultados promissores. Se se confirmarem, nos próximos dez a quinze anos, as vantagens que esses jovens têm hoje relativamente aos seus pais e mães, o saldo de integração social será positivo.

Dinâmicas socioculturais e identitárias: aportuguesamento dos imigrantes dos PALOP?

  • 21 Sigo aqui de perto o modelo de análise da etnicidade apresentado em Machado (2002).

91Estarão os imigrantes dos PALOP a aportuguesarem-se, ao fim de quarenta anos de imigração? Dito de outra forma, teoricamente mais sustentada: estarão os imigrantes africanos a tornar-se etnicamente menos diferenciados dos portugueses em geral? Se pensarmos a etnicidade como um processo social e cultural, feito de contrastes e de continuidades, estarão hoje os imigrantes dos PALOP mais contrastantes ou mais contínuos relativamente à população portuguesa?21

92O prolongamento do tempo de residência das populações imigrantes não significa necessariamente diluição de contrastes étnicos. Esses contrastes podem permanecer ou até acentuar-se. Historicamente, podemos encontrar nos países grandes receptores de imigrantes exemplos de todos os tipos. Como será com os imigrantes africanos em Portugal?

93Pensemos numa dimensão social da etnicidade tão decisiva como é a composição de classe. O que vimos no ponto anterior significa que os contrastes sociais entre os imigrantes dos PALOP e os portugueses em geral não aumentaram ao longo dos anos. Pelo contrário, diminuíram, em especial nos descendentes de imigrantes, que, do ponto de vista da composição socioprofissional, estão mais próximos dos jovens em geral do que os seus pais e mães dos portugueses da sua idade.

94E do lado das dimensões culturais da etnicidade, como sejam a língua ou a orientação das sociabilidades, esta última particularmente importante nos processos de integração social?

95Seria preciso conhecer melhor as práticas linguísticas dos imigrantes dos PALOP. Se sabemos que os primoimigrantes de origem caboverdiana e guineense falam correntemente os respectivos crioulos no dia-a-dia – o que não impede que também falem competentemente o português –, como será o regime linguístico dos seus filhos? Os descendentes de caboverdianos e de guineenses estão a guardar a língua materna dos seus pais ou o uso do crioulo está em perda?

96Ainda que sejam dados fotográficos, que captam a realidade num certo momento no tempo e não em fluxo, o Quadro 12 revela que os filhos de caboverdianos e de guineenses dominam e utilizam correntemente o crioulo. Seja em casa seja com os amigos – e é de sublinhar a semelhança dos resultados para os dois contextos –, o crioulo é falado com frequência. São minoritários os que dizem falá-lo pouco ou não o falar (21% dos filhos de caboverdianos e 34% dos filhos de guineenses).

97Isso não significa, no entanto, que não falem regularmente português. As modalidades de resposta que correspondem às utilizações exclusiva e dominante do português somam 40% para os descendentes de caboverdianos, seja no contexto doméstico seja no contacto com os amigos, e 44% para os descendentes de guineenses, nesses dois círculos. A utilização exclusiva ou dominante do português regista até percentagens mais elevadas do que a utilização exclusiva ou dominante do crioulo, em particular do lado dos jovens de origem guineense. Neste ponto eles distanciar-se-ão dos seus pais e mães, para quem a utilização exclusiva ou dominante do crioulo, nesses dois contextos específicos, será mais comum.

98Vale a pena dizer também que os regimes linguísticos dos jovens não são independentes dos seus perfis sociais. Assim, os rapazes fazem uma auto-avaliação do domínio do crioulo mais favorável do que a das raparigas; uns e outras utilizam o crioulo em casa em igual medida, mas as raparigas usam bastante mais o português do que os rapazes quando estão com os amigos; e verifica-se que o uso do crioulo decresce consideravelmente à medida que aumenta o nível de escolaridade. Este último dado é particularmente importante porque sugere a existência de uma correlação entre prática linguística e posição social, aqui medida indirectamente pelo nível de escolaridade, mas que se confirma directamente através do indicador de classe: os jovens de classes populares usam comparativamente mais o crioulo e os de classe média e alta comparativamente mais o português.

Quadro 12. Práticas linguísticas dos descendentes de imigrantes africanos

Quadro 12. Práticas linguísticas dos descendentes de imigrantes africanos

Fonte: Projecto JODIA, CIES-ISCTE, 2004.

99Do lado das sociabilidades, um indicador estratégico que podemos confrontar com a tese do aportuguesamento é o dos casamentos mistos (Quadro 13). Com que frequência casam entre si imigrantes africanos e portugueses autóctones? Casam mais agora do que antes? Quantos dos casamentos celebrados por cidadãos dos PALOP são com portugueses ou portuguesas?

  • 22 Sobre este tema ver Ferreira e Ramos (2007). Ver também Fonseca (coord.) e outros (2005).

100Os números indicam que, de 1999 para cá, os casamentos mistos aumentaram. Foram 341 em 1999 e 617 em 2007, tendo havido duas pequenas quebras, uma em 2004 e outra em 200722. O número máximo foi atingido em 2006, com 654 casamentos. Desde 1999, primeiro ano em que há registo disponível de dados de casamentos com estrangeiros desagregados por nacionalidade, foram celebrados 4427 casamentos. Podemos ver também que os casamentos mistos representam uma parte muito pequena, embora crescente, do total de casamentos, que baixa de ano para ano, mas, muito mais importante do que isso, vemos que a maioria dos casamentos celebrados por imigrantes dos PALOP são com portugueses ou portuguesas. Em 1999 foram 67%, em 2007 foram 65% e em 2004 atingiu-se o valor máximo da série, 72%.

Quadro 13. Casamentos entre portugueses e imigrantes dos PALOP, 1999-2007

Quadro 13. Casamentos entre portugueses e imigrantes dos PALOP, 1999-2007

Fonte: Estatísticas Demográficas, INE.

101Significa isto que estamos a assistir a uma dinâmica alargada de casamentos mistos e, por essa via, ao aportuguesamento acelerado dos imigrantes dos PALOP? Provavelmente não. Os indicadores nem sempre indicam exactamente o que parece, e este é exemplo disso.

102O problema é que este não é verdadeiramente um indicador de casamentos mistos. Na medida em que uma parte substancial dos imigrantes dos PALOP tem nacionalidade portuguesa, e as aquisições de nacionalidade são cada vez mais, como veremos já a seguir, um casamento entre um estrangeiro e um cidadão nacional pode ser, e será muitas vezes, entre duas pessoas com a mesma origem étnica, por exemplo, um imigrante de nacionalidade caboverdiana e outro imigrante de origem caboverdiana e nacionalidade portuguesa.

103Uma parte não determinável dos casamentos entre portugueses e cidadãos dos PALOP será, portanto, deste tipo. São casamentos mistos apenas no sentido «jurídico» da palavra, mas não no sentido sociológico, já que são casamentos intra-étnicos e intra-raciais. Só a investigação directa que controle a combinação complexa de variáveis étnico-raciais e variáveis jurídicas pode permitir perceber a dimensão dos casamentos mistos no sentido inter-étnico e inter-racial.

  • 23 Note-se ainda que esses casamentos podem ser mistos e interétnicos num outro sentido, menos importa (...)

104Informações pontuais de pesquisa e a observação empírica quotidiana levam a crer que apenas uma pequena parte desses mais de 4000 casamentos são verdadeiramente mistos, isto é, contraídos entre pessoas originárias de um dos cinco PALOP, independentemente da respectiva nacionalidade, e portugueses autóctones23. Por exemplo, na pesquisa referida sobre jovens descendentes de imigrantes dos PALOP, apenas 9% disseram ter um pai ou uma mãe de origem europeia. Já dos jovens que viviam em situação conjugal aqueles que tinham um cônjuge de origem europeia eram 24%.

105Em suma, a via matrimonial de aportuguesamento dos imigrantes dos PALOP terá alguma expressão, mas não aquela que os indicadores disponíveis sugerem à primeira vista. Essa expressão será maior os descendentes de imigrantes do que nos imigrantes propriamente ditos.

106Num outro plano, podemos considerar como indicador de aportuguesamento a aquisição de nacionalidade portuguesa, seja pelo lado do imigrante que a requer, seja pelo lado do Estado que defere esse requerimento e a atribui. A aquisição de nacionalidade pode ter, e muitas vezes tem, um lado instrumental. Facilita comprovadamente a integração do imigrante no país de acolhimento, a começar pela relação com as instituições, além de aumentar as suas capacidades de mobilidade internacional, neste caso abrindo aos imigrantes dos PALOP a circulação no espaço europeu, como já vimos. Mas também tem um lado expressivo, de identificação, que favorece o sentimento de pertença ao país a cuja nacionalidade se acede.

107O que os dados mostram (Quadro 14) é que cada vez mais imigrantes dos PALOP têm requerido e obtido a nacionalidade portuguesa. Em 2000 naturalizarem-se apenas 897 imigrantes, mas em 2007 foram 5 132 e, no ano anterior, 6158. No conjunto do período em análise foi atribuída nacionalidade portuguesa a um total de 17 837 pessoas originárias desses países.

108A aquisição de nacionalidade portuguesa aumenta para imigrantes de todos os cinco PALOP, mas o volume de naturalizações é bastante diferenciado. Constituindo a imigração mais antiga e mais numerosa, os caboverdianos são quem mais se tem naturalizado. Mas o critério do volume e da antiguidade já não se aplica noutros casos. Os guineenses, menos numerosos e mais recentes do que os angolanos, ultrapassam-nos largamente na quantidade de naturalizações (5670 contra 2362). Os guineenses registam mesmo a maior «taxa de naturalização», calculada dividindo o número de aquisições de nacionalidade pelo número de imigrantes com a mesma origem nacional. A taxa é de 24%, mais de três vezes maior do que a dos angolanos, que é a mais pequena de todas (7%).

109A curva ascendente do número de concessões de cidadania portuguesa, e a subentendida curva ascendente de pedidos, impulsionadas também pela revisão em 2006 da lei da nacionalidade que a tornou menos restritiva, constituem um indicador evidente do processo de aportuguesamento em curso da imigração dos PALOP. É mais literal e inequívoco do que os indicadores anteriormente referidos. Mas apenas capta o nível mais superficial do aportuguesamento, o nível jurídico, não chegando às camadas mais profundas dos sentimentos de pertença nacional, de formação muito mais lenta e complexa.

Quadro 14. Aquisições de nacionalidade portuguesa por imigrantes dos PALOP, 2000-2007

Cabo Verde

Angola

GuinéBissau

São Tomé e Príncipe

Moçambique

Total

2000

407

131

177

81

101

897

2001

428

104

137

46

53

768

2002

470

160

197

98

60

985

2003

746

232

345

145

n.d.

1 468

2004

615

120

307

85

n.d.

1 127

2005

557

174

472

99

n.d.

1 302

2006

2 491

703

2 433

366

165

6 158

2007

2 189

738

1 602

448

155

5 132

Total

7 903

2 362

5 670

1 368

534

17 837

Taxa de

naturalização

12,4%

7,2%

23,9%

12,9%

9,5%

13,0%

Fonte: Serviços de Estrangeiros e Fronteiras.

110Não é por adquirirem a nacionalidade portuguesa que os imigrantes se passarão a sentir plenamente portugueses. O vínculo objectivo não se transforma automaticamente em vínculo subjectivo. Por outro lado, tão ou mais importante do que o sentimento de pertença dos próprios, é o sentimento dos portugueses originários relativamente a eles. Será que os vêem como portugueses ou continuam a considerá-los como «outros»? Por outras palavras, passará a haver, por via da naturalização, uma co-inclusão simbólica entre portugueses autóctones e portugueses de origem imigrante, no sentido de se referirem uns aos outros na primeira pessoa do plural? Ou continuará a prevalecer uma lógica dissociativa do «nós» e «eles»?

111Não há respostas suficientes para estas perguntas. Do lado dos sentimentos de inclusão simbólica dos portugueses de origem africana pelos portugueses autóctones não há mesmo qualquer resposta directa resultante de pesquisa científica. É um tema totalmente por explorar. Do lado das populações imigrantes, uma informação parcelar pode retirar-se do estudo sobre descendentes de imigrantes que vem sendo citado e que uso por uma última vez.

  • 24 Para o desenvolvimento deste tema ver Machado (2006).

112Um dos indicadores do inquérito procurava captar justamente os sentimentos de pertença nacional dos filhos de imigrantes dos PALOP. E à pergunta sobre se se sentem portugueses, europeus, africanos ou dos PALOP de onde as suas famílias são oriundas, os jovens responderam que se sentem mais africanos e dos PALOP do que se sentem portugueses24.

113Mas, sendo o sentimento de portugalidade genericamente mais fraco do que o de africanidade, de angolanidade ou de caboverdianidade, ele aumenta com certas características sociais dos jovens. Os jovens nascidos em Portugal sentem-se mais portugueses do que os nascidos no estrangeiro; os de nacionalidade portuguesa mais do que os de nacionalidade estrangeira, o que prova que o vínculo objectivo tem algum efeito subjectivo; e, também revelador da natureza dos processos de integração social e simbólica, os jovens com mais recursos económicos e culturais e melhores condições de vida sentem-se mais portugueses do que os restantes.

  • 25 Ver Vala (1999), Vala, Brito e Lopes (1999), Machado (2001), Cabecinhas (2002) e Marques (2007).

114Sobre a inclusão simbólica dos portugueses de origem africana pelos portugueses autóctones só de forma indirecta podemos ter alguma pista. E por isso deve tomar-se essa pista com reserva. As pesquisas sobre percepções de racismo por parte de imigrantes africanos são consistentes nos resultados25. Embora as percepções variem quanto à intensidade, inquiridos e entrevistados dizem generalizadamente haver racismo em Portugal, localizam-no numa variedade de contextos quotidianos e relatam pormenorizadamente episódios racistas de que foram vítimas. Ora, o racismo é, neste contexto de argumentação, justamente o oposto da inclusão simbólica, como a expressão «vai para a tua terra», muitas vezes ouvida, ilustra tristemente.

115A hipótese do aportuguesamento dos imigrantes dos PALOP não encontra nos dados apresentados, muito parcelares e de ordem estritamente quantitativa, uma confirmação plena. Mas eles também não a rejeitam. Até porque não têm todos o mesmo sentido. Se a aquisição da nacionalidade portuguesa pode ser lida no sentido da confirmação, a conservação de línguas específicas, como os crioulos caboverdiano e guineense, tem significado inverso. E quanto aos casamentos mistos, o indicador apresentado é de leitura insuficiente. Em todo o caso, comparando gerações, os dados sugerem que os filhos falam essas línguas menos do que os pais e estabelecem mais do que eles ligações conjugais mistas. Além de diferenciado por gerações, o aportuguesamento poderá ser segmentado, isto é, diferente consoante os perfis sociais dos imigrantes.

Notas finais

116Ao fim de quarenta anos a imigração africana dos PALOP está largamente sedentarizada. Se há cenário improvável é o do regresso em massa desses imigrantes aos países de origem. Para não falar dos seus filhos e filhas, aos quais, tendo eles nascido ou crescido em Portugal, nem sequer se aplica, em rigor, a noção de «regresso à origem». Os próprios não concebem essa ideia, sendo mais provável que projectem emigrar para outro país europeu do que para o país de origem da família.

117O que está em aberto, do ponto de vista dos fluxos migratórios, é saber como evoluirão os sistemas migratórios que ligam Portugal a cada um dos PALOP. Nuns casos não parece ter havido alterações significativas nos factores de repulsão na origem, o que leva a pensar que, intensificando-se a atracção no destino, por via do crescimento económico, os fluxos voltarão a intensificar-

118-se; noutros essas alterações ocorreram e tornam menos prováveis fluxos de saída intensos, podendo, pelo contrário, gerar até algum regresso de migrantes. Dir-se-ia que Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Cabo Verde estão na primeira situação e Angola e Moçambique na segunda.

119Ainda no plano dos fluxos, fica também a pergunta se a imigração africana para Portugal continuará a ser quase exclusivamente lusófona. Poderão as pequenas populações de senegaleses, guineenses da Guiné-Conacri ou marroquinos, todas abaixo dos 2000 indivíduos, constituir os núcleos fundadores de migrações mais amplas? No que respeita, em particular, à imigração norteafricana, sempre causa alguma expectativa e surpresa a comparação com Espanha, com muitíssimos imigrantes dessa zona aqui mesmo ao lado.

120Independentemente dos cenários que possamos desenhar quanto a novos movimentos de entrada, o que é certo é que as populações já fixadas continuarão a desdobrar-se geracionalmente, completando, digamos assim, as suas pirâmides de idades, simultaneamente no topo, com cada vez mais imigrantes idosos, e na base com muitas crianças e jovens das ditas «segunda» e também já «terceira» gerações.

121Será preciso também estudar as dinâmicas socioprofissionais dessas populações, especialmente a questão estratégica da mobilidade social. Neste aspecto há muita investigação por fazer, seja sobre a mobilidade intrageracional ou de «carreira» dos primoimigrantes, seja sobre a mobilidade intergeracional, desde já comparando descendentes de imigrantes com os seus pais e mães e, a médio prazo, envolvendo na análise também os filhos desses descendentes.

122Quanto ao processo de aportuguesamento dos imigrantes, as taxas crescentes de naturalização, por um lado, e algumas diferenças entre pais e filhos no que se refere às práticas linguísticas e ao estabelecimento de ligações conjugais mistas, por outro, sugerem que de uma geração para a outra esse processo acelera um pouco. Mas há que dizer que quarenta anos são, afinal, um tempo curto para captar processos de longa duração como são os de assimilação cultural.

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Bibliografia

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Notas

1 Na data em que este texto é publicado, passam vinte anos sobre o primeiro texto científico publicado sobre a imigração em Portugal, dedicado justamente à imigração a partir dos PALOP. Trata-se do artigo de Ana de Saint-Maurice e Rui Pena Pires, «Descolonização e migrações: os imigrantes dos PALOP em Portugal», Revista Internacional de Estudos Africanos, 10/11, 1989.

2 Em 2007, os não-PALOP eram 11 265 e representavam apenas 8% do total de imigrantes africanos. Senegaleses (1947), marroquinos (1871), e guineenses da Guiné-Conakri (1835) eram os principais grupos. Há também registo de 2083 nacionais da África do Sul, mas estes serão provavelmente indivíduos de ascendência portuguesa regressados daquele país, onde há uma numerosa população de emigrantes portugueses.

3 Entre esses estudantes contavam-se os que vieram a tornar-se líderes de movimentos de libertação das ex-colónias ou mesmo dirigentes máximos dos novos países independentes. Mencionando só alguns dos mais importantes, foi o caso de Amílcar Cabral, líder do PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde) e de Agostinho Neto, líder do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola) e primeiro presidente da República Popular de Angola. A Casa dos Estudantes do Império foi o espaço associativo e político onde secretamente esta geração de dirigentes independentistas se formou.

4 Sobre o regresso dos portugueses das ex-colónias africanas ver Rui Pena Pires, Maria José Maranhão, João Quintela, Fernando Moniz e Manuel Pisco, Os Retornados. Um Estudo Sociográfico, Lisboa, Instituto de Estudos para o Desenvolvimento, 1984.

5 Sobre esses primeiros contingentes de africanos ver Saint-Maurice e Pires (1989). Sobre os luso-africanos e suas características migratórias, sociais e culturais ver Fernando Luís Machado, «Luso-africanos em Portugal: nas margens da etnicidade», Sociologia, Problemas e Práticas, 16, 1994.

6 Machado, Abranches, Matias e Leal (2007).

7 Sobre o envelhecimento de imigrantes na Europa ver o n.º 8 de 2006 do Journal of Ethnic and Migration Studies, integralmente dedicado a esse tema.

8 O projecto intitulou-se «Jovens Descendentes de Imigrantes Africanos: Transição para a Integração ou para a Exclusão Social?» (JODIA), decorreu no CIES-ISCTE, entre 2003 e 2005, sob a responsabilidade do autor deste texto e com financiamento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia. A equipa de investigação incluía também Ana Raquel Matias e Sofia Leal.

9 Machado, Abranches, Matias e Leal (2007).

10 Tratou-se do projecto europeu LIMITS (Immigrants and Ethnic Minorities in European Cities: Life-Courses and Quality of Life in a World of Limitations), financiado pela Comissão Europeia, cuja parceria portuguesa decorreu no CIES-ISCTE, entre 2002 e 2005, sob a responsabilidade do autor deste texto e com a colaboração de Maria Abranches.

11 A análise aprofundada destes e de outros dados dessa pesquisa pode ver-se em Machado e Abranches (2005).

12 Sobre as modalidades de inserção dos imigrantes nos mercados de trabalho dos países receptores ver Portes (1999).

13 Sobre este assunto ver Fernando Luís Machado e outros (2003). António Firmino da Costa, Rosário Mauritti, Susana da Cruz Martins, José Luís Casanova e João Ferreira de Almeida, «Classes sociais e estudantes universitários: origens, oportunidades e orientações», Revista Crítica de Ciências Sociais, 66, 2003, pp. 45-80.

14 A comparação referida encontra-se em Machado, Matias e Leal (2005) e Machado (2007).

15 Para esta comparação e outras análises sobre a escolaridade dos portugueses ver Almeida e Vieira (2006).

16 Uma análise aprofundada da situação e trajectos dos filhos de imigrantes africanos em Portugal pode encontrar-se em Machado (2008).

17 Sobre este tema ver Capucha (2005).

18 Cf. Estatísticas da Segurança Social, 2005.

19 Cf. Estatísticas de 2008, Direcção-Geral dos Serviços Prisionais.

20 Ver Seabra e Santos (2006).

21 Sigo aqui de perto o modelo de análise da etnicidade apresentado em Machado (2002).

22 Sobre este tema ver Ferreira e Ramos (2007). Ver também Fonseca (coord.) e outros (2005).

23 Note-se ainda que esses casamentos podem ser mistos e interétnicos num outro sentido, menos importante neste contexto, que é o de serem celebrados entre pessoas oriundas de diferentes PALOP. Inversamente, casamentos entre cidadãos portugueses serão, em alguns casos, mistos e interétnicos, caso envolvam um português autóctone e um português originário de qualquer um dos cinco PALOP.

24 Para o desenvolvimento deste tema ver Machado (2006).

25 Ver Vala (1999), Vala, Brito e Lopes (1999), Machado (2001), Cabecinhas (2002) e Marques (2007).

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Índice das ilustrações

Título Quadro 4. Número de ordem dos imigrantes dos PALOP no conjunto dos imigrantes em Portugal (1980-2007)
Créditos Fonte: Serviço de Estrangeiros e Fronteiras; Rocha-Trindade (2001) para os anos de 1980, 1990 e 1995.
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/lerhistoria/docannexe/image/1991/img-1.png
Ficheiros image/png, 33k
Título Quadro 12. Práticas linguísticas dos descendentes de imigrantes africanos
Créditos Fonte: Projecto JODIA, CIES-ISCTE, 2004.
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Título Quadro 13. Casamentos entre portugueses e imigrantes dos PALOP, 1999-2007
Créditos Fonte: Estatísticas Demográficas, INE.
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Referência do documento impresso

Fernando Luís Machado, «Quarenta anos de imigração africana: um balanço»Ler História, 56 | 2009, 135-165.

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Fernando Luís Machado, «Quarenta anos de imigração africana: um balanço»Ler História [Online], 56 | 2009, posto online no dia 15 outubro 2016, consultado no dia 19 janeiro 2025. URL: http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/lerhistoria/1991; DOI: https://0-doi-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/10.4000/lerhistoria.1991

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Autor

Fernando Luís Machado

Departamento de Sociologia e CIES – ISCTE

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