1O óleo de palma, historicamente denominado dendê, não tem uso restrito a confecção de pratos da culinária originária de outras colônias portuguesas na África e Ásia, tal o caso do vatapá, caruru, acarajé, bobó, xinxim (Cascudo, 2011). O uso do óleo de dendê apresenta ampla utilização, seja nas frituras industriais, margarinas, massas e biscoitos, chocolates e sorvetes, cosméticos, sabão, sabonetes e detergentes e biodiesel (Bentes & Homma 2016; Corley & Tinker 2016).
2A produção mundial de óleo de dendê vem crescendo a um ritmo de cerca de 6% ao ano, tomando-se os dados dos últimos dez anos. E consolidando um processo de concentração da produção no sudeste da Ásia, notadamente Indonésia (~60% da produção mundial), Malásia (~23% da produção mundial) e Tailândia (3,74% da produção mundial) (FAOSTAT, 2022). Sendo que a concentração histórica anterior (até 1978) da produção de óleo de dendê ocorria na África, em especial Nigéria, República Democrática do Congo, Camarões, Gana, Costa do Marfim, Guiné e Benin, entretanto a África representa cerca de 5% da produção mundial (Figura 1). Outra guinada histórica está relacionada com a ultrapassagem da produção de óleo de dendê em relativizando a produção de soja em óleo a partir de 2006. Em termos mundiais, o dendezeiro com apenas 1/6 da área de soja consegue produzir quase uma vez e um quarto mais óleo de dendê do que a soja (Bentes & Homma, 2016).
Figura 1 Produção mundial de óleo de dendê, ao longo da série histórica (1962-2020), em função dos principais produtores.
Fonte: FAOSTAT (2022)
3Se na antiguidade, o óleo de oliva exerceu uma marcante influência sobre o crescimento socioeconômico das sociedades que se desenvolveram às margens do Mediterrâneo. Na era moderna, o óleo de palma tem sido um fator preponderante para o salto qualitativo e o avanço tecnológico dos países localizados no sudeste asiático, com destaque para a Indonésia, Malásia e Tailândia (FAOSTAT, 2022).
4Os governos destes três países ao decidirem pelo cultivo do dendê os governos destes três países e atribuírem um caráter de destacada prioridade en seu planejamento estratégico, relacionado ao agronegócio, surpreenderam o mundo ao implantarem, no curto período de aproximadamente quatro décadas, cerca de 17 milhões hectares de palma de óleo e tornarem-se os maiores fornecedores de óleo vegetal do planeta. Com essa iniciativa contribuíram para a oferta de um importante componente da dieta alimentar da humanidade e possibilitaram uma marcante melhoria da qualidade de vida de seus habitantes, via inclusão econômica.
5Não obstante os méritos dessa política, em priorizar o desenvolvimento socioeconômico e bem-estar aos seus cidadãos, os custos ambientais relacionados à perda de diversidade biológica nestes países, cujas severas consequências ligadas à extinção de inestimáveis espécies vegetais e animais de sua biota, com reflexos envolvendo o discutido aquecimento global, resultante da excessiva liberação de gás carbônico, e seu consequente efeito estufa, despertaram uma firme reação das comunidades internacionais ligadas à defesa do meio ambiente (Fitzherbert et al., 2008).
6Ao se posicionarem contrárias ao uso insustentável dos recursos naturais, cuja consequência exerce papel fundamental no desequilíbrio ambiental do planeta, esses grupos lançaram um contundente sinal de alerta máximo às diversas cadeias produtivas ligadas ao agronegócio das grandes commodities, inclusive a da palma africana, cujas áreas adequadas ao seu cultivo localizam-se nos países em desenvolvimento, em cujas regiões tropicais estão localizadas as últimas reservas de florestas nativas. (Gerasimchuk et Yam Koh, 2013).
7Atualmente, o Brasil ocupa a sétima posição quanto a produção mundial de óleo de dendê, o que corresponde a 0,68% da produção mundial. Nas Américas, Colômbia (1,71% da produção mundial) e Guatemala (0,69% da produção mundial) apresentam produção superior ou equivalente ao Brasil. Enquanto que Equador (0,58% da produção mundial) e Honduras (0,56% da produção mundial) apresentam menor contribuição a produção mundial (FAOSTAT, 2022).
8Avaliando-se o caso do Brasil, o estado do Pará, desde o início dos registros de produção (ano de 1988), sempre teve contribuição expressiva na produção de óleo de dendê. Tanto que já no início dos registros o Pará já representava cerca de 50% da produção nacional. Atualmente, o Pará com uma produção de 2,8 milhões de toneladas produzidas representa cerca de 99% da produção nacional, considerando-se os dados do IBGE para o ano de 2020 (IBGE 2022) (Figura 2).
9Destaque é o crescimento dos plantios de dendezeiros híbridos interespecíficos (HIE) procedentes do cruzamento do caiauê (Elaies oleifera – femenina) x dendezeiro africano (Elaies guineensis – masculino) a partir da década de 2010 (Homma 2016a). Este híbrido foi desenvolvido pelo pesquisador George O’Neill Addison (1916-1967), do Instituto Agronômico do Norte (IAN), na década de 1950, visando desenvolver um dendezeiro apto para áreas de várzeas. No momento em que se discute sobre bioeconomiaa e biodiversidade amazônica, o HIE só foi encontrar sucesso mais de seis décadas depois (Bentes & Homma 2016; Homma 2016a, 2022; Homma et al. 2016; Menezes et al. 2017; Santos et al. 2016).
Figura 2 Produção nacional de frutos de dendezeiro (milhões de toneladas)
Contraste da proporção da produção nacional (%) entre o estado do Pará e os outros estados brasileiros
10A produção no Pará é representada de modo predominante na forma plantios homogêneos (plantations) empresariais, entretanto outras formas de plantios começam a ter mais expressão, seja o caso de pequenos produtores associados ou não a empreendimentos empresariais (Mota, Mourão Junior et Schmitz, 2019; Mota et al., 2019), os quais em muitos dos casos tem optado pela formato de sistemas agroflorestais, que consorciam outras espécies perenes como no caso do cacau (Theobroma cacao) e açaí (Euterpe oleraceae).
11Esta cadeia produtiva tem excelentes possibilidades de tornar-se uma muito boa alternativa socioeconômica para importantes estados brasileiros que, apesar de disporem de elevadas quantidades de florestas nativas muito bem protegidas, dispõem de expressiva quantidade de áreas alteradas, em grande parte abandonadas ou subutilizadas. No Estado do Pará, o cultivo da palma de óleo vem desempenhando um papel de destaque como geradora de emprego e renda para os produtores rurais, em especial os pequenos produtores, com reflexos benéficos expressivos (Bentes & Homma 2016; Homma 2016b; Menezes et al. 2017; Santos et al. 2016).
12Neste trabalho é apresentada uma trajetória geohistórica do cultivo da palma de óleo no estado do Pará. Evidenciando-se a importância da cadeia produtiva dessa cultura, a relevância de seu papel como geradora de riqueza e viabilizadora de emprego e renda por meio da ocupação de áreas ociosas. É destacado seu importante papel como sequestradora de carbono e, por meio de uma integração harmônica entre os atores envolvidos, possibilitar a inclusão socioeconômica de pequenos produtores e, lançando mão de uma exequível plataforma de sustentabilidade, contribuir para mitigar as causas do efeito estufa e suas consequências.
13Tomando-se como a base de dados de produção agrícola municipal (PAM) relativa ao período de 1990-2020(IBGE 2022) foram avaliados períodos quinqueniais pré-estabelecidos, levando-se em consideração o (i) percentual máximo de produção municipal (dominância), (ii) o número total de municípios que exercem ou exploram uma determinada cadeia (representatividade) e (iii) o número de municípios assinalados nos postos percentis 25%, 30%, 40%, 50%, 60%, 70% e 80% foram registrados (contribuição significativa). Afim de obter-se uma classificação global, adotou-se o limiar máximo de 80% como expressão da contribuição significativa.
14Evidenciado-se as fases na cadeia, compostas de um ou mais períodos quinqueniais, os aferidores de dominância, representatividade e contribuição significativa foram obtidos em cada um dos anos constituintes dessas fases, expressas sob a forma de seus valores médios, mínimos e máximos.
15A ocorrência de municípios nessas fases, permitiu estabelecer trajetórias a partir dos padrões de contribuição significativa (PCS), constando da expressão da produção dos municípios que contemplavam cerca de 80% (posto percentil, rank, P(80%)) da produção total do estado em uma dada cadeia, apresentaram cinco padrões, a saber: “estável” – o município apresentava contribuição significativa em todas as fases evidenciadas; “recente” - o município apresentou contribuição significativa somente nas fases mais recentes; “esporádico” - o município apresentou contribuição significativa em alguma das fases, mas sem qualquer orientação ou continuidade; “anterior” - o município apresentou contribuição significativa somente nas fases iniciais; “não significativa” - o município não apresentou contribuição significativa em nenhuma das fases. A ocorrência dos municípios nas fases evidenciadas foi sumarizada por meio de um diagrama de Venn, a partir do qual foram definidos o número de municípios nas referidas trajetórias.
16Uma síntese da “expressão horizontal” da produção de óleo de dendê considerando o nível mesorregional, ou mesmo microrregional foi proposta. Sendo que essa síntese se ampara na aplicação de uma estrutura orbital genérica: pólo (POL) » sub-pólo (SUB) » satélite (SAT) na classificação desses níveis supramunicipais (microrregião, mesorregião). Para definição dessa estrutura foram adotados os seguintes limiares: (POL)≥ 20% da produção; 20%>(SUB)≥10%; 10%>(SAT)≥2%, no caso de valores inferiores a 2%, considerou-se que a expresão da cadeia na unidade não apresentou destaque.
17Aplicou-se a classificação trajetórias municipais aos valores de produção mais recente (2020), afim de definir sua “expressão vertical” nos processos de territorialidade (Torre 2014), avaliando-se o grau de estabilidade ou de expansão. Adotou-se como critério de estabilidade, a ocorrência de pelo menos 5% da produção contida nesse padrão, enquanto que com relação a expansão, limiares foram adotados, sendo considerado: expansão leve (EXP) ≥2% da produção, expansão moderada (EXP1+) ≥10% da produção, expansão forte (EXP2+) ≥20% da produção e expansão muito forte (EXP3+) ≥30% da produção.
18A representatividade da produção de óleo de dendê, ao longo da série, oscilou entre 14 e 29 municípios, o que representa entre 10-20% dos municípios do estado do Pará. Já a dominância, ao longo da série, oscilou entre cerca de 25-50% de concentração em um único município (Figura 3). Quanto a concentração da produção em um conjunto de municípios a oscilação, modo geral, foi bastante baixa. Seja nos percentis P(25%), P(30%), P(40%): 1-2 municípios; P(50%), P(60%), P(70%): 2-5 municípios; e mesmo no caso de percentias mais elevados P(80%): 4-6 municípios. O que denota uma elevada concentração da produção em um menor número de municípios. Mesmo com o contínuo aumento da representatividade ao longo da série histórica (Figura 3).
Figura 3 Número de municípios produtores de dendezeiro e percentual máximo de produção municipal em cada ano da série histórica
Fonte: (IBGE 2022)
19Avaliando-se o comportante das curvas, foi possível sugerir a ocorrência de três fases, tais sejam:
Fase 0 - Compreendendo os períodos anteriores a 1990, devido a ausência de dados nas bases IBGE (as quais tem início de registro em 1988) em escala municipal, não foi possível uma representação espacial adequada desse período. Segundo Homma (2016b), duas fases são evidenciadas: (i) “Fase Denpasa, Codenpa, Coopama, Camta” e (ii) “Fase Denpasa, Agromendes, Dentauá, Denam, Reasa, Crai, Palmasa, Aproden, Emade, Codepa”, tal como evidenciada na linha do tempo em Figura 5
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“Experimentação”- Nesse período constam as primeiras iniciativas de produção, compostas inclusive por ensaios financiados por governos e uma forte política de subsídios.
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Assevera-se a concentração de cultivos incialmente nas bordas da Região Metropolitana de Belém e início da migração a novas áreas de refúgio foram empreendidas durante esse período.
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Fase I - Compreendendo os anos de 1990-2001, apresenta como característica uma representatividade de 13-18 municípios, com uma dominância municipal de 31,3-46,9% (Figura 3). A mesorregião [NE] apresentou uma média de 72% da produção do estado e a mesorregião [MET] uma média de 28% da produção do estado. Sendo registrados os municípios de: [NE-TOM] - Tailândia (31,3-46,9%), [NE-TOM] - Moju (3,9-23,4%), [NE-TOM] - Acará (6,6-19,4%), [MET-BEL] - Santa Bárbara do Pará (4,6-12,2%), [MET-CAS] - Santo Antônio do Tauá (6,6-9,7%), [MET-BEL] - Benevides (2,3-16,1%), [MET-CAS] - Santa Izabel do Pará (3-9,7%), [NE-BRG] - Igarapé-Açu (0,3-6,1%), [MET-CAS] - Castanhal (0,7-9,3%), [NE-GUA] - Ipixuna do Pará (0-4,8%), [NE-SAL] - Vigia (0,6-0,9%), [NE-TOM] - Tomé-Açu (0,1-1,2%), [NE-BRG] - São Francisco do Pará (0,2-0,9%), [NE-SAL] - Maracanã (0,3-0,3%), [MET-CAS] - Bujaru (0,1-0,5%), [NE-BRG] - Santa Maria do Pará (0,01-0,1%), [NE-GUA] - São Domingos do Capim (0,01-0,1%), [MET-CAS] - Inhangapi (0,01-0,01%), [NE-GUA] - Santa Luzia do Pará (0,01-0,1%), [NE-GUA] - Ourém (0,01-0,1%).
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“Decana” Essa fase compreende parcialmente a “Fase Agropalma, Denpasa, CRA, Coacará, Caiuaué, Marborges, Yossam, Palmasa” apontada por (Homma 2016b) (Figura 5).
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E representa o início da concentração da produção na micrregião [NE-TOM] e redução nas microrregiões [MET-BEL] e [MET-CAS], outras microrregiões despontam, mas ainda com pequena expressão, como o caso de [NE-BRG] (Figura 4).
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Fase II - Assinalada no período de 2002-2009, apresenta como característica um pequeno aumento na representatividade de 16-18 municípios, e manutenção da dominância municipal de 32,8-49,7% (Figura 3). A mesorregião [NE] ampliou sua expressão englobando uma média de 85% da produção do estado e a mesorregião [MET] uma média de 15% da produção do estado. Os municípios seguintes municípios apresentaram registro: [NE-TOM] - Tailândia (32,8-49,7%), [NE-TOM] - Acará (13,4-20,9%), [NE-TOM] - Moju (6,6-18,5%), [MET-BEL] - Santa Bárbara do Pará (4,9-9,2%), [NE-BRG] - Igarapé-Açu (4,1-5,1%), [NE-BRG] - Bonito (2,3-7%), [MET-CAS] - Santo Antônio do Tauá (0,8-4,8%), [MET-CAS] - Castanhal (2,6-4,9%), [NE-TOM] - Tomé-Açu (0,8-4,4%), [MET-CAS] - Santa Izabel do Pará (1,2-3,2%), [NE-TOM] - Concórdia do Pará (0,7-1%), [NE-SAL] - Vigia (0,2-0,6%), [MET-CAS] - Bujaru (0,3-0,5%), [NE-BRG] - São Francisco do Pará (0,3-0,5%), [NE-SAL] - Maracanã (0,1-0,3%), [NE-BRG] - Nova Timboteua (0,1-0,2%), [NE-BRG] - Santa Maria do Pará (0,02-0,6%), [NE-GUA] - Santa Luzia do Pará (0,03-0,04%), [MET-CAS] - Inhangapi (0,02-0,04%).
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“Consolidação” - Essa fase também compreende parcialmente a “Fase Agropalma, Denpasa, CRA, Coacará, Caiuaué, Marborges, Yossam, Palmasa” apontada por (Homma 2016b) (Figura 5).
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Sendo consolidado o pólo produtivo na microrregião [NE-TOM] e de redução de produção nas microrregiões da metropolitana, sendo parcialmente ocupados pela emergente microrregião [NE-GUA] (Figura 4).
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Fase III - Correspondente aos anos de 2010-2020, apresenta como característica um expressivo aumento na representatividade de 18-29 municípios, aliada a uma redução na dominância municipal de 24,8-43,8% (Figura 3). A mesorregião [NE] apresentou uma média de 94% da produção do estado e a mesorregião [MET] uma média de 6% da produção do estado, reafirmando o estabelecimento desse pólo na mesorregião [NE]. Sendo registrados os municípios de: [NE-TOM] - Tailândia (24,8-43,8%), [NE-TOM] - Acará (7,4-17,5%), [NE-TOM] - Moju (5,5-15%), [NE-TOM] - Tomé-Açu (4,2-24,3%), [NE-TOM] - Concórdia do Pará (1,9-18,1%), [NE-BRG] - Bonito (5,7-13,8%), [NE-BRG] - Igarapé-Açu (1,8-4,5%), [MET-CAS] - Santo Antônio do Tauá (1,4-6,5%), [NE-CAM] - Abaetetuba (0,91-1,92%), [MET-CAS] - Castanhal (0,64-1,74%), [NE-GUA] - São Domingos do Capim (0,54-1,82%), [NE-GUA] - Aurora do Pará (1,01-1,01%), [NE-GUA] - Irituia (0,62-1,42%), [NE-GUA] - Garrafão do Norte (0,12-1,84%), [NE-BRG] - Capanema (0,59-0,59%), [MET-CAS] - Santa Izabel do Pará (0,25-0,72%), [MET-CAS] - Bujaru (0,24-1,8%), [NE-BRG] - Santa Maria do Pará (0,19-0,6%), [NE-BRG] - São Francisco do Pará (0,14-0,39%), [NE-GUA] - São Miguel do Guamá (0,13-0,41%), [MET-BEL] - Santa Bárbara do Pará (0,22-0,31%), [NE-SAL] - Vigia (0,08-0,39%), [NE-BRG] - Nova Timboteua (0,13-0,36%), [NE-SAL] - Terra Alta (0,11-0,36%), [NE-GUA] - Capitão Poço (0,05-0,23%), [NE-SAL] - Maracanã (0,07-0,19%), [NE-SAL] - São João da Ponta (0,05-0,09%), [NE-SAL] - Curuçá (0,04-0,1%), [MET-CAS] - Inhangapi (0,02-0,02%), [NE-GUA] - Mãe do Rio (0,02-0,02%), [NE-SAL] - Marapanim (0,01-0,01%).
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“Expansão”- Concordando plenamente com a “Fase Programa de Produção Sustentável de Palma de Óleo no Brasil”, tal como indicada por Homma (2016b) (Figura 5). Nessa fase ocorreu a substituição do nome dendê para palma de óleo e a aquisição e criação de novas empresas. Em 2011 a Biopalma da Amazônia S.A. foi adquirida pela Companhia Vale, ocorreu a criação da Belém Bionergia do Brasil (BBB) pela Petrobrás e a gigante americana de alimentos Archer Daniels Midland Company (ADM) efetuou um pequeno plantio em São Domingos do Capim. O interesse maior da ADM estava na visão de longo prazo adquirindo o Terminal de Grãos Ponta da Montanha, em 2012, no porto de Vila do Conde.
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Reforçando a tendência de consolidação da produção de dendê na microrregião [NE-TOM] e [NE-BRG], mas também apresentando novas áreas emergentes no nordeste paraense, como nas microrregiões [NE-GUA], [NE-SAL], [NE-CAM] (Figura 4).
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20Entre as fases foi possível estabelecer na fase I (29-40x103 ha) um máximo acumulado de cerca de 40 mil ha, na fase II (40-52x103 ha) 52 mil ha e na fase III (52-189x103 ha) um máximo acumulado de 189 mil ha. Mais uma vez reforçando a fase III como o momento de elevadíssima expansão da cultura na região (Figura 4), tomando-se como base os dados do IBGE (2022). Entretanto, Venturieri et al. (2023) apresenta uma área plantada de cerca de 223x103 ha (Tabela 1).
Figura 4 Cartogramas de municípios produtores de dendezeiro nas mesorregiões nordeste paraense e metropolitana nas fases evidenciadas na análise.
Tamanho do bullet – proporcional ao percentual de produção média em cada uma das fases
21Avaliando-se as fases propostas por Homma (2016b) e as evidenciadas a partir de similaridades de produção entre os municípios, foi possível assinalar elevada concordância (Figura 5), ainda seja possível assinalar uma segmentação na escala espacial. A natureza distinta, mas complementar as abordagens reforça a noção de que realizações no espaço são efetuadas sob determinantes distintos e podem constituir diferentes trajetórias na construção do espaço.
22Figura 5 Linha do tempo relativa a cultura do dendezeiro na região amazônica e eventos associados. Adaptado de Homma (2016b)
23A partir do registro de cada município nas fases evidenciadas foi possível estabelecer uma espécie de “trajetória” de cada município quanto a seu histórico na produção de óleo de dendê (Figura 6). Sendo possível notar que a maioria dos municípios produtores apresentaram trajetória “estável” (13 municípios) ou “recente” (15 municípios). Somente um município apresentou trajetória “esporádica” e sete municípios apresentaram trajetória “anterior” Figura 6).
Figura 6 Diagrama de Venn com o número de municípios nas fases evidenciadas na série histórica
24Deste modo, foi possível estabelecer as trajetórias de cada um dos municípios com representatividade na produção de óleo de dendê, sendo que a atual produção de óleo de dendê, concentra-se em municípios com trajetória “estável” (~80% da produção), seguido de municípios com trajetória “recente” (~19% da produção), outras trajetórias, tais sejam: “esporádica”, “anterior” ou “não significativa” apresentam valores muito inferiores de produção (~1% da produção) (Tabela 1 e Figura 7).
Tabela 1 Valores de área total, produção, pertinência a fases, trajetórias e tendências nos municípios
|
|
|
Área total
|
Produção
|
|
Fases
|
|
|
|
Meso
|
Micro
|
Municípios
|
(ha) (§)
|
(t) (§§)
|
|
|
|
Trajetória
|
Tendência
|
NE
|
CAM
|
Abaetetuba
|
2.986,61
|
47.250
|
|
|
●●●
|
REC
|
[2]
|
NE
|
TOM
|
Acará
|
34.919,61
|
209.720
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[3]
|
NE
|
GUA
|
Aurora do Pará
|
1.376,35
|
28.500
|
|
|
●●●
|
REC
|
[1]
|
MET
|
BEL
|
Benevides
|
|
|
●
|
|
|
ANT
|
|
NE
|
BRG
|
Bonito
|
12.859,14
|
160.800
|
|
●●
|
●●●
|
REC
|
[2]
|
MET
|
CAS
|
Bujaru
|
1.989,66
|
6.667
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[2]
|
NE
|
BRG
|
Capanema
|
1.125,39
|
16.640
|
|
|
●●●
|
REC
|
[1]
|
NE
|
GUA
|
Capitão Poço
|
3.199,52
|
3.000
|
|
|
●●●
|
REC
|
[2]
|
MET
|
CAS
|
Castanhal
|
2.440,93
|
18.000
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[3]
|
NE
|
TOM
|
Concórdia do Pará
|
6.933,81
|
220.542
|
|
●●
|
●●●
|
REC
|
[2]
|
NE
|
SAL
|
Curuçá
|
|
1.022
|
|
|
●●●
|
REC
|
[2]
|
NE
|
GUA
|
Garrafão do Norte
|
2.359,81
|
36.480
|
|
|
●●●
|
REC
|
[2]
|
NE
|
BRG
|
Igarapé-Açu
|
7.872,96
|
51.799
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[3]
|
MET
|
CAS
|
Inhangapi
|
89,08
|
|
●
|
●●
|
|
ANT
|
|
NE
|
GUA
|
Ipixuna do Pará
|
4.190,37
|
|
●
|
|
|
ANT
|
|
NE
|
GUA
|
Irituia
|
1.236,80
|
21.658
|
|
|
●●●
|
REC
|
[2]
|
NE
|
GUA
|
Mãe do Rio
|
1.481,59
|
450
|
|
|
●●●
|
REC
|
[1]
|
NE
|
SAL
|
Maracanã
|
6,38
|
3.520
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[2]
|
NE
|
SAL
|
Marapanim
|
25,30
|
375
|
|
|
●●●
|
REC
|
[1]
|
NE
|
TOM
|
Moju
|
38.606,84
|
424.278
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[3]
|
NE
|
BRG
|
Nova Timboteua
|
590,69
|
4.920
|
|
●●
|
●●●
|
REC
|
[2]
|
NE
|
GUA
|
Ourém
|
80,92
|
|
●
|
|
|
ANT
|
|
NE
|
BRG
|
Peixe-Boi
|
11,61
|
|
|
|
|
NS
|
|
MET
|
BEL
|
Santa Bárbara do Pará
|
547,59
|
|
●
|
●●
|
|
ANT
|
|
MET
|
CAS
|
Santa Izabel do Pará
|
2.097,97
|
7.200
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[3]
|
NE
|
GUA
|
Santa Luzia do Pará
|
1.177,31
|
|
●
|
●●
|
|
ANT
|
|
NE
|
SAL
|
Santa Maria do Pará
|
991,52
|
5.250
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[3]
|
MET
|
CAS
|
Santo Antônio do Tauá
|
3.118,81
|
40.600
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[3]
|
NE
|
SAL
|
São Caetano de Odivelas
|
926,54
|
|
|
|
|
NS
|
|
NE
|
GUA
|
São Domingos do Capim
|
4.908,83
|
22.933
|
●
|
|
●●●
|
ESP
|
|
NE
|
BRG
|
São Francisco do Pará
|
1.010,83
|
4.050
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[3]
|
NE
|
SAL
|
São João da Ponta
|
|
1.333
|
|
|
●●●
|
REC
|
[2]
|
NE
|
GUA
|
São Miguel do Guamá
|
1.140,09
|
5.700
|
|
|
●●●
|
REC
|
[2]
|
NE
|
TOM
|
Tailândia
|
41.864,41
|
942.084
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[3]
|
NE
|
SAL
|
Terra Alta
|
479,32
|
4.083
|
|
|
●●●
|
REC
|
[2]
|
NE
|
TOM
|
Tomé-Açu
|
39.365,82
|
536.700
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[3]
|
NE
|
SAL
|
Tracuateua
|
88,70
|
|
|
|
|
NS
|
|
NE
|
SAL
|
Vigia
|
915,05
|
3.889
|
●
|
●●
|
●●●
|
EST
|
[3]
|
|
|
Total
|
223.016,16
|
2.829.443
|
|
|
|
|
|
Onde: (§) – área total acumulada, a partir de Venturieri et al. (2023); (§§) – produção de frutos de dendezeiro (IBGE, 2022 - dados 2020) ● – fase I; ●● – fase II; ●●● – fase III; EST – PCS “estável”; REC – PCS “recente”; ANT – PCS “anterior”; NS – não significativo; [1] – recentíssimo; [2] – em consolidação; [3] - consolidado
25Quanto a tendência de produção foram evidenciados três condições: consolidado – o município apresenta produção significativa contínua durante todo o período compreendido nas fases; em consolidação - o município apresenta produção significativa na maior parte o período compreendido nas fases; recentíssimo - o município apresenta produção significativa somente na parte final do período compreendido nas fases.
26Deste modo, concatenando-se os padrões de contribuição significativa (PCS) e as tendências, tem-se uma maior concentração da produção (dados IBGE-PAM 2020) em municípios com padrão estável consolidado (79,29%; ? área) representados por Tailândia, Tomé-Açu, Moju, Acará, Igarapé-Açu, Santo Antônio do Tauá, Castanhal, Santa Izabel do Pará, Santa Maria do Pará, São Francisco do Pará e Vigia. Enquanto o padrão estável em consolidação abarcou valores muito baixos (0,36%) sendo representado por Bujaru e Maracanã (Tabela 1).
27Outra trajetória|tendência importante foi recente em consolidação (17,91%) representado por: Concórdia do Pará, Bonito, Abaetetuba, Garrafão do Norte, Irituia, São Miguel do Guamá, Nova Timboteua, Terra Alta, Capitão Poço, São João da Ponta e Curuçá. Enquanto a trajetória|tendência recente recentíssimo (1,62%) foi menos expressiva, sendo representado por Aurora do Pará, Capanema, Mãe do Rio e Marapanim (Tabela 1).
Figura 7 Cartograma produção municipal de dendezeiro nas mesorregiões nordeste paraense e metropolitana
Segundo as trajetórias evidenciadas na análise, a partir da série histórica 1990-2020 (IBGE 2022). Tamanho do bullet – proporcional ao percentual de produção no ano de 2020
28Deste modo, tem-se na microrregião Tomé-açu [NE] como o pólo estável de produção. Já as microrregiões Bragantina [NE] e Castanhal [MET] são assinaladas como sub-pólos, ambos estáveis. Enquanto que as microrregiões Belém [MET], Guamá [NE] e Cametá [NE] foram classificadas como satélites, sendo que a micrroregião Belém apresentou um padrão anterior, enquanto que as microrregiões Guamá e Cametá apresentou uma padrão recente (Tabela 2).
29A expansão na cadeia de produção do óleo de dendê apresenta uma clara expansão, na ordem 20% da produção contida em municípios trajetória “recente” de produção, tanto com relação a conversão de novas áreas, quanto conversões em municípios onde essa cultura não era assinalada.
30A cultura do dendezeiro no estado do Pará parece ser uma honrosa exceção entre o padrão de comportamento das cadeias, tomadas grosso modo, assinalando um processo contínuo de incremento e importância na produção nacional, tanto que atualmente representa a quase totalidade desta.
31Uma forte atuação do Estado esteve presente ao longo de todas as fases, em especial nas iniciais. Pode-se dizer que o estabelecimento cultivo do dendezeiro é produto de planejamento. Em vários momentos, o Estado foi agente importante para solução de questões ou mesmo para o fornecimento de subsídios. A despeito de qualquer discussão mais aprofundada sobre o papel do Estado como indutor, tem-se que em momentos críticos, tal a crise propiciada pelo amarelecimento fatal, houve uma certa “miopia” do setor privado quanto a questões relacionadas ao fomento a pesquisa e desenvolvimento tecnológico, que foram os responsáveis pela continuidade do desenvolvimento da cadeia de produção do dendê.
32O dendezeiro apresenta um espaço consolidado com elevada produção, podendo tratar a microrregião de Tomé-açu, em especial Tailândia e Moju, como uma “região de palmares”. Ressaltando-se que a expansão da cultura tem-se dado de forma consistente, incluindo momento de elevadíssimas taxas de incorporação anual, em regiões contíguas a dita “região de palmares”.