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Dossiê alimentação e políticas alimentares nas cidades

Abastecimento alimentar em contextos de crise: uma análise sobre o Haiti

L’approvisionnement alimentaire dans des contextes de crise : une analyse d'Haïti
Food supply in crisis contexts: an analysis of Haiti
John Osthe et Valdemar João Wesz Junior

Résumés

Historiquement et actuellement, la République d'Haïti a fait face à de multiples crises qui ont eu un impact intense et direct sur sa population. Cet article vise à analyser les espaces, les acteurs et les dynamiques de l'approvisionnement alimentaire dans le pays, en se concentrant spécifiquement sur la petite commune de Saint-Raphaël (département du Nord). Parallèlement, l'accent sera mis sur le travail des madan sara, maillon central de la compréhension de l'approvisionnement alimentaire en Haïti. En plus d'une revue de la littérature et d'une analyse des données secondaires, des entretiens ont été menés avec différents acteurs impliqués dans la problématique à Saint-Raphaël (agriculteurs, consommateurs, détaillants, madan sara, entre autres). Les résultats montrent que le principal lieu d'approvisionnement à Saint-Raphaël est le marché agricole municipal, dont les produits sont vendus à la fois par des agriculteurs et des détaillants. Tant au niveau local que national, une grande partie de la dynamique d'approvisionnement est assurée par les madan sara, des femmes entrepreneurs individuelles indépendantes qui achètent les produits des familles paysannes locales et les transportent vers les grandes villes, en ramenant d'autres marchandises, notamment des produits importés. Elles établissent un lien vital entre les zones rurales et urbaines, étant la clé de la circulation des produits et de l'approvisionnement alimentaire d'Haïti, avec une énorme capacité de résistance et de résilience, même dans un contexte national marqué par de multiples crises.

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Texte intégral

1Os estudos sobre o abastecimento alimentar em tempos e contextos de crise ganharam maior amplitude com a pandemia de Covid-19, causada pelo vírus SARS-CoV-2 ou Novo Coronavírus. Parte destes trabalhos está enfocado em locais de médio e alto desenvolvimento que, em um contexto de isolamento social, redução dos estoques e inflação no preço dos alimentos, viram seus sistemas de abastecimento serem fortemente abalados, com aumento nos níveis de insegurança alimentar (Gundersen et al., 2021, Fitzpatrick et al., 2021, Ihle et al., 2020, Kent et al., 2022, O'Hara e Toussaint, 2021, entre outros). Não obstante a relevância destas pesquisas, há localidades em que a crise alimentar é praticamente contínua. Segundo os relatórios da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), alguns países da África subsaariana, do Sul da África e do Caribe, apesar de melhorias nas últimas décadas, seguem apresentando uma permanente e elevada incidência da subnutrição (FAO, 2000 e 2023).

2Em termos de América Latina, essa situação é mais evidente na República do Haiti. O país tem enfrentado, historicamente e na atualidade, problemas de ordem econômica, social, política, humanitária e climática, que impactam de maneira intensa e direta a sua população (Valler Filho, 2007, Beckett, 2020, Paul, Emmanuel e Govain, 2022, Paul, Govain e Emmanuel, 2023). Além de liderar o posto de país mais pobre (CEPAL, 2022) e com pior índice de desenvolvimento humano das Américas (PNUD, 2024), a fome tem se mantido em patamares altíssimos nos últimos 20 anos, afetando praticamente metade da sua população (FAO, 2024). Outro dado bastante chamativo é que mais da metade dos alimentos consumidos no país são importados (MARNDR, 2010).

3Nesse sentido, o tema do abastecimento alimentar é central no Haiti, inclusive nas cidades interioranas com forte presença de atividades agropecuárias. Este artigo tem como objetivo analisar os espaços, os atores e as dinâmicas de abastecimento alimentar no país, focando de maneira específica em Saint-Raphaël, município do Departamento Norte, com aproximadamente 50 mil habitantes (IHSI, 2024), que conta com uma importante produção agrícola. Além disso, será dada evidência para a atuação das madan sara, mulheres empreendedoras individuais independentes que compram a produção agroalimentar das famílias agricultoras locais e levam para as cidades maiores, sendo um elo chave para a circulação de produtos e para o abastecimento alimentar em diferentes regiões do país.

4Além de uma revisão bibliográfica nos temas da pesquisa, foram sistematizados dados secundários disponíveis tanto em instituições internacionais, como FAO, Banco Mundial, Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), assim como em instituições nacionais, com destaque ao Instituto Haitiano de Estatística e Informática (Institut Haïtien de Statistique et d'Informatique, IHSI), Ministério da Agricultura, Recursos Naturais e Desenvolvimento Rural (Ministère de l'Agriculture, des Ressources Naturelles et du Développement Rural, MARNDR) e Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (Ministère des Travaux Publics, Transports et Communications, MTTPC). Também foi realizada uma pesquisa de campo em Saint-Raphaël, visitando tanto as áreas de produção agropecuária no município como os principais espaços de comercialização. Além disso, foram conduzidas 41 entrevistas, em crioulo haitiano, com diferentes atores ligados ao tema alimentar no município, sendo 25 famílias agricultoras, quatro donos de mercearias, quatro consumidores finais, três madan sara, três comerciantes de animais (atizan) e duas revendedoras (revandèz). Os entrevistados foram selecionados de maneira aleatória, por adesão, e as entrevistas ocorreram entre maio de 2023 e março de 2024 de maneira presencial, com apoio de um estudante de agronomia residente no município, e de modo remoto pelos autores, via chamadas telefônicas e aplicados de mensagem (WhatsApp).

5Em termos da estrutura do artigo, além da Introdução e das Considerações finais, o texto está subdividido em três itens. O primeiro traz as principais características atuais do Haiti em termos de produção e abastecimento agroalimentar. O segundo item aprofunda em Saint-Raphaël, detalhando os espaços, os atores e as dinâmicas de abastecimento alimentar no município. O último tópico centra-se nas madan sara, analisando o papel desta intermediária itinerante, com destaque para a sua relevância no abastecimento alimentar nas cidades haitianas.

Haiti: produção agrícola e abastecimento alimentar em contextos de múltiplas crises

6A República do Haiti está localizada no Caribe, na ilha Espanhola, que é compartilhada com a República Dominicana. Conforme dados do IHSI (2024), o território haitiano estende-se sobre uma área de 27.750 Km2, sendo predominantemente montanhoso, com a terra de uso agrícola ocupando aproximadamente dois terços do país. A população do Haiti é estimada em 11,9 milhões habitantes (em 2021), sendo predominantemente jovem (37,6% têm menos de 18 anos) e com uma população rural ainda expressiva (43,6%). O país é dividido em dez departamentos e 146 comunas, com uma concentração demográfica na região metropolitana de Porto Príncipe, capital do Haiti, onde um quarto da população reside.

7O Haiti é marcado, historicamente e na atualidade, por instabilidades e tensões, consequência de um acúmulo de intervenções militares e de ajuda humanitária fracassadas (Johnston, 2024). No contexto recente, são crises múltiplas e interconectadas, que perpassam questões políticas, de segurança pública, econômicas, sociais, alimentares, climáticas, etc. Do ponto de vista político, a situação se deteriorou em 2021 com assassinado do então presidente do país, Jovenel Moïse, piorando no início de 2024 com a renúncia, por pressão de grupos criminosos, do primeiro-ministro Ariel Henry, que deixou o Estado completamente a deriva. Isso se expressa na segurança pública, em que diferentes gangues controlam atualmente 80% de Porto Príncipe, com um número crescente de vítimas, incluindo pessoas mortas, feridas e sequestradas (um aumento de 122% entre 2022 e 2023) (ONU, 2024).

8Em termos econômicos, o Haiti tem apresentando decrescimentos sucessivos de 2019 a 2022, tendo o pior Produto Interno Bruto (PIB) per capita das Américas, e uma balança comercial deficitária (Banco Mundial, 2024). Além disso, tem um IDH de 0,552 em 2022, o pior da região, estando na 158ª posição no ranking mundial (PNUD, 2024). Estimativas do Banco Mundial (2024) apontam que a pobreza, utilizando como critério US$ 3,65/dia, alcança 63,0% da população em 2023. Em paralelo, a fome atinge 45,0% da população no Haiti na média dos anos de 2020 e 2022, valor que salta para 82,6% quando se analisa a insegurança alimentar moderada ou grave no mesmo período (FAO, 2023). E, para complexificar ainda mais, o país é frequentemente atingido por eventos climáticos extremos, como secas severas, ciclones e terremotos, como foi o terremoto de 2010, que arrasou o país (Dor e Wesz Jr., 2024).

  • 1 Segundo o Censo Geral da Agricultura de 2008/2009, as explorações agropecuárias no Hati têm, em méd (...)

9Esse contexto marcado por múltiplas crises, obviamente, afetou e afeta o espaço rural, a produção agrícola e o abastecimento alimentar no Haiti. Apesar do setor agropecuário contribuir com 22,3% do Produto Interno Bruto (PIB) e gerar 45,6% das ocupações em 2022 (Banco Mundial, 2024), tanto o índice de produção agrícola como o índice de produção alimentar, ambos calculados pela FAO (2024), estão em forte decréscimo desde 2014. E, quando se comenta acerca da agricultura haitiana, está-se referindo fundamentalmente a uma massa de paysan (como são corriqueiramente chamados os camponeses, em crioulo haitiano) que realizam uma produção familiar diversificada em pequenas áreas1, e que enfrentam um conjunto de problemáticas, como a falta de recursos financeiros, ausência de apoio (público, privado, de organizações não-governamentais), baixo acesso a inovações tecnológicas e infraestrutura, falta de transporte, etc. (MARNDR, 2012).

10Além disso, os agricultores concorrem com o ingresso massivo de produtos importados, derivados de um conjunto de medidas de liberalização econômica adotado pelo Haiti a partir dos anos 1980. Frente aos vários problemas econômicos que o país enfrentava naquele momento, instituições financeiras internacionais, com destaque ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e ao Banco Mundial, condicionaram que o Haiti, assim como outros países da região, implementasse Programas de Ajuste Estrutural em troca de empréstimos (Florida e Redon, 2019). Em 1986 o país abriu os portos provinciais, alterou as taxas alfandegárias, retirou as taxas de exportação e as autorizações de importação e publicou uma lei especial que suspendeu medidas prévias para proteger a produção nacional (Baptiste, 2007). Atualmente, segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC, 2023), o Haiti é o país mais liberal da América Latina e do Caribe.

11No entanto, como aponta Étienne (2023), a liberalização do comércio não levou em conta a situação da produção agrícola local e os impactos socioeconômicos e alimentares que poderiam derivar destas iniciativas. O último dado divulgado pelo MARNDR, para o ano de 2010, indicava que 44% da disponibilidade alimentar do país era feita com produtos importados, além de 8% prover de ajudas humanitárias, enquanto a produção nacional atendia a 48% (MARNDR, 2012). A título de comparação, em 1981, a parcela das importações na disponibilidade de alimentos no Haiti não atingia 19% (MARNDR, 2010). Atualmente, frente ao contexto acima pontuado, provavelmente a dependência das importações seja ainda superior àquela de 2010.

12Um recente estudo desenvolvido pela FAO, União Europeia e Cirad (2022) sobre o Haiti confirma que os sistemas alimentares, tal como existem atualmente no país, são o resultado de um conjunto de políticas que favoreceram a importação de produtos em detrimento dos sistemas produtivos locais. E, apesar das recentes iniciativas de investimento privado, o sistema de abastecimento alimentar é deficiente e instável, em que os atores intermédios e finais da cadeia captam a maior parte do valor agregado. Ainda segundo este estudo, “os atores do sistema alimentar no Haiti estão divididos entre um grande número de atores locais e um pequeno grupo de importadores ou exportadores capazes de cobrir os riscos associados às suas atividades (sediados na capital), que detêm um poder considerável (sobre as cadeias de valor local, sobre a economia e sobre a política em geral)” (FAO, União Europeia e Cirad, 2022, p. 20). Além disso, atualmente, os contrabandistas e os membros do crime organizado perturbam o funcionamento dos mercados agroalimentares no país, o que dificulta a circulação de pessoas e mercadorias, fragmentando o território e ampliando os problemas de insegurança alimentar.

Espaços, atores e dinâmicas de abastecimento alimentar em Saint-Raphaël

13Saint-Raphaël é uma comuna haitiana localizada no Departamento Norte, com uma população estimada em 53.755 habitantes, que residem predominantemente na área rural (67,4%) (IHSI, 2024). A FAO (2023) criou uma tipologia para as microrregiões do Haiti, cruzando pobreza, potencial agrícola e eficiência agrícola, e nela Saint-Raphaël pertence ao primeiro grupo, em vermelho no mapa (Figura 1), onde predomina uma alta pobreza, que atinge 71,8% da população, com um baixo potencial agrícola, derivado principalmente do relevo ondulado e das frequentes estiagens. Mesmo assim, as planícies são utilizadas de maneira intensa, muitas vezes com uso da irrigação, conformando-se em uma das principais zonas agrícolas do país, com forte incidência do cultivo de milho, arroz, feijão, mandioca, batata, cana-de-açúcar e legumes em geral, além da criação de aves, cabras, bois e porcos. Segundo o Censo Geral da Agricultura de 2008/2009, as unidades produtivas em Saint-Raphaël têm, em média, um hectare, e para 7 de cada 10 recenseados, o destino principal da produção é a comercialização, valor superior à média regional e nacional, que fica próximo de 6 para cada 10 agricultores (MARNDR, 2012).

Figura 1 – Tipologia agrícola das microrregiões haitianas

Figura 1 – Tipologia agrícola das microrregiões haitianas

Fonte: FAO (2024).

14Saint-Raphaël é um grande centro regional de abastecimento (MTPTC, 2021). E, no caso da população local, eles recorrem a diferentes espaços e atores para aquirir os produtos alimentares. Conforme uma consumidora entrevistada, a “escolha de onde comprar depende dos produtos que quero ou preciso”, mas “eu geralmente compro dos agricultores ou revendedores no mercado agrícola, às vezes tem vizinhos agricultores, eu compro nas casas deles, eu compro nas mercearias também.” Outra consumidora comenta que “eu compro tudo no mercado agrícola municipal e no meu vizinho, que é agricultor e traz pra mim o que ele produz”.

15É consenso entre todos os entrevistados que o mercado agrícola municipal (Marché Agricole de Saint-Raphaël, le Jeudi), também chamado de mercado público, é o principal local do para a aquisição de produtos alimentares em Saint-Raphaël. Ali predominam os produtos locais, ainda que também se encontrem, em menor medida, mercadorias importadas. Embora este mercado funcione diariamente, com foco no abastecimento urbano local, os maiores movimentos ocorrem na quinta, quando muitos produtores rurais levam sua produção para comercialização e chegam compradores de outras comunas e departamentos (Figura 2). Além dos próprios agricultores (paysan) que vendem, sobretudo na quinta-feira, estão diariamente as revendedoras (revandèz).

Figura 2 – Mercado agrícola de Saint-Raphaël

Figura 2 – Mercado agrícola de Saint-Raphaël

Fonte: Pesquisa de campo (2023).

16Dos 25 agricultores entrevistados para esta pesquisa, 84,0% deles comercializa parte da sua produção no mercado agrícola municipal. A depender da época e das condições climáticas, eles vendem milho, arroz, feijão, mandioca, batata-doce, pimenta e legumes (cebola, tomate, alho-poró, beterraba, cenoura, quiabo, etc.), além de animais (aves, cabras, porcos e, em menor incidência, bovinos). Os paysan que detêm menor produção e maior variedade de produtos tendem a usar este espaço para venda direta aos consumidores finais. Já os agricultores que dispõe de volumes mais significativos, aproveitam o mercado agrícola municipal para comercializar com as madan sara, que compram para vender em outros municípios (ver próximo item), além das revandèz, que comercializam diariamente no próprio mercado. Como elas compram maiores quantidades, conseguem um menor preço e assim podem competir com os outros agricultores que também vendem de maneira direta aos consumidores finais nas quintas-feiras.

17As revandèz, que são predominantemente mulheres, vendem em pequenas quantidades e, não raro, comercializam a crédito. Elas desempenham um papel mais focalizado, sendo uma intermediária que está conectada com o consumidor final e que geralmente comercializa na escala local, seja no próprio mercado agrícola municipal, seja de porta em porta (Dorville, 1975, IICA, 1981). Conforme uma revandèz entrevistada, “as pessoas que compram de mim, elas compram para cozinhar pra sua família”. Em Saint-Raphaël, além de revender produtos agroalimentares locais adquiridos diretamente dos agricultores (comprados tanto no mercado municipal como nas unidades de produção que ficam nas imediações da cidade), muitas delas também comercializam mercadorias importadas, que são trazidas pelas próprias madan sara no seu retorno ao município. Sobretudo em cidades maiores, onde o contato direto com os agricultores é limitado, a revandèz abastece-se com os produtos das regiões interioranas que são trazidos pelas madan sara (Lundahl, 2010).

  • 2 Como explicou uma revandèz, há diferenças importantes entre ambas. “Elas [madan sara] vendem em out (...)
  • 3 Uma característica marcante no sistema agroalimentar haitiano é divisão de gênero, em que homens ge (...)

18A revandèz e a madan sara atuam principalmente no comércio de produtos vegetais in natura2. No caso dos produtos de origem animal, há diferenças na dinâmica de abastecimento. Embora as transações também ocorram principalmente no mercado agrícola de Saint-Raphaël, é em um espaço próprio, chamado palan, em que os agricultores e os atizan levam seus animais para a comercialização. Os atizan são homens3 que viajam constantemente até outros municípios para comprar e vender animais, especialmente bois, cabras e suínos, que adquirem dos próprios agricultores ou de outros atizan. Geralmente, além do comércio de animais, eles também são agricultores, trabalhando nas duas atividades em paralelo. Em relação a abrangência espacial das suas transações comerciais, esta depende fundamentalmente dos meios de transporte que detém, sendo que alguns percorrem a pé e outros em pequenos caminhões (próprios ou terceirizados).

Eu compro e vendo gado, algumas vezes também comercializo porco e cabra, mas eu me especializei na comercialização de vaca mesmo. [...] Segunda eu compro em Hinche [Departamento Central], na terça eu compro em Saint-Michel, que fica na região do Artibonite, e na quinta eu comercializo em Saint-Raphaël. Em Saint-Michel o gado, ali, é muito mais barato e eu trago para Saint-Raphaël para revender.

É muito melhor compra [o animal] de pecuarista mesmo, é barato, porque quando se compra de outro atizan pode ser mais caro, o atizan tem que tirar a margem dele. [...] Só que antes era [uma atividade] mais rentável. Agora os animais estão muito caros, você compra em um preço e as pessoas querem comprar de você a um preço mais barato. Todas essas questões de instabilidade política afetam a rentabilidade de todas as atividades no país. Às vezes tem tantos protestos que não consigo sair para daqui [Saint-Raphaël] para comprar ou vender. Hoje está muito difícil!

Geralmente eu levo os animais de um município para outro. Às vezes eu compro e comercializo os produtos no mesmo lugar, chego bem cedo e compro gado, porco e cabra de um agricultor ou de outro atizan por um bom preço, e se os bichos não tem nenhuma doença, eu posso revender bem fácil por um preço mais alto ali mesmo para um pecuarista, ou para outro atizan ou um bouche, que abate esses bichos para comercializar a carne.

19No mercado agrícola municipal, conforme o relato acima, esses animais geralmente são vendidos para paysan (que compram para criação), atizan (que irão revender, principalmente em outros mercados) e bouche (que abatem os animais e comercializam em pedaços entre os consumidores finais ali mesmo ou em suas casas). Vale pontuar que não há normas sanitárias específicas que regulamentam o abate dos animais e o comércio da carne.

20Em Saint-Raphaël a população urbana também compra nas pequenas mercearias dos bairros. Conforme uma consumidora entrevistada, “é mais vantagem quando você compra dos agricultores, é melhor. Mas tem as mercearias, onde você pode achar os produtos que os agricultores não tem, como óleo, sazon, espaguete, os produtos industrializados, importados”. De fato, estes estabelecimentos comerciais não oferecem alimentos perecíveis, e geralmente são importados. Conforme afirmam os proprietários das mercearias,

Eu vendo arroz, feijão, milho, espaguete, peixe, biscoito, doce, óleo, extrato de tomate, sazón, manteiga, maionese e outras coisas industrializadas. Eu não vendo fruta e legumes, nem carnes. Eu compro uma parte no mercado público do município, que são os grãos, e uma parte é importada da República Dominicana. [...] Eu viajo até a fronteira para comprar os produtos importados.

De comida, eu vendo arroz, milho, óleo, pães, doce, biscoito, feijão, farinha, massa e outras coisas. [..]. A maior parte são importados e eu mesmo viajo e compro de uma grande empresa lá [na fronteira].

21Geralmente são os próprios donos das mercearias que vão até a fronteira com a República Dominicana para comprar os produtos, mas também a quem vá até as cidades maiores e compre de algumas empresas especializadas no comércio de produtos importados. Em algumas ocasiões mais esporádicas, eles também adquirem das próprias madan sara que trazem essas mercadorias. Além disso, segundo um entrevistado, “aqui em Saint-Raphaël há mercearias que já são de propriedade delas [madan sara]”.

22Vale pontuar que no município não há supermercados e os restaurantes tem uma atuação modesta. Outros canais de abastecimentos perpassam a compra direta dos agricultores em espaços para além do mercado agrícola, seja quando os agricultores entregam na própria casa dos consumidores, seja quando vendem nas beiras de estrada ou diretamente nas unidades de produção ou nas suas residências na área urbana. Uma parte dos residentes da cidade detém terras na zona rural e lá realiza a produção agropecuária com fins de autoabastecimento, além da venda. Dos 25 paysan entrevistados, 6 residem na sede do município. E, como comenta um deles, “quase todo dia vou trabalhar na minha terra e [na volta] trago alimentos que eu produzo para abastecer a minha família, mas também vendo uma parte para meus vizinhos da cidade”.

  • 4 A única exceção é um agricultor que tem uma produção pequena e acaba vendendo de maneira direta aos (...)

23Entre os agricultores entrevistados, o principal comprador da produção agrícola é a madan sara, visto que 24 dos 25 paysans comercializam parte da sua produção via este canal4. Embora algumas delas comprem dos agricultores no mercado público do município, a maioria geralmente adquire a produção na própria lavoura, quando ela está apta para a colheita. Para tanto, as madan sara contratam trabalhadores para auxiliarem na colheita e para carregarem os produtos nos meios de transporte, já que serão comercializados em outras regiões, sobretudo nas cidades maiores. Ainda que as madan sara tragam no seu retorno alguns produtos que são demandados na localidade, eles geralmente chegam até os consumidores finais via revandèz. Embora as madan sara pouco atuem na venda direta de produtos alimentares às famílias consumidoras em Saint-Raphaël, elas são um elo central no processo de abastecimento alimentar das cidades haitianas.

O papel das madan sara no abastecimento alimentar das cidades haitianas

24As madan sara, como comentado acima, são mulheres empreendedoras individuais independentes que se especializaram na atividade comercial informal, atuando como intermediárias privadas itinerantes, que compram a produção agroalimentar das famílias agricultoras locais e levam para as cidades maiores, trazendo no seu retorno outras mercadorias (IICA, 1981, MARNDR, 2010, PNUD, 2015). O nome madan sara deriva de uma ave migratória que circula muito e está sempre à procura de alimento, que acaba por encontra-lo onde quer que esteja (Murray e Álvarez, 1975).

25É importante comentar que as madan sara navegam no mundo dos negócios há mais de 200 anos (Mintz, 2010). Tradicionalmente eram mulheres de origem rural, proveniente de famílias agricultoras, em que o marido e os filhos trabalhavam na terra e elas saiam para comercializar a produção da sua família e da vizinhança. Conforme se fortaleciam economicamente, foram indo para cidades maiores, chegando a Porto Príncipe. Nesse sentido, elas começam a fazer a conexão entre as regiões rurais mais afastadas e a capital do país, sendo centrais no abastecimento alimentar de Porto Príncipe, com destaque na comercialização da produção nacional (Mintz, 2010).

26Como explica Lundahl (2010, p. 120), elas transportam

Produtos alimentares cultivados em inúmeras pequenas explorações agrícolas em todo o país, das zonas excedentárias para as zonas deficitárias e do campo para a cidade. [...] São comerciantes profissionais conhecidas como 'madanm sara' que viajam pelo campo, geralmente ao longo de rotas estabelecidas, trazendo mercadorias urbanas ou importadas para as áreas rurais e, simultaneamente, levam alimentos a granel para serem vendidos nas cidades.

27Para as madan sara entrevistadas, esta denominação é atribuída a “uma pessoa, especialmente mulher, que viaja e comercializa produtos agrícolas”, “uma mulher que compra dos agricultores para levar para vender nas cidades”, “uma pessoa que sempre viaja vendendo seus produtos agrícolas”. Nesse sentido, é uma ocupação marcada pela presença feminina, pelo trânsito entre localidades e pelo comércio de produtos agrícolas. Em relação a esse último ponto, o que elas vendem varia em função da própria sazonalidade. “Eu comercializo vários produtos, mas isso tem a ver com a temporada. Tem vez que é tempo de legumes, como beterraba, cebola, alho-poró, tomate, cenoura. Tem momento que tem arroz, feijão, andú, entre outros. Então, posso dizer que depende, e isso tem a ver com a temporada mesmo”. E as três entrevistadas retornam a Saint-Raphaël com produtos alimentares importados.

Nessa época eu vendo alho-poró, quiabo, beterraba, cebola, tomate. Compro esses produtos para levar a Ouanaminthe e compro espaguete importando que sai da República Dominicana para trazer para Saint-Raphaël.

E quando a gente volta pra nossa cidade, trazemos produtos importados, que compra nas cidades maiores para trazer pra zona rural.

Eu viajo para vender os produtos locais em Ouanaminthe ou Cap-Haïtien e, quando eu estou regressando para o Saint-Raphaël, sempre volto com alguns produtos dominicanos que eu compro na República Dominicana, como leite e carne de frango para vender em Saint-Raphaël.

28São relações comerciais baseadas na confiança, isto é, são negócios conduzidos a partir das redes interpessoais. Se, por um lado, elas ajudam os agricultores nas zonas rurais a ganhar a vida e a vender os seus produtos, a população da cidade, por sua vez, pode desfrutar dos produtos do campo (Mintz, 2010). As madan sara estabelecem assim uma ponte entre os agricultores e a população da cidade, conectando os diferentes departamentos e microclimas do país. Além disso, pode-se dizer que é uma ocupação hereditária, passada de mãe para filha (Hossein, 2015). No caso das entrevistadas, duas delas comentam justamente sobre isso (“aprendi a profissão com minha mãe”, “minha mãe era uma madan sara”).

  • 5 Ocorre a importação tanto de grãos básicos (arroz, feijão, lentilha, etc.) como de alimentos indust (...)

29Achelus (2022), ao analisar dois dos mais importantes mercados agroalimentares de Porto Príncipe (Croix-des-Bossales e Hyppolite), mostra como que esses espaços, que tinham forte presença de agricultores na venda de alimentos nacionais, que iam até lá vender seus produtos de maneira esporádica e irregular, foram perdendo espaço para as madan sara. E, nos últimos anos, elas começaram a comprar produtos importados não-alimentares, principalmente dos Estados Unidos e da República Dominicana, para vender nas suas cidades de origens, como ferramentas para construção civil, roupas, tecidos, livros, entre outros (Pressoir et al., 2016). Inclusive alguns pesquisadores distinguem diferentes tipos de madan sara, dependendo da escala de sua operação (por exemplo, se viajam na escala regional, nacional ou internacional), dos tipos de produtos que comercializam (por exemplo, produtos alimentares locais versus bens de consumo importados) e do tamanho dos seus ativos (Hossein, 2015, James, 2016). Nesse sentido, é um grupo bastante heterogêneo, que tem diversificado sua escala de atuação e os produtos comercializados5.

  • 6 “A capilaridade das ‘Madanm Sara’ no território das cidades haitianas é tão grande que, no pós-Terr (...)

30As madan sara são responsáveis por até 90% do comércio local no Haiti (FTF, 2016, apud Vansteenkiste, 2022), o que as torna essenciais para pensar o tema da segurança alimentar no país. Mas, além de comprar e vender bens alimentares, estas mulheres partilham informações no campo dos preços agrícolas, da política e da saúde6 (Vansteenkiste, 2022). Além disso, “os agricultores recorrem ao financiamento informal de ‘madan sara’ que, em alguns casos, os pré-financia, para garantir assim seu abastecimento na colheita” (Banco Mundial, 2019, p. 14). Tanto as madan sara como os agricultores entrevistados em Saint-Raphaël comentam que, no caso de um paysan que não detém recursos suficientes para a próxima safra, em um contexto em que a política agrícola praticamente inexiste, ele pode obter um valor antecipado com uma madan sara que dispõe de maior capital, o que para ela também se torna interessante ao garantir acesso à produção da próxima colheita.

31Embora essas características evidenciem um modo de atuação das madan sara muito similar aos intermediários “clássicos” na relação com os agricultores, está-se referindo a um contexto/país muito particular, em que o Estado está ausente, as condições de infraestrutura e de segurança pública são muito precárias e os agricultores detém poucas condições de saírem da escala local para buscar novos mercados para sua produção agropecuária. Como o diretor de uma organização não governamental (ONG) haitiana afirmou em uma entrevista para Hossein (2015, p. 37),

Há uma opinião de que o intermediário é mal, mas madan sara são heroínas. São elas que chegam às aldeias de difícil acesso a pé ou de burro para comprar os produtos dos agricultores, embora haja muitos riscos pessoais para elas nas estradas. Apesar dos muitos perigos, as madan sara trazem produtos frescos das áreas rurais para as pessoas da cidade. Sem as madan sara para conectar os agricultores aos mercados, a agricultura morreria aqui. Somos todos muito abençoados por ter madan sara.

32A importância das madan sara se amplia neste momento em que o Haiti é fortemente atingido por múltiplas crises. São elas que realizam o escoamento da produção da agricultura familiar, fazendo com ela chegue até as grandes cidades, sendo a principal via de abastecimento dos produtos alimentícios nacionais, assim como tem levado outros produtos básicos até as regiões interioranas. No entanto, como elas mesmo comentam, está cada vez mais complexa e difícil a situação.

As dificuldades são muitas, e pioraram ultimamente. No transporte, com o problema de insegurança, às vezes tem muitas manifestações, mobilização, e o caminhão não pode passar, nós ficamos, dormimos na rua, os produtos estragam.

As principais dificuldades envolvem a questão do transporte, que é muito ruim, não tem boa infraestrutura rodoviária... para viajar com os produtos é muito cansativo. E tem os riscos de não conseguir passar por conta de bloqueios e os roubos de cargas.

33Embora a situação atual não seja nova, Gilles e Paul (2023) argumentam que ela tem se agravado rapidamente, sobretudo na região metropolitana de Porto Príncipe ou nas rodovias próximas à capital, ampliando os riscos para as madan sara. Além das estradas em péssimas condições, elas estão cada vez mais inseguras dado o seu controle por grupos armados, ampliado os casos de assaltos e roubo de cargas, além de situações ainda mais extremas, como sequestros e estupros. Nesse contexto, o grande desafio foi encontrar novas formas para contornar estes repetidos ataques a si e aos seus negócios. Conforme os autores, isso significou, em alguns casos, visar novos territórios e contextos para implementar as suas atividades e/ou diversificá-las. Frente a isso, muitas madan sara foram buscar novos espaços de comercialização (mais afastado das zonas controladas por grupos armados), passaram a utilizar tecnologias que permitem o comércio online (ainda que seja muito mais incipiente quando comparado com outros países da América Latina) e fomentaram novos mercados transnacionais (ampliando o número de madan sara na fronteira entre o Haiti e a República Dominicana).

34No caso de Saint-Raphaël, as madan sara passaram a atuar mais fortemente no Norte do país, sobretudo em Ouanaminthe (na fronteira com a República Dominicana) e em Cap-Haïtien (uma das maiores cidades do país, que fica no litoral Norte), onde a situação está menos problemática que em Porto Príncipe. Como destacou uma madan sara entrevistada, “eu transito por todos os lugares. Somente agora não vou pra capital por causa da insegurança. Antes eu sempre ia pra capital, quando o país estava mais estável. Mas agora não tem condições. Está muito perigoso!” Em outro momento da entrevista ela conclui: “temos que nos virar, se adaptar, busca alternativa, porque se nós não levamos [a produção agrícola local], quem vai levar?”.

35Portanto, destaca-se a centralidade das madan sara para a circulação de produtos e para o abastecimento alimentar de diferentes regiões do Haiti, sendo chaves no escoamento da produção agropecuária local. Além disso, merece evidência a capacidade de adaptação que estas intermediárias itinerantes foram desenvolvendo ao longo do tempo, bem como o modo com que foram construindo estratégias para contornar contextos complexos e difíceis.

Considerações finais

36A atual situação na qual a República do Haiti está mergulhada, marcada por variadas, simultâneas e interrelacionadas crises tem, obviamente, impactado de maneira intensa e direta a sua população, com destaque aos temas conectados com o abastecimento alimentar. Ainda que essa problemática tenha intensidades distintas nas suas diferentes localidades e regiões, é uma situação grave e altamente preocupante em todo o país. Mesmo que as pequenas cidades interioranas, com Saint-Raphaël, sejam menos afetadas do que a capital Porto Príncipe, todos os entrevistados afirmaram que a situação atual está muito pior do que anos atrás, destacando temas de insegurança pública, desemprego, inflação, escassez de produtos, maior precarização dos serviços básicos, entre outros.

37Mesmo com alta pobreza e com uma parte do seu território com baixa aptidão agrícola, Saint-Raphaël é uma das principais zonas agrícolas do país, sendo um grande centro regional de abastecimento agroalimentar. E, neste tema, não há dúvidas acerca da importância do mercado agrícola municipal, seja para o abastecimento da população local, seja para aqueles compradores de outras comunas e departamentos. Embora os consumidores finais também comprem em mercearias, na sua residência (de vendedores que vão de porta em porta), nas propriedades rurais próximas à cidade, na beira da estrada ou nas próprias casas urbanas de alguns agricultores que residem na sede do município, o Marché Agricole de Saint-Raphaël é o principal espaço de abastecimento alimentar, sobretudo nas quintas-feiras, quando a circulação de pessoas e mercadorias se intensifica.

38Para além da situação específica de Saint-Raphaël, este artigo evidenciou a centralidade das madan sara no Haiti, visto que grande parte da dinâmica de abastecimento alimentar perpassa estas mulheres empreendedoras dinâmicas e versáteis que compram a produção das famílias agricultoras locais e levam para as cidades maiores, trazendo no retorno outras mercadorias, com destaque aos produtos importados. Elas estabelecem uma conexão vital entre as áreas rurais e urbanas, sendo chaves para a circulação de produtos e para o acesso de alimentos (domésticos e externos) em diferentes regiões do país. E, apesar de estarem sendo diretamente afetadas pelas múltiplas crises na qual o país está submerso, deve-se destacar a sua enorme capacidade de resistência e resiliência mesmo em um contexto nacional extremamente desfavorável e hostil.

Agradecimentos

39Os autores agradecem ao Jerry Zephyr pelo apoio na pesquisa de campo e aos editais nº 77/2022/PRPPG e n. 121/2023/PRPPG da Unila.

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Notes

1 Segundo o Censo Geral da Agricultura de 2008/2009, as explorações agropecuárias no Hati têm, em média, 1,3 hectares (MARNDR, 2012).

2 Como explicou uma revandèz, há diferenças importantes entre ambas. “Elas [madan sara] vendem em outros lugares, nós só vendemos e compramos aqui mesmo. E elas compram uma maior quantidade de produtos do que a gente.”

3 Uma característica marcante no sistema agroalimentar haitiano é divisão de gênero, em que homens geralmente atuam de maneira mais direta com a agricultura (paysan) e com o comércio de animais (atizan), enquanto as mulheres enfocam-se na venda local (revandèz) ou itinerante (madan sara) de produtos agrícolas (Osthe, 2023).

4 A única exceção é um agricultor que tem uma produção pequena e acaba vendendo de maneira direta aos consumidores no mercado agrícola municipal. Por outro lado, apenas dois produtores entrevistados vendem somente para madan sara, pois a grande maioria deles aciona diferentes mercados em simultâneo (Osthe, 2023).

5 Ocorre a importação tanto de grãos básicos (arroz, feijão, lentilha, etc.) como de alimentos industrializados (farinha de trigo, salsicha, espaguete, suco artificial, refrigerantes, biscoitos, salgadinhos processados, doces, etc.). Também são importados alimentos rejeitados pelos consumidores americanos (como pés de galinha) e pelos consumidores dominicanos (como arroz quebrado). À medida em que se aumenta a importação de alimentos, as madan sara começam a participar na distribuição destes produtos importados mais baratos (Vansteenkiste, 2022).

6 “A capilaridade das ‘Madanm Sara’ no território das cidades haitianas é tão grande que, no pós-Terremoto de 2010, quando a Minustah [Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti] não sabia precisamente como fazer para levar os alimentos e medicamentos arrecadados mundialmente, foram elas que aliviaram, com seus produtos e sem qualquer procura e reconhecimento da Minustah, a situação de enorme vulnerabilidade na região da capital” (Magalhães, Machado e Baeninger, 2018, p. 85).

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Table des illustrations

Titre Figura 1 – Tipologia agrícola das microrregiões haitianas
Crédits Fonte: FAO (2024).
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Titre Figura 2 – Mercado agrícola de Saint-Raphaël
Crédits Fonte: Pesquisa de campo (2023).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/58095/img-2.png
Fichier image/png, 3,7M
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Pour citer cet article

Référence électronique

John Osthe et Valdemar João Wesz Junior, « Abastecimento alimentar em contextos de crise: uma análise sobre o Haiti »Confins [En ligne], 63 | 2024, mis en ligne le 01 juillet 2024, consulté le 12 décembre 2024. URL : http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/58095 ; DOI : https://0-doi-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/10.4000/11wvp

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Auteurs

John Osthe

Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA, https://orcid.org/0009-0002-5777-9281 , johnosthe123@gmail.com

Valdemar João Wesz Junior

Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA), https://orcid.org/0000-0002-8154-7088 , jwesz@yahoo.com.br

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