1Pensar estrategicamente o desenvolvimento regional do ponto de vista territorial é um desafio. O território é a manifestação mais evidente dos processos econômicos, sociais e políticos que moldam a região enquanto espaço vivido. Sua leitura atenta desvela não apenas as contradições presentes e latentes no tecido social, mas também as relações que se estabelecem entre sociedade e natureza.
2A proposta central deste estudo é compreender a configuração territorial do estado de São Paulo segundo seus aspectos dinâmicos, procurando apontar as principais tendências espaciais de desenvolvimento em médio e longo prazo. Estamos propondo colaborar na elaboração de visões de futuro que ajudem a construção do consenso em torno dos objetivos maiores de desenvolvimento harmônico e durável. Portanto, interpretar, por meio de uma visão multi-escalar, a complexidade dos processos espaciais que contribuem para a diferenciação do território paulista em regiões.
3Para caminhar na direção proposta, partiremos da definição de três diretrizes estratégicas para o desenvolvimento regional: a coesão territorial, a policentralidade e a sustentabilidade. Essas diretrizes não podem ser vistas como simples metas a serem alcançadas, representam um sistema de valores que balizam as práticas da vida pública e privada na direção ao enfrentamento do imenso desafio de vencer as carências históricas do desenvolvimento periférico, ao mesmo tempo, promover a adaptação aos impactos das mudanças climáticas globais, que já se fazem sentir pontualmente, tanto na metrópole paulistana, como em distintos lugares do planeta.
4O principal instrumento a nos guiar no percurso é a análise multiescalar, considerando que a dinâmica territorial responde a forças que atuam em escalas distintas – global, nacional e local (ou regional). A crise financeira e o aquecimento da atmosfera planetária são processos globais que afetam e afetarão o cotidiano de todos. Da mesma maneira, teremos que conviver com mudanças na estrutura etária da população brasileira, que gradualmente afetarão nossos hábitos diários e vão afetar diretamente as escolhas de políticas públicas em todas as esferas de governo.
5O foco central da análise é a compartimentação territorial do estado como síntese dos processos globais, nacionais e regionais. A definição desses compartimentos procurou espelhar os principais vetores da dinâmica territorial de São Paulo, como a Macrometrópole, os eixos estruturantes, a nodalidade dos aglomerados urbanos e os remanescentes florestais. Vetores esses que se interpenetram e intercambiam fluxos de energia, matéria e informações, contribuindo para desenhar formas espaciais que estão em constante movimento.
6Por final, a partir dos compartimentos definidos, foram elaborados três exemplos de modelos espaciais simples para descrever visões de futuro, do ponto de vista da prospectiva territorial. A idéia-força subjacente a esses modelos está na desnecessária sofisticação para exercitar o raciocínio espacial e a compreensão dos movimentos aparentes e difusos do território.
7O percurso do texto parte de algumas considerações sobre coesão, policentralidade e sustentabilidade no estado de São Paulo. Procede-se a seguir uma avaliação sumária de alguns indicadores econômicos, sociais e demográficos como meio de subsidiar posterior análise de compartimentação. São apresentados os avanços da análise multiescalar como instrumento de análise e compartimentação do território. A prospectiva territorial encerra o trajeto com três exemplos que ressaltam a importância da coesão territorial, da policentralidade e da sustentabilidade ambiental para o desenvolvimento futuro do estado de São Paulo.
8A noção de coesão territorial parte do princípio de que os agentes sociais que atuam em determinado território podem colaborar em torno de programas e projetos comuns, reduzindo, por meio de negociações pactuadas, os custos de transação inerentes ao processo de desenvolvimento.
9Do ponto de vista da coesão territorial, o estado de São Paulo, embora seja uma das áreas mais dinâmicas do Brasil, ainda apresenta desigualdades territoriais expressivas, conforme pode ser avaliado pelas análises realizadas na seção anterior. As disparidades entre municípios paulistas são significativas, com especial destaque entre aqueles da Macrometrópole e os eixos dinâmicos de Campinas e Ribeirão Preto e aqueles das áreas mais deprimidas dos Vales do Ribeira e do Paraíba do Sul.
10O conceito de policentralidade é complementar ao de coesão territorial, já que os territórios são lugares que se estruturam em redes de distintas escalas de interação. A noção elementar de policentralidade está associada à idéia de rede de cidades, segundo a qual os núcleos urbanos formam os nós que são conectados por arcos, por onde circulam fluxos materiais e imateriais, seguindo uma hierarquia definida por sua complexidade funcional.
11No que diz respeito à policentralidade, a rede urbana de São Paulo apresenta uma estruturação complexa e hierarquizada (Mapa 1), embora fortemente polarizada pela metrópole paulista, que centraliza as principais funções de serviços especializados. Com capitais regionais importantes, onde se destacam Campinas (Nível 2A); Ribeirão Preto e São José do Rio Preto (Nível 2B), o território paulista já dispõe de subsistemas urbanos capazes de consubstanciar uma estrutura policêntrica, que permitiria distribuição mais harmônica do crescimento e uma integração mais efetiva entre as suas diversas regiões.
12Uma opção por reforçar a policentralidade no território paulista certamente contribuiria para aumentar a coesão territorial e tenderia a garantir uma maior participação dos agentes sociais no processo de desenvolvimento regional, descentralizando atividades e aumentando as possibilidades de acesso a serviços qualificados, indispensáveis na fase atual da economia do conhecimento.
Mapa 1: Rede urbana do estado de São Paulo, 2007
Fonte: Pesquisa Região de Influência das Cidades, IBGE, 2007.
13A noção de sustentabilidade é muitas vezes considerada como a inclusão da dimensão ambiental no processo de planejamento. Porém, esta é uma visão superficial das implicações que envolvem a opção estratégica pelo desenvolvimento sustentável. Incluir sustentabilidade na discussão significa considerar, de forma geral, as condições de vida das gerações futuras e, portanto, implica colocar a qualidade de vida e o planejamento como itens prioritários da agenda.
14Quanto à sustentabilidade, a divisão espacial em Unidades de Gerenciamento dos Recursos Hídricos (UGRHI) (Mapa 2) é o principal instrumento disponível para a gestão sustentável do território. Entretanto, como reconhecem os autores dos Cenários Ambientais 2020:
“Apesar de serem considerados instrumentos importantes, poucos planos regionais foram feitos no início do século. Em 2009, por exemplo, apenas uma das 22 Unidades de Gerenciamento de Recursos Hídricos (UGRHI) contava com o ZEE [zoneamento ecológico econômico] aprovado (Litoral Norte) e somente o Vale do Paraíba contava com um plano de mineração, que diz respeito à extração de areia nas suas várzeas. Na mesma época, poucos planos regionais de resíduos sólidos estavam consolidados, como o do Alto Tietê, Cabeceiras, Baixada Santista e Vale do Ribeira.” (SMA/CPLA, 2009, p. 38).
Mapa 2: Unidades de Gerenciamento de Recursos Hídricos do estado de São Paulo
Fonte: Conselho Estadual de Recursos Hídricos do estado de São Paulo.
15O principal desafio para a gestão do desenvolvimento regional está em articular esses três valores – que já se encontram presentes em diversas iniciativas do setor público do estado de São Paulo – em torno de uma agenda proativa capaz de mobilizar as forças sociais presentes no território na direção de melhores condições de vida, com equidade no acesso a educação, saúde, saneamento e segurança (o chamado “E3S”). Para tanto, um dos caminhos a ser trilhado é buscar uma distribuição mais harmônica dos equipamentos de serviços coletivos no território, o que significa orientar o desenvolvimento para uma estrutura espacial policêntrica.
16Por final, a gestão dos recursos hídricos é um caminho para uma reavaliação mais criteriosa dos serviços ambientais prestados pelos recursos ecológicos, que abarcam o solo, as florestas e a biodiversidade, dentre outros, cuja valorização progressiva representa a via mais eficaz para conquistar a sustentabilidade ambiental.
17Procede-se a seguir um com um conjunto de mapas referentes ao estado, acompanhada de uma breve descrição com o objetivo de identificar as principais tendências da evolução demográfica, econômica e social do território paulista. Tal análise é a base para os exercícios de compartimentação do estado que serão apresentados adiante.
18Uma das chaves para entender a distribuição territorial da sociedade e da economia paulistas é a distribuição da população. É fato bem reconhecido historicamente que tanto o avanço da ocupação territorial dentro do estado quanto as relações entre São Paulo e o país por meio de padrões determinados de imigrações foram aspectos fundamentais para a formação do estado.
19Com a evolução da densidade demográfica entre 1940 e 2000, observa-se no Mapa 3 que o eixo histórico de expansão demográfica a partir da capital se adensa em direção as regiões de Campinas até alcançar Ribeirão Preto e São José dos Campos, seguindo o eixo viário e econômico do estado. Nas regiões Oeste e Centro Oeste, nota-se que, com algumas exceções, os níveis de adensamento demográfico são semelhantes aos padrões verificados na década de 60 e permanecem relativamente estancados desde então, permanecendo restritos às capitais das regiões administrativas e de governo.
Mapa 3: Densidade demográfica – 1940-2000
Fonte: Fundação Seade, 2006.
20A esse padrão de distribuição territorial da população correspondeu uma forte combinação de crescimento econômico e imigração, além de taxas de natalidade relativamente altas, sobretudo até o final da década de 1980. Desde então, o estado conhece um refluxo dos movimentos migratórios e as taxas de crescimento demográfico passam a ser influenciadas por uma forte queda das taxas de natalidade. Nesse sentido, as taxas de crescimento anual da população do estado decaem de 3,6% a.a na década de 50 para 1,3% a.a. entre 2000-2010. O conjunto com a tendência da taxa geométrica de crescimento anual da população entre 1980 e 2020, exposto no Mapa 2, mostra que a evolução desta taxa tende a se arrefecer em todo o estado.
21O reflexo desse arrefecimento é um padrão de distribuição da população segundo faixas etárias com forte compartimentação regional, mas com ritmos e tendências diferenciadas de acordo com a faixa a ser observada.
22A evolução da população com mais de 60 anos para os anos 2000, 2010 e 2020, mostra que o envelhecimento da população tende a ser mais rápido nas porções do Oeste paulista. Por outro lado, no caso da população jovem, de 15-24 anos, nota-se uma clara tendência de convergência das taxas de participação dessa faixa da população nos municípios de praticamente todas as regiões do estado.
Mapa 4: Taxa geométrica de crescimento anual da população – 1980/1991, 1991/2000, 2000/2010 e 2010/2020
Fonte: Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia – IBGE; Fundação Seade.
Mapa 5: Participação da população segundo faixas etárias
Fonte: Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia – IBGE; Fundação Seade.
23Do ponto de vista da atividade econômica, o movimento da distribuição do PIB chama a atenção pela sua concentração em torno dos municípios mais populosos e industrializados do estado, que pertencem à área do complexo metropolitano expandido, como se vê no Mapa 6. Em termos regionais, essa área compreende 86% do PIB estadual em 2007. Outra forma de mostrar essa concentração é mediante a participação municipal: somente a capital de São Paulo respondeu por 35% do PIB paulista; metade da riqueza produzida no estado se concentra em apenas seis municípios; e 202 cidades são responsáveis por 95% da riqueza gerada – a apropriação dos 5% restantes é feita pelos outros 443 municípios (Fundação Seade, 2009).
24Em relação ao PIB per capita, o padrão de concentração da atividade econômica é ainda mais evidente e permite observar que, a despeito de algumas cidades que fogem da média, há padrões que permitem apontar para algumas tendências de aglomeração e compartimentações.
25A primeira área a ser destacada é o eixo de maior PIB per capita, que se estabelece a partir da capital e se expande até Campinas (eixo Anhanguera/Bandeirantes), São José dos Campos (eixo Dutra), Sorocaba (eixo Castelo Branco) e Região Metropolitana da Baixada Santista (eixo Anchieta/Imigrantes).
26De outro lado, chamam atenção as áreas relativamente deprimidas do ponto de vista econômico, nas quais se destacam os municípios do Oeste e Centro-Oeste (com exceção dos municípios-sede das respectivas regiões de governo e administrativas), as cidades litorâneas do Vale do Paraíba e uma grande área composta, grosso modo, pelos municípios das regiões de governo de Registro, Sorocaba, Itapeva, Itapetininga e Avaré.
Mapa 6: Produto Interno Bruto em porcentagem e per Capita, 2007
Fonte: Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia – IBGE; Fundação Seade.
27A distribuição do PIB per capita está relacionada à distribuição dos setores da indústria e dos serviços no território, que se concentra na macrometrópole paulista. Na indústria, apenas 10 municípios são responsáveis por 48% da atividade – todos eles se concentram nessa área e, com exceção de São José dos Campos, Campinas, Jundiaí e Sorocaba, os outros seis são da Região Metropolitana de São Paulo. No setor de serviços, a concentração é ainda mais forte: 10 municípios são responsáveis por 67% do valor adicionado, sendo que apenas Ribeirão Preto fica fora do arco metropolitano nucleado pela capital.
28No caso da atividade agropecuária, há uma compartimentação ainda mais clara. O Mapa 7 mostra um arco das regiões de Campinas, Ribeirão Preto, Barretos e São José do Rio Preto até o bloco formado pelas regiões de Avaré, Itapeva e Itapetininga.
Mapa 7: Participação dos municípios no valor adicionado da agropecuária – 2007
Fonte: Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia – IBGE; Fundação Seade.
29No que diz respeito aos indicadores sociais, optou-se aqui pela utilização do Índice Paulista de Responsabilidade Social (IPRS), da Fundação Seade. A escolha dos indicadores desse índice se justifica pela sua dimensão sintética, na qual é possível observar, além de indicadores de educação e saúde, a dimensão econômica dentro de uma mesma perspectiva metodológica.
30A figura a seguir descreve os critérios de formação dos grupos do IPRS.
Figura 1: Critérios de formação dos grupos do IPRS
Fonte: Fundação Seade. Índice Paulista de Responsabilidade Social – IPRS.
31E os dados do Mapa 8, com a distribuição dos municípios do estado segundo os grupos do IPRS, mostram aspectos importantes do padrão recente de desenvolvimento econômico-social paulista do ponto de vista territorial.
32Uma tentativa de análise por compartimentos territoriais permite observar que boa parte dos municípios que apresentam níveis elevados de riqueza (Grupos 1 e 2) se aglomeram em torno do principal eixo econômico e demográfico do estado. Nesse espaço convivem tanto municípios com bons indicadores de riqueza, saúde e educação, como aqueles que, a despeito dos elevados níveis de renda, não apresentam bons indicadores sociais.
Mapa 8: Índice Paulista de Responsabilidade Social (IPRS), 2006
Fonte: Fundação Seade. Índice Paulista de Responsabilidade Social – IPRS.
33Chama a atenção, por outro lado, nas porções a Oeste e Centro Oeste do estado, o número de municípios que se caracterizam por serem cidades que, mesmo incapazes de atingir bons indicadores de riqueza, apresentam bons indicadores sociais (Grupo 3) ou mesmo indicadores intermediários (Grupo 4). Por meio do IPRS, é possível observar um quadro complexo do estado de SP, no qual há, por exemplo, aglomerações de municípios que combinam PIB per capita deprimido com elevados indicadores de longevidade e escolaridade.
34Nesse sentido, tais áreas se diferenciam daquelas de baixa riqueza situadas nas regiões de Avaré, Itapeva e Itapetininga, nas quais se situam os municípios que apresentam maior vulnerabilidade também do ponto de vista de educação e saúde.
35A breve análise de indicadores demográficos, econômicos e sociais permite refletir sobre a dinâmica territorial recente do estado de São Paulo e pavimentam o caminho para a construção da análise multiescalar. Este instrumento abarca consigo a idéia de que a dinâmica territorial responde a forças atuantes em escalas distintas: a global, a nacional e a local (ou regional). A análise nessas três escalas, realizada ao longo desta seção, provê os fundamentos para a compartimentação territorial do estado de São Paulo.
36São Paulo destaca-se no contexto sul-americano e global como um território que apresenta elevados índices de integração e diversificação econômica. Boa parte desse desempenho se deve a estruturação de um grande adensamento urbano nas bordas do Planalto Paulista, que foi capaz de articular fluxos materiais e imateriais em distintas escalas. A metrópole paulista é, ao mesmo tempo, um relé que ativa os circuitos econômicos nacionais a partir de estímulos provenientes da economia mundial e pólo de um campo de forças que se projeta no espaço nacional dinamizando energias latentes que hoje vão alem das fronteiras nacionais e alcançam vastas extensões da América do Sul.
37Megacidade mundial, cidade-região global e grande metrópole nacional são denominações que se enquadram perfeitamente na descrição do aglomerado metropolitano de São Paulo. Megacidade mundial por suas dimensões superlativas, tanto quanto à sua população de cerca de 19,7 milhões de habitantes em 2010, quanto ao seu Produto Interno Bruto de aproximadamente US$ 225 bilhões (World Bank, 2010). No entanto, esses dois indicadores já permitem colocar o primeiro grande desafio da megalópole paulistana, pois embora esteja entre os 5 maiores aglomerados urbanos em população, ocupa a 15ª posição no que diz respeito ao PIB, superado por Cidade do México e Buenos Aires, considerando o contexto latino-americano (World Bank, 2010).
38A pobreza de grandes contingentes populacionais é um desafio comum às megacidades do Sul, conforme pode ser percebido no mapa a seguir, que expõe claramente a assimetria entre a população e o produto interno bruto nos grandes aglomerados do Leste Asiático, da África e da América do Sul. No entanto, São Paulo assume posição peculiar, pois considerando o PIB per capita, sua posição é inferior a apresentada, além dos aglomerados já mencionados, por Santiago do Chile e Rio de Janeiro, segundo os dados do Banco Mundial (World Bank, 2010).
Mapa 9: Megacidades mundiais -2006
Fonte: The World Bank, 2010.
39Enquanto integrante da rede de cidades globais (Sassen, 2001 e 2006a e Taylor, 2003), São Paulo ocupa uma posição peculiar. De um lado, é o principal centro econômico e financeiro da América do Sul, de outro se situa em posição marginal ao cinturão de cidades mundiais no hemisfério norte, estruturado principalmente por Londres, Nova Iorque e Tóquio, que comandam boa parte dos circuitos financeiros e de serviços avançados em escala global.
Mapa 10: Rede de Cidades Globais
Fonte: Foreign Affairs, 2009.
40Considerando a articulação do território paulista às correntes mercantis da economia mundial, observa-se que sua estrutura logística está apoiada diretamente no Porto de Santos, o principal “hub” de carga conteinerizada do Atlântico Sul. Em termos nacionais, Santos responde por 1 em cada 3 contêiners movimentados nos portos brasileiros e expressa a forte concentração do comércio exterior em seu hinterland.
41Da mesma maneira, os aeroportos internacionais de Guarulhos e Viracopos formam a principal plataforma logística de carga aérea internacional do Brasil, respondendo juntos por mais de 70 % do volume de mercadorias movimentadas por aviões pelo comércio exterior brasileiro. Esses grandes nós logísticos são interconectados por um sistema de rodovias que convergem para a metrópole paulistana e definem o traçado das áreas nodais do território estadual mais diretamente articuladas aos circuitos globais de mercadorias. Esse desenho pode ser observado no mapa a seguir, que expressa o volume da corrente de comércio exterior, isto é, o agregado de exportações e importações, por municípios do estado de São Paulo.
Mapa 11: Infraestrutura e correntes de comércio exterior, 2010
Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
42O porto de São Sebastião, embora seja um dos mais importantes do Brasil na movimentação de graneis, é praticamente um terminal exclusivo da Petrobrás para desembarque de óleo cru e embarque de derivados de petróleo. Sua posição na borda da Serra do Mar e nas vizinhanças da Ilhabela é, no entanto, ilustrativa das vulnerabilidades do território paulista às mudanças climáticas globais.
43As escarpas da Serra do Mar nunca foram um obstáculo efetivo à ocupação do território paulista, no entanto as fortes pendentes dificultaram o uso agropecuário de suas vertentes. Por esse motivo, hoje formam os mais extensos remanescentes de Mata Atlântica disponíveis no território estadual e abrigo primordial de biodiversidade para os seres vivos que os integram, já que pouco restou da cobertura vegetal original das terras do planalto, dizimada pela “onda verde” das plantações de café. A observação do mapa 12 mostra que essa área presta um serviço ambiental primordial para economia e sociedade paulistas, na medida em que as principais fontes de água superficial têm suas origens nas encostas florestadas da Serra do Mar. Biodiversidade, água superficial, moderação térmica, estabilidade de encostas são serviços ambientais indispensáveis para a manutenção da vida e sua reprodução. Mais do que isto, considerando a gravidade das previsões futuras acerca do comportamento do clima, sua manutenção e ampliação é um desafio decisivo para a sustentabilidade.
Mapa 12: Área Urbanizada, remanescentes florestais e água superficial, 2008
Fonte: Atlas dos remanescentes florestais da Mata Atlântica, 2008.
44Combinando esses dois aspectos é possível traçar um esboço de uma compartimentação territorial de São Paulo, que, além de refletir as lógicas da competitividade e da sustentabilidade, colocam um desafio importante para o planejamento regional no sentido de promover a coesão territorial e a policentralidade, já que mantidas sob a dinâmica das forças de mercado tendem a agravar a concentração econômica, a desigualdade social e a deterioração das condições ambientais.
Mapa 13: São Paulo: cidade-região global
Elaboração dos autores.
45Grosso modo, considerando os cartogramas anteriores, pode-se fazer a leitura do território paulista sob a ótica global como uma cidade-região policêntrica e diversificada nucleada pela Macrometrópole que, a partir da capital, se estende para o Norte até o entorno de Campinas, interligando as respectivas áreas metropolitanas, para o Sul em direção a Santos, também estabelecendo a conexão com a Região Metropolitana da Baixada Santista. Para Oeste, Sorocaba e para o Leste São José dos Campos, núcleo central do eixo do Vale do Paraíba que avança em direção ao Rio de Janeiro.
46A partir da Macrometrópole se abre a Dorsal Paulista, termo cunhado por Hervé Thery (2006), inspirado na Dorsal européia, onde se situam as principais áreas nodais diretamente vinculadas à economia mundial, como São Paulo, Campinas, São Bernardo do Campo, Santos, Ribeirão Preto dentre outras.
47As dimensões de São Paulo na economia e na sociedade brasileiras conferem ao seu território um papel decisivo na estruturação do espaço nacional. Para compreender melhor essa dimensão, foram consideradas duas regionalizações recentes que espelham a dinâmica territorial e refletem a importância de seus centros de gestão na escala nacional. São elas: o “Estudo da Dimensão Territorial para o Planejamento”, realizado pelo CEDEPLAR para o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (2008), e as “Regiões de Influência das Cidades” – 2007, desenvolvida pelo Departamento de Geografia do IBGE.
48O “Estudo da Dimensão Territorial para o Planejamento” apresenta propostas que subsidiam a abordagem da dimensão territorial no planejamento nacional. Em seu módulo III, que trata das Regiões de Referência, foi construída uma proposta de regionalização em duas escalas (macrorregional e sub-regional) para o território brasileiro, o que permitiu subsidiar a escolha e localização de projetos de investimentos, bem como a articulação de políticas públicas.
49Foram considerados critérios econômicos, ambientais e sociopolíticos na definição das regiões, que têm em conta o papel desempenhado pelas cidades na organização do território, e considerada a força de polarização em sua área de influência.
50A regionalização teve por base a Divisão do Brasil em Microrregiões Geográficas realizada pelo IBGE e não respeitou os limites das unidades federativas, conforme pode ser observado no mapa 14. A Macrorregião de São Paulo incorpora várias microrregiões geográficas do Sul de Minas Gerais e cede a microrregião de Bananal para a sub-região de Volta Redonda, que pertence à Macrorregião do Rio de Janeiro.
Mapa 14: Estudo para a dimensão territorial do planejamento – Sub-regiões do estado de São Paulo
Fonte: Brasil/MPOG, 2008.
51Com base na metodologia definida pelo CEDEPLAR, que teve como ponto de partida um modelo gravitacional para estabelecer a hierarquia dos centros urbanos brasileiros, por meio da comparação dos seus índices de terceirização, os autores calcularam um Índice de Interação entre esses centros e as demais localidades geográficas, resultando em um conjunto de 118 sub-regiões, do qual 13 delas foram agrupadas na Macrorregião de São Paulo. São elas: Araçatuba, Bauru, Campinas, Itapetininga, Marília, Pouso Alegre, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, Sorocaba, São José dos Campos, São José do Rio Preto, São Paulo e Varginha.
52O estudo mostra que, apesar do território paulista apresentar uma elevada densidade econômica, ainda está muito distante de possuir uma estrutura policêntrica estabilizada, pois sua configuração espacial reflete distintos graus de nodalidade. Da mesma maneira, a coesão territorial é pouco consolidada, com disparidades flagrantes nos indicadores sociais apresentados por suas regiões. A mera observação do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social já deixa clara esta situação, com o flagrante desnível entre a Dorsal Paulista e o centro-sul do estado.
53A regionalização na escala nacional traz novas questões para a gestão do desenvolvimento regional do território paulista, não apenas quanto às suas dimensões internas, mas principalmente nas trocas materiais e imateriais que se estabelecem para além de seus limites territoriais. De um lado, há um prolongamento das atividades econômicas, como o cultivo de cana-de-açúcar e produção de açúcar e álcool para o Triângulo Mineiro e Mato Grosso do Sul. De outro, há projeções funcionais de centros dinâmicos como Maringá e Londrina sobre a porção meridional do estado.
54A atualização das Regiões de Influência das Cidades (REGIC) retoma a concepção utilizada nos primeiros estudos realizados no IBGE, que resultaram na Divisão do Brasil em regiões funcionais urbanas, de 1972, ou seja, estabelece inicialmente uma classificação dos centros e, a seguir, delimita suas áreas de atuação. Na atual versão, foi privilegiada a função de gestão do território dos centros urbanos.
55Os resultados mostram que São Paulo, grande metrópole nacional, tem projeção em todo o País, a rede urbana paulista é núcleo denso desse sistema, cujas ramificações se estendem além das fronteiras estaduais, incorporando parte do Triângulo Mineiro e do sul de Minas Gerais, estendendo-se a oeste pelos estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rondônia e Acre.
56O estudo mostra que a distribuição espacial das sedes das grandes empresas do país acompanha, em linhas gerais, a dinâmica econômica do país. O estado de São Paulo é aquele com maior concentração de grandes empresas. Das 1.124 maiores empresas, 470 se localizam no estado, com destaque para São Paulo (365) e Campinas (30).
57Apresentando uma rede de cidades com alta densidade, topologia diferenciada e uma estrutura hierárquica consolidada, a Região de Influência de São Paulo concentra cerca de 28,0% da população brasileira e 40,5% do Produto Interno Bruto - PIB de 2005. A alta concentração/primazia se reflete no PIB per capita, que é de R$ 21,6 mil para São Paulo, e R$ 14,2 mil para os demais municípios do conjunto. Seu dinamismo projeta-se sobre o território nacional, embora sua área de influência direta tenda a se reduzir pela emergência de novos centros regionais nas franjas do território sob sua influência.
58A leitura do território paulista sob a ótica global e nacional, aliada a dinâmica espacial a nível regional, contribuem para diferenciar os compartimentos territoriais do estado segundo as diretrizes estratégicas de coesão territorial, policentralidade e sustentabilidade. Exploradas as escalas global e nacional, conduziremos, a partir de agora, um exercício de compartimentação intra-estadual para trabalhar a escala regional de análise.
59Os cartogramas a seguir (Mapa 15) apresentam a concentração e a dispersão dos seguintes índices e indicadores: IPRS, PIB, PIB per capita, rodovias e atividade agrícola (cultivos de cana-de-açúcar e laranja e de batata e feijão), que contribuíram para diferenciar o território. Alguns desses dados foram expostos anteriormente, mas, vistos lado a lado, deixam mais claros os padrões territoriais existentes no estado.
Mapa 15: Padrões espaciais do estado
Fonte: Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia – IBGE; Fundação SEADE.
60Recuperando a análise realizada, podemos destacar as concentrações espaciais da atividade econômica, refletida pelas representações do PIB e PIB per capita, contidas, sobretudo na Macrometrópole, que vai do Vale do Paraíba até as 3 regiões metropolitanas, e segue um pouco mais ao norte de Campinas. Contudo outros grupos se destacam como o entorno de Ribeirão Preto e, por sua fragilidade, o Vale do Ribeira no entorno de Registro e ao norte parte da Serra do Mar.
61Em relação à produção agrícola, podemos notar a grande área de produção de cana-de-açúcar e laranja ao norte (e já presente no oeste), e concentração da produção de batata e feijão, alimentos voltados ao consumo interno, no entorno de Itapetininga e Avaré. O mapa do IPRS nos apresenta uma espécie de “L” que vai de Barretos até Santos (norte-sul) e segue até o Vale do Paraíba, formando um conjunto de municípios que apresentam os melhores indicadores de riqueza, longevidade e educação.
62Outro passo necessário é a observação da malha rodoviária do estado, que explicita bem as ligações entre capital, litoral e interior, assim como as ligações com outros estados. Essa malha é a principal infraestrutura de circulação de pessoas e mercadorias do estado, exercendo importante função como eixos estruturantes em todo o seu sistema econômico e social.
63O Mapa 16 contém uma articulação entre os principais eixos rodoviários do estado e as principais nodalidades, isto é, os centros regionais definidos pela REGIC, representando assim, a principal rede de circulação e seus nós. A existência de uma rede urbana consolidada e policêntrica são fundamentais para o desenvolvimento regional mais coeso, e, nesse sentido, uma infraestrutura eficiente é decisiva.
Mapa 16: Centralidades e eixos
Fonte: Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia – IBGE; Secretaria Estadual dos Transportes.
64A transformação constante e acelerada das regiões e de sua diversidade é um fator que dificulta os estudos de regionalização e desafia os métodos existentes. Para lidar com tal desafio, nos inspiramos em métodos reconhecidos internacionalmente, como o da nova geografia regional francesa, e no trabalho realizado por Théry (2006) sobre o estado de São Paulo.
65Apresentamos os componentes que constituem o exercício de compartimentação do estado no Mapa 17, composto por cinco representações cartográficas assim descritas: mapa das três regiões metropolitanas definidas por lei estadual; mapa da macrometrópole criado por estudos socioeconômicos desenvolvidos pela Emplasa; os principais eixos rodoviários; as principais nodalidades classificadas pela REGIC (2007); corredor da biodiversidade (também conhecido como corredor da Serra do Mar).
Mapa 17: Componentes constitutivos da compartimentação
Fonte: Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia – IBGE; Secretaria Estadual dos Transportes.
66Utilizando como diretriz os conceitos de policentralidade, coesão territorial e sustentabilidade, foram definidos 9 macro compartimentos para o estado de São Paulo, procurando representar os principais processos espaciais que moldam a configuração territorial do estado, especialmente a Macrometrópole e os eixos estruturantes que dela partem. Como se vê no Mapa 18, esses compartimentos são: Core Metropolitano, Dorsal Sul, Dorsal Norte, Vale do Paraíba, Litoral, Borda Meridional, Borda Setentrional, Noroeste e Pontal do Paranapanema.
Mapa 18: Compartimentos do Estado de São Paulo
Elaboração dos autores.
67Em um modelo espacial simplificado, o Core Metropolitano representa um nódulo planetário, em torno do qual gravitam quatro grandes nódulos satélites: Campinas, Santos, São José dos Campos e Sorocaba. Assim a macrometrópole é a estrutura espacial que articula 4 compartimentos territoriais do estado de São Paulo, a saber: a Dorsal Sul, o Litoral, o Vale do Paraíba e a Borda Meridional.
68A Dorsal Paulista, tal como descrita por Thery (2006), foi dividida em dois compartimentos: Dorsal Sul e Norte. A principal diferença entre elas é o grau de concentração de nodalidades ao longo dos principais eixos estruturantes do estado.
69Paralelamente à Dorsal, também dividida em dois compartimentos, setentrional e meridional, temos a Borda. A noção de borda tem um sentido polissêmico no estado de São Paulo. É tanto borda dos Planaltos Ocidental e o Atlântico, como borda entre a Mata Atlântica e os Campos Cerrados e, na concepção utilizada nesse trabalho, como borda da própria dorsal paulista. Trata-se de compartimentos que ainda estão em processo de consolidação, com áreas nodais relativamente isoladas uma das outras.
70O Litoral é o compartimento marcado pelo Corredor de Biodiversidade da Mata Atlântica e pela concentração de atividades industriais nas proximidades do complexo portuário de Santos e do terminal de São Sebastião. O Vale do Paraíba é, segundo vários autores (ver Rezende e Lima, 1999), o vetor de união entre as cidades mundiais de São Paulo e Rio de Janeiro, onde inclusive a projeção da área de influência de Volta Redonda (RJ) se faz presente em território paulista, conforme está descrito na REGIC (IBGE, 2008).
71No Oeste do estado temos dois compartimentos: o Noroeste e o Pontal do Parapanema, cuja estruturação espacial ainda denota fragilidade. Com áreas nodais bastante distantes entre si e com ainda reduzida capacidade indutora de mudanças.
72Com o intuito de mostrar a importância da análise prospectiva para a compreensão da dinâmica dos processos territoriais e de sua importância para a gestão pública do desenvolvimento regional, serão elaborados alguns esquemas simples para visualizar tais dinâmicas e facilitar a tomada de decisão quanto ao futuro que pretendemos colaborar em sua construção.
73Com base nos compartimentos definidos anteriormente, foram construídas 3 visões territoriais de futuro, explorando algumas tendências espaciais focadas nos princípios de coesão territorial, policentralidade e sustentabilidade.
74A distribuição da população e dos aglomerados urbanos no território estadual permite construir um modelo simplificado dos padrões de sua ocupação e das tendências principais de seu futuro. Para tanto, basta imaginar uma diagonal que atravesse o território paulista de sudoeste para nordeste, conforme pode ser vista no Mapa 19. É flagrante que temos duas situações territoriais completamente distintas. De um lado, o conjunto formado pelos compartimentos do Core Metropolitano, do Litoral, do Vale do Paraíba, a Dorsal Sul e a Borda Meridional, que representam menos da metade do território estadual (43%) e concentram cerca de 80% da população e 86% do PIB estadual. Há de se considerar também a grande concentração urbana ancorada pela Macrometrópole, que diferencia radicalmente essa região da porção ao norte da diagonal, que apresenta áreas nodais dispersas e pouco articuladas.
Mapa 19: A Diagonal Paulista
Fonte: Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia – IBGE, 2010. Elaboração dos autores.
75Essa distribuição territorial assimétrica permite colocar algumas indagações quanto ao futuro do território paulista. A primeira delas é sobre as relações que se estabelecem entre estruturas espaciais, ao mesmo tempo, tão próximas e tão díspares do ponto de vista territorial. São relações de dependência ou complementaridade e como afetam a vida dos seus habitantes.
76Para construir um território policêntrico, com coesão territorial e sustentabilidade ambiental é necessário que se pense nas formas possíveis de se evitar que a diagonal continue a dividir o território paulista em duas partes tão distintas. É necessário também refletir sobre qual o padrão espacial que se deseja para o futuro: baseado na expansão contínua da Macrometrópole ou uma numa estrutura mais difusa e diversificada com áreas nodais dispersas e articuladas no território estadual.
77Compreender que as porções “norte” e “sul” definidas pela diagonal paulista são partes de um mesmo processo espacial, como verso e reverso da mesma moeda, implica em que a construção da agenda regional não pode ignorar essas diferenças, ao contrário, deve considerá-las como vantagens a serem exploradas no sentido da promoção do desenvolvimento regional com coesão territorial.
78Mudanças na mobilidade espacial se manifestam principalmente através do crescimento e diversificação da rede de cidades. Os resultados preliminares do Censo Demográfico de 2010, mostram que as grandes metrópoles tenderam a estabilizar o seu crescimento, enquanto cidades médias passaram a ser as novas áreas nodais para a difusão de mudanças no território.
79A noção de “efeito de borda” é muito usada em ecologia para expressar as alterações na estrutura e na composição fisionômica nas margens do ecossistema. No caso em questão (Mapa 20), o arco das cidades médias pode ser visto como estímulo ao desenvolvimento de cidades desse porte a partir da Dorsal no território da Borda, o que traz implicações para as políticas de desenvolvimento regional, já que a emergências dessas áreas nodais pode se transformar em vetores de desenvolvimento territorial policêntrico.
Mapa 20: Arco das cidades médias na borda do Core Metropolitano
Fonte: Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia – IBGE, 2010. Elaboração dos autores.
80A expansão das cidades médias representa uma nova tendência demográfica que desloca o centro das atenções das grandes aglomerações e abre novos desafios para as políticas de desenvolvimento regional. Novos valores de vida urbana estão sendo construídos e novas demandas por serviços coletivos estão se apresentando em cidades que podem planejar seu crescimento de modo a valorizar a sustentabilidade ambiental e a qualidade de vida.
81A possibilidade de favorecer a emergência de uma estrutura urbana policêntrica a partir da dinâmica territorial espontânea deve ser considerada como uma alternativa para favorecer a coesão territorial no interior paulista, considerando o “efeito de borda” que apresentam diante da concentração espacial na Macrometrópole e na Dorsal Sul.
82A Macrometrópole paulista se estende do litoral de Santos até o Planalto Atlântico ao norte de Campinas. Essa grande mancha urbana é atravessada por um extenso corredor de florestas de encostas que ocupa boa parte do território do compartimento Litoral.
O litoral não é apenas a mais importante reserva florestal do estado. É também um mosaico de mangues, restingas e áreas inundáveis onde vivem as populações caiçaras, que dependem diretamente de sua capacidade de suporte para manter-se como grupos sociais coesos.
Mapa 21: O cinturão litorâneo
Fonte: Atlas dos remanescentes florestais da Mata Atlântica, 2008. Elaboração dos autores.
83Uma política territorial que vise preservar e ampliar os remanescentes florestais de Mata Atlântica é fundamental para a manutenção da biodiversidade, a estabilização das encostas e a recarga dos mananciais. Da mesma maneira, os manguezais da zona costeira têm um papel fundamental na manutenção da produtividade primária dos estuários costeiros, fonte de alimentos e trabalho para as populações caiçaras.
84A valorização da sustentabilidade ambiental deverá considerar os remanescentes florestais como patrimônio fundamental da sociedade paulista, com implicações para todos os compartimentos territoriais do estado. Mecanismos tributários compensatórios e estímulos financeiros devem ser considerados seja para garantir a preservação do Corredor de Biodiversidade que atravessa a Borda Meridional, o Litoral, o Core Metropolitano e o Vale do Paraíba; seja para promover a regeneração das áreas de preservação ambiental em compartimentos fortemente impactados pelo desflorestamento como o Pontal do Paranapanema e o Noroeste.
85Os esquemas de compartimentação aqui apresentados resultam, então, de uma tentativa de construir instrumentos de política territorial voltados para uma perspectiva de futuro a partir das tendências que se apresentam na década de 2000. Eles não devem ser entendidos como uma “síntese regional” a partir das divisões territoriais existentes, nem como construções típicas baseadas nas premissas do pensamento da geografia tradicional – ainda que sua definição possa se apoiar em parte do repertório de técnicas de regionalização clássicas.
86A definição dos indicadores para análises prospectivas e representação cartográfica permitiu uma avaliação no nível de cada unidade territorial definida no estudo. O estado foi compartimentado em áreas nas quais se integram processos de ordem histórica, geográfica, demográfica, econômica e social, bem como a base físico-territorial quando essa se mostrasse fator de identidade crucial para determinados objetivos de planificação.
87A leitura do território paulista elaborada aqui está relativamente pouco embasada nos critérios de regionalização tradicionais e largamente utilizados nos estudos do gênero. Dentro de uma perspectiva que se poderia chamar de mais “heterodoxa”, uma junção de critérios permitiu que o território fosse compartimentado segundo uma perspectiva que ora privilegiou elementos de interação funcional entre centros urbanos dentro da rede urbana paulista, em conjunção com os vetores de crescimento econômico e demográfico; ora observou as conformações físico-territoriais, mesmo que essas recortassem várias centralidades.
88No primeiro caso, o Complexo Metropolitano e a Dorsal Paulista (norte e sul) mostram como forças polarizadoras de três áreas metropolitanas – sendo uma delas de classe mundial – são capazes de capitalizar a maior parte da riqueza gerada no território estadual, a partir da renda gerada pelo setor de serviços, pela indústria e pela agrocopecuária. Seguindo as tendências históricas do desenvolvimento do Estado, essas áreas mostram um aprofundamento dos seus domínios em direção ao Norte, o que reconfigura a chamada Região Administrativa de São José do Rio Preto, que passa a compartilhar tanto as características produtivas e demográficas da chamada Diagonal Norte, quanto as do compartimento Noroeste (área nucleada pela centralidade do município de Araçatuba).
89De outro lado, o desenho do compartimento Litoral, é orientado a partir de questões críticas ligadas à sustentabilidade ambiental, em função do aporte de serviços ambientais que essa área propicia em termos de biodiversidade e recursos hídricos, e dos impactos urbanos geograficamente localizados da exploração do pré-sal, em perspectiva de curto e médio prazo.
90O estudo apresenta, portanto, uma forma diferente de olhar o território paulista, baseada em uma análise multiescalar, e busca, assim, subsidiar com novas informações o planejamento territorial do estado de São Paulo.