1Os modelos digitais de representação da superfície terrestre, comumente conhecidos como Modelos Digitais de Elevação (MDEs), são uma importante fonte de informações para os estudos geomorfológicos. A origem dos dados que irão compor esses modelos pode variar, desde àqueles elaborados a partir de isoípsas até os gerados por meio de tecnologias de sensores remotos, como o Shuttle Radar Topography Mission (SRTM) ou o Light Detection and Ranging (LiDAR).
2Cada um destes dados possui particularidades de resolução, abrangência de cobertura, níveis de precisão e acurácia distintos, vindo representar apenas as elevações do terreno (Modelo Digital de Terreno – MDT), bem como as elevações por sobre o terreno, como benfeitorias e o dossel florestal (Modelo Digital de Superfície – MDS).
3A capacidade de representação destes dados e suas implicações é um tema discutido com recorrência na literatura. Zhang e Montgomery (1994), por exemplo, avaliaram a reposta de produtos com diferentes resoluções de grids, variando entre 2, 4, 10, 30 e 90 metros. Os resultados apontaram uma influência da dimensão das células nas respostas da modelagem de fluxo, havendo uma melhora no grid de 10 metros em relação aos de 30 e 90 metros, mas nenhuma melhora significativa quando comparado com grids de 2 e 4 metros. Nesta mesma linha, Grohmann (2015) comparou diferentes Modelos Digitais de Elevação - MDEs (SRTM, ASTER GDEM e Topodata) com os dados do projeto Radiografia da Amazônia, identificando que o ASTER GDEM apresentou uma menor correlação com a morfologia do terreno.
4Dentre os estudos geomorfológicos que fazem uso destes modelos digitais, têm-se àqueles relacionados ao mapeamento de áreas potencialmente instáveis a ocorrência de processos como os movimentos de massa. Estudos envolvendo esta temática tomaram vulto no Brasil, principalmente em face aos eventos catastróficos que afetaram, por exemplo, algumas cidades de Santa Catarina em 2008, a região serrana do Rio de Janeiro em 2011, as cidades de Antonina e Morretes no Paraná (2011), e municípios do Vale do Ribeira (SP) em 2014. De acordo com um levantamento organizado por Macedo e Martins (2015), entre os anos de 1988 e 2015 foram registrados 773 eventos de movimentos de massa em 243 municípios brasileiros, causando a morte de 3.396 pessoas.
5Diferentes métodos vêm sendo desenvolvidos no intuito de indicar áreas potencialmente instáveis na paisagem, buscando compreender os mecanismos deflagradores do processo a partir de uma integração entre os fatores condicionantes da topografia, da morfometria do relevo, dos solo, das drenagens, da quantidade de precipitação e da dinâmica hidrológica (FERNANDES et al. 2001). Com os avanços no desenvolvimento de Sistema de Informação Geográfica (SIG), especialmente a partir dos anos de 1990, diferentes métodos foram desenvolvidos buscando apontar áreas suscetíveis a ocorrência dos processos de movimentos de massa. Dentre eles estão os modelos em bases físicas que se apoiam em entendimentos matemáticos que permitem avaliar relações previsíveis a partir de variáveis dependentes e independentes (CHORLEY, 1967), expressando as relações observadas em campo ou as feições morfológicas através de equações matemáticas (FERNANDES, 2016).
6Um exemplo é o modelo SHALSTAB (Shallow Landsliding Stability Model) desenvolvido por Montgomery e Dietrich (1994) e operacionalizado em SIG por Dietrich e Montgomery (1998). O modelo calcula, para cada unidade do terreno de uma bacia hidrográfica, seu potencial de instabilidade para a ocorrência de escorregamentos rasos, baseando-se em parâmetros físicos do solo (coesão e ângulo de atrito), profundidade do solo, área de contribuição à montante e declividade. Deste modo, a representação digital do relevo é fundamental para a sua aplicação, uma vez que é a partir desta representação que se pode extrair as informações essenciais de área de contribuição à montante e os ângulos de inclinação das vertentes, que serão relacionadas com os parâmetros do solo (espessura, coesão e ângulo de atrito).
7Desde os anos 2000 diversos trabalhos fazem uso do SHALSTAB no Brasil, como Guimarães et al. (2003a), Gomes et al. (2005), Zaidan e Fernandes (2009), Vieira et al. (2018), dentre outros. Gomes et al. (2005), em bacias hidrográficas na cidade do Rio de Janeiro, compararam os resultados do SHALSTAB utilizando dados topográficos em distintas escalas (1:10.000 e 1:50.000). Os autores apontaram uma diferença no percentual de área identificadas como Incondicionalmente Instável. Utilizando a escala 1:10.000 70% das cicatrizes de escorregamentos coincidiram com esta classe, mas utilizando a escala 1:50.000, este valor caiu bruscamente para 12%.
8No intuito de identificar áreas potencialmente instáveis no município de Juiz de Fora (MG), Zaidan e Fernandes (2009) aplicaram o modelo e os resultados mostraram um alto percentual de acerto entre as classes mais instáveis e as cicatrizes mapeadas. Todavia, os autores destacaram dificuldades na elaboração do mapa de cicatrizes devido à dinâmica de ocupação da área. Dentre os variados trabalhos internacionais, vale mencionar Teixeira et al. (2014), que avaliaram a eficiência do SHALSTAB quando comparado ao Fator de Segurança, apontando que houve uma diferença de pouco mais de 2% em relação ao acerto de cada modelo.
9Uma discussão mais aprofundada sobre as implicações de MDEs em análise de instabilidade poder ser verificada, por exemplo, em Claessens et al. (2005).
10Deste modo, o presente trabalho questiona se uma melhor resolução do MDT implica em resultados mais eficientes na modelagem de instabilidade de vertentes. Com isso, o objetivo do trabalho foi avaliar a resposta de um modelo em base física (SHALSTAB) em face da resolução da célula que compõe o modelo digital de representação do relevo, considerando a aplicação dos mesmos valores dos parâmetros físicos do solo para uma área afetada por escorregamentos rasos. É importante destacar que foram adotadas informações referentes exclusivamente ao terreno (isoípsas) e, portanto, os modelos digitais são tratados, doravante, como Modelos Digitais de Terreno (MDTs).
11O SHALSTAB representa espacialmente a suscetibilidade potencial de ocorrência de escorregamentos translacionais rasos, tendo como área de aplicação uma bacia hidrográfica, a partir da compilação de um modelo de estabilidade das vertentes e de um modelo hidrológico em condição estável (steady-state) (MONTGOMERY e DIETRCH, 1994). Os modelos combinados (estabilidade e hidrológico) determinam uma razão entre a quantidade de precipitação pluvial e a transmissividade do solo suficientes para ocorrência de uma ruptura. O primeiro se apoia em um modelo de estabilidade das vertentes baseado na equação do talude infinito, que define uma razão entre as tensões de sustentação e desestabilização dos materiais; o segundo se baseia na proposta de O’Loughlin (1986), que leva em conta a razão entre a concentração e a transmissão da água no solo, vindo a indicar, o padrão espacial de equilíbrio de saturação do solo, definido por uma área de contribuição a montante (Equação 1).
12Onde:
13q = precipitação pluvial crítica necessária para a ruptura [mm/dia]; T = transmissividade do solo (razão entre a condutividade hidráulica saturada e a espessura do solo) [m²/dia]; a = área de contribuição [m²]; b = comprimento do contorno da célula [m]; θ = ângulo da encosta [º]; ρw = densidade da água [g/cm³]; g =aceleração da gravidade [m/s]; z = espessura do solo [m]; ρs = densidade global do solo saturado [g/cm³]; φ = ângulo de atrito do solo [º]; c’= coesão efetiva do solo [kPa].
14Dietrich e Montgomery (1998) hierarquizaram sete classes de estabilidade apoiados nos resultados da formulação, e que são adotados nos produtos gerados pelo modelo, apontando ao menos quatro usos potenciais do modelo: a geração de mapas de perigo; a indicação de áreas menos suscetíveis a escorregamentos para práticas de reflorestamento; planejamento de sistema viário; identificação/seleção de setores prioritários para análise (monitoramento) em bacias hidrográficas. Todavia, os autores não negam a possível ocorrência de incongruências nos resultados, que podem acontecer quando o modelo indica áreas não sujeitas a escorregamentos, mas que foram afetadas, ou, áreas sujeitas a escorregamentos, mas que ainda não foram afetadas (MONTGOMERY, et al., 1998).
15Um maior aprofundamento da formulação, que levou ao desenvolvimento do SHALSTAB, pode ser verificado em Guimarães et al. (2003), no qual destacaram que o modelo não condiciona à plataforma SIG a decisão de classificar níveis de estabilidade e em Dietrich et al. (2001), no qual destacam seu potencial de uso para áreas com parcas informações geotécnicas.
16A área de estudo é a Bacia Hidrográfica do Bom Brinquedo (BHBB), com 0,16 km², localizada no Morro do Bom Brinquedo, junto a área urbana do município de Antonina/PR (Figura 1). A área foi definida em face a disponibilidade de dados cartográficos em distintas escalas e por conter registros de eventos de escorregamentos rasos passíveis de identificação (cicatrizes).
17Essa área integra o compartimento dos Morros Isolados Costeiros (OKA-FIORI et al., 2006) e foi severamente afetada (Figura 2) por um conjunto de movimentos de massa (escorregamentos rasos) deflagrados após um período de precipitação pluvial (98,6 mm/24hs) ocorridos em 11/03/2011, com um acúmulo de 263mm nos 10 dias antecedentes aos evento (MINEROPAR, 2013; PICANÇO et al. 2014).
Figura 1: Localização da Área de Estudo.
Fonte: ESRI, IBGE. Elaboração dos autores.
Figura 2: A) área urbana do município de Antonina (PR), circundada pelas Morros Isolados Costeiros; B) Área afetada por escorregamentos; C e D) Cicatriz de escorregamentos (em vermelho).
Fonte: Fotos dos autores em 2011 (B) e 2014 (A, C e D).
18Os dados utilizados para a construção dos MDTs consistiram em: (a) curvas-de-nível com equidistância de 10 m, provenientes de carta topográfica em escala 1:25.000 (DSG, 2002); (b) curvas-de-nível com equidistância de 5 m; (c) curvas-de-nível com equidistância de 1 metro, sendo que estes dois últimos provenientes de dados topográficos em escala 1:2.000 do Plano Diretor Municipal (PMA, 2007). Não obstante, deve-se esclarecer que as curvas de nível de 1 metro resultaram de interpolação a partir das curvas de 5metros e houve a necessidade de retificação das mesmas, o que foi realizado manualmente, não sendo, portanto, resultado de interpretação fotogramétrica (Figura 3).
Figura 3: (A) Curvas-de-nível com 1 e 5 metros de equidistância antes da retificação, e (B) após a retificação.
Fonte: Prefeitura municipal de Antonina. Elaboração dos autores.
19Para a elaboração dos MDTs foi utilizado o método r.surf.contour (RSC) disponível no programa GRASS (Geographic Resources Analysis Support System) (GRASS, 2017) e que permite a elaboração de um arquivo raster a partir de curvas-de-nível, sendo que a resolução do grid de cada MDT foi definida pelo valor da equidistância entre as curvas (10, 5 e 1m).
20A aplicação do SHALSTAB foi feita a partir do programa SAGA (System for Automated Geoscientific Analyses) (CONRAD et al. 2015). O primeiro procedimento foi o preenchimento de vazios (fill sinks), usando o método proposto por Planchon e Darboux (2001), sendo o produto (raster) desta aplicação o dado base para a operação do modelo. Na sequência foi obtido o raster de acúmulo de fluxo (flow accumulation) usando do método Multiple Flow Direction, além da representação do parâmetro de inclinação das vertentes (Slope).
21Nos três testes (MDT 10, 5 e 1m) foram utilizados os mesmos valores dos parâmetros físicos do solo, obtidos na mesma bacia (BHBB) por Lopes (2013): Ângulo de Atrito (ϕ): 31°; Peso Específico (Ps): 2,6g/cm³; Profundidade (Z): 1m; e Coesão (c’): zero. Para a condutividade hidráulica (m/h) adotou-se o valor encontrado por Gomes e Vieira (2016), que realizaram medições usando um Permeâmetro de Guelph em uma bacia hidrográfica afetada por movimentos de massa na Serra do Mar paulista.
22Para avaliar a eficiência dos resultados dos mapas de suscetibilidade foi feita uma verificação quanto à Distribuição das classes de instabilidade (D) dada pelo SHALSTAB (sete classes), ou seja, o percentual de ocorrência dessas classes em toda a bacia para cada um dos MDT’s utilizados. Na sequência, foi empregado um mapa com 17 de cicatrizes de escorregamentos elaborado por Martins et al. (2017a) para a extração da Concentração de Cicatrizes (CC), que é o percentual de cada classe de instabilidade dado pelo modelo verificada apenas no interior da cicatriz, permitindo quantificar o percentual de ocorrência de classes mais ou menos instáveis em áreas que já sofreram ruptura. Esta abordagem tem sido adotada, satisfatoriamente, em diversos trabalhos que utilizaram o SHALSTAB (Guimarães et al., 2003 e Vieira et al., 2017, dentre outros).
23O MDT-10 apresentou a maior diferença no valor médio das células (Tabela 1), aproximadamente 73, enquanto os outros dois mostraram-se muito similares. Porém, o menor desvio padrão ocorreu naquela mesma representação (38) contra valores muito similares dos MDTs 5 e 1. Já os valores mínimos das células são distintos, sendo que no MDT-10 foi de 20 metros e nos outros dois de 7 e 10 metros. Isso está associado ao método de interpolação empregado, no qual as variações de valores mínimos e máximos não ultrapassam os valores altimétricos das curvas de nível. Assim é possível inferir uma limitação na capacidade dos dados originais (curvas de nível) em representar as menores altimetrias do relevo da bacia e, para as maiores altimetrias, essa diferença diminui entre os MDTs de melhor resolução (154 e 155), aumentando para o MDT-10 (150).
Tabela 1: Valores das células de cada MDT.
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Total de Células
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Mínimo
|
Máximo
|
Média
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Desvio Padrão
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MDT-1m
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164.181
|
7
|
154
|
66,553
|
40,666
|
MDT-5m
|
6.580
|
10
|
155
|
66,796
|
40,734
|
MDT-10m
|
1.648
|
20
|
150
|
73,981
|
38,927
|
Elaboração dos autores.
24Os resultados revelaram que a classe Incondicionalmente Instável obteve a mesma Distribuição (D) nos três MDTs (Figura 4), sobremaneira nos trechos médios das vertentes. O MDT-5 obteve a maior D na classe mais instável, com um pouco mais de 16%, enquanto os outros dois MDTs possuem D em torno de 15%. Já para a segunda classe mais instável (0-50mm/dia), os três MDT’s registraram valores próximos a 24%. Todavia, nos três testes a classe de maior D foi a Incondicionalmente Estável, 52, 50 e 48%, reduzindo conforme o aumento da resolução (10, 5 e 1m, respectivamente) (Figura 5).
Figura 4: Mapa de classes do SHALSTAB para a Bacia do Bom Brinquedo, considerando a variação da resolução dos MDTs (10, 5 e 1m).
Elaboração dos autores.
Figura 5: Gráficos de Distribuição de Classes (D) e Concentração de Cicatrizes (CC) do modelo SHALSTAB para a BHBB, considerando o MDT 1, MDT 5 e MDT 10.
Elaboração dos autores.
25As quatro classes intermediárias apontaram baixos valores nos três casos, sendo que o MDT-10 registrou o menor valor na classe 50-100mm/dia (5,22%), não havendo grande distinção em relação aos outros dois MDTs, para esta mesma classe (5,7% e 6,4% para 5 e 1m, respectivamente). Vale destacar também que foram registrados valores próximos de zero, ou mesmo nulos, nos MDTs 10 e 5 para as classes 200-400mm/dia e >400 mm/dia (Figura 5). Essa insignificância nos valores intermediários encontra par no trabalho feito por Martins et al. (2017b), que analisaram a influência de MDTs de origens distintas quando aplicado o SHALSTAB. Naquele estudo os autores empregaram uma versão do SHALSTAB disponível em ambiente SIG (DIETRICH e MONTGOMERY, 1998), que expressa os resultados, também em sete classes, a partir de uma razão logarítmica de precipitação e transmissividade (Log Q/T).
26Considerando a Concentração de Cicatrizes (CC), o MDT-5 apresentou o maior valor para a classe mais estável (34%) e os dois outros, valores entre 27% (MDT-5) e 29% (MDT-1). Isso permitiu avaliar que, mesmo o MDT-5 tendo apresentado um maior CC para a classe mais instável, também marcou um maior falso positivo, lembrando que os outros dois também tiveram esse registro, mas com percentual menor.
27Já para as duas classes de maior instabilidade somadas (Incondicionalmente Instável e 0-50mm/dia), o MDT-10 registrou 60%, o MDT-5 62% e o MDT-1, um pouco mais de 66%. Esses valores permitiram avaliar que o MDT-1 teve o melhor desempenho. Entretanto, é fundamental ressaltar que os percentuais de Distribuição e de Concentração de Cicatrizes devem ser avaliados não isoladamente, mas também considerando o número total de células que compõem o grid, uma vez que há um aumento no número de células do grid diante de uma maior resolução do raster, levando ao aumento do número de células de cada classe.
28Vale lembrar que o SHALSTAB indica as vertentes potencialmente instáveis, partindo de uma condição “incondicionalmente estável” até uma situação “incondicionalmente instável”. Deste modo, para fins de definir qual área deve ser entendida como potencialmente instável deve-se considerar quais das classes de instabilidade serão adotadas na análise. Esse apontamento é trazido por Dietrich et al. (2001), que apresentaram uma discussão em que abordam qual, ou quais, dentre as classes do modelo, devem ser consideradas como instáveis, levando em conta a resolução grid. Segundo estes autores, para um grid de 5 metros é mais adequado considerar como potencialmente instável as áreas que ocorrem nas duas classes mais instáveis do modelo (Incondicionalmente Instável e 0-50mm/dia). Por conseguinte, as demais classes devem passar a ser consideradas quanto menor a resolução (Dietrich et al., 2001).
29Deste modo, é possível considerar que o MDT-1 teve um CC de um pouco mais de 29% para a classe Incondicionalmente Instável, o MDT-5, pouco mais de 62% (somando as duas classes mais instáveis) e o MDT-10, próximo a 70%, considerando as três classes mais instáveis. Já, levando em conta o CC para a classe mais estável, o MDT-10 apresentou o menor percentual, ou seja, um menor falso positivo.
30Em resumo, a adoção de um grid de melhor resolução não permitiu um maior refinamento na distribuição de células instáveis no interior das cicatrizes, uma vez que os percentuais não foram tão discrepantes entre si (Figura 5). Além disso, todos os três testes tiveram algum percentual de ocorrência de classes estáveis no interior de cicatrizes (entre 27 e 35%).
31Cabe apontar uma possível limitação da representação de 10 metros, pois indica valor zero em uma classe do SHALSTAB (>400mm/dia). Isso pode estar associado à incapacidade desta resolução em representar certas nuances do relevo que poderiam materializar esta classe, já que para as outras duas resoluções (5 e 1m) estas nuances foram representadas, ainda que minimamente e com decréscimo, a partir da resolução mais fina para a de 5 metros (0,47 e 0,3%). Em suma, um percentual muito pequeno de células do grid ocorreu dentro desta classe no MDT-5 e 1, enquanto no MDT-10, estas células não ocorreram.
32Essa relação entre a resolução do grid e a área da bacia hidrográfica analisada é um fator que a ser levado em conta, uma vez que a aplicação de modelos, a exemplo do SHALSTAB, tem sido feita considerando resoluções e dimensões de bacia bastante distintas, assim como exemplifica o trabalho de Seefelder (2017) que, ao avaliar diferentes aplicações de modelos, identifica testes realizados em bacias com 820km² usando MDEs com 5 metros de resolução bem como 10km² adotando um grid de 30m.
33Já o MDT de melhor resolução possui uma limitação que está expressa no trabalho em tela, pois deriva de curvas de nível geradas por interpolação e não de restituição fotogramétrica. A disponibilidade de produtos cartográficos de maior escala não é comum, a exemplo de dados do Portal de Mapas do IBGE (IBGE, 2019) que conta com 476 cartas topográficas em escala 1:25.000 do território brasileiro. Particularmente, no estado do Paraná (onde se insere a área de estudo deste trabalho), há disponibilidade 86 de cartas topográficas em escala 1:25.000 referente ao Projeto Pró-Atlântica, cuja área de cobertura se restringe a região da Serra do Mar e litoral (ITCG, 2019); não existindo nestes dois bancos de dados disponibilidade de mapeamentos em escala de maior detalhe.
34Diante dos resultados apontados, o MDT de menor resolução (10 metros) foi capaz de indicar áreas potencialmente instáveis de maneira satisfatória, não havendo melhora significativa quando do aumento da resolução. Tal afirmação encontra apoio em trabalhos anteriores, como o já mencionado Zhang e Montgomery (1994) que avaliaram a eficácia de modelos com resoluções variando de 90 a 2 metros, não encontrando melhora com dados de 4 e 2 metros. YUAN et al. (2008) ao avaliarem suscetibilidade a escorregamentos usando 11 diferentes dados com resolução (entre 5 e 190 metros), concluíram não haver uma melhor acurácia nos mapas com resolução mais refinada. Em trabalhos mais recentes, Oliveira et al. (2018), avaliaram a influência de modelos digitais de elevação de 1 e 5 metros no mapeamento de áreas suscetíveis a escorregamentos, usando regressão logística. Estes autores também concluíram que não houve influência significativa nos resultados considerando as diferentes resoluções.
35Os resultados mostraram que não houve significativa melhora na indicação de áreas potencialmente instáveis na bacia considerando os diferentes MDTs. Deste modo, aponta-se que a melhora na resolução aumentou o número de células definidas como Incondicionalmente Instáveis, mas não significou uma melhora direta na resposta do modelo de análise de instabilidade. Além disso, todos os testes indicaram a ocorrência da classe de estabilidade no interior das cicatrizes, sendo que o menor percentual foi no MDT de 10m.
36Considerando a falta de mapeamento sistemático em escala de detalhe no Brasil, pode-se julgar adequado a aplicação do modelo fazendo uso de MDTs com resolução espacial de 10 metros. Entretanto, investigações futuras poderão aprofundar as análises sobre as implicações da dimensão da área da bacia e a resolução mínima e máxima mais adequadas para simulações de instabilidade de vertentes usando modelos (particularmente nos que se refere a obtenção da declividade e da área de contribuição) que possuem um forte apoio na representação topográfica.
37O emprego de modelos matemáticos em base física para a análise de instabilidade de vertentes tem como dado básico a representação digital do relevo. Portanto, deve-se atentar para a relação entre a resolução do grid e a definição de qual, ou quais classes de instabilidade devem ser consideradas na validação dos mapeamentos, particularmente em modelos em que as classes indicam um aumento de potencial de instabilidade e não um único limite entre instável ou estável.