1O crime não se distribui de maneira aleatória no espaço. Pequenas porções de um determinado território concentram grandes quantidades de eventos (Sherman; Gartin; Buerger, 1989a; Sherman, 1995; Weisburd et al., 2004a).
2Dentre as mais importantes constatações empíricas da denominada “criminologia do lugar” (criminology of place) tem-se que o crime se concentra em unidades geográficas muito pequenas (Weisburd; Amram, 2014; Weisburd, 2015, 2004; Weisburd; Groff; Yang, 2012).
3Alia-se a isso o fato de que os microambientes representam o melhor nível de escala para análise do crime do ponto de vista espacial. O geógrafo Keith D. Harries (1974), relata que as ofensas têm suas próprias “ecologias de lugar”; o layout, características estruturais e o design do bairro podem afetar a oportunidade para determinados tipos de crime. Segundo o autor, “a discussão de fatores microambientais demonstra que os delitos variam muito em sua capacidade de controle por meio da manipulação do ambiente físico” (HARRIES, 1974, p. 78).
4Stucky e Ottensmann (2009) fazem uma revisão sobre a relação entre o uso e ocupação do solo e o crime em âmbito da criminologia. Os trabalhos remontam estudos seminais da Escola de Chicago (Burgess, 1916; Shaw; Mckay, 1942), passando pelas discussões acerca das paisagens urbanas e o crime (Jacobs, 1961; Newman,1971), as teorias das atividades de rotina de Cohen; Felson (1979) e do padrão de crime (Brantingham e Brantingham, 1981), análise de hot spots de crimes (Loukaitou-Sideris, 1999; Sherman; Gartin; Buerger, 1989; Weisburd; Lum; Young, 2004) e prevenção do crime através do design ambiental (Eck, 2002; Felson, 2002; Jeffery, 1977; Lab, 1992; Plaster-Carter; Carter; Dannenberg, 2003).
5Geradores e atratores de crimes são utilizados para elucidar as concentrações espaciais de atividades criminosas com a concentração de equipamentos urbanos, facilities e outras instalações (Brantingham; Brantingham, 1995; Kinney et al., 2008). Os geradores de crime são lugares que são facilmente acessíveis ao público, que podem se tornar locais de altas concentrações criminais pela presença de grandes grupos de pessoas, que criam ocasiões de crime (centros comerciais, instalações de ensino e de mobilidade, por exemplo). Outros lugares oferecem oportunidades específicas e transitórias, tornando-se atrativos de crimes. Exemplos de atratores incluem locais de eventos, estádios etc., que desempenham funções tais que os torna adequados para os infratores motivados encontrarem potenciais alvos ou vítimas fracamente vigiadas (Bernasco; Block, 2011).
6Neste contexto, o objetivo geral deste artigo é explorar o mapeamento de crimes por microespaços sob a perspectiva da lei de concentração do crime, tendo como recorte espacial se deu na cidade de Belo Horizonte com recorte temporal dos dados de 2018 a 2021.
7A justificativa do estudo reside em seu potencial para oferecer insights para estratégias de prevenção e controle criminal. Ao entender onde o crime se concentra e como ele muda ao longo do tempo, as agências de aplicação da lei e os urbanistas podem desenvolver intervenções direcionadas e baseadas em evidências para mitigar o crime. Além disso, os resultados do estudo baseados em modelagem do espaço geográfico podem contribuir para a compreensão teórica mais ampla das dinâmicas espaciais do crime, enriquecendo os campos da geografia, criminologia, ciências sociais e policiais, abrindo campo para pesquisas futuras.
8Weisburd, em uma palestra para a Sociedade Americana de Criminologia ocorrida em Sutherland em 2014, afirmou que há uma consistência no grau em que o crime está concentrado em pontos quentes em todas as cidades (e ao longo do tempo nas cidades) (WEISBURD, 2015). Essa consistência era tão forte que sugeria uma “lei de concentração do crime nos lugares” (law of crime concentration at places), a qual prevê que nas cidades maiores cerca de 50% da criminalidade está concentrada em 5% dos segmentos de rua e 25% do crime em apenas 1% dos segmentos de rua (Weisburd; Groff; Yang, 2012).
9Muitos estudos, desde o final da década de 1980, descobriram que há um agrupamento significativo de crimes em unidades microgeográficas de análise (Andresen; Malleson, 2011; Braga, Papachristos; Hureau, 2014; Brantingham; Brantingham, 1999; Curman; Andresen; Brantingham, 2014; Pierce; Spaar; Briggs, 1988; Sherman; Gartin; Buerger, 1989a, 1989b; Weisburd; Amram, 2014; Weisburd et al., 2004; Weisburd; Green, 1994; Weisburd; Lawton; Ready, 2012; Weisburd; Maher; Sherman, 1992; Weisburd; Morris; Groff, 2009). No entanto, os estudos até o momento variaram muito nas unidades geográficas usadas, no tipo de dados sobre crimes (por exemplo, chamadas para atendimento e incidentes criminais) e nos tipos de crimes examinados (Weisburd, 2015).
10Dois estudos iniciais, examinando endereços de ruas e medidas gerais de crime, encontraram resultados surpreendentemente semelhantes. Pierce, Spaar e Briggs (1988) descobriram que 3,6% dos endereços de rua, em Boston, incluíam 50% das chamadas de emergência para a polícia. Sherman, Gartin e Buerger (1989b), em uma análise de chamadas de emergência para endereços de rua, descobriram que apenas 3,5% dos endereços em Minneapolis produziam 50% de todas as chamadas de crimes para a polícia em um único ano. Da mesma forma, Eck, Gersh e Taylor (2000) também examinaram ligações de crimes em endereços e descobriram que os 10% mais representativos (em termos de crime), no Bronx e Baltimore, representavam aproximadamente 32% de uma combinação de roubos, assaltos, arrombamentos, furtos e roubos de automóveis. Observando locais públicos, como escolas de ensino médio, conjuntos habitacionais públicos, estações de metrô e parques, Spelman (1995) descobriu que os 10% piores dos locais produziam 50% das chamadas de crimes.
11Outros estudiosos analisaram incidentes criminais em segmentos de rua ou grupos de segmentos de rua. Um estudo realizado por Weisburd et al. (2004) confirma não só a concentração do crime no local, mas também a estabilidade dessa concentração ao longo do tempo. Weisburd et al. (2004) examinaram segmentos de rua na cidade de Seattle de 1989 a 2002, eles descobriram que 50% dos incidentes criminais, durante o período de 14 anos, ocorreram em apenas 4,5% dos segmentos de rua.
12Curman, Andresen e Brantingham (2014) também examinaram incidentes criminais em Vancouver, Canadá, por segmento de rua usando dados de incidentes, eles descobriram que 7,8% dos segmentos de rua produzem 60% do crime e que os padrões de crime em locais de alta taxa são relativamente estáveis ao longo do tempo.
13Weisburd e Mazerolle (2000) estudaram os mercados de drogas, que frequentemente incluíam grupos de segmentos de rua, eles descobriram que aproximadamente 20% de todos os crimes de desordem e 14% dos crimes contra pessoas estavam concentrados em apenas 56 pontos de tráfico de drogas em Jersey City, Nova Jersey, uma área que compreendia apenas 4,4% dos segmentos de ruas e cruzamentos da cidade (Weisburd; Green, 1995).
14Alguns trabalhos relataram concentração de crimes para tipos específicos de crimes. A pesquisa original de Sherman, Gartin e Buerger (1989b) indicou concentrações de crimes por tipos específicos de crimes:
-
todas as ligações de roubo vieram de apenas 2,2% dos lugares da cidade;
-
todos os roubos de veículos motorizados vieram de 2,7% dos lugares; e
-
todas as ligações de estupro vieram de 1,2% dos lugares (Sherman; Gartin; Buerger, 1989b).
15Mesmo alguns crimes, que talvez pareçam menos propensos a se concentrar de forma tão contundente, como roubos, assaltos e distúrbios domésticos também mostraram altos níveis de concentração no nível microgeográfico. Todos os roubos vieram de 11% dos lugares, todos os assaltos vieram de 7% dos lugares e todos os distúrbios domésticos vieram de 9% dos lugares (Weisburd, 2015).
16Braga, Papachristos e Hureau (2010) examinaram incidentes de violência armada entre 1980 e 2008 em Boston. Eles descobriram que os incidentes de violência armada eram estáveis e concentrados em menos de 5% dos segmentos de rua e cruzamentos, também relataram que entre 1% e 8% dos segmentos de ruas e cruzamentos foram responsáveis por quase 50% de todos os roubos comerciais e 66% de todos os roubos de rua.
17Ao estudar os pontos quentes do crime juvenil, Weisburd, Morris e Groff (2009) descobriram que 86 segmentos de rua, de aproximadamente 25.000 em Seattle, representaram um terço de todos os crimes juvenil oficiais em um período de 14 anos.
18Esses estudos estabeleceram claramente que o crime está concentrado em unidades microgeográficas. Mas é difícil tirar conclusões sólidas sobre até que ponto existem semelhanças na concentração do crime entre as cidades devido à natureza variada das unidades de análise, tipos de dados e tipos de crimes examinados (Weisburd, 2015).
19Weisburd (2015) declara que os dados apresentados por ele sugerem que existe uma lei de concentração do crime. Esta lei estabelece que para uma medida definida de crime, em uma unidade microgeográfica específica, a concentração de crime cairá dentro de uma estreita faixa de porcentagens para uma proporção cumulativa definida de crime.
20A Lei de Concentração do Crime prevê que a faixa percentual de unidades microgeográficas - Weisburd (2015) chama de largura de banda de porcentagens - que está associada a uma proporção cumulativa específica de crime (por exemplo, 25% ou 50% do crime na cidade) seria muito estreita para uma unidade padrão de crime e geografia. As análises subsequentes representam uma tentativa inicial de definir a largura de banda da lei da concentração do crime nas cidades e ao longo do tempo.
21A forte concentração de crimes em pontos microgeográficos tornou-se uma regularidade fundamental de pesquisa sobre o crime no local (Telep; Weisburd, 2018). Isso sugere que o crime é vivenciado com maior intensidade em um número muito pequeno de lugares de uma cidade e que as agências de aplicação da lei precisam se concentrar nas ruas que representam o top 1% (e 5%) das ruas que “produzem” cerca de um quarto (e metade) do problema do crime (Weisburd; Zastrow, 2021).
22Weisburd e Zastrow (2021) apresentaram relatório de pesquisa sobre estudo das “ruas hot-spot” (também tratada como hot streets) na cidade de Nova Iorque em 2010, 2015 e 2020. No início da década de 1990, havia mais de 700.000 crimes registrados na cidade a cada ano. Em 2010, esse número havia caído para menos de 200.000 crimes. Entre 2010 e 2019, Nova Iorque teve um declínio adicional de 11% nos indicadores criminais (Weisburd; Zastrow, 2021).
23A distribuição dos crimes por tipologia (crimes gerais, crimes violentos e crimes contra o patrimônio) apresentou um comportamento semelhante em termos da porcentagem de crimes concentrados por segmento de rua no período, por exemplo: 25% dos crimes totais se concentram em 1,38% em 2010, 1,27% em 2015 e 1,38% em 2020; 50% dos crimes ocorreram em 5,78% dos segmentos de rua em 2010, 5,54% em 2015 e 5,71% em 2020; 75% dos eventos se concentraram em 16,12% dos microespaços em 2010, 15,50% em 2015 e 15,60% em 2010; por fim, 100% dos eventos criminais ocorreram em 58,15% dos segmentos em 2010, 56,79% em 2015 e 55,22% em 2020. Desta forma os crimes gerais mantiveram uma persistência de concentração de pontos quentes no período. De igual forma, os crimes contra o patrimônio e crimes violentos também mantiveram um mesmo padrão de concentração.
24Ao comentar os resultados de Nova Iorque, Weisburd e Zastrow (2021, p. 10, grifo nosso) relataram que:
Os dados até agora seguem estudos anteriores em outras cidades maiores: cerca de 1% das ruas produzem 25% do crime geral e cerca de 5% das ruas produzem 50% do crime geral (ver Weisburd, 2015; Telep e Weisburd, 2018). Nesse contexto, o número de segmentos de rua que podem ser definidos como focos de crime permaneceu relativamente estável ao longo dos anos, apesar do declínio geral da criminalidade observado na cidade. Mas uma questão-chave – dada a queda muito grande da criminalidade em Nova Iorque nas últimas décadas – é se as ruas dos pontos quentes continuam quentes. Em outras palavras, as ruas de hotspots têm um grande número de crimes, ou o grande declínio da criminalidade em Nova Iorque, trouxe o crime nas ruas de hotspots para níveis muito baixos?
25Os resultados indicaram que houve uma estabilidade ao longo do tempo. Das ruas que foram focos de alta criminalidade em 2010 (top 25% do crime) quase metade (50%) eram pontos quentes de alta criminalidade em 2020. Outros 45% das ruas passaram da categoria mais alta de pontos quentes para a segunda categoria (que produziu 25%–50% do crime). Isso sugere que quase todas as ruas que eram pontos quentes em 2010 também foram pontos quentes em 2020.
26A pesquisa de Weisburd e Zastrow (2021) indicou que há pontos de alta criminalidade em cada um dos bairros da cidade, embora o número varie. As maiores concentrações de pontos quentes são encontradas em Manhattan, Brooklyn e Bronx, representando as partes mais densamente povoadas e urbanas da cidade.
27Essas descobertas de Weisburd e Zastrow (2021) seguem estudos anteriores sobre a estabilidade do crime ao longo do tempo em unidades microgeográficas como o de Weisburd et al. (2004). Há muitas razões para o crime permanecer relativamente alto em pontos quentes, incluindo fatores ambientais, como densidade populacional ou áreas de compras que estão fortemente correlacionadas com o crime no local (Weisburd; Groff; Yang, 2014). “Essas descobertas apontam para a importância de manter os esforços de prevenção ao crime em locais com características que os tornam continuamente vulneráveis ao crime” (Weisburd; Zastrow, 2021, p. 18).
28O trabalho realizado teve como objeto de análise a criminalidade no município de Belo Horizonte, capital do estado de Minas Gerais, localizado na Região Sudeste brasileira, conforme mapa de localização constante da Figura 1.
Figura 1 Mapa de localização de Belo Horizonte
Fonte: Elaborado pelo autor.
29A disposição topográfica onde se ergueu a cidade, acidentada, que caracteriza a cidade, influenciou a disposição sócio espacial da ocupação.
30Belo Horizonte foi construída para ser a capital de Minas Gerais. O núcleo urbano de Belo Horizonte deveria estar circunscrito nos limites da Avenida do Contorno, conforme planejamento da cidade. O centro principal, que concentrava as funções administrativa, comercial e residencial, elitizou-se e, consequentemente, surgiram bairros periféricos que passaram a constituir um cinturão residencial de classe média, que por sua vez, concentraram atividades de prestação de serviço. Essa tendência ocorreu principalmente na direção norte da cidade, onde as características topográficas favoreciam a ocupação e onde recentemente houve novo movimento de expansão, alavancado pela intervenção estatal. Já no sentido sul da cidade, os limites impostos pela Serra do Curral restringiram a expansão o que acarretou na valorização do solo. Para oeste, eixo industrial, o crescimento da cidade se deu a partir da implantação da Cidade Industrial em 1941, com surgimento de bairros operários. À leste observa-se a maior estagnação, onde não há atrativos econômicos, nem naturais.
31O modelo de desenvolvimento da cidade, inicialmente segregacionista determinou uma ocupação do território, cujas regiões apresentam características bem definidas, com funções específicas quanto ao uso do solo. A Lei nº 7.166 de 27 de agosto de 1996, alterada pela Lei nº 9.959 de 20 de julho de 2010, estabelece normas e condições para parcelamento, ocupação e uso do solo urbano no município. A referida legislação define que o “território do Município é considerado área urbana, dividindo-se em zonas” (Belo Horizonte, 1996), de acordo com as diretrizes estabelecidas no Plano Diretor. O zoneamento é definido, segundo os potenciais de adensamento e as demandas de preservação e proteção ambiental, histórico, cultural, arqueológico ou paisagístico e é assim descrito:
32a) Zona de Preservação Ambiental (ZPAM);
33b) Zona de Proteção (ZP);
34c) Zona de Adensamento Restrito (ZAR);
35d) Zona de Adensamento Preferencial (ZAP);
36e) Zona Central (ZC);
37f) Zona Adensada (ZA);
38g) Zona de Especial Interesse Social (ZEIS);
39h) Zona de Grandes Equipamentos (ZE).
40Dentre as zonas definidas destacam-se com interesse para o presente trabalho as Zonas Centrais (ZC), que são regiões configuradas como centros de polarização regional, municipal ou metropolitana, e que se subdividem em:
41a) Zona Hipercentral (ZHIP);
42b) Zona Central de Belo Horizonte (ZCBH);
43c) Zona Central do Barreiro (ZCBA);
44d) Zona Central de Venda Nova (ZCVN) (BELO HORIZONTE, 1996).
45A ocupação do solo pelas atividades produtivas tem-se como características do setor industrial a desconcentração espacial do emprego industrial, na direção da RMBH e de outras regiões do estado, permanecendo na cidade a indústria metalúrgica, têxtil de alimentos e bebidas, com incremento das áreas de informática e biotecnologia. No setor de comércio e serviços, há desconcentração espacial pelos corredores viários de maior importância, “centros lineares”, pelos bairros da cidade, “centros intrabairros”, além da permanência do centro tradicional da cidade (hipercentro) como principal polo de atração de comércio e serviços urbanos. Há uma carência de atividades de comércio e serviço nas áreas periféricas e as novas polaridades de comércio e serviço não se traduziram em desenvolvimento econômico significativo para os locais que passaram a ocupar (PBH, 2009).
46Belo Horizonte possui uma população residente de 2.315.560, conforme Censo (2022), distribuídos de maneira não uniforme pelo tecido urbano dos 331,354 Km², o que corresponde a uma densidade população de 6.988,18 hab/km². O índice de desenvolvimento humano municipal (IDHM) é de 0,810, conforme dados do Cesno (2010), o que corresponde ao estrato de IDHM “muito alto”, apresentando-se como 20º município no ranking brasileiro dentre 5.565 municípios e segundo em Minas Gerais, dentre os 853 municípios mineiros, atrás apenas de Nova Lima.
47A evolução da população residente em Belo Horizonte, conta na Tabela 1.
Tabela 1 – Evolução da população – Belo Horizonte – 1940-2022
Ano
|
População
|
Diferença
|
Taxa crescimento
|
1940
|
211.377
|
-
|
-
|
1950
|
352.724
|
141.347
|
66,9%
|
1960
|
693.328
|
340.604
|
96,6%
|
1970
|
1.235.855
|
542.527
|
78,2%
|
1980
|
1.780.855
|
545.000
|
44,1%
|
1991
|
2.106.908
|
326.053
|
18,3%
|
2000
|
2.238.526
|
131.618
|
6,2%
|
2010
|
2.375.151
|
136.618
|
6,1%
|
2022
|
2.315.560
|
-59.591
|
-2,5%
|
48Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1940, 1950, 1960, 1970, 1980, 1991, 2000, 2010, 2022.
49No período de 1940 a 2010 houve um incremento populacional em Belo Horizonte, porém pode-se observar que há uma abrupta diminuição neste crescimento, notadamente no período entre 1991 e 2010, o que culminou numa retração da população identificada no último Censo (2022) que apresentou uma redução de 2,5% em relação ao ano de 2010.
50O processo histórico de metropolização de Belo Horizonte se iniciou nos anos de 1940, com a industrialização na Cidade Industrial de Contagem e a corrida pela organização de loteamentos, configurando um estoque que por muitas décadas ainda conteria terrenos vazios. Este processo fez com que Belo Horizonte crescesse na direção oeste, que se transformou em conurbação da malha urbana de Belo Horizonte com município de Contagem. Houve também, na mesma década, investimentos viários e de implantação do complexo da Pampulha a norte da capital, gerando outro eixo de expansão. Na década de 1970, com a grande onda de migrações campo-cidade e o vertiginoso crescimento de Belo Horizonte, municípios a norte receberam populações de baixa renda, que não conseguiam morar na capital, dando origem às periferias precárias. A população de Belo Horizonte quase dobrou no período de 1950 a 1960 (aumento de 96,6%) e novamente entre 1970 e 1960 (aumento de 78,2%). Em 1970, 75% da população metropolitana morava na capital. Este percentual vem diminuindo desde então e, em 2022, apenas 45% da população da região metropolitana mora na capital.
51A partir da definição dos objetivos da pesquisa, definiram-se os critérios para a coleta de dados: o objeto de estudo (crimes de furto e crimes violentos), o recorte espaço-temporal (Belo Horizonte, de 01/01/2018 a 31/12/2021).
52Para o trabalho de identificação dos trechos de vias de Belo Horizonte com maior incidência criminal (hot spots) foram mapeadas, inicialmente sob a forma pontual, as ocorrências de furtos e crimes violentos no período de 2018, 2019, 2020 e 2021.
53A partir do par de coordenadas contido nos REDS as referidas ocorrências foram espacializadas, totalizando:
-
furtos: 72.054 ocorrências em 2018; 69.596 ocorrências em 2019; 53.239 ocorrências em 2020; 55.012 ocorrências em 2021;
-
crimes violentos: 28.006 ocorrências em 2018; 19.848 ocorrências em 2019; 12.758 ocorrências em 2020; 9.860 ocorrências em 2021
54Para a agregação dos dados pontuais às polilinhas representativas dos eixos viários, se deu por união espacial de dados, partindo do princípio que, uma vez georreferenciados, os dados compartilham uma variável comum: a localização espacial.
55De forma a agregar a maior quantidade de dados e representar de forma mais fiel a realidade do fenômeno estudado, foram estabelecidas distâncias em torno dos trechos de vias (buffer) para que as ocorrências pudessem ser agregadas, como pode ser observado na Figura 2.
Figura 2 Exemplo de buffer em torno das linhas para agregar os pontos à linhas
Fonte: Elaborado pelos autores.
56Durante a pesquisa foram testadas distâncias “buffers” ao longo dos eixos das vias, de forma a verificar qual a distância que, ao mesmo tempo, captura a maior quantidade de dados e não provoca sobreposições significativas em áreas de interseções e cruzamentos. A partir de um teste de interseção direta entre os pontos e os trechos de vias, foram obtidos os seguintes resultados:
-
distância 0 m a partir dos Eixos – 0% dos pontos interceptados;
-
distância 5 m - a partir dos Eixos - 20% dos pontos interceptados;
-
distância 10 m - a partir dos Eixos - 50% dos pontos interceptados;
-
distância 12 m - a partir dos Eixos - 64% dos pontos interceptados;
-
distância 15 m - a partir dos Eixos - 78% dos pontos interceptados;
-
distância 20 m - a partir dos Eixos - 92% dos pontos interceptados.
57Tendo por base os resultados dos testes, foi adotada a distância de 20 metros como buffer ao longo das vias para captura dos pontos. A partir desta distância, há pouco ganho de dados e um maior risco de sobreposições entre trechos localizados espacialmente próximos.
58Após estas operações, os oito conjuntos de dados pontuais (quatro anos de cada tipologia de crimes) foram agregados aos polígonos dos buffers das vias, gerando um banco de dados de polígonos com valores de contagem de ocorrências por cada trecho, sendo possível a sua representação espacial conforme Figura 3.
Figura 3 Exemplo de polígonos criados a partir dos buffers com agregação dos dados pontuais de ocorrências
Fonte: Elaborado pelos autores.
59Os códigos dos trechos constantes na base de dados da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) foram mantidos em todas as operações, permitindo a identificação dos trechos e das vias às quais estes pertencem em todas as etapas do processo.
60Foram realizados basicamente dois tipos de análise de concentração dos crimes por segmentos de rua:
-
frequência de eventos por segmento: contagem do número de crimes em mesmo segmento, utilizando a codificação de segmento contida no banco de dados), a fim de se identificar o percentual de segmentos que concentravam 25%, 50% e 100% dos crimes na área de análise;
-
frequência relativa: quantidade de vezes que o mesmo valor de variável apareceu dentro do conjunto, para saber por exemplo, quantos segmentos não houve crimes;
-
coeficiente de Gini, para auferir o nível de concentração e desigualdade entre os segmentos de via (explicado amiúde na sequência).
61Uma das formas utilizadas para calcular a desigualdade de distribuição dos crimes por segmento de ruas foi o coeficiente de Gini. O Gini é uma medida de desigualdade desenvolvida pelo estatístico italiano Corrado Gini e publicada em 1912. Esse índice é comumente utilizado para calcular a desigualdade de distribuição de renda, mas pode ser usada também para qualquer distribuição.
62Ele consiste em um número entre 0 e 1, onde 0 corresponde à completa igualdade (todos têm a mesma distribuição da variável) e 1 corresponde à completa desigualdade (um indivíduo da população concentra toda a variável).
63A base de dados de 2018 a 2021 (MINAS GERAIS, 2022b) utilizada para processamento contou com:
-
249.901 ocorrências de furtos;
-
70.472 ocorrências de crimes violentos.
64A partir da base inicial, foi realizada uma análise crítica, retirando-se os dados com coordenadas inválidas e dados inconsistentes, permanecendo o banco de dados com:
-
245.901 ocorrências de furtos;
-
65.180 ocorrências de crimes violentos.
65O erro amostral para os dados obtidos consta da Tabela a seguir:
Tabela 2 Erro amostral para os dados validados no Banco de Dados da Pesquisa
Tipos de crimes
|
Dados iniciais
|
Dados validados
|
Nível de confiança
|
Erro
amostral
|
Furtos
|
249.901
|
245.901
|
99%
|
0,03%
|
Crimes Violentos
|
70.472
|
65.180
|
99%
|
0,14%
|
(Furtos + Crimes Violentos)
|
320.373
|
311.081
|
99%
|
1,25%
|
Fonte: Elaborado pelos autores a partir dos dados da pesquisa.
66Para o mapeamento por segmentos de rua e apreciação de concentração dos eventos por essa unidade de análise, considerou-se a base de ruas do município de Belo Horizonte com 57.382 trechos de via mapeados.
Tabela 3 Erro amostral para os dados de segmentos de via mapeados
Tipos de crimes
|
Dados iniciais
|
Dados validados
|
Nível de confiança
|
Erro
amostral
|
Furtos
|
249.901
|
207.160
|
99%
|
0,12%
|
Crimes Violentos
|
70.472
|
58.128
|
95%
|
5,42%
|
(Furtos + Crimes Violentos)
|
320.373
|
265.288
|
95%
|
2,50%
|
Fonte: Elaborado pelos autores a partir dos dados da pesquisa.
67Com a finalidade de identificar os pontos quentes em Belo Horizonte dos crimes de furto e crimes violentos, realizou-se o mapeamento por segmentos de vias para o período de análise de 2018 a 2021.
Figura 4 Pontos quentes de CV e furtos – Belo Horizonte – 2018-2021
Fonte: Elaborado pelo autor a partir dos dados da pesquisa.
68Uma questão central para avaliar a alocação do policiamento numa cidade é a distribuição geográfica dos focos de criminalidade. Eles estão localizados apenas em um bairro específico ou em bairros muito específicos, ou estão espalhados pela cidade? Existe uma forte variabilidade entre ruas ou os pontos quentes se agrupam em “bairros quentes”?
69Conforme os mapas constantes da Figura 3, verifica-se que há uma manutenção visual da concentração dos crimes violentos e furtos por segmentos de rua em Belo Horizonte ao longo do período de análise. Os segmentos de rua mais quentes em Belo Horizonte estão presentes nos diversos dos bairros e regiões da cidade, embora o número varie.
70As maiores concentrações de pontos críticos são encontradas no hipercentro da cidade, que apresenta uma concentração criminal desproporcional em relação ao restante de Belo Horizonte. O hipercentro de Belo Horizonte concentra instalações de comércio e prestação de serviços (instituições de ensino, bancárias, usos comerciais, transportes públicos), local de maior concentração de eventos criminais contra o patrimônio (Faria; Diniz; Alves, 2022). A concentração de instalações de comércio e serviços é, portanto, fator explicativo da aglomeração de atuações criminais, pois, de acordo com as teorias do padrão de crime (Brantingham; Brantingham, 1981) e das atividades rotineiras (Cohen; Felson, 1979), reúne grande número de pessoas que podem ser vítimas em potencial, as quais se deslocam para a realização de atividades diárias.
71Não obstante, as regiões de Venda Nova e Barreiro também apresentam concentrações destacadas, representando as partes mais densamente povoadas e urbanas da cidade. Estes três pontos (Hipercentro, Venda Nova e Barreiro) são consideradas Zonas Centrais de Belo Horizonte, conforme a lei que determina o uso e ocupação do solo, que são regiões configuradas como centros de polarização regional, municipal ou metropolitana, e que se subdividem em: Zona Hipercentral (ZHIP); Zona Central de Belo Horizonte (ZCBH); Zona Central do Barreiro (ZCBA); Zona Central de Venda Nova (ZCVN) (Belo Horizonte, 1996).
72Destaca-se que o ano de 2020 há uma considerável diminuição de segmentos com registros de crime, o que pode ser atribuído pelos impactos do distanciamento social promovidos pelas medidas sanitárias e administrativas decorrentes da Pandemia de COVID-19. A influência da redução de mobilidade comunitária para locais de comércio (varejo) e lazer, bem como para parques, são compatíveis com a mesma queda das taxas criminais, o que corrobora com as teorias criminais do padrão do crime e das atividades de rotina, pois há uma disponibilidade menor de alvos em potencial nesses locais o que, por consequência, diminui a atividade criminal na mesma proporção (Faria; Diniz; Alves, 2022).
Gráfico 1 Concentração de crimes violentos e furtos por segmento de rua – Belo Horizonte – 2018-2021
Fonte: Elaborado pelos autores a partir dos dados da pesquisa
73Quando se analisa os dados agregados de ambas as tipologias (furtos e crimes violentos), obtém-se uma grande estabilidade em termos da concentração ao longo do período de análise (GRÁFICO 1). A concentração de 25% dos eventos ocorreu em 0,56% em 2018, 0,37% em 2019, 0,47% em 2020 e 0,50% em 2021 (média de 0,48% 0,08%). Isso significa uma quantidade média de 273 segmentos problemáticos, que merecem maior atenção da polícia para realização da prevenção criminal. Destacam-se nos segmentos com maior concentração criminal áreas da cidade que representam atratores e geradores de crimes (Brantingham; Brantingham, 1995). Tais espaços são locais onde há grandes concentrações e fluxos de pessoas polarizados por equipamentos urbanos e instalações de comércio e serviços.
74Embora não se concentrar sobre as características de todos os segmentos pontuados como relevantes em concentração criminal, pesquisas anteriores apontam para uma série de fatores que levam a altos níveis de criminalidade nas ruas (Jones; Pridemore, 2019; Weisburd, Groff e Yang, 2012). Alguns destes fatores seguem modelos de oportunidade para explicar o crime, tais como a densidade populacional e a atividade comercial. Isto é sugerido no mapa pelo número relativamente maior de pontos quentes no hipercentro de Belo Horizonte. No entanto, o segmento com maior criminalidade em Belo Horizonte não está localizado no hipercentro. A Avenida Antônio Abrahão Caram destaca-se pela concentração de registros criminais devido à presença do Estádio Governador Magalhães Pinto (Mineirão), que funciona como instalação “atratora de crimes”, devido o deslocamento de grande número de pessoas para dias de eventos esportivos e culturais que funcionam na instalação. Na sequência do ranking de maior volume de registros criminais tem-se 22 segmentos de rua localizados no hipercentro de Belo Horizonte.
75Comparando-se com o estudo da concentração criminal em Nora Iorque, a rua com maior concentração criminal daquela cidade tem como destaque a presença da loja de departamentos Macy's, que atrai grande volume de pessoas (Weisburd; Zastrow, 2021).
76A concentração de 50% das ocorrências de furtos e de crimes violentos ocorreram em 4,00% dos segmentos de vias em 2018, 3,05% em 2019, 3,25% em 2020 e 3,23% em 2021 (média de 3,38% 0,42%). Com relação aos segmentos que concentraram a totalidade dos eventos, houve uma redução de 7,61% o que representa uma diminuição de 4.367 segmentos de rua com incidência criminal registrada.
77As características sociais dos segmentos de rua também foram identificadas como relacionadas aos níveis de criminalidade. Desvantagem concentrada (percentagem de indivíduos que vivem abaixo do limiar da pobreza, com assistência pública, desempregados, com menos de 18 anos e em agregados familiares chefiados por mulheres) e baixa eficácia coletiva (confiança nos vizinhos e vontade de intervir em problemas comuns) também foram identificados como variáveis-chave na compreensão das ruas com alto índice de criminalidade.
785.2 Análise da concentração criminal por microespaços na escala intraurbana
79Mudando-se a escala de análise, considerando apenas setores isoladamente, buscou-se identificar o nível de concentração em nível comunitário. Como exemplo, ilustra-se a distribuição do crime nos três setores que figuram como Zonas Centrais em Belo Horizonte: Hipercentro, Venda Nova e Barreiro, conforme mapas da Figura 5:
Figura 5 Pontos quentes de CV e furtos – Hipercentro, Venda Nova e Barreiro – 2018-2021
(a) Hipercentro.
Fonte: Elaborado pelos autores a partir dos dados da pesquisa.
(b) Venda Nova.
(c) Barreiro.
80Ao longo dos três mapas, existe uma grande variabilidade na distribuição do crime, rua a rua, com segmentos de grande concentração criminal frequentemente ladeados por ruas com pouca ou nenhuma criminalidade. Isto significa que é falacioso classificar bairros inteiros como focos de criminalidade, uma vez que a maioria das ruas, mesmo em áreas de maior criminalidade, não apresentam esse comportamento. Esta é uma lição importante para as agências policiais para o planejamento assertivo de seus recursos policiais, normalmente escassos, bem como para os cidadãos, que, por vezes, movidos pelo senso comum acreditam que áreas muito extensas sejam infestadas pelo crime de maneira generalizada.
81Com a finalidade de se mensurar o nível de desigualdade entre as concentrações de eventos por segmentos, foi calculado o coeficiente de Gini para os crimes de furto, crimes violentos e crimes totais (TABELA 4).
Tabela 4 Coeficientes de Gini para crimes de furto, crimes violentos e crimes totais – Belo Horizonte – 2018-2021
Fonte: Elaborado pelos autores a partir de dados da pesquisa.
82Usando esta abordagem (TABELA 4), encontrou-se evidências de concentração muito forte para as três tipologias utilizadas na pesquisa. Para todos os crimes, o coeficiente de Gini generalizado varia entre 0,84 e 0,91 ao longo dos quatro anos estudados, para crimes violentos entre 0,79 e 0,96 e para crimes de furto entre 0,88 e 0,91. Esses dados indicam que os níveis de concentração na cidade são estáveis, com tendência a maior concentração na atualidade, apesar das quedas de criminalidade observadas.
83Respeitando-se os critérios de comparabilidade, percebe-se certa similaridade com o trabalho de Weisburd e Zastrow (2021), que encontrou para Nova Iorque resultados similares: coeficiente de Gini entre 0,77 e 0,79 para todos os crimes; entre 0,81 e 0,84 para crimes violentos e entre 0,80 e 0,82 para crimes contra o patrimônio.
84Desta forma, reforça-se o aspecto de há uma discrepância enorme entre uma pequena parcela de segmentos de rua numa cidade com grandes concentrações de crimes e a grande maioria com pouco ou nenhum registro criminal, sendo enganoso imaginar que há áreas ou comunidades inteiras com predisposição criminal.
85Uma questão importante a se verificar é se, a despeito de variação da taxa geral de crimes no período, os segmentos de ruas que eram pontos quentes em 2018 permanecem como pontos quentes em 2021. Em uma análise contemplando as duas tipologias de crimes considerados nesta pesquisa (crime violentos e furtos) verifica-se que houve uma redução de 35,17% no acumulado dos crimes, conforme representado no Gráfico 2:
Gráfico 2 Evolução do número de crimes violentos e furtos– Belo Horizonte – 2018-2021
Fonte: Elaborado pelos autores a partir de SIGOP (2022).
86Na análise acumulada dos eventos (crimes violentos e furtos) observou-se que houve uma expressiva estabilidade dos pontos quentes, obtendo-se 72,32% de manutenção dos níveis de incidência criminal por segmento de 2021 comparado a 2018. Os resultados desta pesquisa sugerem uma estabilidade de pontos quentes ao longo do período. Este achado corrobora com os resultados de estudos anteriores (Weisburd; Zastrow, 2021; Weisburd et al., 2004).
87As evidências encontradas reforçam a importância de manter os esforços de prevenção ao crime em locais com características que os tornem continuamente vulneráveis ao crime.
88O estudo confirmou a aderência dos dados de Belo Horizonte à Lei de Concentração do Crime (Weisburd, 2015). À guisa de exemplificação, em 2021 houve concentração de 25% dos furtos ocorridos em 0,40% dos segmentos de rua em Belo Horizonte e 50% deste mesmo tipo de delito ocorreu em 2,56% dos segmentos. Os crimes violentos também apresentaram comportamento semelhante. Para o ano de 2021, 25% dos crimes violentos ocorreu em 0,96% dos segmentos de rua e 50% destes delitos ocorreu em 3,42% dos segmentos de rua de Belo Horizonte. De maneira complementar, verificou-se que há uma desigualdade muito grande em termos de concentração criminal, os coeficientes de Gini indicaram em média valores próximos de 0,90, o que significa que o crime no município está muito concentrado em pequenas porções do seu território.
89Assim, os resultados da análise criminal são promissores para a implementação de uma estratégia de prevenção criminal por meio de Policiamento de Hot Spots, pois permite focar em um número reduzido de espaços, os quais tem potencial em contribuir com maior possibilidade de redução das taxas gerais de crimes.
90Outra previsão teórica que se confirmou foi a estabilidade dos hot spots. Em Belo Horizonte os dados indicaram que houve uma estabilidade de manutenção do status em termos de concentração criminal entre o período de análise (2018 a 2021) acima de 70% para ambos os crimes analisados, o que demonstra que, apesar de diminuição geral nas taxas criminais durante o período, os pontos quentes permaneceram quentes.
91Apesar do grande declínio da criminalidade nos últimos anos, as ruas dos pontos quentes continuam a ser “quentes” e um grande número de ruas enfrenta elevados níveis de criminalidade. Observar as taxas gerais de criminalidade nos centros urbanos, como é o caso de Belo Horizonte, mascara os sérios problemas criminais enfrentados por muitos cidadãos que vivem ou trabalham em ruas movimentadas. Embora a reforma policial e os esforços para identificar soluções sociais e comunitárias para os problemas do crime devam ser uma parte central da agenda de segurança pública, o policiamento continua a ser um serviço crítico necessário a um grande número de ruas da cidade.
92Neste sentido, o suporte da disciplina geográfica para o estudo apresenta oportunidades significativas para o campo da segurança pública e políticas de prevenção ao crime, pois o mapeamento por microespaços (segmentos de rua) permitem uma estratégia para Policiamento de Pontos Quentes focados nos pontos de maior concentração. Tal abordagem tem o potencial de contribuir para uma redução significativa nas taxas gerais de crimes, otimizando a alocação de recursos e maximizando o impacto das intervenções. A persistência dos pontos quentes também sugere a necessidade de intervenções contínuas e focadas para combater eficazmente o crime em áreas problemáticas específicas.