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“O lucro entra pelo cano”: a produção de saneamento básico via parceria público-privada (PPP) como estratégia de captação de renda na produção do espaço urbano de Serra (ES)

“La ganancia entra por el caño”: la producción de saneamiento básico a través de la Asociación Público-Privada (PPP) como es­trategia de captación de renta en la producción del espacio urba­no de Serra (ES)
“Profit enters through the pipe”: the production of basic sanitation through Public-Private Partnership (PPP) as a strategy for raising income in the production of the urban space of Serra (ES)
Vanderson Moreira Silva Alves e Carlos Teixeira de Campos Júnior

Resumos

O artigo discute a produção do espaço urbano, considerando a produção de infraestruturas de esgotamento sanitário na forma de Parceria Público-Privada (PPP). Busca-se compreender as estratégias de apropriação de renda sob esta nova forma de se produzir o espaço da cidade. A análise recai sobre o período atual do capitalismo, marcado pela financeirização da economia, conforme Chesnais (2005). O objetivo é discutir os mecanismos de apropriação de renda por meio da construção de infraestrutura para o saneamento básico via Parceria Público-Privada e as transformações socioespaciais que decorrem desta forma de se produzir o espaço urbano do município de Serra (ES).

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Notas da redacção

Artigo recebido em: 15/04/2018
Artigo publicado em: 28/11/2018

Texto integral

Introdução

  • 1 Entende-se por saneamen­to básico todo o conjunto dos serviços públicos de manejo de resíduos sólid (...)

1Por décadas, o saneamento básico1 foi considerado o ramo mais “atrasado” do setor de in­fraestruturas no Brasil. A falta de investimentos públicos, a escassez de recursos, o desin­teresse político para o planeja­mento e execução de obras e a ausência de uma base jurídica e institucional capaz de assegu­rar a lucratividade do setor pri­vado, dentre outros fatores, se apresentaram como principais motivos para o relativo “atraso” na produção e provisão do sane­amento básico, não só no Brasil, como também na grande maio­ria dos países periféricos.

2No período atual, em que predomina a financeirização da economia, Chesnais (2005) argumenta que o capital porta­dor de juros, ou simplesmente a “finança”, assume a centrali­dade das relações econômicas e sociais. Conforme Almeida Fi­lho e Paulani (2011), a centrali­dade assumida pela finança tem como principal consequência o fato de que “a exterioridade que caracteriza esse tipo de ca­pital vai ser inserida no seio da própria acumulação produtiva” (ALMEIDA FILHO; PAULA­NI, 2011).

3É na perspectiva apontada por Chesnais (2005) que busca­mos discutir as recentes trans­formações do setor de infraes­trutura no contexto brasileiro, em relação ao saneamento bá­sico, mais especificamente so­bre o esgotamento sanitário. As contribuições de Prado (2005) e Harvey (2008) sobre o papel do Estado no contexto neoliberal também serviram como referên­cia para este artigo.

4O remodelamento do Progra­ma de Parcerias e Investimentos (PPI), na gestão do presidente Michel Temer, veio reforçar as políticas neoliberais, priori­zando a formação de Parcerias Público-Privadas (PPP) e priva­tização das empresas públicas de saneamento básico. Michel Temer, do partido Movimento Democrático Brasileiro (MDB), assumiu definitivamente a Pre­sidência da República em 31 de agosto de 2016, após o Senado Federal aprovar o processo de impeachment e afastar do cargo a presidente Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores (PT).

5Desde que assumiu a presi­dência do país, Michel Temer tem acelerado a efetivação na prática da política econômica neoliberal, realizando mudan­ças substanciais em diversas áreas, como a reforma traba­lhista, a regulamentação da ter­ceirização para atividades-fim e a reforma da previdência, que ainda tramita no Congresso.

6Em relação ao Saneamento Básico, a gestão Temer contri­buiu para a rápida entrada do capital privado na produção e operação dos serviços de água e esgoto. A privatização de es­tatais e a formação de PPPs tem sido a tônica para o setor de saneamento deste governo. Aproveitando-se do arcabouço jurídico constituído em outros governos, como a Lei de PPP (2004), a Lei do Saneamento Básico (2007) e o Plano Na­cional de Saneamento Básico (2013), o Programa de Parce­rias e Investimentos, na atual gestão, colocou o saneamento básico na linha de frente para atrair o capital privado.

7Por se tratar de um setor onde se desenvolvem diversos servi­ços, o presente artigo abordará o esgotamento sanitário, mais especificamente o processo de produção da infraestrutura desse serviço. O objetivo é ana­lisar e discutir os mecanismos de apropriação de renda através da produção, operação e ma­nutenção dos equipamentos de esgoto na forma de Parceria Pú­blico-Privada.

8Conforme Prado (2005a), quase não há bens inerentemen­te públicos ou bens que não pos­sam ser privatizados por meio de legislação consequente de decisões políticas. Consideran­do que o período atual é marca­do pelo surgimento da empresa totalmente rentista, onde, mes­mo havendo geração de valor e de mais-valia, a finalidade prin­cipal é a captação de renda, o setor de infraestruturas tem se mostrado como setor estratégi­co para ação dessas empresas. Desta forma, por que a produ­ção de infraestruturas tornou-se interessante para essas empre­sas de caráter rentista? Quais os mecanismos de apropriação de renda que emergem através do setor de infraestrutura?

A Parceria Público-Privada (PPP) enquanto estratégia de acumulação e reprodução do capital

9Parceria Público-Privada se refere ao contrato de concessão sob os serviços ou obras públi­cas, podendo ocorrer sob duas modalidades: patrocinada ou administrativa.

10A concessão patrocinada é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas em que a remuneração do parceiro priva­do se dá por meio da tarifa paga pelo usuário, mais a contrapres­tação pecuniária do poder públi­co.

11A concessão administrativa é o contrato de prestação de ser­viços em que a Administração Pública é a usuária direta ou in­direta do serviço prestado pela concessionária, ainda que en­volva execução de obra ou for­necimento e instalação de bens. Na concessão administrativa, a remuneração da empresa é feita integralmente pelo poder públi­co.

12Já a concessão comum não se constitui como PPP, pois se trata da concessão de serviços públicos ou de obras públicas onde não há contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado (BRASIL, 2004).

13O modelo atual de PPP im­plantado no Brasil teve origem no Reino Unido, entre as déca­das de 1980 e 1990, como parte da política neoliberal implan­tada por Margaret Thatcher. O modelo logo foi adotado por ou­tros países da Europa, alcançan­do também os demais continen­tes. Conforme Prado (2005a), as políticas de liberalização, de desregulamentação e de priva­tização, iniciadas nos governos de Ronald Reagan e Margaret Thatcher, provocaram uma mu­dança substancial no modo de funcionamento do capitalismo contemporâneo, favorecendo o rentismo em detrimento da pro­dução industrial. Essas políticas não se restringiram somente aos países onde foram implantadas, mas mundializaram-se com o processo de globalização.

14No Brasil, a parceria entre os setores público e privado ocorre desde os anos 1990, porém, foi somente após criação da Lei nº 11.079/2004 (BRASIL, 2004), denominada “Lei de PPP”, que as grandes empresas passaram a atuar de maneira mais efe­tiva. Dentre os regulamentos promulgados pela referida lei, ficou instituído que os contratos de PPP não podem ser inferio­res ao montante de 20 milhões de reais, e devem ter duração de no mínimo 05 e no máximo 35 anos.

15São Paulo foi o primeiro estado brasileiro a contar com uma PPP. O contrato para a construção da “Linha 4 Amare­la” do metrô da capital paulista foi celebrado na forma de con­cessão patrocinada, pelo prazo de 30 anos, a um parceiro priva­do (SÃO PAULO, 2017).

16O setor de infraestrutura é o mais visado para a implanta­ção dos contratos na forma de PPP. A construção de portos, aeroportos, rodovias, ferrovias, sistemas de energia e o sanea­mento básico, serviços empre­endidos prioritariamente pelo Estado, têm despertado cada vez mais o interesse do capital privado. O grande aporte de verbas e recursos públicos des­tinados às referidas atividades e a facilidade na obtenção de cré­dito via bancos de desenvolvi­mento são alguns dos elementos que fazem da infraestrutura o setor estratégico para uma nova forma de acumulação e reprodução do capital, sobretudo o de origem financeira.

17Santana e Rodrigues Júnior (2006) argumentam que a Lei de PPP criou demasiadas facilida­des para a reprodução do capital privado nos setores onde antes não era possível sua entrada. A análise crítica de alguns dos ar­tigos da Lei nº 11.079/2004 (Lei de PPP) nos revela as estraté­gias criadas para atrair e favore­cer novos investidores na PPP.

18O artigo 7º fixa que a con­traprestação da Administração Pública deve ser precedida da disponibilização do serviço objeto do contrato da PPP. Em tese, nenhum pagamento pode­ria ser feito durante o prazo de construção da obra, porém, o §1º do mesmo artigo flexibiliza a regra, ao facultar à Adminis­tração Pública o pagamento da contraprestação relativa à par­cela fruível do serviço objeto do contrato, ou seja, admite-se o pagamento parcial mesmo antes das obras finalizadas.

19Já o artigo 16 institui o Fun­do Garantidor de Parcerias Pú­blico-Privadas (FGP), cujo ob­jetivo é garantir o ressarcimento do parceiro privado caso o po­der público não consiga honrar seus compromissos na PPP, no âmbito da União. Ressalta-se que, segundo este dispositivo, o FGP não pode ser objeto de con­tingenciamento orçamentário e nem ter seus ativos destinados ao pagamento de precatório.

20De acordo com Santana e Rodrigues Júnior (2006), a for­mação do referido fundo se dá pela participação do poder pú­blico e se limita ao teto de 06 (seis) bilhões de reais na inte­gralização de cotas. Os referidos autores chamam a atenção para o fato de que a integralização de cotas poderá ser realizada tanto em dinheiro quanto em títulos da dívida pública, bens imó­veis dominicais e bens móveis, inclusive ações de sociedades de economia mista federal ex­cedente ao necessário para ma­nutenção de seu controle pela União (conforme parágrafo 4º do art. 16).

21O artigo 27 impede que o financiamento da obra, na for­ma de PPP, seja totalmente re­alizado com recursos públicos, alegando assegurar a divisão dos riscos entre os parceiros. Porém, o mesmo artigo institui que as operações de créditos das empresas públicas ou socieda­des de economia mista contro­ladas pela União não poderão ultrapassar 70% das fontes de recursos financeiros das socie­dades de propósito específico (sociedade empresária cuja ati­vidade é restrita ao objeto da PPP). Para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, as re­feridas operações de crédito não poderão superar 80% do total dos recursos.

22Em última instância, o par­ceiro privado arcaria com ape­nas 30% dos investimentos, e, nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, somente 20% dos recursos estariam a cargo da iniciativa privada, o que põe em xeque não só a questão da divisão igualitária dos riscos, como também o discurso de es­cassez dos recursos do Estado, uma vez que a maior parcela do investimento advém do poder público, e não da esfera privada.

23Além disso, as facilidades criadas para a concessão de crédito via bancos nacionais e in­ternacionais de desenvolvimen­to, prioridade na destinação dos investimentos dos fundos de previdência complementar das empresas estatais e de econo­mia mista para as empresas par­ticipantes de PPPs, são algumas das estratégias instituídas pela legislação para atrair o capital privado.

24O artigo 5º, §2º, inciso I, per­mite aos financiadores da PPP assumirem o controle do empre­endimento quando o parceiro privado não estiver cumprindo com suas obrigações, de forma a promover a reestruturação financeira do projeto e assegu­rar a continuidade dos serviços contratados (SANTANA; RO­DRIGUES JÚNIOR, 2006). De acordo com os autores, trata-se, na verdade, de um dispositivo para garantir que os investido­res financeiros não percam o “benefício das PPPs”.

Esse dispositivo é visto pelas instituições financeiras interessadas em investir nas PPPs como instrumento importante de garantia dos direitos dos investidores, possibilitando a reestruturação de pro­jetos na iminência de fracasso por inefi­ciência da gestão do parceiro privado, a bem da verdade, substituindo-o por outra empresa e dando continuidade ao negócio (SANTANA E RODRIGUES JÚNIOR, 2006, p.161).

25Observa-se, com isso, que no caso das PPPs, o sistema de crédito possui papel fundamen­tal. Diante de toda flexibilidade proporcionada pela legislação para assegurar a remuneração do capital na PPP, a produção de infraestrutura tem sido estra­tegicamente utilizada pelas ins­tituições financeiras como um novo campo para acumulação e reprodução do capital.

26Para compreender o papel do Estado e sua relação com os sistemas de crédito e opera­ções financeiras, David Harvey, em sua obra “O novo imperia­lismo” (publicada em 2003, tradução brasileira em 2004), desenvolve o conceito da “acu­mulação por espoliação”, que, em resumo, seria a continuida­de do processo de “acumulação primitiva”, proposta por Marx. Para Harvey (2008), a acumu­lação por espoliação decorre das estratégias neoliberais de acumulação de riqueza na atual fase de organização do modo de produção capitalista.

27De acordo com Harvey (2008), a crise fiscal que pairou sobre os Estados Unidos nos anos 1970 marcou a transição para uma nova etapa do impe­rialismo capitalista. Os Estados Unidos fizeram uso da primazia de ser o país detentor da moeda internacional e emitiram dólar para além das necessidades de crescimento da economia glo­bal, o que, de acordo com Al­meida Filho e Paulani (2011), detonou pressões inflacionárias mundiais, as quais constituíram as condições necessárias para a explosão de capital “fictício”, hoje em circulação (ALMEIDA FILHO; PAULANI, 2011).

28Os Estados Unidos conse­guiram impor uma nova ordem na economia mundial, que pro­porcionou a passagem do poder e dos interesses burgueses, an­tes situados sobre as atividades produtivas, para as instituições vinculadas ao capital financeiro (ALMEIDA FILHO; PAULA­NI, 2011).

29Harvey (2008) argumenta que o Estado possui um papel decisivo para a manutenção da atividade capitalista. Isso não significa que o capitalismo não funcione sem o arcabouço do Estado, porém, sua ausência representaria aos capitalistas maiores riscos. Segundo o au­tor, a ausência de oportunidades lucrativas que garantam o fluxo contínuo de acumulação de ca­pital é um problema inerente ao capitalismo. A busca por novas oportunidades de acumulação de capital requer investimentos em infraestruturas físicas e sociais de longa duração, investimentos estes que poderiam ser realiza­dos pelo próprio capital, mas se mostram muito mais efetivos quando realizados pelo Estado.

30Conforme Harvey (2008),

o Estado usa seus poderes para dire­cionar a dinâmica regional não só por meio de seu domínio dos investimentos infraestruturais e através do seu aparato administrativo, mas mediante sua atribui­ção de formular leis e sua capacidade de impô-las. Os exemplos vão de reformas institucionais à criação de paraísos para o investimento (HARVEY, 2008, p. 78).

31Retomando o conceito da “acumulação por espoliação”, é importante frisar que o ponto cen­tral para Harvey (2008) é o exce­dente de capital. De acordo com o autor, é preciso compreender o modo com que a acumulação por espoliação ajuda a resolver o problema da sobreacumulação. A acumulação por espoliação libera um conjunto de ativos que estão disponíveis, inclusive a força de trabalho, a custos muito baixos, para que o capital sobreacumula­do possa lhes dar alguma lucra­tividade. Além disso, o sistema de crédito e o capital financeiro também são elementos que com­põem a acumulação, pois permi­tem as valorizações fraudulentas de ações, falsos esquemas de enri­quecimento, o aprisionamento de populações inteiras às dívidas es­tatais, fraudes corporativas e des­vio de fundos (HARVEY, 2008).

32Para Harvey (2008), as ca­racterísticas da acumulação por espoliação são: a privatização e a mercadificação dos ativos pú­blicos; a financialização; a ad­ministração, e; a manipulação da crise e a redistribuição via Estado. Nesse sentido, o Estado passa a ter um caráter necessá­rio, “seja porque pode dispor de seus ativos para mitigar as crises de sobreacumulação, seja por­que produz capital fictício, seja por sua atribuição de formular e impor as leis, seja, finalmente, porque detém o monopólio da violência” (ALMEIDA FILHO; PAULANI, 2011, p. 256).

33Abordamos a PPP conforme a perspectiva apresentada por Harvey (2008), uma vez que, ao tratar da privatização e da mer­cadificação, o autor chama aten­ção para o fato de que, na acu­mulação por espoliação, bens que até então eram concebidos como bens públicos passam a ser privatizados com a finalida­de de assegurar a obtenção de lucros para investidores. Con­forme Harvey (2008),

todo tipo de utilidade pública [...] foi privatizado em alguma medida por todo o mundo capitalista [...] a passagem de direitos de propriedade comum, obtidos ao longo de anos de dura luta de classes [...] ao domínio privado tem sido uma das egrégias políticas de espoliação, com frequência imposta contrariando a am­pla vontade da população. Todos esses processos equivalem à transferência de ativos do domínio público e popular aos domínios privados e de privilegio de clas­se. (HARVEY, 2008, p. 172-173).

34No que se refere ao papel do Estado, a argumentação de Har­vey (2008) nos parece bastante apropriada para compreender­mos também a criação das Par­cerias Público-Privadas. Para Harvey (2008), uma das carac­terísticas da acumulação por espoliação é a manipulação das crises e a redistribuição. A redis­tribuição via Estado é comumen­te marcada por políticas que be­neficiam a parcela mais rica da população, em detrimento dos mais pobres. Isto ocorre, pois o Estado acaba promovendo “es­quemas de privatização e cortes de gastos públicos que sustentam o salário social. Mesmo quando a privatização parece favorável às classes baixas, seus efeitos de longo prazo podem ser negati­vos” (HARVEY, 2008, p. 176).

35Quando falamos da criação de condições para a iniciativa privada no setor de saneamento, estamos falando de um Estado capitalista, em um contexto ne­oliberal, que por meio das suas ações cria mecanismos que pos­sibilitam a acumulação e a re­produção do capital. Nesse sen­tido, Harvey (2008) afirma que estamos diante de

um tipo peculiar de aparelho de Estado cuja missão fundamental foi criar condi­ções favoráveis à acumulação lucrativa do capital pelos capitalistas domésticos e estrangeiros [...]. As liberdades que en­carna refletem os interesses dos detento­res de propriedade privada, dos negócios, das corporações multinacionais e do ca­pital financeiro. (HARVEY, 2008, p. 80).

36A PPP estabelece o obscure­cimento do processo produtivo da infraestrutura. Criam a ide­ologia de que a produção dos equipamentos públicos só se faz eficientemente quando rea­lizada pelo setor privado. Forta­lecem o discurso de um Estado ineficiente e incapaz de realizar obras e serviços de boa qualida­de para a população. Insere-se, assim, a produção de infraestru­tura pública na lógica da produ­ção de mercadorias. Estipula-se um preço, um tributo que pre­cisa ser pago pelo conjunto da sociedade que deseja ter acesso ao bem público produzido via parceria privada.

37De acordo com Borja (2017, s/p), “no capitalismo avançado e financeirizado a fronteira en­tre o público e o privado fica cada vez mais tênue”, o que não significa dizer que no período da grande indústria concorren­cial e monopolista tenha sido diferente, pois tanto antes como agora o papel do Estado é ga­rantir a produção, reprodução e valorização do capital.

38Seguindo o raciocínio, San­tana e Rodrigues Júnior (2006) apontam o caráter rentista que as políticas do Estado têm assu­mido na atualidade. Conforme os autores, os governos estão

a serviço da acumulação financeirizada do capital. E esta, afinal, é a questão que está por trás de tantas outras. A principal fonte de gastos públicos vem a ser, jus­tamente, aquela voltada para atender aos juros e rendimentos demandados pelo capital financeiro. Este é o maior compro­misso do orçamento do Estado brasileiro, por exemplo, pagar credores e remunerar capital financeiro (SANTANA E RODRI­GUES JÚNIOR, 2006, p. 171).

39Neste ínterim, o saneamento básico, mais especificamente o esgotamento sanitário, tem se apresentado como nova frente de expansão do capital em bus­ca de remuneração. A criação do marco regulatório para o se­tor e os investimentos públicos anunciados para esta área foram fundamentais para despertar o interesse dos grandes grupos empresariais em busca de novas oportunidades de remuneração.

A produção rentista do espaço via provisão de saneamento básico

40Discutiremos neste subitem o papel da PPP em obras de saneamento básico, buscando compreender as estratégias ren­tistas aplicadas na produção do espaço no momento da finan­ceirização da economia.

41O que se pretende é mais do que compreender a simples dis­tribuição das atividades da so­ciedade sobre o espaço, trata-se de compreender a produção so­cial do espaço como momento da produção da vida, superando a ideia do espaço como palco da ação humana e buscando a com­preensão da dimensão social do espaço produzido por uma sociedade dividida em classes (CARLOS, 2015).

42Desta forma, “o espaço pen­sado como produção/produto da ação da sociedade está, assim, imerso na totalidade da repro­dução social. Esse movimento do pensamento permite vislum­brar o papel da produção do es­paço na reprodução da socieda­de contemporânea” (CARLOS, 2015, p.9).

43No sistema capitalista, o pró­prio espaço torna-se uma mer­cadoria, mas uma mercadoria com características distintas daquelas da produção fabril. Enquanto mercadoria, o espaço se expressa por seu valor de uso e pelo valor, que se manifesta em valor de troca. O acesso ao espaço socialmente produzido fica condicionado pela existên­cia do título de propriedade so­bre as frações do solo.

44Sobre o contexto atual do sistema capitalista, Lencioni (2015) afirma que “o domínio e a direção da reprodução do ca­pital em geral está sob o manto das finanças. Dizendo de outra maneira, é o capital financeiro quem dirige e domina o pro­cesso de reprodução em geral” (LENCIONI, 2015, p. 150).

45Nesse sentido, Carlos (2009) argumenta que o que há de mais novo nesse processo é o fato de que o “setor financeiro vai se re­alizar por meio do espaço, isto é, produzindo o espaço, uma vez que o capital tende a migrar de um setor ao outro da econo­mia, e quando isso ocorre, uma nova infraestrutura se torna ne­cessária como condição e meio para que tal processo se realize” (CARLOS, 2009, p. 305).

46O espaço torna-se alvo dos grandes grupos empresariais li­gados ao mercado financeiro. O Estado assume papel importan­te nesse processo, pois é o agen­te responsável por estabelecer os mecanismos que criarão uma nova base para a acumulação e reprodução do capital via pro­dução do espaço. Conforme Prado (2005b), quase não há bens inerentemente públicos ou bens que não possam ser priva­tizados.

47Lefebvre (1978) argumenta que “o ar, a água, a luz, a terra – os elementos – adquirem va­lor de uso desde o momento em que eles se produzem e se ven­dem, portanto adquirindo valor de troca: o ar, com o ar condi­cionado; a água com o forneci­mento por canalizações; a luz com a iluminação artificial; a terra enfim, e, sobretudo, logo que ela torna-se objeto de pro­priedade” (LEFEBVRE, 1978 apud. BAGGIO, 2002, p. 27).

48Nesse sentido, o setor do sa­neamento básico tem sido cap­turado pela lógica de mercado e servido de novo impulso para a reprodução do capital. Os ser­viços de esgotamento sanitário, que durante muito tempo fica­ram a cargo do Estado, passam agora por uma nova forma de produção. Resgatando o con­ceito das condições gerais de produção (Karl Marx), e con­siderando o saneamento bási­co como parte integrante dos meios de consumo coletivo (LOJIKINE, 1997), cabe refle­tir sobre algumas transforma­ções que chamam a atenção no período atual.

49Se antes havia certa dificul­dade em inserir os meios de consumo coletivos no setor das mercadorias, principalmente por conta do lento processo de consumo desses bens, como no caso das redes de esgotamento sanitário, levando a uma baixa rotatividade do capital produti­vo no setor de consumo e, con­sequentemente, uma baixa ren­tabilidade (LOJIKINE, 1997), no período atual observa-se a entrada maciça dos agentes privados na produção de sane­amento básico, justificada pelas altas taxas de ganho na forma de renda proporcionadas aos investidores no setor. E isso graças à política neoliberal que tem se intensificado nos últimos anos, através da qual a produção dos meios de consumo coletivo tem servido como nova frente de expansão e reprodução do capital.

50Prova disso é o fato de que legislação brasileira vem prepa­rando terreno e consolidando as bases para a entrada maciça dos agentes privados no setor. A Lei nº 11.445/2007, denominada Lei do Saneamento, e o Plano Nacional de Saneamento Bási­co – Plansab (2013), associados à Lei de PPP, já detalhada ante­riormente, consistiram nas ba­ses jurídicas e econômicas que faltavam para a entrada incisiva da iniciativa privada no ramo do saneamento básico.

51Conforme nota técnica do DIEESE (2017), com o objetivo de atrair a iniciativa privada e o capital estrangeiro, o Governo Federal admitiu a necessidade de alterações no atual modelo de regulação da economia brasilei­ra. A instituição do Programa de Parcerias e Investimentos (PPI), em novembro de 2016, se deu com o objetivo principal de “de­signar ao Estado o papel de ‘re­gulador’ e acabar com qualquer ‘entrave burocrático’, inclusive ambiental, para a transferên­cia de empresas estatais para a iniciativa privada” (DIEESE, 2017, p.2). Conforme o referido documento,

o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ficará en­carregado de formar e participar do Fun­do de Apoio à Estruturação de Parcerias (Faep), de natureza privada, cuja finali­dade será estruturar e moldar as parcerias com a iniciativa privada e programas de desestatização, atuando junto a qualquer órgão ou entidade da União, estados, Distrito Federal e municípios (DIEESE, 2017, p. 3).

52A Lei do Saneamento (2007) tornou obrigatório o investi­mento, por parte dos municípios, em redes de água tratada, coleta e tratamento de esgoto. Além disso, a referida lei tam­bém estabeleceu as bases legais para o estabelecimento dos con­tratos de concessão, asseguran­do as possibilidades de repro­dução do capital do investidor privado.

53O Plano Nacional de Sane­amento Básico (2013), por sua vez, estabeleceu a universalização dos serviços de tratamento de água e esgoto para todos os municípios brasileiros como a principal meta a ser cumprida até o ano de 2033. Desta forma, para o cumprimento da meta, o Governo Federal prevê um in­vestimento total de R$ 508 bi­lhões de reais em saneamento básico, priorizando os contra­tos via PPP e privatizações. No período entre 2014 e 2016, as verbas concedidas pela União para as obras de saneamento giraram em torno de 09 (nove) bilhões de reais por ano (BRA­SIL, 2017).

54Conforme resolução, o Con­selho do PPI resolveu opinar pela “qualificação de empreen­dimentos públicos estaduais de saneamento por meio de contra­tos de parcerias com o setor pri­vado, no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República” (BRASIL, 2016). Até 80% dos investimentos feitos pela ini­ciativa privada nessas parcerias poderão ser financiados pelo BNDES.

55Após a criação dos meca­nismos jurídicos e econômicos que passaram a reger o setor de saneamento no Brasil, ob­servou-se uma movimentação de empresas privadas buscan­do expandir seus negócios via privatização e formação de PPP para os serviços de água e esgo­tamento sanitário.

56Em entrevista concedida à grande mídia, Roberto Muniz, presidente da Associação Brasi­leira das Concessionárias Priva­das de Serviços de Água e Es­goto (Abcon), afirmou que “os governos começaram, finalmen­te, a olhar a infraestrutura como vetor de crescimento”. Em outro trecho da mesma reportagem, o presidente do Grupo Equipav, holding que controla a empresa de saneamento Aegea, afirmou que a taxa de retorno em sane­amento é de 10% a 11% ao ano, “muito mais atraente do que o retorno de projetos de ferrovias ou rodovias, por exemplo,” dis­se o entrevistado, justificando, em seguida, que a garantia da rentabilidade no setor é, ainda, a baixa cobertura desses servi­ços, representando um enorme potencial de crescimento (ISTO É, 2013).

57O maior contrato de PPP em saneamento básico foi celebra­do no ano de 2013 pelo gover­no de Pernambuco. O contrato firmado entre a Companhia Pernambucana de Saneamen­to (Compesa) e um consórcio formado pelas empresas Foz do Brasil, do Grupo Odebrecht, e Lidermac Construções prevê investimentos no montante de 4,5 bilhões de reais para univer­salizar o serviço de água e esgo­to em 15 municípios da Região Metropolitana do Recife (BRA­SIL, 2014).

58Sobre o cenário das PPPs no contexto brasileiro, dados do DIEESE (2017) dão conta de que até o mês de março de 2017 foram anunciados

mais 55 projetos do PPI, entre eles a de­sestatização de outras 14 empresas esta­duais de saneamento. [...] De acordo com a Associação Brasileira de Concessio­nárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), a iniciativa pri­vada opera os serviços de fornecimento de água e esgotamento sanitário em 316 municípios de 18 estados no Brasil. No total, são 258 contratos de prestação de serviços, distribuídos em 133 concessões plenas, 28 parciais, 15 parcerias público­-privadas (PPPs), 3 locações de ativos e 1 subdelegação de serviços. Além disso, existem outros 78 contratos de assistência técnica. A estimativa da Abcon (2016) é que, nesses contratos, os serviços pres­tados atinjam 31,11 milhões de pessoas. Segundo o Sindicato Nacional das Con­cessionárias Privadas de Serviços Públi­cos de Água e Esgoto (Sindcon), somente seis empresas concentram em torno de 95% dos negócios privados, são elas: OAS, GS Inima, Odebrecht Ambiental, Águas do Brasil, Aegea e Cab Ambiental. (DIEESE, 2017, p. 3).

59Para Moraes (2016), as PPPs consistem na forma mais predatória de relação entre os poderes público e privado. Isto porque elas funcionam nos moldes do capitalismo sem ris­cos. Conforme o autor, trata-se de uma parceria entre aspas, “porque o parceiro privado acaba usufruindo bastante dos recursos públicos, através de linhas de crédito a juros baixís­simos, apropriando-se desses recursos” (MORAES, 2016, s/p), e uma vez no exercício da operação e manutenção, ou seja, da exploração dos servi­ços públicos de água e esgoto, ele praticamente determina os espaços onde haverá a cons­trução das obras e a ampliação dos serviços. De acordo com Moraes (2016),

entre uma população de baixa renda na periferia que muitas vezes nem tem ain­da o serviço de saneamento, ou tem de maneira inadequada, e uma população de renda média, ele [o parceiro privado] prefere, óbvio, investir naqueles bairros com esse perfil de maior capacidade de pagamento, porque sabe que ali vai obter lucro sem risco nenhum. Enquanto lá na periferia ele pode não conseguir obter o retorno monetário desses recursos apli­cados (MORAES, 2016, on-line).

60As decisões políticas se ar­ticulam cada vez mais aos inte­resses dos grupos financeirizados, e isso tem repercutido na forma com que as legislações vigentes são constantemente remodeladas em favor dos re­feridos grupos. De acordo com Prado (2005b), o surgimento da empresa totalmente rentista, onde, mesmo havendo geração de valor e de mais-valia, a fi­nalidade principal é a captação de renda, define bem o período atual.

61Entende-se por renda todo título de propriedade que per­mite, por sua exclusividade, proporcionar um ganho ao seu detentor pelo simples direito de propriedade. Sobre a renda fundiária, Marx (1985-1986) esclarece que é somente o títu­lo de certo número de pessoas “sobre a propriedade do globo terrestre que lhes capacite a se apropriarem, como um tribu­to, de parte do mais-trabalho da sociedade” (MARX, 1985- 1986, p. 239). Desta forma,

O dono de terra é rentista, porque a renda fundiária que lhe é devida liga-se ao fato de ser proprietário de uma dada porção do globo terrestre (que pode ser explo­rada capitalistamente). Dono de capital monetário é rentista, porque o juro que lhe é devido liga-se ao fato de ser dono de um montante de dinheiro (que pode ser empregado como capital). (PAULA­NI, 2016, p. 518).

62O capitalismo contemporâ­neo é marcado por um fortís­simo traço rentista. Trata-se de um rentismo que agora é cons­titutivo do processo de acumu­lação, e não mais um entrave à acumulação, como outrora se apresentavam, conforme apon­tam Chesnais (2005) e Prado (2005b).

63Para Chesnais (2005), esta­mos diante de um novo capita­lismo, cuja dinâmica centra-se no capital portador de juros. A finança atual, conforme propõe o autor, é marcada pela ação do mercado secundário de títulos, o qual somente negocia os ati­vos já emitidos e possibilita a valorização fictícia da proprie­dade que já existe. Chesnais (2005) afirma que o que define o capitalismo atual é a “recons­tituição de uma massa de ca­pitais procurando se valorizar fora da produção, como capital de empréstimos e de aplicação financeira, tem por origem o esgotamento progressivo das normas de consumo e a baixa rentabilidade dos investimen­tos industriais” (CHESNAIS, 2005, p. 38).

64Neste contexto, o papel da propriedade torna-se funda­mental, pois é por meio dela que se criam os direitos aos rendimentos sob a forma de aluguéis, de rendas fundiárias, de juros e de rendimentos rela­cionados às aplicações em Bol­sa de Valores. Chesnais (2005) utiliza o termo “propriedade patrimonial” referindo-se ao direito à renda, seja a renda ad­vinda da propriedade de imó­veis, seja a renda que provém das aplicações do capital-di­nheiro em atividades financei­ras. Chesnais (2005) adverte que a propriedade patrimonial não tem por finalidade nem o consumo nem a criação de ri­queza que aumentem a capaci­dade de produção, mas sim o rendimento.

65O exemplo brasileiro dos contratos de concessão por meio de PPP para as obras de saneamento básico nos servem de exemplo sobre esse tipo de rentismo. Conforme Paulani (2016), “nesse tipo de contrato, portanto, as rendas produzidas pelo trabalho executado no se­tor são inteiramente privatiza­das, ao invés de ficarem sob o controle do Estado” (PAULA­NI, 2016, p. 527). Segundo a autora, esse tipo de contrato é o que mais combina com o processo de financeirização da economia, traço marcante do capitalismo contemporâneo.

66Ao contrário dos contratos de serviço que vinculam ao capital apenas o lucro obtido na prestação dos serviços, as concessões atrelam ao capital também as rendas produzidas no processo de exploração dos recursos (PAULANI, 2016). A promoção da participação privada nos serviços de sane­amento responde à lógica do capitalismo financeirizado, que assume no Brasil contornos al­tamente conservadores, decor­rentes de um neoliberalismo intensivo com traços notada­mente rentistas.

67Ao obter a concessão para a produção e exploração de determinado serviço público, no caso em análise, a conces­são do esgotamento sanitário, a empresa vencedora da dis­puta obtém, por conseguinte, o monopólio sobre a prestação e exploração do serviço por um determinado período de tempo. Isso permite à empresa privada não só estabelecer os preços do serviço de esgotamento, como também cobrar um tributo na forma de renda pelo mero tí­tulo de concessão desse tipo de serviço monopolizado. A exclusividade da operação do esgotamento sanitário pelo par­ceiro privado se configura no monopólio deste sobre o servi­ço público de esgoto, monopó­lio que permite ao ente privado traçar suas estratégias com a finalidade de deixar o negócio cada vez mais lucrativo, como a possibilidade de se obter re­ceitas extras por meio de ati­vidades alternativas, como o beneficiamento do esgoto para a produção de água de reuso, como já acontece em algumas cidades brasileiras onde a pro­dução de saneamento na forma de PPP já foi implantada.

68Ao se produzir infraestrutu­ra para saneamento básico, se produz também o espaço, pro­dução esta que se articula ao processo global de acumulação capitalista. A produção via PPP possui um caráter rentista que se reflete no modo como o es­paço é produzido socialmente e como o próprio espaço tor­na-se um ativo financeiro por meio dos títulos de proprie­dade, através dos contratos de concessão à iniciativa privada.

69Desta forma, a produção do esgotamento sanitário no con­texto do capitalismo contem­porâneo tem assumido cada vez mais um caráter corporativo, através do qual as grandes hol­dings do setor de infraestrutura encontram novas oportunida­des de valorização e reprodu­ção do capital, em especial, os capitais advindos das finanças. A lógica rentista se apodera do bem público, dando-lhe uma nova roupagem e onerando os serviços para as camadas mais pobres da população.

A produção de saneamento básico via Parceria Públi­co-Privada (PPP) no mu­nicípio de Serra (ES)

  • 2 A Cesan é uma empresa de economia mista, controlada pelo Governo do Estado do Espíri­to Santo, que (...)

70O governo do Espírito Santo não aderiu ao programa de con­cessão de companhias de água e esgoto do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), mas vale fri­sar que o governo capixaba já vinha colocando em prática as PPPs e tem atraído investido­res, principalmente para servi­ços de esgotamento sanitário de alguns municípios da Região Metropolitana da Grande Vitó­ria (RMGV). Até o ano de 2018, o Governo do Estado, por meio da Companhia Espírito Santense de Saneamento (Cesan)2, já havia firmado contratos na for­ma de PPP para a ampliação, manutenção e operação do sis­tema de esgotamento sanitário dos municípios de Serra e Vila Velha.

MAPA 1: Localização do município de Serra no contexto da Região Metropolitana da Grande Vitória (RMGV)

MAPA 1: Localização do município de Serra no contexto da Região Metropolitana da Grande Vitória (RMGV)

Fonte: Elaborado pelos autores

71Inserido no contexto da Re­gião Metropolitana da Grande Vitória (RMGV), o município de Serra viveu um intenso cres­cimento populacional a partir da década de 1970, devido, princi­palmente, à mudança do perfil produtivo do Espírito Santo, da decadência do café e sua erra­dicação na década de 1960 para a implantação de plantas indus­triais no município, a partir da década de 1970.

72Não foi por acaso que Ser­ra recebeu a primeira PPP do estado do Espírito Santo, tam­pouco o fato de a primeira PPP do estado ter sido na área de saneamento básico. Em 1970, Serra possuía uma população de 17.286 habitantes. Nas décadas que se seguiram, o crescimento foi acelerado, chegando a uma população de 502.618 habitan­tes em 2017, tornando-se o mu­nicípio mais populoso do estado do Espírito Santo (IBGE, 2017).

73O mercado imobiliário se formou plenamente em Serra a partir dos anos 2000, quando o município recebeu inúme­ros lançamentos imobiliários realizados tanto por empresas locais como por empresas de abrangência nacional. Em 2011, o município concentrou 78,9% das unidades imobiliárias lan­çadas na Região Metropolitana da Grande Vitória (RMGV). Conforme os dados dos proje­tos aprovados na Secretaria de Desenvolvimento Urbano da Serra, somente no período entre 2009 e 2010 foram aprovados mais de 7,5 mil unidades imobi­liárias (ALVES, 2017).

74Até o final do ano de 2013, o serviço de esgotamento sani­tário de Serra esteve na respon­sabilidade da Cesan. A partir de 2014, o consórcio Serra Am­biental assumiu, já na forma de PPP, os serviços de produção, operação e manutenção do es­gotamento do munícipio. Toda a infraestrutura produzida até então pela Cesan foi repassada para o parceiro privado, assim como as obras que estavam em andamento naquele momento.

75A implantação da primeira PPP capixaba se deu por meio de Concorrência Internacio­nal, aberta pela Cesan, para a concessão administrativa dos serviços de ampliação, manu­tenção e operação do sistema de esgotamento sanitário do município de Serra, no ano de 2014. O Consórcio Serra Am­biental foi a empresa vencedora do certame. O valor do contra­to corresponde ao montante de R$ 485.498.350,11, corrigido anualmente, de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

76A Serra Ambiental é uma So­ciedade de Propósito Específica (SPE) formada pelo consórcio entre três empresas: a constru­tora Aterpa M. Martins S/A, Sonel Engenharia S/A e Mauá Participações Estruturadas S/A, cada empresa com a cota de 33% do negócio. Em novembro de 2016, a Aegea, uma holding do saneamento, comprou a So­nel Engenharia S/A e adquiriu a cota da Aterpa M. Martins S/A no consórcio, assumindo, as­sim, o controle administrativo da Serra Ambiental.

77O modelo de remuneração da concessionária, estipulado em contrato, se dá através de uma contraprestação mensal que corresponde à soma de uma parcela fixa, equivalente à re­muneração dos investimentos realizados pela concessionária, e uma parcela variável, equiva­lente à remuneração pela execu­ção dos serviços.

78A parcela fixa será paga em 360 meses e sofrerá correção anual, de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Con­sumidor Amplo (IPCA). Já a parcela variável corresponde ao preço unitário sobre o metro cúbico de esgoto proveniente de todo o município de Serra, incluindo mais uma taxa sobre a operação, manutenção e tra­tamento do esgoto proveniente do município de Fundão. Outro mecanismo de cobrança é o acréscimo de 10% sobre o preço cobrado por m3 de esgoto, onde o hidrômetro estiver instalado há mais de 08 anos, a título de compensação por possíveis re­gistros de medição a menor.

79Além da contraprestação mensal, a concessionária tam­bém poderá explorar as “recei­tas alternativas” relacionadas ao esgotamento sanitário, desde que não envolvam o forneci­mento de água e nem as ativi­dades relacionadas aos biossólidos. Conforme o contrato de concessão, as “receitas alter­nativas” serão compartilhadas com a Cesan, que terá direito a receber 20% (vinte por cen­to) da receita líquida, exceto as receitas alternativas relativas à ligação intradomiciliar. Cabe mencionar que a porcentagem a ser compartilhada com a Cesan poderá ser descontada no preço da contraprestação a ser por ela paga.

80Apesar de a PPP para o esgo­tamento sanitário em Serra ser ainda recente, algumas mudan­ças já são percebidas, principal­mente no que se refere ao preço das tarifas e à forma de organi­zação do processo produtivo.

81Em 2014, quando a PPP ain­da estava em vias de implanta­ção, a Cesan realizou o reajuste de 5,31% nas tarifas de água e esgoto para os municípios da Região Metropolitana da Gran­de Vitória (RMGV). Em 2015 e 2016, durante os dois primei­ros anos de operação da PPP, os reajustes realizados pela Cesan sobre os serviços de água e esgoto foram de 10,59% e 11,06%, respectivamente (ES­PÍRITO SANTO, 2018). O au­mento sobre as tarifas de água e esgoto ocorreu no mesmo pe­ríodo em que a Cesan iniciou o pagamento de suas obrigações com a Serra Ambiental. Teve início o pagamento das contra­prestações mensais e também o depósito de garantia na Conta de Reserva e na Conta Vincula­da por parte da Cesan, no mon­tante inicial de R$ 2 milhões.

82Após a implantação da PPP em Serra, uma nova tarifa foi criada pelo governo estadual. A Lei 10.495/2016 instituiu a cobrança da tarifa pelas pres­tadoras de serviços públicos de saneamento básico, em razão da disponibilidade da infraestrutu­ra do esgotamento sanitário. A nova tarifa está sendo cobrada dos usuários que possuem rede e tratamento de esgoto à dispo­sição e que, mesmo após comu­nicado da Cesan, não efetuaram a ligação do imóvel ao ponto de coleta de esgoto. Trata-se de um dispositivo que busca inibir o lançamento irregular de esgoto e, ao mesmo tempo, aumenta o número de contribuintes para as concessionárias de água e esgoto que operam no estado, principalmente para a Cesan. Vale ressaltar que uma parte da contraprestação mensal paga à Serra Ambiental pela Cesan provém justamente do volume de esgoto tratado. Desta for­ma, quanto maior o número de imóveis ligados à rede coletora, maior será o repasse da Cesan para a Serra Ambiental.

83O caso de Serra e de outras cidades brasileiras evidenciam que o saneamento básico se tor­nou um novo ambiente de ne­gócios. Além de executar novas obras, a empresa se beneficia operando o sistema físico pre­viamente constituído. No caso da Serra Ambiental, toda a in­fraestrutura construída anterior­mente à concessão pela estatal foi transferida para o consórcio privado.

  • 3 Conforme ação promov­ida pelo Sindicato dos Tra­balhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Espír (...)

84Antes da implantação da PPP, o município de Serra con­tava com 21 Estações de Trata­mento de Esgoto (ETE) e 129 elevatórias de esgoto. Uma das metas do Consórcio Serra Am­biental é reduzir essas 21 ETES para 10 ETES, com a possibili­dade de se reduzirem também as elevatórias. A redução do número de ETES vem acompa­nhada da redução do quadro de funcionários. Em 2016, após a Aegea assumir o controle acio­nário da Serra Ambiental, foram demitidos 73 dos 200 funcioná­rios que a empresa empregava. As demissões faziam parte da reestruturação administrativa promovida pela nova gestão da PPP3.

85Tanto na Serra Ambiental como nas empresas que a con­trola, a “governança corporati­va” aparece como um dos pila­res fundamentais para a liquidez do negócio. Conforme Chesnais (2003), a governança corporati­va é uma característica do regi­me de acumulação sob o domí­nio das finanças, que estabelece novas formas de relações entre acionistas, dirigentes das em­presas e empregados, e acentua a influência da finança sobre os governos.

86A criação do Regime Espe­cial de Incentivos para o De­senvolvimento do Saneamen­to Básico (REISB), pela Lei 13.329/2016 (BRASIL, 2016), serve de exemplo para demons­trar a influência política e eco­nômica das grandes empresas sobre o poder público. Trata-se de um mecanismo institucional, criado com o objetivo de esti­mular a empresa prestadora de serviços públicos de saneamen­to básico a aumentar seu volu­me de investimentos, por meio da isenção à contribuição ao Programa de Integração Social – PIS, ao Programa de Forma­ção do Patrimônio do Servidor Público – PASEP e à Contribui­ção para Financiamento da Se­guridade Social – COFINS.

87O REISB se estenderá até o ano de 2026, e não se aplica às empresas optantes pelo Regime Especial Unificado de Arreca­dação de Tributos e Contribui­ções devidos pelas Microem­presas e Empresas de Pequeno Porte – Simples Nacional, mas abrange as grandes empresas do setor de saneamento.

88As mudanças na legislação, em torno do saneamento básico, não foram realizadas ao acaso. Trata-se de mais uma estratégia onde os agentes empresariais jogaram todos os esforços, no sentido de influenciar a política pública e a elaboração e apro­vação de leis. Tais articulações refletem o que já anunciava Lefevbre (1999), para quem, “no capitalismo, a base econômica comanda. O econômico domi­na. As estruturas e superestru­turas organizam as relações de produção (o que em nada exclui os atrasos, os distanciamentos e as disparidades)” (LEFEBVRE, 1999, p. 112).

89Nesse sentido, o saneamento foi inserido na lógica atual do mercado, e os serviços presta­dos pelo setor possuem caráter rentista. Primeiro, a questão da água, depois, a coleta e o tra­tamento do esgoto tornaram-se objetos extremamente rentá­veis. Percebe-se uma articula­ção entre os agentes privados e o poder público para a formu­lação e aprovação de leis para ocupar o espaço que, até então, era ocupado pelas empresas pú­blicas. Conforme Borja (2017), trata-se de um modelo de pres­tação de serviços que se assenta na lógica da governança cor­porativa (CHESNAIS, 2003), da eficiência econômica e da rentabilidade do capital, e não vai responder a outras lógicas, como a da justiça e da inclusão social.

90A própria ação do capital imobiliário em Serra é um dos elementos que nos permite compreender um pouco mais dessa articulação entre os agen­tes privados e o poder público. Articulações que contribuem ainda mais para a segregação socioespacial na cidade.

91A produção imobiliária que se desenvolveu em Serra é vol­tada para faixas bem acima do nível médio de renda de grande parte da população do municí­pio. Não se trata então de aten­der a uma demanda social, mas sim a uma demanda de merca­do. Isso se torna mais evidente quando a própria gestão muni­cipal enxerga a atividade imo­biliária como um fator positivo para a transformação do perfil socioeconômico do morador de Serra. De acordo com a Secretá­ria de Desenvolvimento Urbano (gestão 2008-2012),

a estratégia é colocar moradia de alta renda, porque vindo moradia de mais alta renda a gente trabalha o setor de servi­ços e comércio, que é o que emprega e é o que distribui renda (...) nós precisa­mos incrementar a riqueza da população para aumentar a possibilidade dessa po­pulação ter mais renda. E crescer, mas não crescer naquele nível de população de menor renda. E o que tem isso a ver com a política urbana? Tem a ver porque a forma como foi encontrada na Serra foi através dos condomínios e loteamentos. (Secretária de Desenvolvimento Urbano de Serra, 2009, apud. Zanotelli; Ferreira, 2011).

92Observa-se a legitimação do processo de exclusão so­cial, por parte da própria gestão municipal, em diversos níveis. Consolida-se a exclusão social por meio dos espaços urbaniza­dos privativos (condomínios re­sidenciais e loteamentos de alto padrão), cujos muros impedem a entrada do restante da popula­ção nessas áreas.

93Também se amplia a segre­gação social ao se priorizar empreendimentos para pessoas com nível de renda mais ele­vado, relegando aos demais moradores a moradia precária em áreas periféricas, muitas vezes, por meio de ocupações irregulares e loteamentos clan­destinos. Para esses moradores, não haverá universalização dos serviços de esgoto, pois não se inserem na “cidade legalizada”, sob o controle dos órgãos públi­cos de fiscalização, resumindo, não geram receitas, na forma de impostos, para a gestão mu­nicipal, nem rendimento para as concessionárias de energia, água e esgoto.

Considerações Finais

94No período atual do capita­lismo, os limites entre o público e o privado se apresentam como fronteiras a serem removidas. Nos momentos de grandes cri­ses, o Estado movimenta-se para assegurar a valorização e a acumulação do capital, crian­do condições para o surgimento de novos negócios em diversas modalidades. Abrem-se novas frentes para a expansão do ca­pital.

95O processo de globalização foi responsável pela introdução de um novo padrão de acumu­lação e regulamentação social e política, a partir dos anos 1970 (HARVEY, 2008; PRADO, 2005b). Paralelo a isso, as polí­ticas neoliberais e a desregula­mentação financeira, associada à mundialização do dólar e ao desenvolvimento dos fundos de pensão, liberaram um enorme volume de dinheiro no mercado financeiro. Dinheiro em busca de valorização. Desta forma, o mundo dito globalizado torna­-se essencialmente dominado pelas finanças.

96Na busca por valorização, o capital assume posições em espaços onde ainda não havia penetrado. A influência políti­ca e econômica exercida pelas grandes corporações pressio­nam cada vez mais os Esta­dos nacionais, principalmente pelo fato de o Estado possuir os principais mecanismos que transformam as transações eco­nômicas no mercado. Os gover­nos possuem ainda um papel essencial para o capital, em especial para a “desregulamen­tação” dos mercados nacionais. Isso significa um enorme apara­to de normas e leis criadas para a entrada do capital financeiro em áreas antes não visadas, como o setor de saneamento.

97Wallerstein (2003) argumen­ta que cabe ao Estado o poder da restrição legal. Nesse sentido, o Estado pode decretar ou proibir monopólios, assim como criar cotas. O Estado pode simples­mente assumir parte dos custos de produção do capitalista, por meio da concessão de crédi­to e subsídios, ou, ainda, pode beneficiar múltiplos empresá­rios, simultaneamente, na cons­trução de infraestrutura e das condições gerais de produção. Além disso, o autor argumenta que “o Estado oferece aos em­presários a possibilidade de não pagar os custos de reparação dos danos que infligem ao que não é sua propriedade” (Wal­lerstein, 2003, p. 98). Desta for­ma, quando os empresários não assumem a responsabilidade sobre determinados impactos da atividade produtiva, como no caso da degradação ambien­tal, por exemplo, o Estado está permitindo o repasse dos custos à sociedade em geral.

98Neste contexto, o setor de infraestrutura pública inseriu-se perfeitamente na lógica de mer­cado do rentismo. A produção do bem público pelo parceiro privado não ocorre de maneira desinteressada. Estipula-se um preço, um tributo que precisa ser pago pelo morador da cida­de que deseja ter acesso ao bem produzido.

99No Brasil, a novidade do mo­mento tem sido o saneamento básico. A criação de legislação específica (Lei de PPPs e Lei do Saneamento), o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plan­sab) e a promoção de privati­zações e PPPs por um órgão do próprio Governo Federal (PPI) deixam claras as articulações entre os agentes privados, para a conquista e mercantilização dos bens públicos. Trata-se de uma lógica rentista que captu­rou, estrategicamente, o setor de saneamento como fonte de acumulação e reprodução do capital de origem financeira. Através das concessões, dos incentivos e das altas taxas de retorno de investimento, o es­gotamento sanitário abriu uma nova frente de expansão de negócios e de remuneração do capital.

100O mero título de monopólio dos bens e serviços públicos garante ao parceiro privado a oportunidade de extrair renda sobre bens e serviços que antes eram produzidos pelo Estado. Agora, são bens que servem ao capital. Além da renda obtida pelo mero título de propriedade via concessão, existe também a possibilidade de se explorar ou­tras atividades que podem ser agregadas ao contrato, a médio e longo prazos.

101Pesquisas recentes têm in­dicado a tendência para a re­estatização de diversos setores em âmbito internacional, prin­cipalmente nos países da Euro­pa e das Américas. Conforme apontam Pigeon, McDonald, Hoedman, Kishimoto (2013) e Lobina, Kishimoto, Petitje­an (2015), entre os anos 2000 e 2014 ocorreram mais de 845 casos de reestatização dos ser­viços públicos, envolvendo mais de 1600 cidades, em 45 países ao redor do mundo. Des­te total, 235 casos de reestatiza­ção corresponderam aos servi­ços de abastecimento de água e saneamento, em 37 países, a maioria em países ricos. A prin­cipal justificativa dos governos locais para cessação dos con­tratos de PPPs está relacionada a problemas na gestão privada da água, à falta de investimento em infraestruturas, ao aumento das tarifas e até mesmo a danos ambientais.

102O Brasil segue na contramão desse processo. Negligenciando as experiências, na maior parte negativa, dos outros países, o Governo Federal vem empre­endendo um projeto de privati­zações e formação de parcerias entre os setores público e pri­vado. Com o auxílio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), criam-se estratégias cada vez mais vantajosas para atração de investidores privados para as obras de infraestrutura pública. A concessão de crédito a juros mais baixos, isenção fiscal e ga­rantia de retorno ao investimen­to são os principais mecanismos para a realização desse projeto, colocando por terra o discurso sobre a escassez de recursos e inabilidade dos governos, e re­velando a subordinação do Es­tado ao capital.

103Desta forma, as políticas públicas para o saneamento básico, no contexto nacional, se mostram cada vez mais ren­táveis para os investidores, po­rém, excludente para a parcela mais pobre da população, am­pliando a segregação socioes­pacial na cidade.

104Visando os municípios mais populosos e as áreas mais valo­rizadas da cidade, onde geral­mente reside a população com maior poder aquisitivo, os in­vestimentos em infraestrutura via PPP tendem a concentrar-se onde o risco de inadimplência é menor, desta forma, não com­prometendo a rentabilidade do consórcio.

105Priorizam-se os bairros eliti­zados, em detrimento das áreas onde reside a população mais pobre, restringindo o acesso ao serviço somente para parcela da sociedade que pode pagar por ele, ou então se amplia o acesso aos mais pobres por meio de ta­rifa subsidiada pelo Estado.

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Notas

1 Entende-se por saneamen­to básico todo o conjunto dos serviços públicos de manejo de resíduos sólidos, de limpe­za urbana, de abastecimento de água, de esgotamento sani­tário e de drenagem e manejo de águas pluviais, bem como infraestruturas destinadas ex­clusivamente a cada um destes serviços (BRASIL, 2007).

2 A Cesan é uma empresa de economia mista, controlada pelo Governo do Estado do Espíri­to Santo, que atende 52 dos 78 municípios do Espírito Santo, in­cluindo todos os sete municípios da RMGV e 45 municípios no in­terior do estado. A atividade fim da companhia é captar, tratar e distribuir água, bem como cole­tar e tratar esgotos sanitários.

3 Conforme ação promov­ida pelo Sindicato dos Tra­balhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Espírito Santo (SINDAEMA-ES) con­tra a Serra Ambiental em 2016 (SINDAEMA-ES, 2018).

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Índice das ilustrações

Título MAPA 1: Localização do município de Serra no contexto da Região Metropolitana da Grande Vitória (RMGV)
Créditos Fonte: Elaborado pelos autores
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/geografares/docannexe/image/5077/img-1.png
Ficheiro image/png, 333k
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Para citar este artigo

Referência eletrónica

Vanderson Moreira Silva Alves e Carlos Teixeira de Campos Júnior, «“O lucro entra pelo cano”: a produção de saneamento básico via parceria público-privada (PPP) como estratégia de captação de renda na produção do espaço urbano de Serra (ES) »Geografares [Online], 27 | 2018, posto online no dia 28 novembro 2018, consultado o 13 dezembro 2024. URL: http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/geografares/5077

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Autores

Vanderson Moreira Silva Alves

Doutorando em Geografia Pro­grama de Pós-Graduação em Geografia Universidade Federal do Espírito Santo
vandersonmsalves@gmail.com

Carlos Teixeira de Campos Júnior

Professor Titular do Departamen­to de Geografia e do Programa de Pós-Graduação em Geografia Universidade Federal do Espírito Santo
ctcampos@gmail.com

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