1A discussão ambiental tem se tornado, desde meados do século XX, uma questão-chave das relações internacionais, inspirando grandes conferências mundiais exclusivamente sobre o tema. A melhoria da gestão dos recursos naturais e a conservação do meio ambiente de maneira geral se tornaram preocupações emergenciais dos principais organismos internacionais, dedicando acordos multilaterais, relatórios temáticos específicos e megaencontros diplomáticos com intensa participação da imprensa internacional.
2O desenvolvimento produtivo industrial se tornou o maior responsável pelas degradações ambientais no final do milênio. O avanço do aquecimento global, do desmatamento e da poluição em diversos âmbitos chegaram a níveis extremos que afetam as gerações atuais e futuras. As práticas produtivas para o crescimento econômico atingiram um ponto crítico no uso desenfreado da natureza enquanto recurso, tornando urgente o rearranjo destas práticas para o equilíbrio com o meio ambiente, de forma a não prejudicar seu uso como recurso natural e como ecossistema responsável pela vida do planeta. As atuais tendências econômicas globais demonstram a necessidade de repensar o uso do meio ambiente, buscando equilibrar a preservação ambiental sem o comprometimento do crescimento econômico. Tal ideia é refletida no conceito de desenvolvimento sustentável.
3Este trabalho visa descrever a trajetória das discussões sobre a questão ambiental no cenário internacional, com foco nas principais conferências ambientais internacionais realizada pela Organização das Nações Unidas desde o início da década de 70. Em seguida, explica-se a apropriação do uso da natureza pela lógica de acumulação de capital por meio da produção em grande escala, atual configuração do sistema econômico mundial, e como se dá a busca pelo equilíbrio entre economia-ecologia e lucro produtivo-gestão dos recursos naturais. Por fim, faz-se uma comparação entre os projetos de “Cidade Sustentável” de Seropédica (Brasil) e a eco-town de Kitakyushu (Japão), a fim de demonstrar como funcionam os discursos e as dinâmicas acerca do desenvolvimento sustentável na execução prática do conceito.
4O aumento da preocupação com a proteção ambiental de forma mais veemente data da Segunda Guerra Mundial, onde foi atestada o tamanho da capacidade de destruição alcançada pelo homem com as bombas nucleares de Hiroshima e Nagasaki, no Japão. O episódio se caracteriza não apenas pela destruição iminente do meio ambiente e da vida humana, mas por suas consequências para as gerações futuras, como doenças crônicas, infertilidade do solo e contaminação da água, por exemplo. Paralela à criação da Organização das Nações Unidas em 1945 para evitar a repetição de conflitos mundiais e garantir a manutenção da paz, surgem discussões internacionais acerca da intenção de conter a degradação ambiental em grandes níveis já constatada desde o fim da guerra.
- 1 O livro Primavera Silenciosa (1962), da ambientalista Rachel Carson, descreve as preocupações acerc (...)
5As décadas seguintes levantaram preocupações similares, como a utilização excessiva de agrotóxicos1 nas plantações de grande escala na década de 60 nos Estados Unidos que causaram danos também geracionais para o solo e para a população, assim como as crises de fornecimento de petróleo na década de 70 que identificaram a dependência sistêmica de recursos naturais não-renováveis, o que poderia levar ao colapso econômico de diversos países.
- 2 O relatório Meadows (Limites do Crescimento) é um documento publicado em 1972, elaborado por pesqui (...)
6Entre o fim dos anos 60 e início dos anos 70, é elaborado o Relatório Meadows2, habitualmente conhecido como “Limites do Crescimento”, que relacionava o desenvolvimento econômico e o crescimento progressivo da população mundial à utilização desenfreada de recursos naturais necessários para a manutenção da vida. O momento de incertezas sobre a durabilidade dos recursos e a necessidade de proteção ambiental atrelados ao tom pessimista das ações humanas sobre os avanços do desenvolvimento industrial deram suporte à criação de um encontro mundial realizado pela ONU, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, sediado na cidade de Estocolmo (Suécia) em 1972. Dentre as propostas tratadas na conferência, destacam-se o combate à poluição e a criação do PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) como agência específica das ações para preservação ambiental.
- 3 Disputa ideológica entre países capitalistas e socialistas no mundo bipolar. A guerra data do fim d (...)
7A realização da Conferência no auge da disputa ideológica da Guerra Fria3 também desencadeou um embate entre os países participantes, caracterizado pela disputa entre o desenvolvimentismo dos países centrais e o conceito de “crescimento zero” apoiado pelos países periféricos – que visava congelar o desenvolvimento produtivo e econômico dos países industrializados sob a justificativa de conter o uso indiscriminado de recursos ambientais.
- 4 O Relatório Brundtland (Nosso Futuro Comum) foi publicado em 1987 pela Comissão Mundial sobre o Mei (...)
8Em meados da década de 80, um novo documento chamado Relatório Brundtland4, conhecido como “Nosso Futuro Comum”, foi elaborado em parceria com a ONU. O relatório apresentava uma tônica oposta ao anterior, com uma visão mais colaborativa e otimista acerca das possibilidades de cooperação e construção de um futuro mais igualitário ecológica e humanamente. Todavia, as conclusões propostas se mostraram vagas, como a conceitualização do termo “desenvolvimento sustentável” sem características mais definidas, e discussões pautadas na minimização da gravidade dos problemas ambientais e em pequenas soluções interdisciplinares para práticas limpas, mas sem prejuízo do desenvolvimento.
- 5 Homônimo da cidade do Rio de Janeiro.
9O próximo encontro aconteceu somente 20 anos depois, seguindo a argumentação proposta pelo novo relatório, dado o dilema acerca do crescimento econômico da Conferência de Estocolmo. Concomitantemente com o término da Guerra Fria e o desmantelamento da União Soviética, o modelo capitalista na década de 90 se tornara o cerne do sistema econômico mundial, acompanhado da disseminação do neoliberalismo, modelo que segue a reforma da doutrina liberal clássica, adaptando o conceito de não-intervenção do Estado na economia para algumas das necessidades dos Estados assistencialistas. Dessa forma, toda a discussão internacional sobre a questão ambiental precisava ser ressignificada às necessidades da época. A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992) dessa vez fora sediada no Brasil, um país emergente, à perspectiva festiva da Cidade Maravilhosa5. O foco da conferência – popularizada como ECO-92 – foi guiado pela biodiversidade característica do país e a gestão dos recursos naturais alimentada pelo argumento desenvolvimentista. A fisionomia do conceito de “desenvolvimento sustentável” começa a ser construída em um megaevento mundial.
10Em 2002, o conceito aparece explicitamente na Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, ocorrida em Joanesburgo (África do Sul) para avaliar o progresso alcançado pelos acordos estabelecidos na ECO-92. Apesar de organizada também pela ONU, não se tratava de uma conferência oficial como as anteriores. A inovação trazida neste encontro foi a inclusão de pautas sociais, como erradicação da fome e da pobreza, incluídas nas discussões anteriores como preocupações implícitas e secundárias. O encontro ficou conhecido como RIO+10, pela proximidade da conferência seguinte, a RIO+20.
11Consolidadas as determinações produtivas e econômicas do modelo capitalista como fundamentos da nova ordem mundial, é realizada uma nova reunião oficial para estabelecer os preceitos inicialmente formulados na anterior. A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – a RIO+20 – é sediada novamente no Rio de Janeiro (Brasil) em 2012. Esta assembleia carrega o legado misto das conferências anteriores: uma desconfiança de megaeventos diplomáticos, o questionamento da consistência científica dos impactos ambientais e climáticos e a proposição de soluções práticas generalizadas e demasiado redundantes.
- 6 A economia verde é um conjunto de processos produtivos, de comércio e de serviços que atuam na prom (...)
12O grande resultado da conferência se encontra na formulação e definição de conceitos, com a caracterização oficial do conceito de “desenvolvimento sustentável” e a aparição de outros como “economia verde”6, que dão sustentação à ideia de que a ressignificação dos conceitos e práticas ecológicos dependem, indubitavelmente, das necessidades econômicas e produtivas do sistema capitalista internacional.
13A globalização se apresenta como um processo contínuo e irreversível instituído pelo avanço do sistema capitalista mundial (BAUMAN, 1999). É um processo atrelado em sua essência às mudanças econômicas, e estas exprimem as novas relações do capital, tanto quanto suas consequências para adaptação dessas relações, como reestruturação econômica, política, social, espacial e ambiental.
14Nas Conferências das Partes das Nações Unidas voltadas ao tema do meio ambiente, é possível perceber a evolução da discussão acerca da problemática ambiental, cada vez mais envolta pelo sistema capitalista e atrelada ao desenvolvimento econômico dos países (CORRÊA DO LAGO, 2013). O dissenso entre as partes na Conferência de Estocolmo sobre os limites do desenvolvimentismo, bem como a reiteração da necessidade de controle das atividades que contribuem para a degradação ambiental evidenciadas na ECO-92 e na RIO+20 – caracterizadas pelo conceito de desenvolvimento sustentável – evidenciam a teoria de Immanuel Wallerstein sobre a desestruturação do sistema econômico capitalista atual. Para o autor, o esgotamento ecológico é uma tendência da ruptura já em curso do modelo, caracterizada pela disputa entre o lucro da produção de grandes empresas e a preservação dos recursos naturais utilizadas de forma inescrupulosa pelas mesmas (WALLERSTEIN, 2003). Desse modo, não é possível preservar o exercício de acumulação de capital pela produção em larga escala sem limitar o uso dos recursos naturais.
15A ECO-92 e a RIO+10, ainda que opostas às disposições de crescimento zero da Conferência de Estocolmo, podem ser consideradas como parte da transição entre as perspectivas econômicas que transcrevem as conferências ambientais internacionais. Durante a ECO-92, o sistema capitalista experimentava as consequências do neoliberalismo, modelo político-econômico que David Harvey apontou como contraditório por defender concepção liberal clássica de não-intervenção do Estado na economia e, ainda assim, permitir a formação de monopólios privados de mercado sobre os recursos ambientais, que deveriam ser considerados bens comuns da população mundial. Há também a contradição entre o bem-estar social proposto como um dos princípios da teoria capitalista e o tratamento do meio ambiente como mercadoria diante da política do livre-mercado (HARVEY, 2008). Nesse mesmo sentido, Zigmunt Bauman também define de maneira direta as consequências da relação hierárquica entre economia e ecologia, ao dizer que “(…) o poder desarraigado (…) é livre para explorar e abandonar as consequências dessa exploração” (BAUMAN, 1999, p. 16).
16O avanço da globalização e do sistema capitalista caminha para a reestruturação espacial das cidades como reflexo da exploração de novas áreas por empresas onde os centros de decisão se mantêm em grandes aglomerações urbanas e a área produtiva migra para regiões onde há incentivo e chances de maiores lucros (LENCIONI, 2015). Dessa forma, o lucro se sobrepõe aos danos ambientais ocasionados pelas mudanças de região das empresas, que fisicamente se direcionam às áreas com custos de produção reduzidos, como mão-de-obra barata, abundância de matéria-prima, redução do transporte, entre outros – geralmente áreas rurais – enquanto seus centros de decisão se instalam em aglomerados urbanos economicamente relevantes no sistema internacional (BAUMAN, 1999). Milton Santos explica esta dinâmica de reorganização do espaço tanto da perspectiva regional, com mudanças locais de fábricas, como da perspectiva global, com a migração de multinacionais para países periféricos e a manutenção dos centros de decisões em países centrais (SANTOS, 2000).
17Com a preocupação central do sistema sendo o acúmulo de capital, as empresas buscam externalizar os custos da sua produção para aumentar seus lucros, utilizando de forma inescrupulosa os recursos ambientais disponíveis e evitando o pagamento de impostos ao Estado pela exploração (WALLERSTEIN, 1999). A reorganização do espaço antes rural para alocação de indústrias caracteriza um exemplo destas práticas de externalização de custos (HARVEY, 2008) e mobilidade do capital e da produção (BAUMAN, 1999) particulares do modelo capitalista, no qual só há espaço para a natureza enquanto mercadoria e recurso produtivo. Os recursos naturais são utilizados como matéria-prima e o meio ambiente como espaço de organização da produção, sem que haja preocupação ou ressarcimento aos danos ecológicos causados pela instalação de grandes fábricas, assim como benefícios à população local em forma de incentivos sociais, atendendo apenas ao resultado de lucro das grandes empresas.
18A construção da perspectiva de conservação ambiental, ultimada pela construção do conceito de desenvolvimento sustentável, evidencia a apropriação do sentido da sustentabilidade ecológica pela expectativa de lucro e crescimento econômico e industrial (OLIVEIRA, 2012).
- 7 Os projetos escolhidos para exemplificar as práticas produtivas-ambientais do desenvolvimento suste (...)
19A implementação de projetos governamentais para difundir práticas sustentáveis tem se tornado uma realidade comum ao redor do mundo. Tanto governos nacionais e locais como organismos internacionais desenvolvem projetos de lei ou programas de aceleração para o desenvolvimento sustentável em diversos âmbitos. Os projetos de Seropédica e Kitakyushu7 foram designados para ilustrar alguns desses programas implantados em diferentes áreas do globo e sob diferentes perspectivas: como discursos de governança e soluções viáveis aplicadas.
20Esse processo é definido pelo conceito de reestruturação produtiva do espaço (OLIVEIRA, 2016) que explica a sua reconfiguração pelas novas dinâmicas de produção e acumulação de capital. Nesse sentido, observa-se a reconstrução de cidades para atender às demandas capitalistas de escoamento da mercadoria, de alocação de indústrias e de utilização da natureza como recurso. Desse modo, define-se um novo modelo produtivo de gestão para a cidade, incluindo a sustentabilidade como uma das forças motriz da sua reconfiguração, sensível à proposta de alinhamento entre a produção em larga escala e a preservação ambiental evidenciada pelo conceito de desenvolvimento sustentável.
21A cidade de Seropédica, localizada na borda metropolitana da cidade do Rio de Janeiro e pertencente à região da Baixada Fluminense, recebeu nos últimos anos a instalação de grandes indústrias multinacionais e complexos logísticos, se tornando um exemplo da utilização do conceito de desenvolvimento sustentável enquanto discurso popular atualmente.
- 8 O Arco Metropolitano é o nome popular da Rodovia Raphael de Almeida Magalhães, uma rodovia construí (...)
22Em 2014, a prefeitura adotou o título “Cidade Sustentável” para a implementação de um projeto de reestruturação territorial-produtiva da cidade. Novas empresas – dentre estas complexos logísticos e fábricas multinacionais – seriam alocadas na antiga região rural da cidade, já tida como posição estratégica de escoamento da produção dada a proximidade do Arco Metropolitano8, uma das principais vias do estado do Rio de Janeiro. O auxílio de subsídios do governo dados às empresas seria revertido em geração de empregos e aumento do bem-estar da população local. As práticas sustentáveis adotadas incluíam, por exemplo, a instalação de diversos pontos de coleta seletiva para reciclagem do lixo, e a proteção ambiental da Floresta Nacional Mário Xavier, localizada na cidade.
Figura 1: logo da Prefeitura de Seropédica após a implementação do projeto “Cidade Sustentável” em 2014.
Disponível em: http://seropedica.rj.gov.br/wp-content/uploads/2016/04/logo_site_prefeitura.fw_.png. Acesso em 30 de abril de 2019.
23Todavia, com a mudança do governo local após as eleições em 2016, o projeto foi encerrado pela nova gestão e o novo título de “Governo do Povo” foi adotado pela prefeitura.
24Cerca de 17 empresas foram instaladas desde 2010 na cidade, como a Procter & Gamble, a Petrobras e o complexo logístico Golgi9. Porém a realização do projeto sustentável prometido à população, incluindo os efeitos positivos como melhorias sociais e atividades de preservação ambiental local, foram abandonados. Não há registros públicos de atividades realizadas que sejam relacionadas às propostas do projeto, bem como dados e políticas públicas que comprovem a melhoria da qualidade de vida da população em vista da chegada das empresas.
Figura 2: logo da Prefeitura de Seropédica após a mudança de gestão da cidade nas eleições de 2016 para o título de “Governo do Povo”.
Disponível em: http://seropedica.rj.gov.br/wp-content/uploads/2017/06/topo_pagina_pms-1024x163.png. Acesso em 30 de abril de 2019.
25O programa do governo “Cidade Sustentável” de Seropédica demonstra como o discurso do desenvolvimento sustentável é bem recebido pela sociedade atualmente – ainda que não tenha resultados efetivos. A utilização da sustentabilidade enquanto discurso é importante para a angariação de votos, ainda que as promessas não sejam cumpridas. No caso específico da cidade, a mudança de gestão comprometeu a viabilidade do projeto “Cidade Sustentável”, característica da descontinuidade de políticas públicas em razão da forma como se aplica a governabilidade no Brasil, e como a questão ambiental é posta em segundo plano pela governança.
26A cidade de Kitakyushu, localizada na ilha de Kyushu ao sul do Japão, abriga um complexo metalúrgico de grande porte desde a década de 60. Por conta da grande produção, a região sofre com grave poluição do ar e dos rios, afetando seu ecossistema e a qualidade de vida da população local.
Figura 3: a poluição dos rios da cidade de Kitakyushu na década de 60.
Disponível em: https://www.sbmc.or.jp/english/20041018/Kitakyushu_City_vol2_vol3.htm. Acesso em 30 de abril de 2019.
Figura 4: a poluição do ar pelas fábricas da cidade de Kitakyushu na década de 60.
Disponível em: https://www.jica.go.jp/brazil/portuguese/office/news/2013/c8h0vm00004nzhen-att/c8h0vm00004nzhk0.pdf. Acesso em 30 de abril de 2019.
27Desde o fim da década de 80, o governo do Japão instituiu, em um sistema tripé que incluía a parceria de entidades públicas e privadas (locais, nacionais e internacionais) juntamente com a sociedade civil, o projeto KITA (Kitakyushu International Techno-Cooperative Association) para a cidade. O planejamento incluía a reestruturação industrial e ecológica da cidade, a fim de manter os níveis da produção em larga escala ao tempo que buscava reverter os quadros de poluição e definir novas atividades produtivas e comerciais sustentáveis.
Figura 5: recuperação dos rios após a implementação do projeto de eco-town na década de 80.
Disponível em: https://www.sbmc.or.jp/english/20041018/Kitakyushu_City_vol2_vol3.htm. Acesso em 30 de abril de 2019.
Figura 6: reversão da poluição do ar após a implementação do projeto de eco-town na década de 80.
Disponível em: https://www.jica.go.jp/brazil/portuguese/office/news/2013/c8h0vm00004nzhen-att/c8h0vm00004nzhk0.pdf. Acesso em 30 de abril de 2019.
- 10 Eco-friendly é um termo utilizado em referência às atividades sem prejuízo do ecossistema local.
28O projeto foi bem-sucedido em seus objetivos, como reportado por um relatório do Banco Mundial em 1993, e contou com iniciativas como políticas de gênero e produção científica e tecnológica, por exemplo. O sucesso do projeto incluiu a sua internacionalização, de forma que, atualmente, é também exportado para outras regiões do mundo, principalmente países emergentes da Ásia no sul global, como a China. As empresas locais comercializam produtos e serviços sustentáveis, a população redefiniu atividades sociais comuns para o modelo eco-friendly10 e o governo implantou projetos e leis de preservação ambiental na região e no país.
29Os resultados do projeto incluem redução significativa da emissão de gases poluentes, reciclagem dos resíduos da produção, reutilização de água pelas indústrias e pela população local, produção de energia limpa, modelo de cidade autossustentável, exportação do modelo de planejamento urbano, investimentos em pesquisa e tecnologia, produção e exportação de produtos e serviços sustentáveis.
- 11 Informação disponível em: https://www.japanfs.org/en/news/archives/news_id031424.html.
Acessada em 3 (...)
30O projeto de Kitakyushu recebeu premiações nacionais e internacionais, incluindo o prêmio de Primeira Cidade-Modelo para Crescimento Verde da Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OECD), em 201111.
- 12 Conceito japonês criado na década de 90 para nomear a reestruturação de cidades com planejamento ur (...)
31O protótipo da chamada eco-town12 reflete a possibilidade de aplicação do conceito de desenvolvimento sustentável, em que a relação economia-ecologia abrange um tom mais homogêneo. É possível observar um projeto mais devidamente estruturado, e que reflete a possibilidade de uma reestruturação produtiva-ambiental para o desenvolvimento sustentável.
32Os projetos sustentáveis demonstram a aplicação prática – ou o uso apenas como discurso eleitoral – do conceito de desenvolvimento sustentável definido ao longo do tempo. O termo se apresenta como crucial nas discussões internacionais, e com necessidade de execução prática iminente, a fim de garantir a viabilidade do uso de recursos naturais para a conservação ambiental e manutenção da vida das gerações atuais e futuras.
33É importante ressaltar o papel histórico da Divisão Internacional do Trabalho na economia internacional abordada por Milton Santos para o entendimento das atividades econômicas produtivas dos países em questão (Japão e Brasil). Após a Segunda Guerra Mundial, o Japão se consolidou como um país central pelo seu alto desenvolvimento tecnológico, enquanto o Brasil ainda estava iniciando seu processo de industrialização. A análise comparativa dos projetos sustentáveis deve levar em conta a capacidade econômica e produtiva dos países em relação aos avanços tecnológicos, recursos disponíveis e capital para investimento no setor produtivo, que são desequilibrados entre os dois países.
34Por outro lado, a adequação – de forma geral – dos métodos produtivos à proteção do meio ambiente, todavia, tem se mostrado generalista em todo o mundo. Apesar do aumento da atenção para o tema e da realização de programas por organismos internacionais e projetos governamentais locais, as práticas para o desenvolvimento sustentável não se adequam à realidade e dimensão do problema atualmente. Tais práticas, de modo geral, ainda sobrepõem o lucro e o desenvolvimento econômico acima da conservação de rios, florestas e animais selvagens como bens comuns de toda a humanidade, não-passíveis de exploração pelo capital. A eco-town de Kitakyushu apresentou resultados mais próximos de uma sustentabilidade efetiva no sistema produtivo e de planejamento urbano, enquanto o projeto ”Cidade Sustentável” de Seropédica não dispõe de registros de políticas públicas realizadas para este fim.
35Enquanto não houver cooperação total entre entidades públicas, privadas e a sociedade civil com medidas efetivas de manutenção da vida ambiental, com ações locais, regionais, nacionais e internacionais que alimentem o progresso da sustentabilidade ambiental acima dos ganhos econômicos – com práticas alternativas de produção como a agroecologia, por exemplo – o planeta seguirá no curso de deterioração dos ecossistemas, da vida ambiental, animal e, sobretudo, humana.