1O estabelecimento de áreas legalmente protegidas é o principal instrumento de gestão socioambiental aplicado no estado do Amapá. Existem várias tipologias de áreas: Terras Indígenas (TI), Territórios Remanescentes de Comunidades Quilombolas (TRCQ), Áreas de Preservação Permanente (APP), Reservas Legais (RL) e Unidades de Conservação (UC). Neste estudo, refletimos sobre as UC, que têm maior evidência no espaço amapaense. A principal questão que norteou a pesquisa foi: quais as principais características, especificidades e dificuldades presentes na gestão e manejo das UC do Amapá?
2A hipótese principal é que as UC presentes no território amapaense, embora sejam numerosas e ocupem significativo percentual da área do estado, não conseguem atingir suas finalidades de preservação e conservação. As causas demonstram ser a falta de implementação política, administrativa, financeira e técnica e a carência de equipamentos.
3O nosso objetivo geral é o de analisar a gestão das UC amapaenses a partir de suas características, especificidades e dificuldades de gerenciamento e manejo. Os nossos objetivos específicos são: (i) contextualizar a instituição de áreas legalmente protegidas no mundo e no Brasil como ferramenta de gestão ambiental; (ii) contextualizar o território amapaense; e (iii) analisar as principais características, particularidades e obstáculos que as UC enfrentam nos seus processos de gestão e manejo.
4O método utilizado foi o hipotético-dedutivo e a forma de abordagem foi a pesquisa qualitativa. O método hipotético-dedutivo permite construir teorias e formular hipóteses e, com base nos resultados obtidos, fazer previsões (Gil, 2019). Usamos também os métodos de pesquisa documental, teórica e legal. Nossa pesquisa usou fontes primárias, como documentos de domínio público disponibilizados em sites de entidades públicas, os documentos oficiais do Cadastro Nacional de Unidades de Conservação (CNUC), da Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Amapá (SEMA/AP) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Consultamos também artigos científicos e teses.
5O artigo está dividido em cinco tópicos: o primeiro é sobre as áreas protegidas e a gestão ambiental, mostrando as categorias de áreas protegidas e a importância da proteção ambiental para manutenção da biodiversidade; a segunda apresenta a um histórico da criação das UC no Brasil, destacando as diretrizes que embasaram a política ambiental brasileira; a terceira discorre sobre aspectos da formação territorial amapaense; a quarta contextualiza a criação, gestão e manejo das UC no espaço amapaense; e, por fim, a quinta parte apresenta as considerações finais.
6A International Union for Conservation of Nature (IUCN) elaborou em 1993 e publicou em 1994 uma classificação internacional de áreas legalmente protegidas. Definiu seis categorias dotadas do objetivo comum de, quer fossem áreas terrestres ou marinhas, se dedicar especialmente à proteção e à manutenção da diversidade biológica e dos recursos naturais e culturais associados, manejados por meio de ferramentas legais ou outros instrumentos efetivos (IUCN, 2012). Os documentos da IUCN norteiam a criação, a gestão e o manejo de áreas legalmente protegidas, principal instrumento estatal e de organizações não governamentais (ONG) utilizado para proteger, preservar e conservar a diversidade biológica e os serviços ambientais conexos (Armsworth et al., 2011; Bruner, Hanks & Hannah, 2003; Chape et al., 2005; Dawson et al., 2011; Li et al., 2013; Loucks et al., 2008; Rodrigues et al., 2004a, 2004b; United Nations Environment Programme-World Conservation Monitoring Centre [UNEP-WCMC], 2008; Williams et al., 2005).
7A finalidade de categorizar essas áreas em escala internacional é construir uma linguagem comum, o que facilita o intercâmbio de informações técnicas e científicas entre as diversas nações, além de orientar estudos, implantação e manutenção das áreas naturais legalmente protegidas e propor a formulação de sistemas dessas áreas em cada país (Brito, 2010). A classificação na IUCN alcançou uma ampla aceitação internacional, inclusive por instituições como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB). O Brasil aprovou o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) em 2000, com base nas indicações da IUCN.
8No Brasil, a primeira UC a ser criada foi o Parque Nacional (PARNA) de Itatiaia (1937), como consequência da publicação do Código Florestal (1934) e promulgação da Constituição da República do Brasil (1937), com forte influência da instituição do PARNA de Yellowstone (Estados Unidos, 1872). Outros acontecimentos internacionais e nacionais contribuíram para a criação de novas UC no país, como: a Conferência de Estocolmo (1972), a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/1988) e a Eco-92 (1992). Em geral, os eventos e os seus documentos constituíram as diretrizes relativas à proteção, conservação e preservação do ambiente e ajudaram o Brasil a criar os instrumentos legais (leis, decretos e resoluções) e a infraestrutura (órgãos e instituições) para estabelecer, gerir e manejar as UC. Um dos desdobramentos da Eco-92, por exemplo, foi o envio, ainda em 1992, ao Congresso Nacional do projeto de lei que propunha a criação do SNUC (Brito, 2010).
9Em 18 de julho de 2000 foi sancionada e publicada a Lei Federal nº 9.985, que regulamentou o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII da CRFB/1988 e instituiu o SNUC. A lei definiu um sistema que integra, sob um mesmo marco legal, as UC nas esferas federal, estadual e municipal, e fomenta a conservação da diversidade biológica, de modo a garantir para as gerações futuras o usufruto das riquezas naturais do território brasileiro. Essa lei foi importante, pois consolidou o arcabouço relativo aos tipos de UC e unificou as diretrizes básicas para estudo, criação, gestão e manejo de UC no Brasil. Ela assim definiu uma UC como:
[…] espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (Brasil, Lei nº 9.985/2000, art. 2º, alínea I)
10A definição de UC preconizada pelo SNUC considerou os parâmetros e diretrizes indicados pela IUCN (1994). O sistema brasileiro seguiu também a estruturação da IUCN quando previu dois grupos de UC: as de Proteção Integral, que visam manter os ecossistemas livres de alterações causadas pela ação humana e admitem apenas o uso indireto de seus recursos naturais, e as de Uso Sustentável, que permitem a exploração dos recursos ambientais de forma a garantir a sua sustentabilidade, com o objetivo de manter a diversidade biológica e os demais atributos ecológicos (Brasil, Lei nº 9.985/2000, art. 7º, incisos I e II). Os dois grupos se desdobram em 12 categorias de UC (Quadro 1).
Quadro 1 – Categorias de Unidades de Conservação definidas pelo SNUC
Grupo
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Categorias
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Objetivos
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Proteção integral
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Estação Ecológica (ESEC)
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Preservar a natureza e realizar pesquisas científicas.
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Reserva Biológica (REBIO)
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Preservar a integridade da biota e demais atributos naturais.
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Parque Nacional (PARNA)
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Preservar ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica.
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Monumento Natural (MN)
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Preservar sítios naturais raros, singulares ou de grande beleza cênica.
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Refúgio de Vida Silvestre (RVS)
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Proteger ambientes naturais assegurando condições de existência e reprodução de espécies e comunidades da flora local e da fauna residente ou migratória.
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Uso Sustentável
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Área de Proteção Ambiental (APA)
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Proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.
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Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE)
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Manter ecossistemas naturais de importância regional e local e regular o seu uso de modo a compatibilizar com os objetivos de conservação da natureza.
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Floresta Nacional (FLONA)
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Usar sustentavelmente os recursos florestais e realizar pesquisas científicas, com ênfase em métodos para exploração sustentável de florestas nativas.
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Reserva Extrativista (RESEX)
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Proteger os meios de vida e a cultura das populações extrativistas, assegurando o uso sustentável dos recursos naturais.
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Reserva de Fauna (RF)
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Possibilitar estudos técnico-científicos sobre o manejo econômico sustentável de recursos faunísticos.
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Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS)
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Preservar a natureza assegurando as condições e os meios necessários para a reprodução e a melhoria dos modos e da qualidade de vida e exploração dos recursos naturais pelas populações tradicionais.
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Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN)
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Conservar a diversidade biológica.
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Fonte: elaborado pelos autores com base na Lei nº 9.985/2000
11O SNUC trouxe várias inovações para a política brasileira de UC, como: a democratização no processo de criação destas áreas (audiências públicas); a possibilidade de Organizações Sociais de Interesse Público (OSCIP) participarem diretamente da gestão de UC; a instituição de processo de estudos técnicos para criação da maioria das unidades; e a exigência de manter no Ministério do Meio Ambiente (MMA) um cadastro sobre as UC no país, assim instituído o CNUC. Porém, ele apresentou pontos frágeis, que geram e mantêm instabilidade nos processos de instituição e gestão dessas áreas, como a não indicação de formas de resolver problemas fundiários e sociais, e obscuridades sobre as questões orçamentárias e de recursos humanos.
12Para o SNUC se tornar exequível, foi necessário regulamentar alguns dos seus artigos, o que ocorreu com a emissão do Decreto Federal nº 4.340, de 22 de agosto de 2002, regulamentando 18 artigos relacionados aos estudos técnicos preliminares, atos de criação, denominação, consultas públicas para criação e definição de limites, além de normatizar a instituição dos conselhos gestores (consultivos e deliberativos), os planos de manejo e a gestão das UC. O Decreto Federal nº 5.746, de 5 de abril de 2006, regulamentou o art. 21, que dispõe sobre o processo de criação e gestão das RPPN.
13É importante destacar que a proteção da natureza no Brasil está vinculada às políticas territoriais e que no Amapá, estado cujo território tem alto percentual de áreas protegidas, a gestão do território e do ambiente deve incorporar as questões socioambientais, priorizando as populações tradicionais (ribeirinhos, indígenas, quilombolas, pescadores, extrativistas e pequenos produtores) que dependem dos elementos da natureza para sobreviver, e não somente os grandes projetos de mineração, de energia e de biotecnologia (Silva et al., 2021). “Um Estado que não se preocupa com suas populações mais vulneráveis e que suas ações beneficiam, sempre, o poder econômico e político” (Mello-Théry, 2011, p. 17) demonstra interesses obscuros para com a gestão territorial e ambiental.
14A área territorial do Amapá e a estimativa de sua população, conforme dados disponíveis no site do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2021), são, respectivamente, 142.814,585 km² e 877.613 pessoas, distribuídos em 16 municípios (Mapa 1). A configuração territorial do estado foi influenciada por fatos históricos, políticos e econômicos, como: a instituição da Capitania Hereditária do Cabo Norte (1637); a disputa limítrofe com a França sobre parte do atual território do Amapá (1700-1900); a criação do Território Federal do Amapá (TFA – 1943-1988); a instalação de grandes projetos produtivos de mineração e agropecuária (Indústria e Comércio de Mineração S. A. – ICOMI, 1957-1997, e Jari, desde 1967); a transformação do Amapá em estado (1988); e as instituições da Área de Livre Comércio de Macapá e Santana (1992) e da Zona Franca Verde do Amapá (2015). Esses acontecimentos contribuíram diretamente para a formação territorial do estado e colaboraram para a potencialização de conflitos entre exploradores (capitalistas) e os povos nativos (ribeirinhos, indígenas, quilombolas, pescadores, extrativistas e pequenos produtores).
Mapa 1 – Municípios amapaenses
Fonte: organizado por Brito e elaborado por Souza (2022)
15Com relação aos municípios, vários eventos históricos, geopolíticos e econômicos contribuíram diretamente para as suas instituições. Até 1943, quando o Amapá pertencia ao estado do Pará, tinham sido criados os municípios de Macapá (1856) e Mazagão (1890), com o objetivo de garantir os interesses brasileiros no contexto da questão limítrofe com a França; adicionalmente, o município de Amapá (1901) foi instituído logo após a resolução dessa questão. Logo depois da instituição do TFA (1943), foram instituídos os municípios de Oiapoque (1945) e Calçoene (1956). Essa configuração permaneceu até 1987, quando foram criados os municípios de Santana, Ferreira Gomes, Laranjal do Jari e Tartarugalzinho. Embora eles tenham sido constituídos ainda no período do território, a sua criação foi influenciada pela elevação do Amapá a estado (1988). Depois disso, foram constituídos os municípios de Serra do Navio, Pedra Branca do Amapari, Itaubal, Cutias, Pracuúba, Porto Grande (1992) e Vitória do Jari (1994) (Brito, 2010). Assim, o Amapá tem hoje 16 municípios, 11 deles criados a partir de 1987.
16Com relação aos aspectos bióticos do Amapá, o Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá (IEPA, 2008) informa que o estado, integralmente situado no Bioma Amazônia, abriga importante diversidade biológica. Os seus principais tipos de vegetação são: campo de várzea, cerrado (savanas), floresta densa de terra firme, floresta de transição, floresta aberta de várzea, floresta densa de várzea e manguezal (Mapa 2).
Mapa 2 – Tipos florísticos no Amapá
Fonte: organizado por Brito e elaborado por Souza (2022)
17Além da rica diversidade florística, o Amapá apresenta significativa rede hidrográfica e destacada diversidade de fauna. Grande parte dessa biodiversidade ainda é desconhecida pela comunidade científica. O desconhecimento prejudica a proteção, preservação e conservação desse patrimônio biótico e indica a necessidade de realizar pesquisas que identifiquem o real potencial biológico do estado. Com a finalidade de preservar e conservar não somente a biodiversidade, mas os grupos sociais (ribeirinhos, indígenas, quilombolas, pescadores, extrativistas e pequenos produtores) do Amapá, o estado e o governo federal usaram como principal ferramenta de gestão socioambiental a proteção legal de áreas (Brito, 2010). Da totalidade territorial do Amapá, aproximadamente 70% estão sob proteção legal de apenas duas tipologias de áreas, TI e UC (Mapa 3).
Mapa 3 – Unidades de conservação, terras indígenas e corredor da biodiversidade
Fonte: organizado por Brito e elaborado por Souza (2022)
18Mas devemos considerar, também, os territórios quilombolas, que no Amapá assumem duas condições: (i) os TRCQ, áreas já homologadas, com a emissão do título coletivo de propriedade pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA); e (ii) as comunidades quilombolas que o INCRA publicou a certificação das áreas. Além das APP e das RL, que também são áreas legalmente protegidas e estão presentes em todo o território estadual. Entretanto, não as incluímos no percentual de 70%. Essa descrição corrobora as pesquisas de Tostes e Ferreira (2020), quando afirmam que as áreas protegidas no Amapá estão presentes em todo o seu território.
19Conforme assinalado, o Amapá conta com expressivo número de UC, que protege aproximadamente 62% do seu território (Mapa 3 e Quadro 2). Comparando os Mapas 2 e 3, observa-se que os tipos florísticos com os menores índices de representatividade de UC e de áreas protegidas de modo geral são a floresta de transição e o cerrado, e o que tem maior adensamento de áreas protegidas é o de floresta densa de terra firme. Entretanto, existem UC em todos os tipos florestais.
20De acordo com dados do IBGE (2022), o maior percentual da população amapaense está concentrado nos ecossistemas de floresta de transição e cerrado, nos quais estão localizadas nove sedes municipais (Calçoene, Amapá, Pracuúba, Tartarugalzinho, Ferreira Gomes, Porto Grande, Macapá, Santana e Mazagão). Assim, é possível inferir que uma das causas da reduzida presença de UC nesses domínios florísticos é a sua ocupação humana, tanto populacional quanto de atividades produtivas, em especial a monocultura da soja (Mapa 3).
21A primeira UC no Amapá foi criada na década de 1970 – o Parque Florestal de Macapá (Amapá, Decreto nº 030/1974). Foi instituído pelo governo do TFA, transformada em REBIO da Fazendinha (Amapá, Decreto nº 020/1984), e em 2004 alterada para APA da Fazendinha. Em 1980, o governo federal criou o PARNA Cabo Orange e a REBIO do Lago Piratuba. A justificativa foi a compensação pelos possíveis danos ambientais causados pelas atividades produtivas do Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (Polamâzonia).
22As UC municipais foram as últimas criadas no território amapaense (PNM do Cancão, em 14 de novembro de 2007, RESEX Beija-Flor Brilho de Fogo, em 19 de novembro de 2007 e após 13 anos foi instituída a APA do Carmo do Macacoari, em 05 de maio de 2021). Atualmente, são 20 unidades (Mapa 3 e Quadro 2) – 12 sob administração federal, cinco geridas pelo estado e três sob tutela de três municípios, Pedra Branca do Amapari, Serra do Navio (Brasil, 2022) e Itaubal (Itaubal, Decreto nº 109/2021), perfazendo um total de 8.798.040,91 hectares, representando 61,60% do total da área territorial do estado.
Quadro 2 – Unidades de conservação no Amapá, situação em 2022
nº
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Nome – Ato de Criação
|
Abrangência – Município(s)
|
Área (ha)
|
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Federal – Proteção integral
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1
|
PARNA do Cabo Orange
Dec. Fed. nº 84.913/1980
|
Oiapoque, Calçoene
|
619.000,00
|
2
|
REBIO do Lago Piratuba
Dec. Fed. nº 84.914/1980
|
Amapá, Pracuúba e Tartarugalzinho
|
395.000,00
|
3
|
ESEC Maracá-Jipioca
Dec. Fed. nº 86.061/1981
|
Amapá
|
72.000,00
|
4
|
ESEC do Jari
Dec. Fed. nº 87.092/1982
|
Laranjal do Jari e Almeirim (PA)
|
227.126,00
|
5
|
PARNA Montanhas do Tumucumaque
Dec. Fed. S/N/2002
|
Laranjal do Jari, Oiapoque, Serra do Navio, Calçoene, Pedra Branca do Amapari, Amapá, Ferreira Gomes, Pracuúba e Almeirim (PA)
|
3.867.000,00
|
|
Federal – Uso sustentável
|
6
|
FLONA do Amapá
Dec. Fed. nº 97.630/1989
|
Amapá, Calçoene, Ferreira Gomes, Pedra Branca do Amapari, Porto Grande, Pracuúba, Serra do Navio e Tartarugalzinho
|
412.000,00
|
7
|
RESEX do Rio Cajari
Dec. Fed. nº 99.145/l990
|
Laranjal do Jari, Mazagão e Vitória do Jari
|
481.650,00
|
8
|
RPPN Retiro Paraíso
Port. 86 - N-IBAMA/1997
|
Macapá
|
46,75
|
9
|
RPPN Lote Urbano (REVECOM)
Port. 54 - N-IBAMA/1998
|
Santana
|
17,18
|
10
|
RPPN Seringal Triunfo
Port. 89 - N-IBAMA/1998
|
Ferreira Gomes
|
9.996,16
|
11
|
RPPN Retiro Boa Esperança
Port. 120 - N-IBAMA/1998
|
Porto Grande
|
43,02
|
12
|
RPPN Aldeia Ekinox
Port. 91 - IBAMA/2000
|
Macapá
|
10,87
|
Estadual – Proteção integral
|
13
|
REBIO do Parazinho
Dec. Ter. nº 5/1985
|
Macapá
|
111,32
|
Estadual – Uso sustentável
|
14
|
RDS do Rio Iratapuru
Lei Estadual nº 392/1997
|
Laranjal do Jari, Mazagão e Pedra Branca do Amapari
|
806.184,00
|
15
|
APA do Rio Curiaú
Lei Estadual nº 431/1998
|
Macapá
|
21.676,00
|
16
|
APA da Fazendinha
Lei Estadual nº 0873/2004
|
Macapá
|
136,59
|
17
|
Floresta Estadual (FLOTA) do Amapá
Lei Estadual nº 1028/2006
|
Serra do Navio, Pedra Branca do Amapari, Porto Grande, Mazagão, Ferreira Gomes, Pracuúba, Amapá, Calçoene, Tartarugalzinho e Oiapoque
|
2.369.400,00
|
Municipal - Proteção Integral
|
18
|
Parque Natural Municipal (PNM) do Cancão
Dec. Mun. nº 085/2007
|
Serra do Navio
|
370,26
|
Municipal - Uso Sustentável
|
19
|
RESEX Beija-Flor Brilho de Fogo
Dec. Mun. nº 139/2007
|
Pedra Branca do Amapari
|
68.524,20
|
20
|
APA do Carmo do Macacoari
Dec. Mun. nº 109/2021
|
Itaubal
|
0,60
|
Fonte: elaborado pelos autores com base no CNUC (Brasil, 2022) e Decreto Municipal (Itaubal) nº 109 de 05 de maio de 2021
23Analisando as UC na espacialidade amapaense, independentemente da sua esfera de administração, constatamos realidades e especificidades que provocam várias reflexões, tais como: existência ou não de instrumentos de gestão e manejo; questões fundiárias; condições de degradação socioambiental; superposições de áreas; grandes extensões de UC pertencentes a vários municípios; algumas áreas extrapolam os limites do estado do Amapá (Quadro 2); ilhas que são UC e unidades que compõem o mosaico de áreas protegidas do oeste do Amapá e norte do Pará (Mapa 5) e o corredor da biodiversidade do Amapá (Mapa 3).
24O principal instrumento de gestão das UC é o plano de manejo, que é um documento técnico no qual é considerado o zoneamento da unidade e as normas que devem direcionar a sua gestão e o seu manejo (Brasil, Lei nº 9.985/2000, art. 2º, inciso XVII). No caso das UC do Amapá, apenas sete têm esse documento técnico (os PARNA Cabo Orange e Montanhas do Tumucumaque, as ESEC Jari e Maracá-Jipioca, a FLONA Amapá, a RDS do Rio Iratapuru e a FLOTA do Amapá), o que demonstra que as UC, mesmo constituídas há várias décadas, não cumprem a legislação e as recomendações científicas, o que traz prejuízos para a sua gestão e manejo (Brasil, 2022).
25O SNUC determina que o plano de manejo deve ser elaborado até cinco anos após a criação da unidade e deve ser revisto periodicamente de acordo com a necessidade de cada UC. A ausência desse documento na maioria das UC ambientadas no Amapá leva à carência de planejamento, o que dificulta a conservação e preservação dos componentes naturais e, em unidades de uso sustentável, atrapalha o desenvolvimento socioeconômico das áreas.
26A ausência do plano de manejo é mais problemática nas UC de uso sustentável, como é o caso das APA do Rio Curiaú, da Fazendinha e do Carmo do Macacoari e das RESEX do Rio Cajari e Beija-Flor Brilho de Fogo, UC que permitem a presença de comunidades residentes e nas quais ocorrem atividades produtivas que devem ser conduzidas de modo sustentável. Porém, o plano de manejo é fundamental também para as UC de proteção integral, como é o caso da REBIO do Lago Piratuba, onde a forte pressão antrópica causa conflitos constantes entre produtores empresariais (sojeiros, fazendeiros e madeireiros) que atuam no entorno das áreas, a gestão da unidade e as comunidades residentes no entorno da UC.
27Com relação às principais atividades que provocam conflitos pelo uso dos elementos naturais, o que se destaca no Amapá e pressiona as UC é o desflorestamento (Mapa 4) que, em geral, ocorre para atender às atividades da monocultura (soja), da pecuária (formação de pastos) e de empresas mineradoras. A área de abrangência em que se concentram os maiores desflorestamentos, observando os Mapas 2 e 4, é no cerrado e na floresta de transição.
Mapa 4 – Unidades de conservação e desflorestamento no Amapá entre 2007-2021
Fonte: organizado por Brito e elaborado por Souza (2022)
28Outra ferramenta importante para o gerenciamento de UC são os conselhos gestores. Eles auxiliam as instituições governamentais a administrar a unidade e manejar os seus componentes naturais e permitem a participação da sociedade nos processos de gestão (Macedo & Drummond, 2012). Os conselhos das UC podem ser consultivos ou deliberativos. Nas unidades do grupo de proteção integral devem ser consultivos. As florestas (nacionais, estaduais ou municipais), embora pertençam ao grupo de UC de uso sustentável, também devem dispor de conselhos consultivos (Brasil, Lei nº 9.985/2000).
29As RDS e RESEX devem ter conselhos deliberativos. Os membros das comunidades beneficiadas pela UC participam diretamente das decisões sobre as atividades produtivas e ambientais a serem executadas na área, considerando o seu plano de manejo (Brasil, Lei nº 9.985/2000). Nas demais UC do grupo de uso sustentável (APA, ARIE, RF e RPPN), a instituição de conselhos ainda não foi regulamentada.
30No Amapá, as UC federais e estaduais, de acordo com informações obtidas no CNUC (Brasil, 2022), dispõem de conselhos ativos, com a exceção das cinco RPPN e das unidades municipais. A sua instituição e posse nas UC são fundamentais para que a população envolvida direta e indiretamente com a área participe das discussões e decisões sobre as atividades socioprodutivas e ambientais que devem ser realizadas na área.
31A questão fundiária das UC é outro ponto importante para o gerenciamento e manejo. A falta de regularização fundiária é um dos maiores problemas enfrentados pela gestão das UC no Amapá e em muitos outros estados, causando graves conflitos socioambientais (Rocha, Drummond & Ganem, 2010). Nesse caso específico, há unidades totalmente regularizadas (ESEC Jari e REBIO do Parazinho), entretanto, a maioria se encontra parcialmente regularizada, inclusive com comunidades residindo dentro dos limites de UC de proteção integral e desenvolvendo atividades produtivas, como é caso da Vila Brasil no PARNA Montanhas do Tumucumaque e da comunidade quilombola do Cunani no PARNA Cabo Orange, respectivamente. Existem, também, unidades para as quais não existe informação no CNUC (Brasil, 2022) sobre esta questão, como a FLONA do Amapá, a FLOTA do Amapá, a RESEX Beija-Flor Brilho de Fogo e a APA do Carmo do Macacoari. As RPPN não apresentam problemas fundiários (Brasil, 2022).
32No Amapá, a insegurança fundiária causa conflitos entre a gestão das UC e os usuários das respectivas áreas. Ela se desdobra em insegurança jurídica para os gestores das unidades, que têm que conviver com problemas como agricultura predatória; pecuária extensiva, em especial a bubalinocultura; pesca irregular e caça criminosa. As unidades que têm maiores problemas ambientais relacionados a essa questão são a REBIO do Lago Piratuba, o PARNA Cabo Orange e a ESEC Maracá-Jipioca.
33Outra questão importante para refletir sobre as UC na espacialidade amapaense é a da degradação socioambiental. Em geral, as UC têm nível baixo de degradação e ocupação, principalmente se comparadas às UC do restante do Brasil. Isso ocorre por causa da dificuldade de acessá-las. As UC que apresentam os problemas mais graves no tocante à conservação e preservação ambiental são aquelas localizadas nas periferias dos núcleos urbanos de Macapá e Santana – as APA do Rio Curiaú e da Fazendinha.
34Entretanto, existem registros de danos ambientais em praticamente todas as UC, como: desflorestamentos (desmatamentos, queimadas e incêndios – REBIO do Lago Piratuba, APA do Rio Curiaú, FLONA do Amapá e FLOTA do Amapá); pecuária predatória (bubalinocultura – REBIO do Lago Piratuba, ESEC Maracá-Jipioca e APA do Rio Curiaú); garimpagem (RDS do Rio Iratapuru e PARNA Montanhas do Tumucumaque e Cabo Orange); e deposição inadequada de lixo (APA da Fazendinha e APA do Rio Curiaú). Há, também, registros de agricultura e pesca predatórias e caça em todas as UC do estado, com graus e intensidades diferenciados.
35Outra questão importante para avaliar a gestão das UC no Amapá é relativa à superposição de áreas legalmente protegidas. Existem, por exemplo, sobreposições entre UC e entre UC e TI (o PARNA Cabo Orange se sobrepõe em parte à TI Uaçá). Porém, se consideradas apenas as UC, de acordo com o CNUC (Brasil, 2022) a unidade que concentra o maior percentual de sobreposição é a FLOTA do Amapá, última UC estadual instituída no Amapá, com área de 2.369.400,00 hectares (Quadro 2). Ela abriga em seus limites partes das seguintes unidades: PARNA do Cabo Orange (3.111,05 hectares), RDS do Rio Iratapuru (36.542,14 hectares), RPPN Seringal Triunfo (9.442,06 hectares) e abarca totalmente a RESEX Beija-Flor Brilho, com área de 68.524,20 hectares. Outra UC que está totalmente sobreposta à outra é a RPPN Retiro Paraíso, com área de 46,75 hectares – ela se encontra dentro dos limites da APA do Rio Curiaú.
36As sobreposições de UC no Amapá não provocam conflitos significativos na gestão das unidades. A sobreposição é, aliás, uma condição prevista na legislação. A recomendação para lidar com essa situação é que os gestores das áreas devem levá-las em conta na elaboração dos respectivos planos de manejo e na instituição dos seus conselhos gestores. Ou seja, as sobreposições devem ser consideradas no planejamento, gestão e manejo das áreas.
37Uma característica importante das UC no Amapá são as suas áreas quase sempre extensas (a exceção é a APA do Carmo do Macacoari, com menos de um hectare). Na verdade, é comum que elas abranjam vários municípios, muitos dos quais também são extensos. Isso ocorre com o PARNA Montanhas do Tumucumaque, com área de 3.867.000 hectares – ele abrange terras de oito municípios do Amapá e um do Pará; a FLOTA do Amapá, com 2.369.400 hectares, presentes em dez municípios amapaenses; e a FLONA do Amapá, que envolve nove municípios, todos do estado do Amapá (Quadro 2).
38A partir da análise das UC do Amapá e do Mapa 3, verificamos outra característica relevante das áreas protegidas: algumas unidades extrapolam os limites do território amapaense. Isso ocorre na ESEC Jari, da qual apenas 66.633,96 hectares se encontram dentro da jurisdição do Amapá, representando 28,66% da área total da unidade; ou seja, a maior área dessa ESEC pertence ao Pará. Outro caso é o PARNA Montanhas do Tumucumaque, do qual 38.077 hectares se encontram no estado do Pará, o que representa 0,98% de sua área total.
39Outra especificidade das UC no Amapá é que o PARNA do Cabo Orange, que tem uma área total de 619.000 hectares, tem 219.226,3 ha (35,41% da unidade) em águas litorâneas. Essa condição levou, em 2012, a designação do PARNA como um Sítio Ramsar. Trata-se de um instrumento adotado pela Convenção Ramsar (tratado intergovernamental), que visa promover a cooperação entre países na conservação e uso racional das zonas úmidas no mundo (ICMBio, 2013). Outra especificidade importante é que, do rol de UC do Amapá, duas estão delimitadas em ilhas: é o caso da ESEC Maracá-Jipioca – que envolve as ilhas de Maracá e de Jipioca – e a REBIO do Parazinho – ambientada na ilha do Parazinho, arquipélago do Bailique (Mapa 3).
40O SNUC (2000) normatizou também os mosaicos de áreas protegidas e os corredores ecológicos. O Mapa 3 mostra que o oeste do Amapá é contemplado com várias áreas legalmente protegidas, sobretudo das tipologias UC e TI, formando um notável aglomerado de áreas protegidas. Foi com base nessa configuração que foi criado, em 2013, o Mosaico de Áreas Protegidas do Oeste do Amapá e Norte do Pará (Portaria nº 4/2013/MMA), formado pelas TI Wajãpi, Parque do Tumucumaque e Rio Paru D’Este e pelas UC PARNA Montanhas do Tumucumaque, FLONA do Amapá, FLOTA do Amapá, RDS do Rio Iratapuru, PNM do Cancão e RESEX Beija Flor Brilho de Fogo (Mapa 5).
Mapa 5 – Mosaico de áreas protegidas do oeste do Amapá e norte do Pará
Fonte: organizado por Brito e elaborado por Souza (2022)
41O mosaico de áreas protegidas é um modelo de gestão que busca participação, integração e envolvimento dos gestores das áreas protegidas vizinhas entre si e da sua população no gerenciamento de espaços protegidos (Brasil, Lei nº 9.985/2000). O objetivo é compatibilizar a presença da biodiversidade entre as áreas, valorizar a diversidade social e promover o desenvolvimento sustentável em um contexto regional (O Eco, 2017).
42Destacamos ainda outro conjunto de áreas protegidas no Amapá: ele compõe o chamado corredor da biodiversidade do Amapá (Mapa 3). A institucionalização do corredor foi anunciada no VII Congresso Mundial de Parques, em Durban, África do Sul, em setembro de 2003. Foi a resposta encontrada pelo governo amapaense “[…] para frear as expansões de atividades predatórias que estavam sendo praticadas, além de ser descrito como uma estratégia de conservação do bioma, objetivando fortalecer tanto a conectividade ecológica como o planejamento integrado do uso territorial” (Tostes & Ferreira, 2020, p. 7).
43Das 20 UC localizadas no território amapaense, 12 fazem parte desse corredor de biodiversidade (os PARNA do Cabo Orange e Montanhas do Tumucumaque, as ESEC Maracá-Jipioca e Jari, as RESEX do Rio Cajari e Beija-Flor Brilho de Fogo, a RDS do Rio Iratapuru, a REBIO do Lago Piratuba, a FLOTA do Amapá, a FLONA do Amapá, o PNM do Cancão e a RPPN Seringal Triunfo), além das cinco TI (Parque do Tumucumaque, Waiãpi, Uaçá, Galibi e Juminã). A respeito desse corredor, a Conservation Internacional do Brasil afirma que:
As áreas protegidas integram o conjunto do chamado Corredor da Biodiversidade do Amapá, um projeto que visou conciliar a conservação da natureza com o desenvolvimento social e econômico, pretendendo-se em longo prazo, construir uma economia forte para o estado baseada no ecoturismo e no turismo ecológico, e no uso inteligente dos recursos naturais. (Conservação Internacional do Brasil, 2009, p. 27)
44Os corredores de biodiversidade são ferramentas que objetivam alcançar a sustentabilidade socioambiental, ou seja, considera os princípios do desenvolvimento sustentável e se caracterizam por conectar áreas legalmente protegidas vizinhas entre si. A expansão, recolonização, preservação e desenvolvimento dessas áreas se baseiam “[…] em princípios de planejamento regional, em larga escala, podendo englobar tanto as áreas urbanas como rurais, unindo grandes unidades de paisagem e biomas” (Akashi Junior & Castro, 2010, p. 21).
45Se tivéssemos mais espaço, essas reflexões sobre as condições de gestão e manejo das UC no Amapá poderiam ser ampliadas ao levarmos em conta outras variáveis, como: o potencial biológico; as condições de acessibilidade; os financiamentos; a disponibilidade e a quantidade adequada de equipamentos e de pessoal (técnico); e questões de monitoramento, fiscalização e controle que, em geral, são carentes em todas as áreas. Essas questões são relevantes, pois fazem parte do processo de proteção, preservação e conservação das áreas e são pertinentes e comuns à maioria das UC.
46A criação de UC é um instrumento de gestão territorial e ambiental que o Estado brasileiro utiliza como meio de gerir as paisagens e os recursos da natureza. Na espacialidade amapaense, pela quantidade e percentual registrados, as UC vem sendo uma ferramenta usada intensivamente para proteger e manejar a diversidade biológica do estado. Apesar desse uso intensivo, o poder público falha ao não proporcionar as condições necessárias para que as unidades efetivamente protejam a natureza e gerem benefícios para a sociedade amapaense e brasileira. O ato de criação de UC, por si só, não cumpre os objetivos da gestão socioambiental.
47Portanto, é necessário construir a gestão dessas áreas para que elas cumpram as suas finalidades. Essa construção passa pela elaboração e execução dos planos de manejo e pela nomeação dos conselhos gestores das unidades. Embora determinados legalmente, no Amapá esses dois instrumentos caminham a passos lentos. É preciso também, e com urgência, equacionar e resolver a precária situação fundiária das unidades, o que exige vultosos aportes financeiros e técnicos. A indefinição fundiária implica conflitos permanentes entre gestores das UC e os usuários do potencial ambiental do estado. É preciso ainda reverter o sucateamento dos órgãos de fiscalização e a flexibilização das leis de proteção ambiental, que suscitam diferentes tipos e magnitudes de degradação socioambiental, como registrado no Mapa 4.
48Um penúltimo aspecto a ser considerado é a variedade de categorias de UC presentes no Amapá. Sete UC pertencem ao grupo de proteção integral, a maioria com áreas extensas; as outras 13 UC pertencem ao grupo de uso sustentável. Isso demonstra a existência de uma grande diversidade de finalidades das áreas. Por fim, apesar do alto percentual de áreas legalmente protegidas no Amapá, há carências de ferramentas de gestão ambiental em domínios florísticos específicos, como a floresta de transição e o cerrado.
49Agradecemos ao Programa Nacional de Cooperação Acadêmica na Amazônia - PROCAD/Amazônia. Estabelecido entre os programas de Pós-Graduação PPGCA/UNIFAP, PRONAT/UFRR e PPGCDS/UNB.