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Dossiê Expansão do Agronegócio no Brasil: características, contradições e conflitos

Terra, poder e violência: conflitos no Mato Grosso do Sul e a relação do agronegócio com os Kaiowá e Guarani

Terre, pouvoir et violence: conflits au Mato Grosso do Sul et relations de l’agrobusiness avec les Kaiowá et les Guaranis
Land, power and violence: conflicts in Mato Grosso do Sul and the relationship of agribusiness with the Kaiowá and Guarani
Daniel Macedo Lopes Vasques Monteiro

Résumés

Selon l’Atlas de l’agriculture brésilienne (2017) le Mato Grosso do Sul a 92% de son territoire occupé par des propriétés privées dont 83% sont des grandes propriétés. Les terres indigènes ne représentent que 2% de l’ensemble de l’État. De cette manière, le scénario de la terre du Mato Grosso do Sul rapporte l’inégalité existante dans les zones rurales, qui conduisent à l’expulsion des peuples indigènes de leurs terres d’origine, résultat du processus historique de violence qui actuellement se perpétue par des actions et des pratiques de l’industrie agroalimentaire. De cette façon, cet article vise à comprendre le conflit sur le territoire contesté et les actions violentes du capital, surtout de l’industrie agroalimentaire avec les peuples Kaiowá et Guarani. Pour cela, il est essentiel de comprendre les catégories de pouvoir et de violence (Arendt, 1985), et en conséquence comment le secteur agroalimentaire agit en essayant de s’impose devant ces peuples indigènes. Il faut noter au’en plus de la revue bibliographique, des recherches ont été effectuées sur des sites de nouvelles et des mouvements sociaux qui ont contribué au débat sur les violences qui ont se passés lors du conflit relatif à la terre. Le travail sur le terrain a été effectué.

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Texte intégral

Introdução

1O estado de Mato Grosso do Sul atualmente se constitui no cenário mais polvoroso e intenso de disputa de terras entre os não-indígenas e os indígenas no Brasil. Esses atores especificamente neste trabalho são representados pelo agronegócio e pelos povos Kaiowá e Guarani.

  • 1 Relatórios do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) intitulados como: “Violência contra os Povos (...)
  • 2 Os números apresentados pelas duas fontes de dados não são os mesmos, porém nos dois casos a propor (...)

2Os assassinatos, envolvendo pessoas indígenas no estado, segundo os Relatórios do Conselho Indigenista Missionário “Violência contra povos indígenas”1, são superiores a outras unidades da federação. Os relatórios separam as informações em “dados oficiais” junto à Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) e “dados coletados pelo CIMI”2. No primeiro, os dados são apresentados em valores absolutos, enquanto no segundo cada assassinato é especificado contendo: o nome da vítima (alguns casos são anônimos), o povo, a terra indígena, o município, o local da ocorrência, a descrição do assassinato, o meio empregado e a origem da informação. Por exemplo:

Vítima: Marinelza Lopes.

Povo: Guarani e Kaiowá.

Terra Indígena: Amambai.

Município: Amambai.

Descrição: Em depoimento à polícia, o marido da vítima, que não é indígena, disse que ele e a esposa teriam ido até uma fazenda buscar milho para as galinhas. Ao avistar dois homens na mata, ele ouviu tiros e viu os homens saírem em fuga para a mata. O caso estava sendo investigado.

Meio Empregado: Armas de fogo.

Com informações de: A Gazeta News, 18/2/2018 (CIMI, p.84, 2019).

3Em 2018 os dados coletados pelo CIMI registraram 50 assassinatos de indígenas no Brasil, sendo 13 em Mato Grosso do Sul. Nos anos anteriores o cenário foi similar, sendo de 2012, o valor mais alarmante desde o início dos registros nos relatórios, aparecendo o estado com 61% do total nacional. Esses dados corroboram que o conflito fundiário gerado pela disputa violenta com o agronegócio é pago com vidas indígenas e precariedades presentes no cotidiano desses povos.

4Pode-se afirmar que existe no estado um etnocídio guarani, sendo a cultura e o povo perseguidos e a destruição dos seus modos de vida e pensamentos ameaçados constantemente. Segundo os dados oficiais da SESAI, contidos no relatório do CIMI, o número absoluto de indígenas assassinados entre 2003 e 2018 é de 499 óbitos no estado de Mato Grosso do Sul, ou seja, 39,8% dos indígenas assassinados em todo Brasil neste período, mostrando o foco de tensão e da real situação no estado em relação às políticas públicas de segurança voltadas para estes povos.

5A expansão do capitalismo e, principalmente, da fronteira agrícola para o interior do Brasil, gerou espoliações e destruições das culturas e povos que ali viviam. Atualmente, o agronegócio, força atuante e ideológica em todo país, se articula nas investidas contra os povos indígenas com a finalidade de ocupar suas terras e extrair lucro dos bens naturais ali existentes.

  • 3 Os relatórios do CIMI entre 2003 e 2005 que estão disponíveis para download não revelam os assassin (...)

6Ao mapear os assassinatos no estado entre 2006 e 2018, percebe-se que a parte sul é a região onde ocorre a maior parte dos conflitos. Concentram-se nos municípios de Dourados (142 casos), Amambai (96), Caarapó (38), Coronel Sapucaia (15), Japorã (14), Tacuru (12) e Paranhos (11) (Ver Mapa 01)3. A característica em comum nesses municípios é a localização de Reservas Indígenas criadas para agrupá-los – principalmente os Kaiowá e Guarani – no início do século XX.

  • 4 A reserva indígena é uma modalidade de Terra Indígena de acordo com a legislação vigente (CF/88, Le (...)

7A intenção de “confiná-los” em terras aleatórias, muitas criadas há mais de 100 anos, demonstram que os problemas permanecem até hoje envolvendo os conflitos por terra. Em 1910 a presidência da nascente república brasileira criou o SPILTN (Serviço de Proteção ao Índio e Trabalhadores Nacionais) como o primeiro órgão institucionalizado pelo Estado a tratar da causa indígena. Contudo, somente com a criação do SPI (Serviço de Proteção ao Índio), em 1918, é que políticas mais diretas relacionadas aos territórios e povos indígenas começaram a fazer parte da estratégia da construção de um Estado-Nação, incluindo esses territórios e povos nas políticas e projetos do país, com a finalidade de incentivar o “progresso e a ocupação” do Centro-Oeste brasileiro, abrindo espaços para a agropecuária e a criação de núcleos urbanos. O Estado, através do SPI, demarcou reservas indígenas4, conferindo-lhes um caráter de confinamento, sendo ali colocados indígenas de etnias distintas. Nesse contexto, oito Reservas foram criadas entre 1915 e 1928, no âmbito do ideal positivista que dominava na nação, com o objetivo de tornar o índio um trabalhador nacional.

8Ainda segundo o Relatório de Violência contra os Povos Indígenas no Brasil, dados de 2018 do CIMI revelam que o estado do Mato Grosso do Sul é o segundo no Brasil com Terras Indígenas com pendências administrativas, totalizando 115, atrás apenas do estado do Amazonas, com 222. Dentre essas áreas no estado, 105 são terras dos povos Kaiowás e Guaranis. Quando se trata de luta por terra no Brasil, esses povos se destacam devido à criticidade da situação em que se encontram, resultado de um processo histórico de espoliação que atravessa séculos.

Mapa 01: Assassinatos de indígenas em Mato Grosso do Sul entre 2006 e 2018

Mapa 01: Assassinatos de indígenas em Mato Grosso do Sul entre 2006 e 2018

Elaboração do autor com base em CIMI e FUNAI.

9As investidas do agronegócio acontecem em diversas escalas e intensidades, porém é importante compreender como suas ações são pensadas e articuladas no território e de que forma seus agentes agem no conflito agrário. Assim sendo, o presente trabalho tem como objetivo compreender o conflito pelo território em disputa e as ações violentas do capital, principalmente do agronegócio, para com os povos Kaiowá e Guarani. Para dar conta da proposta foram feitos levantamentos em sites de notícias e de movimentos sociais, além de trabalho de campo na região.

10Este artigo está organizado em duas sessões. Na primeira debate-se a noção de território que está em voga nesta disputa, assim como as categorias de poder e violência analisadas por Arendt (1985), a qual afirma que só aqueles que têm seu poder ameaçado se utilizam da violência como forma de se impor diante do adversário. Na segunda parte há uma relação entre os tipos de violência categorizadas por Souza (2008) e a realidade do povo Kaiowá e Guarani do estado, destacando que as violências não são fragmentadas e fazem parte de um todo gerado, direta ou indiretamente, pelas disputas de terras em Mato Grosso do Sul.

11Pretende-se aqui fazer uma Geografia comprometida com as lutas sociais, a fim de cumprir o papel político da ciência ao se posicionar sobre as desigualdades historicamente construídas pelo processo de apropriação de terras e de extermínio de culturas tradicionais existentes no Brasil e na América Latina. Portanto, a proposta deste artigo é fazer análises referentes às práticas violentas do agronegócio nessa porção do país.

1. Território, poder e violência

12As relações entre indígenas e não-indígenas podem ser abordadas de diversas maneiras na geografia. Porém, a intenção deste trabalho, é focar no conflito especificamente relacionado à questão territorial, em uma perspectiva política da problemática, buscando dessa forma compreender “quem domina, governa ou influencia quem nesse espaço, e como?” (SOUZA, 2013, p.87). O território utilizado neste trabalho não está sendo empregado de acordo com o discurso do Estado-Nação, mas como a “conjunção dos conceitos de espaço e poder” (Souza, 2013, p.86), quando há o exercício do poder e de controle sobre um determinado espaço.

13Raffestin afirma que o espaço é a “prisão original”, enquanto o território “é a prisão que os homens constroem para si” (1993, p.144), ou seja, quando o homem modifica o espaço de acordo com suas intenções, “uma ação conduzida por um ator sintagmático” (1993, p.143). Esses atores, segundo Raffestin (1993), se territorializam quando se apropriam de um determinado espaço, organizando-o a partir de nós, redes e malhas, podendo ser analisado como objetivo: “decifrado a partir das combinações estratégicas feitas pelos atores” e, como meio: “decifrado por meio dos ganhos e dos custos que acarretam os atores”.

14O território “construído pelos homens como prisão para si” só pode ser compreendido enquanto tal, quando a finalidade da interpretação for sobre ações ocidentais. No que se refere às práticas indígenas, esse território não se constitui como prisão em si, pois para esses povos, em suas terras não há fronteiras estabelecidas por cercas ou contratos assinados em papéis timbrados. A concepção desse corpo indígena circular não cabe nas amarras ocidentais dos territórios e territorialidades compreendidas pelo agronegócio (Figura 01).

Figura 01: Jovens Kaiowás pulando a cerca da fazenda para se divertirem – Tekoha Guirá Kambi'y

Figura 01: Jovens Kaiowás pulando a cerca da fazenda para se divertirem – Tekoha Guirá Kambi'y

Fonte: acervo pessoal do autor. Douradina (MS), 2016.

15Nesse sentido, Arruzzo ressalta que,

esta forma de entender o território é muito importante pois desnaturaliza o atuar territorialmente com algo sempre necessário, ou seja, sempre “bom” para determinado grupo social, ressaltando o jogo constante entre custo e benefício de uma ação territorial (ARRUZZO, 2009, p.18).

16Isto desmistifica a prerrogativa direta de que o agronegócio sempre se beneficia totalmente quando se apossa de certa área que já foi terra indígena. É importante ressaltar que os povos indígenas, ao tencionarem e lutarem pelas suas terras originárias, por exemplo, acarretam prejuízos para o agronegócio. Este passa a ter “dificuldade” em negociar suas terras quando as mesmas se situam em área conflituosa. Assim sendo, os povos indígenas são atuantes e mobilizadores de estratégias nos conflitos que ocorrem no estado de Mato Grosso do Sul. São sujeitos de ações que não aceitam o subjugamento e as investidas do capital.

17Deste modo, a relação de poder define e delimita o espaço (SOUZA, 1995, p.78), fundamentando o que chamamos de território na Geografia. Porém, tal discussão, como indica Souza (2013), é apenas uma definição inicial, sendo a partir dela o caminho a ser traçado na reflexão do conceito. Raffestin (1993) afirma também que é através do poder que se torna possível agir sobre o território, repercutindo assim, nas comunicações e intencionalidades das relações sociais.

18O poder é uma categoria que necessita ser destrinchada e compreendida para que dessa forma possamos debater de fato como ele se torna o trunfo da compreensão do território. Na disputa de terras, o conflito é politicamente estabelecido e os anseios estratégicos dos grupos em disputa sobressaem, muitas vezes por meio da violência, na medida em que “toda política é uma luta pelo poder; o tipo de poder mais definitivo é a violência” (MILLS, C. Wright apud ARENDT, 1985, p.22).

19Arendt (1985) identifica o poder como uma habilidade dos homens quando os mesmos agem juntos, pertencentes a um grupo, nunca sendo uma característica particular de um único indivíduo. Portanto, o poder se faz presente através do conjunto, delimitando um território em certo espaço; firmo aqui a necessidade de estabelecer que o mesmo é projetado no substrato espacial material, e é esse substrato que o poder utilizará como suporte para delimitar seu território.

O substrato condiciona as relações sociais em si mesmo, por bloquear, facilitar, dificultar etc. através de sua materialidade (infraestrutura boa ou ruim, que atrai ou afasta investimentos; espaços bem cuidados ou não, que atraem ou repelem visitantes; espaços que favorecem ou desfavorecem o encontro casual, a assembleia, o debate entre os cidadãos...). Mas também condiciona por ser o “portador” de símbolos e mensagens, inscritos formal ou informalmente no mobiliário urbano e, mais amplamente, nos objetos geográficos da paisagem, que colaboram, para o bem e para o mal, para a socialização e a (de)formação de hábitos, costumes e mentalidades” (SOUZA, 2013, p.74).

20Arendt diferencia poder de violência, de autoridade, de força e de vigor. Porém, a fim de não nos alongarmos, cabe aqui compreender violência segundo a autora, e assim traçar o uso dessas duas categorias no recorte espacial da pesquisa. A violência é estabelecida por seu caráter instrumental, e muitas vezes confundida com poder, sendo necessário distingui-los:

O poder é realmente parte da essência de todo governo, mas o mesmo não se dá com a violência. A violência é, por sua própria natureza, instrumental; como todos os meios, está sempre à procura de orientação e de justificativas pelo fim que busca. E aquilo que necessita de justificar-se através de algo mais não pode ser a essência de coisa alguma (ARENDT, 1985, p.32).

  • 5 “Democracias ambíguas” no sentido de não serem plenas, serem contraditórias, e não conseguirem obte (...)

21Porém, em democracias ambíguas5, o uso do poder pela violência por parte do governo, se faz presente, sendo este poder imbuído de legitimidade por certo investimento coletivo. Esta legitimidade é questionada, pois há um “apelo ao passado, enquanto a justificativa diz respeito a um fim que se encontra no futuro” (ARENDT, 1985, p.33). Observa-se que onde há o poder absoluto, não há violência, ou seja, onde há a legitimidade do poder por todos, não há a necessidade do seu caráter instrumental. “A violência aparece onde o poder esteja em perigo” (ARENDT, 1985, p.35), ou seja, o agronegócio, na disputa com os indígenas, utilizando-a para que possa ter o poder total sobre as terras, e tal fato ocorre porque os indígenas não dão legitimidade ao poder desse sistema, atravancando e impedindo a perpetuação do capital sobre as terras do Estado e das propriedades privadas. O agronegócio tem dificuldades em comprar e vender as terras que estão sobre áreas indígenas. Eles se armam em milícias particulares, em sistemas de comunicação, em grandes grupos de advocacia, entre outras articulações, investindo muito dinheiro para garantir o usufruto das terras e o uso do poder absoluto sobre elas, mas como não há poder absoluto neste caso, atua por meio da violência.

2. O cenário de violência dos Kaiowá e Guarani em Mato Grosso do Sul

22É necessário recortar e destrinchar o tipo de violência que todos os povos indígenas do território nacional sofrem, mas aqui vamos nos ater somente aos Kaiowá e aos Guarani. Há uma tipificação das formas de violência existentes. De acordo com a abrangência da categoria violência, é de grande auxílio recorrer à obra “Sociologia da violência e do controle social”, do sociólogo Luís Antônio F. de Souza (2008), para compreender e identificar as operacionalidades da categoria e, assim, assegurar a sua análise sem cair na distinção rasa e sem especificidades. Portanto, o autor a classifica em:

2.1 Violência criminal

refere-se àquelas ações, intencionais ou não, individuais ou coletivas, que são traduzidas em termos de direito penal (crime e contravenções) e para as quais são especificados os tipos, as modalidades e as penas correspondentes (SOUZA, 2008, p.13).

23Diversos fazendeiros e pistoleiros respondem por assassinatos a indígenas, principalmente a lideranças como Marcos Veron, Nísio Gomes, Marinalva Manoel e Simião Vilhalva, que combatem diretamente nas retomadas de terra.

  • 6 Jornal O Globo. Disponível em: < https://oglobo.globo.com/brasil/em-fazenda-de-ms-assassinatos-reivindicacao-pela-posse-da-terra-8157681>. Acessado em: 09 dez. 2019.

24Marcos Veron foi assassinado em 2003 quando estava acampado em uma fazenda no município de Juti (MS) e reivindicava seu território que fazia parte da Terra Indígena Taquara. Neste caso, homens armados dispararam tiros na direção do acampamento indígena, além de terem espancado e ameaçado, sendo Veron golpeado, não resistindoem ao traumatismo craniano sofrido após o ataque6.

  • 7 Brasil de fato. Disponível em: < https://www.brasildefato.com.br/node/10033/>. Acessado em: 09 dez. 2019

25A liderança Nísio Gomes, um dos mais emblemáticos casos, foi assassinada em novembro de 2011 no município de Aral Moreira, logo após a entrada dos indígenas para ocupar o Tekohá Guaiviry. Nísio foi baleado após um ataque de pistoleiros da empresa de segurança privada Gaspen, sendo que seu corpo foi retirado do local e até hoje o paradeiro não foi encontrado7.

  • 8 ONU Mulheres. Disponível em: < http://www.onumulheres.org.br/noticias/nota-publica-onu-mulheres-brasil-pede-justica-sobre-o-assassinato-da-lideranca-indigena-kaiowa-marinalva-manoel/>. Acessado em: 09 dez. 2019.

26A liderança indígena Marinalva Manoel assassinada em 2014 na BR-163 em Dourados, com pelo menos 35 facadas e indícios de estupro. Marinalva era bastante ativa na luta pela demarcação da Terra Indígena de Nu Porã, inclusive integrava a comitiva que foi à Brasília manifestar repúdio contra a anulação por parte do Supremo Tribunal Federal do processo de demarcação da Terra Indígena Guyraroká, 15 dias antes do seu assassinato8.

27Já a morte de Simeão Vilhalva se tornou simbólica e representativa na luta Kaiowá e Guarani no estado e na luta indígena de todo país. Foi ocasionada por uma arma de fogo, sendo o ataque orquestrado por fazendeiros da sua localidade na Terra Indígena Ñanderu Marangatu. No ano de 2015 os Kaiowá e Guarani retomaram cinco fazendas incidentes localizadas na Terra Indígena que fora homologada no ano de 2005, porém com decretos suspensos, aguardando o julgamento final do Supremo Tribunal Federal.

  • 9 Comissão Pastoral da Terra (CPT). Disponível em: <http://www.cptnacional.org.br/index.php/publicacoes/noticias/conflitos-no-campo/2816-indigenaguarani-e-assassinado-no-mato-grosso-do-sul>. Acessado em: 12 jan. 2017.

28De acordo com registros na mídia e dos movimentos sociais, uma notória fazendeira da região convocou uma reunião no Sindicato Rural de Antônio João com a presença de alguns deputados federais e de um senador da república, além de dezenas de produtores rurais. Após a rápida reunião a fazendeira foi com mais de 100 capangas armados em direção à sua fazenda retomada pelos indígenas, proibindo a imprensa de seguir até o local. Os ataques foram feitos, dispersando os Kaiowá e os Guarani da terra reconquistada. No meio da confusão, Simeão Vilhalva procurava seu filho e foi baleado na cabeça. Após o ataque há registros de comemorações na rede social do Facebook por parte da família da fazendeira em relação à barbárie comandada pela mesma.9

2.2 Violência política

refere-se àquelas ações, intencionais ou não, individuais ou coletivas, que podem ser definidas pela lei penal, mas que em geral ultrapassam o próprio direito, pois colocam o Estado como principal perpetrador e, em algumas circunstâncias, podem ser aceitas ou rejeitadas. Em geral, os Estados autoritários são os maiores perpetradores da violência política, mas a violência política independe do regime político (SOUZA, 2008, p.13).

29Essa violência, vinda por meio do Estado, é bastante comum com os Kaiowá e Guarani no Mato Grosso do Sul, como por exemplo, a reintegração de posse em Apyca’í, Dourados, onde a Polícia Federal expulsou, a mando da justiça (juiz Fábio Kaiut Nunes da 1ª Vara da Justiça Federal do Dourados), a família da liderança Damiana Cavanha, de uma área pequena que a mesma ocupava, esperando o Estado demarcar sua terra (MONTEIRO, 2017).

  • 10 Ver também o filme Apyka’i – Os Mortos tem voz. Disponível em: <https://youtu.be/a3IkH2auYl8> e o do vídeo do despejo de julho de</https> (...)

30No entorno havia apenas plantação de cana-de-açúcar, uma imensidão que se perdia no horizonte, em terras de propriedade de Cássio Guilherme Bonilha Tecchio, arrendadas para a usina São Fernando, da qual o maior acionista é José Carlos Bumlai, indiciado e preso na Operação Lava Jato. A família de Damiana está no local há mais de uma década, no qual já enfrentaram diversos despejos, sendo seus poucos pertences destruídos e jogados na beira da estrada10.

31A violência da cena promovida pelo Estado e o desamparo da família naquela situação precária e insalubre em que foram deixados nos faz questionar o lado que o Estado representa e as disparidades existentes na nossa sociedade. De um lado um “mar de cana” e de outro uma família que há décadas luta pelos seus direitos que são negados e cerceados.

32É dessa forma que os agentes do agronegócio concretizam suas práticas, tentando se territorializar, desenvolvendo estratégias para atingir seus fins. Contudo, o capital, em seu processo constante de reprodução ampliada, está sempre em busca de novos espaços que lhe garantam mais lucros e possibilidades de acumulação, desarticulando sistemas anteriormente criados. Neste sentido, procura por meio de novas técnicas, tornar o espaço mais fluido, através da criação de rigidezes (SANTOS, 1996), ou seja, de novos fixos, sobre os quais passam ser desenvolvidas novas ações, desencadeando novos fluxos, estabelecendo novas relações sociais e de poder, criando novos arranjos institucionais e administrativos. Ao se territorializar, o agronegócio modifica também as relações com a natureza local, tendo implicações que envolvem processos de produção e de trabalho, afetando a vida cotidiana dos habitantes da região e, principalmente, dos indígenas.

2.3 Violência social e econômica

atos ou processos pelos quais grupos de pessoas podem ser colocados à margem dos benefícios e dos frutos do trabalho e das atividades sociais, esses processos ocorrem tanto porque as pessoas não recebem condições mínimas que proporcionem acesso aos benefícios como também porque as pessoas são levadas a não acreditar que possuem direitos ou mesmo capacidade para esse acesso. A violência econômica, de forma mais específica, decorre da divisão desigual das oportunidades de ganho ou da divisão desigual do trabalho socialmente necessário, de tal forma que as pessoas contribuem para o produto social, mas não recebem um quantum equivalente às energias individuais dispensadas para essa produção (SOUZA, 2008, p.13).

33Na divisão do trabalho, os Kaiowá e Guarani quase sempre ocupam os serviços inferiores em Mato Grosso do Sul. O setor sucroenergético ainda é, dentre os setores do agronegócio, o que mais se destaca na precarização do trabalhador, principalmente quando se trata dos Kaiowá e dos Guarani em Mato Grosso do Sul. De acordo com Cunha, “hoje a grande maioria dos Guarani e Kaiowá presentes no estado com mais de 40 anos já cortou cana quando criança” (2017, p.30). Em seu trabalho, a autora entrevista guaranis que já cortaram cana em algum momento de suas vidas, registrando que

sempre que abordado [...] e questionado se já havia cortado cana, na grande maioria das vezes a primeira coisa que faziam era mostrar alguma(s) cicatriz(es) pelo corpo. Todos carregam marcas no corpo daqueles dias em que cortavam cana, seja na pele, seja nas dores nas costas, ou até na mutilação de partes de seu corpo e assim que perguntados logo as exibiam como se as mesmas contassem sobre a dor (CUNHA, 2017, p.94).

34Essa relação do trabalho, principalmente no corte da cana, entre o agronegócio e os indígenas, perpassa por diversas ilegalidades e burlas nas contratações, seja na admissão de menores de idade e na falsificação de seus documentos, ou nas condições precárias nos alojamentos; na falta de água potável; na insuficiência ou omissão dos equipamentos de proteção individual; nas jornadas desgastantes de trabalho; no consumo de álcool, drogas e prostituição; além da proibição dos trabalhadores de se ausentarem da fazenda no período do corte e, em alguns casos, mais grave ainda, a servidão por endividamento (CUNHA, 2017).

  • 11 Karaí significa pessoa branca em Guarani.

35Na cidade o mesmo ocorre, ao vermos indígenas em serviços mal remunerados, como garis e pedreiros. Além disso, os mesmos se sentem cerceados ao transitarem por alguns espaços urbanos, como restaurantes, padarias e shoppings, devido às agressões que os mesmos sofrem pelo preconceito vindo dos karaí11. É rara a presença de indígenas dentro do shopping de Dourados, seja passeando ou trabalhando, sendo os serviços destinados a eles escondidos, trabalhando muitos em setores que não são visíveis. Ou seja, o corpo indígena em Dourados é tolhido e invisibilizado em diversas funções sociais e econômicas.

2.4 Violência das instituições públicas

ações ou processos pelos quais as instituições, que são consideradas numa democracia como garantidoras de direitos, passam a ser na verdade obstáculos para o acesso aos direitos, ou mesmo tornam-se perpetradoras de violências contra os cidadãos (SOUZA, 2008, p.14).

36Nesse aspecto, muitos exemplos podem ser usados, como o uso da Polícia Federal que, ao invés de proteger as Terras Indígenas como consta na Constituição de 1988, os reprime e pouco fiscaliza e/ou nem protegem as áreas demarcadas e/ou as Reservas.

37As escolas passam pelo mesmo processo, embora os povos indígenas no Brasil, de acordo com a Constituição de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), tenham direito a uma educação escolar específica, intercultural, bilíngue/multilíngue e comunitária, isso nem sempre é oferecido. Poucas escolas de Ensino Médio são voltadas para os povos Kaiowá e Guarani no Mato Grosso do Sul, fazendo com que diversas crianças dessas etnias frequentem escolas regulares dos karaí ou, simplesmente, não frequentem as escolas, principalmente as que estão em áreas de retomada ou em beiras de estradas. Além disso, a infraestrutura das escolas é precária, faltando manutenção do poder público. As crianças indígenas que frequentam as escolas dos karaí sofrem bullying e preconceito dos outros colegas e até mesmo dos professores e da direção, perpetuando as violências institucionais vividas por eles.

2.5 Violência internacional (macroviolência)

Uma nova divisão internacional do capitalismo, em que nem sempre quem produz mais ou detém mais riquezas pode usufruir. Ao contrário, as regras do mercado global criam e recriam condições nas quais as diferenças entre países são convertidas em desigualdade. Além disso, é no cenário internacional que estão ocorrendo os principais processos de liquidação de direitos humanos: contrabando de armas, migrações, genocídios, tráfico de drogas, tráfico e exploração sexual de pessoas (SOUZA, 2008, p.14).

  • 12 Para os Guarani, tekoha é o lugar físico onde se realiza o “teko”, o modo de ser, o “viver Guarani” (...)

38No caso dos Kaiowá e Guarani esse aspecto se torna emblemático por estarem em uma zona de fronteira político-administrativa entre o Brasil e o Paraguai, estando Mato Grosso do Sul e os tekohas12 em um corredor de tráfico ilícito internacional, contribuindo para o cenário precário, principalmente nas Reservas.

39Porém, a violência estatal dos dois países também está presente, quando há a negação de serviços básicos por parte do Estado brasileiro, com o argumento de que os Guarani e Kaiowá são paraguaios. O mesmo acontece com os serviços públicos do governo paraguaio, alegando que esses indígenas não são cidadãos daquele país. Em muitos casos, os indígenas ficam desamparados quando há a necessidade de conseguir algum direito básico. Essa fronteira político-administrativa não é um limite a ser respeitado pelos Guarani e Kaiowá, pois a mesma foi imposta pelo teor imperialista e capitalista de terceiros, até porque toda aquela região pertencia a esses povos antes da divisão feita pelas metrópoles europeias.

40É necessário lembrar que as fronteiras político-administrativas, estabelecidas pelos karaí, a posteriori, foram traçadas sobre o território guarani já existente. Nos seus territórios existia uma dinâmica de mobilização interna, “los indios desconsideran fronteras y mantienen, literalmente por siglos, estrechas relaciones y circulan cotidianamente de un lado y otro en toda la extensión de la frontera” (THOMAZ DE ALMEIDA; MURA, 2004, p.59).

2.6 Violência simbólica

está em todos os lugares e se reveste em seu caráter não-físico, mas não é menos danosa, pois pela violência simbólica (mídia, educação, moda, costumes, tradições, direito, religião, cultura) as pessoas tendem a aceitar condições injustas ou inadequadas e a naturalizar relações desiguais. [...] na maioria das vezes, torna o inaceitável em aceitável, em convencional (SOUZA, 2008, p.14).

41Esse tipo de violência pode passar despercebida muitas vezes, mas está intrínseca em diversos ramos da sociedade brasileira, principalmente da sul-mato-grossense. A televisão abafa o conflito existente no estado e, quando mostra, o índio está sempre sendo criminalizado. O uso de termos como “invasão” para se referir às terras ocupadas demonstra o lado escolhido pela grande mídia ao retratar a situação. Quando se trata da mídia local, principalmente dos jornais impressos no estado, a violência simbólica é ainda mais descarada e intensa. Nas figuras 02, 03 e 04 observa-se o teor e a finalidade de criminalizar as retomadas de terras indígenas em veículos midiáticos que atuam em três escalas distintas. Destaca-se o uso do verbo “invadir”, presente nos três exemplos.

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Figura 02 – Abordagem do site jornalístico de abrangência nacional

Figura 02 – Abordagem do site jornalístico de abrangência nacional

https://g1.globo.com/​ms/​mato-grosso-do-sul/​noticia/​2019/​08/​28/​grupo-indigena-invade-propriedade-e-incendia-area-de-lavoura-em-dourados.ghtml.

Figura 03: Abordagem de site jornalístico de abrangência estadual

Figura 03: Abordagem de site jornalístico de abrangência estadual

https://www.correiodoestado.com.br/​noticias/​indios-mantem-invasao-de-terra-em-dourados/​113702/​

Figura 04: Abordagem de site jornalístico de abrangência regional

Figura 04: Abordagem de site jornalístico de abrangência regional

https://www.douradosagora.com.br/​noticias/​dourados/​indigenas-continuam-tentando-invadir-fazenda-e-ameacam-atear-fogo-em-viatura

  • 13 Informações obtidas através de trabalho de campo realizado em julho de 2016

43Como vimos anteriormente, a violência simbólica também existe com muita força nas escolas; é comum ouvir relatos de jovens Kaiowá e Guarani sobre os xingamentos e preconceitos vividos por eles. Além disso, as igrejas neopentecostais encontradas em grande quantidade nas Reservas Indígenas do estado (imagem 05), em muitos casos proíbem seus seguidores religiosos, que são indígenas, de cantarem e rezarem do modo tradicional guarani. Em diversas vezes alegam que são coisas do demônio, condenando os que fazem essa prática. Essa violência institucionalizada e religiosa é muito comum onde há igrejas neopentecostais, nas quais a privação de certos hábitos representa uma forma de violência não-física, mas psicológica ao corpo e à mente guarani13.

Figura 05: Igreja neopentecostal localizada na Reserva Indígena de Dourados

Figura 05: Igreja neopentecostal localizada na Reserva Indígena de Dourados

Fonte: acervo pessoal do autor. Dourados, 2016.

2.7 Violência tecnológica

ocorre com o avanço da tecnologia e a dependência causada por ela, seja quando obriga o indivíduo a ter que se adaptar, ou por proporcionar que os “processos de exclusão, de destruição, de dor e sofrimento puderam ser realizados sem o contato físico e de forma tão asséptica” (SOUZA, 2008, p.14).

  • 14 Vídeo, intitulado Ataque Químico Contra a Retomada Tey'i Jusu, que mostra o exato momento da ação d (...)

44Uma ameaça direta ao modo de ser Kaiowá e Guarani é o uso de aviões para lançarem agrotóxicos em cima das plantações, mas que também são usados para atacarem comunidades indígenas. A aplicação desses venenos na produção afeta diretamente as áreas onde eles habitam e degradam as que podem ser reconquistadas. A pulverização de agrotóxicos sobre as comunidades é uma prática violenta que ocorre a mando do produtor que tem comunidades indígenas em seu entorno. Como exemplo pode-se citar os ataques denunciados pelos Kaiowá e Guarani no tekoha Tey’i Juçu, município de Caarapó, no qual vêm sofrendo desde 2015 despejos de veneno por aviões sobre a comunidade, afetando principalmente as nascentes onde os indígenas coletam água para beber14.

45Muitos dos agrotóxicos – herbicidas, fungicidas, inseticidas e acaricidas – utilizados no Brasil são proibidos em diversos países do mundo, como nos Estados Unidos e na União Europeia, devido ao seu potencial teor tóxico à saúde humana. A pulverização dos agrotóxicos pode ser realizada por trabalhadores, tratores ou aviões, e sua aplicação forma verdadeiras “nuvens de veneno” que se dispersam no ar. Atingem, para além dos limites das plantações, as cidades e moradias próximas, a biodiversidade do entorno, as plantações vizinhas e as populações indígenas que ali vivem. É comum ver no Mato Grosso do Sul o limite das Reservas ou de áreas indígenas serem, literalmente, coladas às plantações que utilizam venenos no processo produtivo.

  • 15 Humam Rights Watch. Disponível em: < https://www.hrw.org/pt/report/2018/07/20/320417>. Acessado em 12 dez. 2019.

46O relatório da ONG Humans Rights Watch,15 ao estudar a relação dos agrotóxicos em diversas localidades do Brasil, traz um caso em que, os Kaiowá e Guarani, em uma localidade (não mencionada, propositalmente identificada somente como “localidade B”) relatam incidentes de intoxicação aguda por agrotóxicos. Trata-se de um depoimento feito por um homem indígena, que descreve sua intoxicação ocorrida no ano de 2017.

Foi de manhã cedo, por volta das 8 da manhã; o trator estava pulverizando e senti o cheiro [do agrotóxico]. Dava pra ver o líquido branco [no ar]. Mesmo cheirando, vai para o seu cérebro. Você sente uma amargura na garganta. Você não quer mais respirar veneno - você quer respirar outro tipo de ar - mas não tem nenhum. Então você se sente fraco - você não consegue se levantar, porque o veneno é muito forte - e fica com febre e dor de cabeça…. Você coloca a mão na sua cabeça e sente ela latejando. Eu tive essa dor de cabeça muitas vezes, não aguento mais. Naquele dia, eu tive diarreia e vômito. Todo mundo que vive na beira da nossa comunidade passou mal. Enquanto eu esperava a ambulância, eu fiquei deitado na cama, me sentindo fraco. No hospital expliquei o que eu tinha e a causa. Eles me deram soro e um remédio e eu recebi alta no dia seguinte. Quando eu recebi alta do hospital, o médico me disse para me proteger, mas não tem jeito. (HUMAN RIGTH WATCH, 2017, p.46)

  • 16 Audiência debate alternativas para aperfeiçoar legislação da pulverização no Estado. Disponível em: (...)

47Segundo a Audiência Pública realizada na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, em novembro de 2016, a cana-de-açúcar é o cultivo que mais utiliza agrotóxicos em pulverização aérea, sendo que apenas 32% é depositado nas plantas, os demais vão parar no solo (49%) ou são dispersados pelo vento (19%), chegando a alcançar uma distância de até 32 quilômetros16.

48A cana, assim como a soja, concentra-se em grande parte nas terras de maior conflito entre os indígenas e os fazendeiros. Dentre os 10 municípios maiores produtores de cana no estado, sete estão na zona de conflito: Rio Brilhante, Nova Alvorada do Sul, Ponta Porã, Ivinhema, Dourados e Maracaju, estando aí a maior concentração de usinas do estado, como se pode observar no mapa 02 (Monteiro, 2017).

Mapa 02: Região produtiva de cana-de-açúcar, localização das usinas e das Terras Indígenas em Mato Grosso do Sul

Mapa 02: Região produtiva de cana-de-açúcar, localização das usinas e das Terras Indígenas em Mato Grosso do Sul

Fonte: ARRUZO; CUNHA, 2019, p.132

49Arruzzo e Cunha, ao demarcarem a região produtiva de cana-de-açúcar no estado, destacam que a mesma está sobreposta às áreas onde têm uma forte presença de indígenas, além de estarem nas proximidades das áreas reivindicadas por eles. Além disso a expansão da produção de cana-de-açúcar vem ocorrendo e isto “se configura como um complicador a mais numa situação territorial já bastante complexa” (p.131, 2019). Para as autoras existem três tipos de relações conflituosas entre os agentes do setor sucroenergético e os indígenas: a) a plantação nas terras dos indígenas ou em áreas reivindicadas; b) a precarização do trabalho que envolve os indígenas no corte da cana-de-açúcar; e c) as questões ambientais decorrentes da atividade.

2.8 Microviolências cotidianas

decorrem de conflitos intersubjetivos, ou seja, dos conflitos que ocorrem em que duas ou mais pessoas compartilham espaços, ações ou processos. [...] essas violências também estão presentes nos comportamentos sociais que consideramos fora do padrão (SOUZA, 2008, p.15).

  • 17 Observações percebidas decorrentes de idas à Dourados durante a pesquisa.

50O conflito intersubjetivo ocorre frequentemente nas cidades do sul do estado, principalmente em Dourados, onde a Reserva é próxima do centro urbano, bastando ver como os indígenas são olhados e agredidos verbalmente ao transitarem pelas ruas da cidade. Em cidades menores, como em Douradina, eles nunca andam sozinhos, sempre acompanhados e em grupos, para não sofrerem agressões e nem perseguições17.

51Nas escolas esse conflito pode ser mais intenso, pois o comportamento de crianças indígenas, em muitos casos, não é aceito pelo modelo escolar ocidental; o uso do uniforme, do tênis, do material escolar, a noção de “higiene", tudo isso compõe o choque no espaço de conflito, que é a escola. Convém destacar que, na maioria dos casos, a escola é um espaço onde se desenvolve a prática da violência por ser um ambiente de interação e conflito; nela as crianças ficam fortemente vulneráveis às investidas, ainda que essas não tenham um caráter diretamente físico. Portanto, as agressões sofridas cotidianamente pelas crianças e adolescentes indígenas em Mato Grosso do Sul são reveladoras da desordem e das desigualdades sócio-espaciais do estado.

52Sendo assim, o agronegócio através de suas práticas tenta se territorializar, desenvolvendo estratégias mediante o uso do poder e da violência para atingir seus fins. É importante destacar que, apesar de todas essas investidas violentas, os Kaiowá e os Guarani não sofrem calados e nem se deixam ser agredidos passivamente. Existem também diversas articulações e a utilização de outros mecanismos taticamente usados pelos indígenas, que compõem o conflito. Seria ocidental demais, do ponto de vista cultural, dizer aqui que somente o agronegócio tem forças para agir no conflito, porque nesse caso o conflito não ocorreria; demonstrar as violências que ocorrem com os Kaiowá e Guarani no atual cenário do estado é uma denúncia emergente na luta pelos direitos dos indígenas e pela demarcação de suas terras.

Considerações finais

53Os processos de violência ocorridos no estado revelam a dimensão do vivido no território pelos grupos que o compõem. Diferentes práticas sociais se territorializam no espaço, dando significados e exercendo o poder. Esta luta indígena marca a quebra do paradigma colonial. Os Kaiowá e Guarani se articulam em diversas escalas e compõem uma frente combativa contra os ataques do capital. As Aty Guasu, por exemplo, nos mostram que grandes assembleias multicomunitárias são possíveis. Segundo Benites, o Aty Guasu

é composto pelos líderes políticos, os líderes espirituais (ñanderu e ñandesy) e seus aprendizes (yvyra‘ija), e, sobretudo pelas crianças, mulheres e homens pertencentes às várias famílias indígenas. Durante essa assembleia, ao mesmo tempo em que ocorrem discussões políticas para as autoridades não indígenas, isto é, aos agentes do Estado (MPF, FUNAI, FUNASA, etc,), se realizam também os discursos, as exposições de experiências de vida, os rituais religiosos e rituais festivos para os próprios indígenas participantes da grande assembleia, visando o fortalecimento do modo de ser e viver feliz teko vy‘a (BENITES, 2014, p.181).

54É importante destacar que há troca de saberes e ensinamento aos mais novos sobre a cultura guarani. Ponto forte e nevrálgico da luta que se acirra é que, ao marcar e perpetuar o “ser guarani” através do corpo, da fala, da dança e da reza, os indígenas demarcam os seus símbolos no território, delineando a sua presença no espaço de conflito.

55As lembranças das mortes de lideranças assassinadas pelos fazendeiros são sempre relatadas e descritas, para que ninguém se esqueça do cenário atual de assassinatos e perseguições do povo Kaiowá e Guarani. O relatório final do Aty Guasu de dezembro de 2012 contém a lembrança da maioria das lideranças que morreram pela terra.

  • ATY GUASU KAIOWÁ E GUARANI TERRA INDÍGENA PANAMBI – DOURADINA – MS DOCUMENTO FINAL

  • 29 anos do assassinato de Marçal de Souza – Tupã’i – crime prescreveu; assassinos estão soltos;

  • 12 anos do assassinato de Samuel Martins – assassinos sem julgamento;

  • 12 anos do assassinato de Adriano Pires – assassinos sem julgamento;

  • 9 anos do assassinato de Marcos Veron – mandante sem julgamento;

  • 7 anos do assassinato de Dorvalino Rocha – assassinos sem julgamento;

  • 5 anos do assassinato de Churite Lopes e Ortiz Lopes – assassinos sem julgamento;

  • 3 anos do assassinato de Rolindo Vera e Genivaldo Vera – assassinos sem julgamento;

  • 2 anos do assassinato de Teodoro Ricardi – assassinos sem julgamento;

  • 1 ano do assassinato de Nizio Gomes – assassinos sem julgamento;

  • 5 meses do atropelamento de José Barbosa – Zezinho – morte sem esclarecimento;

  • 3 meses do desaparecimento de Eduardo Pires – buscas nunca foram feitas;

  • 2 meses do afogamento de Amilton Lopes – morte sem esclarecimento.

  • Nós, povo Kaiowá e Guarani, reunidos em mais uma Aty Guasu (Grande Assembleia), entre os dias 28 e 2 de dezembro de 2012, na aldeia Panambi Lagoa Rica, município de Douradina, com mais de 300 representantes de nossas comunidades, denunciamos mais uma vez a toda a sociedade nacional e internacional a situação de violência pela qual passam nossas comunidades e lideranças (apud Benites, 2014, p.185).

56Dessa forma, através de textos, cartas e notas, os indígenas relatam a setores da sociedade brasileira sua situação, ganhando adeptos à luta pela retomada de seu território, reivindicando seus direitos, pautando suas estratégias e cobrando do governo brasileiro. A divulgação das ações conscientiza a população e atrai novos adeptos à luta dos Kaiowá e Guarani no Mato Grosso do Sul.

  • 18 “R-Existência posto que não se reage, simplesmente a ação alheia, mas, sim, que algo pré-existe e é (...)

57O agronegócio age por meio da violência por não conseguir obter facilmente o poder em seu território, perdem o controle de suas estratégias por não conseguirem o domínio total. Esse poder é desestabilizado e não age com predominância devido à força e r-existência18 Kaiowá e Guarani. De acordo com Porto-Gonçalves, “o conflito é o momento em que as contradições se mostram em estado prático e, como tal, são momentos privilegiados para ampliarmos o conhecimento sobre o mundo, sobre cada situação” (2017, p.77). Assim sendo, é necessário expor as ações intempestivas e premeditadas do agronegócio, para que os indígenas do Mato Grosso do Sul possam voltar a ocupar as terras onde seus ancestrais viveram e morreram.

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Bibliographie

ARENDT, Hannah. Da violência. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1985.

ARRUZZO, Roberta Carvalho. Construindo a desfazendo territórios: as relações territoriais entre os Paresi e os não-índios na segunda metade do século XX. Rio de Janeiro: Tese de doutorado (Doutorado em Geografia) – Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2009.

ARRUZO, Roberta Carvalho; CUNHA, Lívia Domiciano. O setor sucroenergético em Mato Grosso do Sul: aspectos econômicos, vulnerabilidades e conflitos territoriais. In: BERNARDES, Júlia Adão; CASTILLO, Ricardo. Espaço Geográfico e Competitividade: regionalização do setor sucroenergético no Brasil. Rio de Janeiro: Lamparina, 2019. pp.109-134.

BENITES, Tonico. Rojerokyhina ha roike jevy tekohape (Rezando e lutando): o movimento histórico dos Aty Guasu dos Ava Kaiowa e dos Ava Guarani pela recuperação de seus tekoha. Rio de Janeiro: Tese de doutorado (Doutorado em Antropologia), Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2014.

CUNHA, Lívia Domiciano. A fronteira em outra perspectiva: o avanço da fronteira agrícola moderna no Mato Grosso do Sul e a precarização das práticas espaciais Guarani e Kaiowa. Niterói: Dissertação de mestrado (Mestrado em Geografia), Instituto de Geociências, Universidade Federal Fluminense, 2017.

CIMI – Conselho Indigenista Missionário. Violência contra os Povos Indígenas no Brasil – Dados de 2018. Relatório. Brasília: 2019

MONTEIRO, Daniel Macedo Lopes Vasques. Disputa territorial no Mato Grosso do Sul: o tempo do direito dos Guarani-Kaiowá e Guarani-Ñandéva e as estratégias e táticas do agronegócio. Rio de Janeiro: Dissertação de mestrado (Mestrado em Geografia), Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2017.

MORAES, Antônio Carlos Robert. Ideologias geográficas. São Paulo: Annablume, 2005.

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PORTO-GONÇALVES, Carlos Walter. Amazônia: encruzilhada civilizatória: tensões territoriais em curso. Rio de Janeiro: Consequência, 2017.

RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. São Paulo: Ática, 1993.

SANTOS, Milton. A natureza do espaço. São Paulo: Hucitec, 1996.

SOUZA, Luís Antônio Francisco de. Sociologia da Violência e do Controle Social. Curitiba: IESDE Brasil S.A., 2008.

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SOUZA, Marcelo Lopes de. Os conceitos fundamentais da pesquisa sócio-espacial. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2013.

THOMAZ DE ALMEIDA, Rubem Ferreira. Do desenvolvimento comunitário à mobilização política: o Projeto Kaiowá-Ñandeva como experiência antropológica. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, 2001.

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Notes

1 Relatórios do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) intitulados como: “Violência contra os Povos Indígenas no Brasil” com dados entre os anos 2002 a 2018.

2 Os números apresentados pelas duas fontes de dados não são os mesmos, porém nos dois casos a proporção dos assassinatos no estado do Mato Grosso do Sul supera ao das demais unidades da federação.

3 Os relatórios do CIMI entre 2003 e 2005 que estão disponíveis para download não revelam os assassinatos por município, somente os números absolutos do estado. Com isso, a escolha de fazer o mapa a partir de 2005 ocorreu por conta desse impedimento.

4 A reserva indígena é uma modalidade de Terra Indígena de acordo com a legislação vigente (CF/88, Lei 6001/73 – Estatuto do Índio, Decreto n.º1775/96). Portanto, segundo a FUNAI, as reservas indígenas “são terras doadas por terceiros, adquiridas ou desapropriadas pela União, que se destinam à posse permanente dos povos indígenas. São terras que também pertencem ao patrimônio da União, mas não se confundem com as terras de ocupação tradicional. Existem terras indígenas, no entanto, que foram reservadas pelos estados-membros, principalmente durante a primeira metade do século XX, que são reconhecidas como de ocupação tradicional”. Informação disponível em: < http://www.funai.gov.br/index.php/indios-no-brasil/terras-indigenas>. Acessada em: 17 jan. 2020.

5 “Democracias ambíguas” no sentido de não serem plenas, serem contraditórias, e não conseguirem obter a legitimidade total do poder. Ou seja, consideradas democracias, mas não possuem caráter completo para tal. Destaque para Moraes: “uma política excludente de consensos restritos, de transformações pelo alto, de violências” (2005, p.105).

6 Jornal O Globo. Disponível em: < https://oglobo.globo.com/brasil/em-fazenda-de-ms-assassinatos-reivindicacao-pela-posse-da-terra-8157681>. Acessado em: 09 dez. 2019.

7 Brasil de fato. Disponível em: < https://www.brasildefato.com.br/node/10033/>. Acessado em: 09 dez. 2019

8 ONU Mulheres. Disponível em: < http://www.onumulheres.org.br/noticias/nota-publica-onu-mulheres-brasil-pede-justica-sobre-o-assassinato-da-lideranca-indigena-kaiowa-marinalva-manoel/>. Acessado em: 09 dez. 2019.

9 Comissão Pastoral da Terra (CPT). Disponível em: <http://www.cptnacional.org.br/index.php/publicacoes/noticias/conflitos-no-campo/2816-indigenaguarani-e-assassinado-no-mato-grosso-do-sul>. Acessado em: 12 jan. 2017.

10 Ver também o filme Apyka’i – Os Mortos tem voz. Disponível em: <https://youtu.be/a3IkH2auYl8> e o do vídeo do despejo de julho de 2016 Disponível em: <https://m.facebook.com/groups/397693280345910?view=permalink&id=1039582656156966>

11 Karaí significa pessoa branca em Guarani.

12 Para os Guarani, tekoha é o lugar físico onde se realiza o “teko”, o modo de ser, o “viver Guarani”. E é para os tekohas que os Guarani querem voltar, um lugar onde se possa viver com um mínimo de dignidade nas terras que viveram seus antepassados.

13 Informações obtidas através de trabalho de campo realizado em julho de 2016

14 Vídeo, intitulado Ataque Químico Contra a Retomada Tey'i Jusu, que mostra o exato momento da ação do despejo de veneno o tekoha Tey’i Juçu. Disponível em: <https://youtu.be/qQn7SpbVsdQ>. Acessado em 12 dez. 2019.

15 Humam Rights Watch. Disponível em: < https://www.hrw.org/pt/report/2018/07/20/320417>. Acessado em 12 dez. 2019.

16 Audiência debate alternativas para aperfeiçoar legislação da pulverização no Estado. Disponível em: <http://www.al.ms.gov.br/Default.aspx?tabid=56&ItemId=48338> Acessado em: 30 jun. 2017.

17 Observações percebidas decorrentes de idas à Dourados durante a pesquisa.

18 “R-Existência posto que não se reage, simplesmente a ação alheia, mas, sim, que algo pré-existe e é a partir dessa existência que se R-Existe. Existo, logo resisto. R-Existo”. (PORTO-GONÇALVES, 2006, p.47)

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Table des illustrations

Titre Mapa 01: Assassinatos de indígenas em Mato Grosso do Sul entre 2006 e 2018
Crédits Elaboração do autor com base em CIMI e FUNAI.
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Fichier image/png, 316k
Titre Figura 01: Jovens Kaiowás pulando a cerca da fazenda para se divertirem – Tekoha Guirá Kambi'y
Crédits Fonte: acervo pessoal do autor. Douradina (MS), 2016.
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/30108/img-2.jpg
Fichier image/jpeg, 256k
Titre Figura 02 – Abordagem do site jornalístico de abrangência nacional
Crédits https://g1.globo.com/​ms/​mato-grosso-do-sul/​noticia/​2019/​08/​28/​grupo-indigena-invade-propriedade-e-incendia-area-de-lavoura-em-dourados.ghtml.
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/30108/img-3.jpg
Fichier image/jpeg, 20k
Titre Figura 03: Abordagem de site jornalístico de abrangência estadual
Crédits https://www.correiodoestado.com.br/​noticias/​indios-mantem-invasao-de-terra-em-dourados/​113702/​
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/30108/img-4.jpg
Fichier image/jpeg, 16k
Titre Figura 04: Abordagem de site jornalístico de abrangência regional
Crédits https://www.douradosagora.com.br/​noticias/​dourados/​indigenas-continuam-tentando-invadir-fazenda-e-ameacam-atear-fogo-em-viatura
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/30108/img-5.jpg
Fichier image/jpeg, 20k
Titre Figura 05: Igreja neopentecostal localizada na Reserva Indígena de Dourados
Crédits Fonte: acervo pessoal do autor. Dourados, 2016.
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/30108/img-6.jpg
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Titre Mapa 02: Região produtiva de cana-de-açúcar, localização das usinas e das Terras Indígenas em Mato Grosso do Sul
Crédits Fonte: ARRUZO; CUNHA, 2019, p.132
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/30108/img-7.jpg
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Pour citer cet article

Référence électronique

Daniel Macedo Lopes Vasques Monteiro, « Terra, poder e violência: conflitos no Mato Grosso do Sul e a relação do agronegócio com os Kaiowá e Guarani »Confins [En ligne], 45 | 2020, mis en ligne le 02 juin 2020, consulté le 10 décembre 2024. URL : http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/30108 ; DOI : https://0-doi-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/10.4000/confins.30108

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Daniel Macedo Lopes Vasques Monteiro

Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. danielmlvm@yahoo.com.br

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