1Os sistemas de engenharia, expressão utilizada por Santos (1988) para denominar o conjunto de infraestruturas criadas para viabilizar a fluidez são fundamentais para o estabelecimento da circulação tanto quanto para a consolidação desta entre os lugares, permitindo o deslocamento de cargas, pessoas e valores culturais e simbólicos. Essa circulação também se estrutura sem o aparato dos sistemas de engenharia do Estado ou das grandes corporações, tendo apenas as embarcações e uma margem de rio que permite uma dinâmica de circulação interna, como é o caso da Amazônia, em especial no Amazonas, onde um dos principais sistemas de engenharia desse circuito de transporte é o barco regional, que se faz presente e permite uma mobilidade interna na região.
2Cada estado da federação possui organização e arranjos espaciais dos transportes, com predominância de fluxos nos modais rodoviário, ferroviário e fluvial, sendo este último predominante em todo o estado do Amazonas. Ora tal condição oriunda da própria formação geomorfológica, com uma rede de drenagem com diversos rios e bastante capilarizada; ora pela dispersão do povoamento em cidades e vilas ao longo dos rios, durante o processo de formação territorial. Além disso, não existe uma malha rodoviária expressiva, nem ferrovias, mas possui vários aeródromos e, principalmente, portos e vias fluviais, as quais continuam a propiciar os deslocamentos dentro do estado.
3Para apresentar um breve panorama sobre os modos de transporte no Amazonas e o desdobramento de alguns processos territoriais, estruturou-se este texto em quatro partes, da seguinte forma: o transporte fluvial, os novos portos fluviais; a construção das rodovias e a organização dos transportes no modal rodoviário no estado e algumas transformações espaciais; e, por fim, o transporte aéreo.
4Os rios na Amazônia têm uma relevância fundamental para o deslocamento de pessoas e cargas em decorrência da própria ausência de outros meios, que possibilitem o deslocamento de cargas e de pessoas, mas o transporte não é essencialmente fluvial como apresenta Ferreira (2016).
5Observa-se nessa região a presença majoritária do transporte fluvial ou rodoviário em frações territoriais distintas, com cidades e vilas fortemente vinculadas aos fluxos rodoviários, fluviais ou rodo-fluviais, este último estando mais presente no caso particular da Amazônia Ocidental, onde, apesar de aparentar ausência de uma organização jurídica do funcionamento do transporte fluvial, esta atividade é extremamente organizada, com horários e rotas estabelecidas e estruturado, internamente, pelas empresas e pelos comandantes das embarcações.
6No estado do Amazonas, apesar do enorme esforço dos governos sejam eles federal e estadual para a construção de rodovias e aeródromos, existe uma parcela substancial do estado que “ainda segue o padrão Rio-Várzea, onde o transporte pela via fluvial para a maior parte das localidades é a única alternativa, pois ainda habitadas por populações caboclas que tem no rio uma de suas fontes principais de vida” (NOGUEIRA, 1999. p 2).
- 1 Embarcação com o formato de canoa e feita de alumínio ou madeira com 3 até 8 metros de comprimento (...)
7A navegação sempre esteve intimamente ligada às formas adaptativas e determinadas pelas condições socioambientais, com o uso dos recursos naturais para a construção das embarcações de madeira, que passaram a perder espaço no mercado para as embarcações construídas em estaleiros, que passaram a utilizar outros conteúdos técnicos, como alumínio, aço, solda, fios e plásticos, na composição das novas embarcações regionais, seja uma voadeira1, uma lancha, um iate, um barco, um lancha expresso ou uma balsa. Essas denominações, não tão familiares, demonstram que nos rios amazônicos encontram-se uma pluralidade de embarcações distintas e com usos e funcionalidades também diversas, recebendo, inclusive, outras denominações de cunho regional.
- 2 Ver em Silveira (2009).
8As evoluções e revoluções logísticas2 ocasionaram transformações substanciais no deslocamento interno da Amazônia, reduzindo o tempo de viagem, aumentando o número de passageiros e de cargas. Essas evoluções e revoluções estiveram acompanhadas da reestruturação produtiva e das novas estratégias de acumulação, presentes na atividade de transporte.
9Olhando para a Amazônia e para o estado do Amazonas, chama atenção a representação dos rios que entrecortam todo o estado, os quais foram fundamentais para a conquista do território em tempos pretéritos e permitem a navegação de embarcações. E, apesar da limitação dos rios para a navegação, durante o período de vazante – seca -, essas embarcações ainda permitem uma mobilidade espacial formidável, numa fração territorial onde os projetos de integração, com a construção de grandes sistemas de engenharia, não foram executados em sua totalidade, ficando aquém das necessidades de circulação interna.
10Os padrões de circulação estão assim centrados: circulação rio-várzea (NOGUEIRA, 1999, p. 70); rodovia-terra firme/várzea, que possui uma participação reduzida no estado; e aéreo-fluvial e aéreo-terrestre, que atende minimamente as demandas regionais e locais. O transporte fluvial possui algumas particularidades essencialmente regionais, como: dispersão da população ao longo de uma rota fluvial, “[...] larga planície inundável pelo menos durante cinco meses do ano e floresta tropical praticamente densa – fizeram com que os rios amazônicos se constituíssem em caminhos de acesso a vilas, missões, fortes e pequenos aglomerados de caboclos, instalados às suas margens”; e a rede hidrográfica existente, que condicionou, ao longo dos séculos, “todas as práticas sociais na região” (NOGUEIRA, 1999, p.74).
11Dentro dessa excepcionalidade do transporte fluvial, surgiu a figura do regatão, uma espécie de “mascate fluvial que negociava a crédito inúmeras mercadorias com as populações estabelecidas nos rios, lagos e igarapés da região” (NOGUEIRA, 1999, p. 74). Sobre esse é possível identificar três tipos de regatões: um da canoa e remo; barco motorizado; barco e com armazéns.
12A motivação econômica com o comércio da borracha silvestre foi responsável pela instalação de linhas internacionais entre a cidade de Manaus, com rotas para Gênova, Liverpool e Nova Iorque; e linhas nacionais, com rotas para o Rio de Janeiro e uma diversidade de rotas regionais. Ou seja, a razão de “toda essa dinâmica espacial foi, evidentemente, a exploração da borracha, mercadoria que era” amplamente comercializada, enquanto o monopólio estava centrado na produção amazônica (NOGUEIRA, 1999, p. 77). Nas décadas de 60 e 70, novas dinâmicas econômicas alteraram substancialmente a organização dos transportes.
13As políticas territoriais das décadas de 60 e 70 alteram também a organização espacial dos transportes fluviais, principalmente com “a expansão da oferta de cargas geradas em Manaus, com o incremento da produção industrial [que] trouxe outras empresas de transporte para a região” (NOGUEIRA, 2011, p. 395).
14A evolução logística que ocorreu no transporte fluvial permitiu a coexistência de modalidades distintas de transporte. Assim, mesmo com a inserção de novas técnicas, os antigos sistemas continuaram a existir, pois os novos ocupam nichos de um mercado cativo, antes não ocupado, e como algumas rotas já são dominadas por grupos econômicos locais ou por cooperativas, ambos inserem as evoluções nas suas próprias rotas fluviais.
- 3 Denominação regional que consiste em colocar caminhões e carretas sobre um comboio de balsas, que s (...)
15Essa nova organização dos transportes se subdividiu em cinco modalidades de transporte: roll on-roll-off amazônico3 - denominado de Ro-Ro Caboclo - com o transporte de carretas – às vezes somente o reboque/trailer - e contêineres em balsas e em comboios fluviais; o transporte de derivados de petróleo; transporte de passageiros e cargas regionais, em embarcações intermunicipais e microrregionais de passageiros (NOGUEIRA, 1994); e o transporte de grãos em balsas graneleiras; lanchas expresso/a jato.
16Segundo Nogueira, “a capacidade de transporte de produtos por via fluvial sempre fez do barco um importante meio de transporte” (2011, p. 389), atrelando tal capacidade ao volume de carga variada e embarcada, além do transporte de passageiros.
17A maior peculiaridade do deslocamento fluvial e do transporte misto – carga e passageiros – é o fato de que a cada rota e em cada período especifico do ano, apresentar ser uma dada dinamicidade, pelo carregamento que varia em cada rota. Além disso, as embarcações realizam o transporte de cargas bastante variadas, desde: estivas em geral, frutas, hortifrutigranjeiro, bebidas, caixarias, refrigerantes, mudança, veículos – motos e carros -, eletrodomésticos. Vale apontar que, na vazante dos rios, as embarcações reduzem o volume transportado para evitar encalhamentos (DAVID, 2010), ou realizam a troca da embarcação e o transbordo da carga para uma embarcação com calado inferior, que permite navegar nos rios. Destaca-se, ainda, que os eventos locais, como as festas atraem centenas de pessoas das cidades e vilas próximas da cidade sede do acontecimento, constituindo uma conjunção de rotas de deslocamento e uma margem de rio com dezenas de embarcações.
18Os barcos regionais de transporte de passageiros e de carga navegam por diversos rios (Quadro 1) e operam em condições singulares, “como dispersão dos passageiros, baixo poder aquisitivo dos mesmos e longas distâncias a serem percorridas”. Então, para manter a reprodução do empreendimento, foi necessário estabelecer a união de três atividades: cobrança da tarifa; cobrança do frete com o transporte de cargas; e realização de um comércio ao longo da viagem, do ponto de origem e de destino (NOGUEIRA, 1999, pp. 79-80). No estado, existem as rotas locais (Fig. 1a), para os mais diversos municípios e com distâncias que podem variar de 50 km até 1.500 km.
Quadro 1: Principais rotas fluviais de transporte de passageiros
Origem x Destino
|
Tempo de Viagem
em horas (h)**
|
Distância
em km
|
Preço*
|
Cotação em Dólar
|
Rio Amazonas
|
Manaus-Almeirim****
|
50h
|
990
|
250,00
283,00
|
66,31
75,06
|
Manaus-Alvarães
|
42h
|
644
|
145,00
|
38,46
|
Manaus-Alenquer
|
26h
|
-
|
-
|
-
|
Manaus-Belém
|
84h
|
1606
|
350,00
|
92,83
|
Manaus-Boa Vista do Ramos
|
22h
|
623
|
100,00
|
26,52
|
Manaus-Itacoatiara
|
11h
|
211**
|
50,00
|
13,26
|
Manaus-Juruti
|
11h
|
-
|
120,00
|
31,83
|
Manaus-Monte Alegre
|
33h
|
-
|
177,00
|
46,94
|
Manaus-Óbidos
|
27h ****
|
-
|
140,00
|
37,13
|
Manaus-Parintins
|
18h
|
475
|
100,00
|
26,52
|
Manaus-Urucará
|
18h 20h
|
344
|
-
|
-
|
Manaus-Uricurituba
|
-
|
248
|
-
|
-
|
Manaus-Barreirinha
|
22h
|
552
|
130,00
|
34,48
|
Manaus-Santarém
|
28h
|
739
|
159,00
|
42,17
|
Manaus-Maués
|
18-20h
|
698
|
100,00
|
26,52
|
Manaus-Faro
|
22h
|
-
|
-
|
-
|
Rio Solimões
|
Manaus-Anamã
|
17h
|
190
|
-
|
|
Manaus-Benjamim Constant
|
168h
|
1575
|
385,00
|
102,00
|
Manaus-Coari
|
30h
|
421
|
106,00
|
28,11
|
Manaus-Codajás
|
11h 24h
|
285
|
80,00
|
21,22
|
Manaus-Santo Antônio do Içá
|
144h
|
1195
|
290,00
|
76,92
|
Manaus-São Paulo de Olivença
|
144h
|
1345
|
330,00
|
87,53
|
Manaus-Tabatinga
|
168h
|
1513
|
385,00
|
102,12
|
Manaus-Tonantins
|
144h
|
1164
|
275,00
|
72,94
|
Manaus-Manacapuru
|
6h
|
115
|
-
|
-
|
Manaus-Caapiranga
|
12h
|
170
|
-
|
-
|
Manaus-Fonte Boa
|
72h
|
880
|
220,00
|
58,35
|
Manaus-Amatura
|
144h
|
1251
|
310,00
|
82,22
|
Manaus-Tefé
|
42h
|
631
|
155,00
|
41,11
|
Rio Negro
|
Manaus-Barcelos
|
29h 36h****
|
454
|
150,00
****
|
39,78
|
Manaus-São Gabriel da Cachoeira
|
84h
|
1001
|
-
|
-
|
Manaus-Novo Airão
|
9h 10h
|
125
|
-
|
-
|
Rio Purus
|
Manaus-Tapauá
|
50h 144h
|
769**
|
|
-
|
Manaus-Lábrea
|
144h
|
1531
|
400,00 450,00
|
106,10
119,36
|
Manaus-Manaquiri***
|
1h 40min
|
79
|
-
|
-
|
Manaus-Beruri
|
21h
|
231
|
-
|
-
|
Rio Madeira
|
Manaus-Humaitá
|
120h
|
965
|
200,00
|
53,05
|
Manaus-Manicoré
|
-
|
616
|
150,00
|
39,78
|
Manaus-Borba
|
6h 30min ****
|
322
|
80,00
|
21,22
|
Manaus-Porto Velho
|
96h
|
1239
|
250,00
|
66,31
|
Manaus-Nova Olinda do Norte
|
-
|
236
|
50,00
|
13,26
|
Manaus-Novo Aripuanã
|
-
|
469
|
120,00
|
31,83
|
Manaus-Autazes
|
12h 17h
|
324
|
-
|
-
|
Rio Juruá
|
Manaus-Carauari
|
120h
|
1411
|
-
|
-
|
Manaus-Eirupené
|
-
|
2417
|
-
|
-
|
Manaus-Juruá
|
96h
|
994
|
-
|
-
|
Manaus-Foz do Jutaí
|
84h
|
1001
|
255,00
|
68,91
|
Obs. Optou-se por incluir apenas as linhas que têm como ponto de início ou fim a cidade de Manaus e outra cidade, pois existe uma densidade de linhas de transporte fluvial entre as cidades situadas nas margens dos rios. Além disso, como ocorrem diversas paradas ao longo de uma viagem, foram incluídas apenas as linhas com ponto inicial e final. Os valores das passagens correspondem à data da pesquisa realizada nos sites e no porto no dia 22/10/18. O valor da passagem é apenas para viagens em que a pessoa dorme em rede.
*Site do Porto de Manaus; **Guia Manaus; ***Instituto Navegando e Lendo; ****Rome2rio; TCU <https://contas.tcu.gov.br/etcu/ObterDocumentoSisdoc?seAbrirDocNoBrowser=true&codArqCatalogado=5501920&codPapelTramitavel=49419279> Cotação em dólar feita em 24/01/19 com base no valor de 1 dólar equivalente à 3.77 reais.
19O aumento de velocidade nos transportes ocorreu com a inserção de novos meios técnicos, os quais passaram a fazer parte de todos os modais de transportes, tendo um imperativo econômico constituído pela própria aceleração do movimento circulatório do capital. Nesse sentido, inclui-se a própria necessidade social de buscar formas de encurtar o tempo de deslocamento, fato presente também no deslocamento amazônico, com sistemas técnicos que o aceleram, atendendo as novas dinâmicas econômicas e sociais.
- 4 O transporte de carga também teve alterações no formato das balsas e nos rebocadores, permitindo au (...)
20Essas buscas para inserir meios técnicos, visando acelerar os deslocamentos, passaram a ser empregados nas embarcações de transporte de passageiros4 ainda na década de 90, no estado do Amazonas. Segundo David (2010, pp. 97-98), “o surgimento do transporte fluvial expresso ocorreu em 1995, no porto de Manaus, com o barco Neblina, que fazia viagens fretadas para diversas localidades, sem ter rota específica”, e apresentando um aumento de velocidade - 30/60 km/h - em comparação com os barcos regionais, em decorrência da mudança da aerodinâmica e do emprego de motores potentes – 600 -1200 cavalos de potência -, recebendo cognomes, como de “the flash” e “a jato” ou “expresso”.
- 5 David (2010, p. 96) destaca que “o transporte fluvial na Amazônia tem sofrido grandes alterações, p (...)
21Essa modalidade de transporte apresenta algumas diferenças em comparação com os barcos regionais. Nessa, não há espaço para atar redes, e os passageiros vão sentados; transporta poucas cargas e apenas fracionadas. Além disso, nas principais rotas (Quadro 2), é possível observar uma redução do tempo de viagem5 e o aumento do valor pago pela passagem. As distâncias no maior estado da federação sofreram uma forte redução com a expansão desta modalidade de transporte de passageiros.
Quadro 2: Transporte a jato -Expresso
Trecho
|
Tempo da viagem
|
Distância
|
Valor
em Reais
|
Cotação em Dólar
|
Manaus-Tefé
|
11h
|
631
|
240,00
|
63,66
|
Manaus-Parintins
|
9h
|
475
|
170,00
230,00
|
45,09
61,00
|
Manaus-Manaquiri
|
7h
|
79
|
-
|
-
|
Manaus-Nova Olinda do Norte
|
4h
|
|
110,00
150,00
|
29,17
39,78
|
Manaus-Manicoré
|
12h – 14h
|
616
|
220,00
290,00
|
58,35
76,92
|
Manaus-Lábrea
|
-
|
-
|
-
|
-
|
Manaus-Coari
|
9h
|
421
|
200,00
|
53,05
|
Manaus-Barcelos
|
23h
|
454
|
200,00
|
53,05
|
Manaus-Carauari
|
18h
|
1411
|
600,00
550,00
|
159,15
145,88
|
Manaus-Amatura
|
34h
|
1251
|
390,00
600,00
|
103,44
159,15
|
Manaus-Benjamim Constant
|
34h-36h
|
1616
|
500,00
700,00
|
132,62
185,67
|
Manaus-Santo Antônio do Içá
|
34h
|
1128
|
390,00
600,00
|
103,44
159,15
|
Manaus-São Gabriel da Cachoeira
|
23h
|
1001
|
420,00
480,00
|
111,40
127,32
|
** Guia Manaus; Navegando e Lendo; Robert David. Cotação com base no valor de 1 dólar equivalente à 3.77 reais.
- 6 “[...] viagens de Parintins à Comunidade do Caburi” (ROSAS, 2017, S/P).
22O transporte em embarcações como “lanchas”, “a Jato” ou “expresso” não ocorre somente entre a capital do estado com outras cidades, pode-se apontar que existem outras linhas desse segmento que possuem centralidades em outras cidades, como em Parintins, onde as viagens ocorrem entre a cidade e um distrito, vila ou assentamento agrícola6. A busca pelo uso dessas embarcações para o deslocamento pelo interior ocorre tanto pela redução do tempo como pelo conforto, apesar da existência de horários estabelecidos pelas empresas e que possuem intervalos longos (ROSAS, 2017).
23A inserção dessa nova modalidade como uma evolução logística regional passou a coexistir com o transporte fluvial de passageiros em barco de recreio ou tradicional, o qual, por sua vez, constitui importância significativa, por ser um transporte muito utilizado pelas pessoas de baixa renda e permite o deslocamento de cargas, como alimentos e mercadorias, além disso, os barcos fazem várias paradas ao longo de uma viagem (DAVID, 2010).
- 7 Com o processo de pavimentação da rodovia BR-163 e a construção de portos privados, em breve, uma p (...)
- 8 Além dessas rotas, ainda tem a rota de transporte de carga em navios entre o litoral brasileiro até (...)
24Além do segmento de transporte de passageiros, existe o segmento de transportes de cargas para as indústrias e o comércio e a distribuição dos derivados de petróleo na Amazônia. Ao contrário do segmento de passageiros onde predomina pequenos empresariais, majoritariamente com uma única embarcação, o transporte de carga é composto por empresas cuja frota abriga dezenas de embarcações –comboios fluviais, rebocadores- realizando basicamente viagens entre as maiores cidades da região: Manaus-Belém e Manaus-Porto Velho, utilizando basicamente os rios Amazonas e Madeira. Uma terceira rota, via Manaus-Santarém-Itaituba, está em processo de implantação e consolidação7, e, nessas rotas, o deslocamento das cargas ocorre em balsas, principalmente com o sistema Ro-Ro Caboclo8.
Figura 1. Modelo espacial da organização da hierarquia do transporte fluvial
a) cidade com rota fluvial regional e local; b) cidade com rota fluvial local, regional e transporte de carga em balsas; c) vários tipos de rotas fluviais que envolvem diversas escalas tendo ou não conexão com as cidades e vilas.
- 9 Pequenas embarcações que realizam o transporte de estudantes para as escolas ao longo dos rios.
25A diversidade de atividades estabelecidas e que apoiam o sistema de transporte pode ser observada pela presença de variantes, como: táxi fluvial, barco escolar, ambulanchas9, posto de combustível flutuante (Fig. 1f), mercearias funcionando como ponto de comércio, posto de fiscalização do estado, lanchonetes e bares (Fig. 2), os quais constituem atividades direta ou indiretamente vinculadas ao transporte fluvial, ao fluxo propriamente dito. Observam-se, ainda, outras atividades relacionadas, como a produção de embarcações de forma artesanal, os serviços de calafetagem e os estaleiros, que produzem uma gama variada de embarcações, concentrando a produção na orla da cidade de Manaus.
- 10 Com o slogan “Nestlé Até Você a Bordo” "Nestlé até você”.
26Algumas atividades realizadas pelo Estado ou pelas empresas, por meio de estabelecimentos fixos, também tiveram uma versão pensada para atender a população amazônica, situada nos rios, marcadas, inicialmente, pela presença militar, com os navios da Marinha, que oferecem serviços hospitalares e de ambulatório. Nas atividades econômicas, podem-se mencionar: o Barco da Nestlé10, que representa a própria expansão e atuação em um mercado cativo; o barco agência da Caixa Econômica Federal, que oferece serviços de atendimento referentes à Bolsa Família, Cartão do Cidadão, saque do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e cadastramento do Programa de Integração Social (PIS).
Figura 2 Tipos de embarcações
No mosaico: a) orla da cidade de Manaus em; barco regional; c) porto privado do Chibatão; d) barco expresso; e) lancha; f) posto de combustível flutuante; g) barco regional e barco expresso; lancha e balsa Ro-Ro; IP4 do Careiro da Várzea na BR-319.
27Num trabalho sobre transporte fluvial, David alertava sobre a relevância do transporte fluvial em suas várias modalidades, porém destaca o “descaso por parte do poder público, referente à estrutura portuária, que na maioria dos municípios é precária” (2010, p. 116). Por seu turno, Becker já apontava que a integração da região “deve ser baseada na circulação fluvial, que merece um investimento enorme, pois sempre foi o grande meio de circulação na Amazônia, e também na aérea [...]” (2005, p. 79).
28Um dos objetivos dos planos de transporte, seja na escala federal, com o Plano Nacional de Logística e Transportes – PNLT e o Programa de Aceleração do Crescimento – PAC; seja na escala internacional, com a Iniciativa de Integração Regional Sul – Americana – IIRSA, é “ampliar a capacidade de fluxos de mercadorias nos portos”, por meio da criação de novas estruturas portuárias que visam a adequação, segurança e melhoria nos modais do transporte fluvial (RODRIGUES; RODRIGUES; CASTRO, 2014, p. 119).
29Essa estruturação de novos projetos passou a ter agenda governamental regional com aporte de recursos federais para a construção de sistemas de engenharia, considerando que, como estratégia geopolítica e geoeconômica de circulação, a adequação dos fixos existentes no eixo do rio Amazonas e nos rios a ele conectados permite integração regional e internacional com a Colômbia, Equador e Peru, reforçando as rotas fluviais entres os países, ou seja, o projeto dos portos que estão na região está diretamente interligado com o eixo principal e estruturante - Leste Oeste - e os portos adjacentes desse eixo (Fig. 3).
Figura 3. Eixo do Amazonas do projeto IIRSA
30Nos últimos oito anos, novos projetos de construção de infraestruturas portuárias foram sendo instituídos em toda a região Amazônica. Essa integração com grandes projetos e com a materialização de vários sistemas de engenharia, que atendem às necessidades regionais e não somente nacionais e internacionais, possibilita sobremaneira uma integração regional, com aumento de eficiência e de segurança.
- 11 Pela Lei N° 12.815, de 5 de junho de 2013, no art. 2° no parágrafo VI, destaca-se que as instalaçõe (...)
31O transporte fluvial de cargas no Amazonas envolve apenas três cidades com grandes sistemas de engenharia portuária. Primeiro, a cidade de Manaus, com uma concentração de estruturas portuárias que recebem navios e demais embarcações; a cidade de Itacoatiara, onde se situam o porto graneleiro da Hermasa-Amaggi e demais estruturas portuárias, ambos permitem a movimentar de carga em navios; e, por fim, a cidade de Humaitá, que possui um porto graneleiro e um porto para a movimentação de contêineres e demais cargas em balsas. Essas três cidades possuem estruturas que permitem uma articulação local com os mercados nacionais e internacionais, já que os demais portos são considerados, pela própria classificação oficial, como estruturas Portuárias Públicas de Pequeno Porte-IP411, num total de 87 (Fig. 4), entre os estados do Amazonas, Roraima, Rondônia, Pará e Amapá. Uma outra cidade que possui instalações portuárias é Coari, mas a estrutura é voltada para movimentação de derivados de petróleo. No Amazonas, constata-se a concentração de 61 portos (DNIT, 2018), a menor quantidade de rodovias e a maior quantidade de cidades e demais ocupações com acesso fluvial, sendo que a implantação dessas estruturas portuárias articula-se diretamente com o eixo principal de circulação Leste-Oeste do rio Amazonas.
Figura 4. IP4 projetados e construídos na Amazônia.
32Esses novos e pequenos sistemas de engenharia não fogem às lógicas capitalistas de produção do espaço pelo Estado, atendendo também as demandas econômicas, mesmo que locais e regionais, com a disposição de uma estrutura para o estabelecimento das atividades econômicas do transporte.
Figura 5. Sobreposição do Eixo do Amazonas e os portos fluviais.
- 12 Além da construção desses portos, ocorre a construção de câmaras frias para armazenamento do pescad (...)
- 13 Esses portos fazem parte do Arco Norte, que envolve portos amazônicos e do litoral, para o escoamen (...)
33Esses portos construídos ao longo dos rios12 e nas orlas das cidades amazonenses estão distantes, do ponto de vista de sua inserção em circuitos produtivos, das commodities, como é o caso dos portos de Porto Velho, Humaitá, Itacoatiara –Hermasa - e, recentemente, no estado do Pará, em Itaituba13. Esses outros portos atendem muito mais as demandas capitalistas internacionais, com a possibilidade de redução de custos logísticos, e seus empreendimentos são controlados, sendo uma boa parte construídos pelas corporações nacionais e internacionais. Aliás, muitas das vezes, têm uma única finalidade, que é permitir o embarque ou desembarque dos grãos de soja e milho. Por outro lado, os portos do interior do Amazonas estão situados numa logística também capitalista, mas permitindo o deslocamento de cargas e pessoas dentro de circuitos espaciais regionais e locais, e o atracamento das embarcações, antes realizado numa margem de rio, passou a ter uma dada centralidade com os portos construídos. Isso, contudo, não quer dizer que a atracação antes existente deixou de ser realizada; ela continua, mas as embarcações de linhas regionais passaram a fazer o atracamento nesses novos portos.
34O estado do Amazonas possuir uma reduzida malha rodoviária com um total de aproximadamente 10 mil km de rodovias federais e estaduais, sendo pavimentadas pouco mais de mil quilômetros e tendo a duplicação AM-070, com 84 km14. A partir desses dados é possível observar que a integração pelas rodovias (Fig. 6) e pela trafegabilidade total continua distante para diversas localidades.
Figura 6. Rodovias no Amazonas
35O estado do Amazonas não ficou distante das políticas territoriais que foram sendo colocadas em prática desde a década de 60, em paralelo com a integração iniciada por Juscelino Kubistchek. Com a construção das rodovias BR-029, atual BR-364, e BR-010, o governo estadual empenhou a execução de planos rodoviários que visassem a integração do estado, seja para propiciar a ocupação nas terras firmes, seja para romper com a primazia do transporte fluvial. Nesse período, diversos projetos foram sendo executados, como a construção da rodovia AM-010, entre Manaus e Itacoatiara (Fig. 7). Nos anos de 1968 até 1977 o governo federal destinou somas de recursos para a construção (Fig 8a) das rodovias BR-319, BR-230, BR-174, BR-307, BR-317 e outras; além do governo estadual que deu início à construção de rodovias regionais (Quadro 3).
Figura 7. Técnicos do DER/Am inspecionando as obras de conclusão da terraplanagem na rodovia AM-010
Fonte: Revista O Cruzeiro, 31 de agosto de 1957, p. 70.
36Todas essas grandes rodovias foram concluídas dentro do Programa de Integração Nacional-PIN, que visava não somente abertura de rodovias como também, estimular a migração e a construção de assentamentos pelo INCRA. Além disso, houve incentivos para a exploração de recursos naturais, como minérios e florestas.
- 15 Essa blindagem foi realizada, por exemplo, ao longo do eixo da Perimetral Norte, entre o Amapá, Par (...)
37Algumas rodovias tiveram sua construção interrompida e outras foram apenas planejadas (Quadro 3), e dificilmente serão construídas, seja pelo custo financeiro de construção, pelos impactos ambientais e sociais negativos, seja pela blindagem com Unidades de Conservação e Terras Indigenas15 já consolidadas.
Quadro 3: Rodovias construídas e planejadas
Nomeclatura
|
Trecho
|
Distância
|
Situação
|
Rodovias Estaduais
|
PA-265
|
Itaituba - Maués/AM. (Aveiro, Itaituba, Maués/AM)
|
250
|
Planejado
|
Sem Código
|
Rodovia do Estanho
BR-230-Jazida
Estanho-Div. Mato Grosso
|
150
29
|
Implantado
|
Sem Código
|
Anori-Codajás**
|
68
|
Implantado
Tráfego sazonal
|
AM-010
|
Manaus-Itacoatiara
|
266
|
Trafegável
|
AM-070
|
Manaus-Mancapuru
|
87
|
Trafegável
|
AM-170
|
Santa Isabel do Rio Negro-BR-210
|
111
|
Planejado
|
AM-174
|
Novo Aripuanã-Apuí
|
278
|
Implantado
Tráfego sazonal
|
AM-175
|
Pauini-BR-317
|
67
|
Planejado
|
AM-240
|
Presidente Figueiredo-Balbina
|
75
|
Trafegável
|
AM-245
|
-
|
-
|
Planejado
|
AM-254
|
Autazes-BR-319
Autazes-Maués
|
93
160
|
Trafegável
Planejado
|
AM-280
|
BR-307-Ipixuna
|
121
|
Planejado
|
AM-329/AC-329
|
Eirunepé-Envira-Feijó
|
134 – 200
|
Planejado
|
AM-326
|
Urucará-AM-363
|
-
|
Planejado
|
AM-330*
|
Silves-AM-363
|
15,59
|
Trafegável
|
AM-333
|
Carauari-BR-230
|
171
|
Planejado
|
AM-343
|
Coari-AM-366
|
107
|
Planejado
|
AM-352
|
Manaucapuru-Novo Airão
|
90
|
Trafegável
|
AM-354
|
Manaquiri-BR-319
|
42
|
Trafegável
|
AM-356
|
Borba-BR-319
|
110
|
Planejado
|
AM-360
|
Rodovia Novo Aripuanã-BR-319
|
100
|
Planejado
|
AM-363
|
Itapiranga-AM-010/Itacoatiara
Itapiranga-Nhamundá
|
110
190
|
Trafegável
Planejado
|
AM-366
|
Juruá-Tapauá-Rio Madeira
|
573
|
Planejado
|
AM-374
|
Santo Antônio do Içá-BR-307
|
93
|
Planejado
|
AM-378
|
São Paulo de Olivença-BR-307
|
24
|
Planejado
|
AM-449
|
AM-010-Base Militar
|
45
|
Implantado
|
AM-452*
|
Iranduba—AM-070
|
11,5
|
Trafegável
|
AM-453
|
Bela Vista-AM-070
|
8,5
|
Trafegável
|
AM-466***
|
-
|
-
|
Implantado
|
Rodovias Federais
|
BR-080
|
S. Gabriel da Cachoeira-Manaus-Jacareacanga
|
1270
|
Planejado
|
BR-174
|
Manaus-Boa Vista-Pacaraima
Manaus-Div-RR
|
1010
250
|
Trafegável
|
BR-174B
Antiga AM-364
|
Democracia-Hevelândia
|
84
|
Implantado
Tráfego Sazonal
|
BR-210
|
Div. AM-RR-Fronteira com a Colômbia
|
840
|
Implantados 36 km
Projetado
|
BR-307
|
Cucuí-São Gabriel da Cachoeira
São Gabriel da Cachoeira-Beijamim Constant
B. Constant-Atalaia do Norte
Atalaia do Norte-C. Thramalturgo
|
212
670
32
625
|
Trafegável apenas 139km
Projetado
Asfaltados
Total 1520km
|
BR-230
|
Div. AM/PA – Lábrea
Lábrea-Benjamin Constant
|
831
687
|
Implantado
Planejado
|
BR-317
|
Lábrea-Boca do Acre
Boca do Acre-Div AM/AC
|
416
100
|
Planejado
Implatado/Trafego sem interrupção
|
BR-411
|
Palmeira do Javari
|
40
|
Planejado
|
BR-433
|
Estirão do Equador
|
85
|
Planejado
|
BR-319
|
Manaus-Div AM-RO
|
859
400
|
Implantado
Asfaltados
|
**“[…] estrada Codajás-Anori foi inaugurada em 1994, e, por falta de manutenção da pista de barro batido, ficou intrafegável” (SAN’TANA, 2006, p. 104).
*** TCU (2013)
Fonte: DNIT. *http://www.transportes.gov.br/images/2014/10/Amazonas.pdf
38Após a construção das rodovias mencionadas, sejam elas estaduais ou federais, as relações sociais e os fluxos econômicos passaram a ser realizadas por meio das novas rodovias, as quais, além de possibilitarem essas dinâmicas, tornaram-se elementos fundamentais para os projetos de colonização, distribuição de terras para empresas e, ainda, permitiram acesso aos recursos naturais minerais e vegetais, e uma valorização e especulação fundiária.
39Assim como os rios amazônicos possuem uma estrutura complexa, que permite a fluidez de embarcações, as rodovias também possuem um conjunto de sistemas de engenharia e diversas atividades que estão diretamente vinculadas aos fluxos, ocasionando a formação de serviços ao longo das vias, entre os quais o serviço de transporte de passageiros entre a capital e as cidades do estado (ver Quadro 4).
Quadro 4: Linhas do transporte rodoviário de passageiros intermunicipal e interestadual
Trecho
|
Distância km
|
Tempo de viagem
|
Valor da passagem
|
Passagem em dólar
|
Empresas
|
Manaus-Itacoatiara
|
266
|
3h 50 min
5h 06 min
|
53,60
|
14,21
|
Aruanã
Eucatur
|
Manaus-Rio Preto da Eva
|
75
|
1h 50 min
|
15,50
|
4,11
|
Expresso-Transamazônica
|
Manaus-Novo Remanso
|
213
|
4 horas
6h 50 min
|
47,30
|
12,54
|
Aruanã
|
Manaus-Itapiranga
|
335
|
5 horas
|
75,00
|
19,89
|
Aruanã
|
Manaus-Abonari km 200 da BR-174
|
220
|
5h 45 min
|
60,20
|
15,96
|
Expresso-Transamazônica
Aruanã
|
Manaus-Presidente Figueiredo
|
121
|
1h 50 min
|
30,50
|
8,09
|
Aruanã
|
Manaus-Balbina
|
200
|
3h 30 min
|
44,00
|
11,67
|
Expresso Transamazônica
Aruanã
|
Manaus-Boa Vista RR
|
775
|
10h 10 min
11h 55 min
|
170,00 230,00
|
45,09
61,00
|
Eucatur
Asatur
Rivaltur
Caburaí
TransBrasil
Amatur
Dantas*
|
Manaus-Caracas VEN
|
2263
|
38h
|
289,00
|
76,65
|
Eucatur
|
Manaus-Manacapuru
|
87
|
1 h
3h 20 min
|
22,75
|
6,03
|
Master
Emtram
|
Manaus-Novo Airão
|
195
|
5h 45 min
|
54,30
|
14,40
|
Master
Emtram
|
Manaus-
(Democracia) Manicoré **
|
441
|
10h
|
150,00
|
39,78
|
Aruanã
TransCoop
|
(Democracia) Manicoré – Porto Velho **
|
620
|
12h
|
210,00
|
55,70
|
-
|
Manaus-Humaitá **
|
703
|
21h
|
231,00
|
61,27
|
Eucatur
TransBrasil
Aruanã
Siqueira Tur
Amatur*
|
Manaus-Lábrea **
|
860
|
30h
|
280,00
296,00
|
74,27
78,51
|
Aruanã
TransCoop
|
Manaus-Porto Velho **
|
894
|
23h 50 min
40 h
|
255,00
|
67,63
|
Eucatur
Serra Azul
TransBrasil
|
Manaus-Apuí **
|
1100
|
24h - 28 h
|
300,00
|
79,57
|
Amatur
|
Vila do Marco Zero (Careiro da Várzea)-Castanho
|
101
|
1h 45 min
|
15
|
3,97
|
Aruanã
|
Vila do Marco Zero (Careiro da Várzea)-Autazes
|
96
|
-
|
-
|
-
|
-
|
Humaitá-Porto Velho
|
206
|
3h
3h 35 min
|
46,80
|
12,20
|
Eucatur
Serra Azul
|
Lábrea-Humaitá
|
215
|
5 h
|
96,00
|
25,46
|
Aruanã
|
Apuí – Porto Velho **
|
604
|
15h 30 min
|
170,00
|
45,09
|
Amatur
TransBrasil
Viação Apuí
|
Boca do Acre-Rio Branco ***
|
216
|
6h
|
40,00
|
10,61
|
Petro Acre
|
Guajará-Cruzeiro do Sul
|
22
|
30-50 min
|
11,00 *
|
2,91
|
J. Cruz Serviços Administrativos
|
*Empresa iniciou operação rodoviária em outubro de 2018; **Linha que pode ter as viagens suspensas entre os meses de janeiro até junho, pois perpassa trecho rodoviário sem pavimento; *** informação obtida via telefone.
Fonte: Guichê Virtual; CNT (2016).
- 16 Outras linhas de ônibus de cooperativas atuam no transporte de passageiros, estabelecendo linhas re (...)
- 17 Agência Reguladora dos Serviços Públicos Concedidos do Estado do Amazonas e Agência Nacional de Tra (...)
- 18 Esse conflito no transporte rodoviário de passageiros já é apontado por Wright (1982).
40Nessas linhas não atuam apenas empresas autorizadas a realizarem o transporte regular, há o transporte fretado e, ainda, o transporte em carros – táxi - e em ônibus não regulamentados. Essa atividade está presente em todas as ligações rodoviárias16, o que gera um impasse entre empresas de ônibus que possuem autorizações emitidas pelas agências reguladoras – ARSAM ou ANTT17 - e aquelas que não possuem autorização18.
41Essas rotas (Fig. 7) permitem visualizar que uma parcela significativa tem como ponto de origem ou de destino a cidade de Manaus, constituindo-se como uma centralidade dos nós dessa rede, apesar de que nem todas as linhas regulares permitem o transporte para a capital. Para a operacionalização dessa atividade econômica, as empresas criaram estratégias para o funcionamento das rotas, que vão desde a instalação de uma rodoviária em um restaurante, adaptações nos veículos para off road, comercialização de passagens em estabelecimentos comerciais, como drogaria e mercados (Fig. 8).
Figura 8. Tipos de veículos
a) Ônibus da rota Manaus-Itacoatiara, na rodovia AM-010; b) rodovia BR-319; c) caminhão romeu-julieta em Humaitá; d) rodovia BR-174; e) veículo na BR-319; f) rodoviária da vila de Realidade.
42As rodovias e as estradas construídas na Amazônia, em sua maioria, foram de realização do Estado, e algumas são de origem privada, estas visando permitir acesso aos recursos naturais. Existem, ainda, outros caminhos terrestres que foram e continuam sendo construídos com objetivo de permitir a passagem de veículos para retirar, principalmente, recursos florestais – madeira. São numerosos esses caminhos, construídos sem obedecer a planos técnicos, além de cortarem a floresta em trajetos tortuosos. Uma parte dessas estradas não regulamentadas é construída com acesso a rodovias federais e estaduais ou, ainda, conectada a algum rio, de tal forma que possibilite a retirada da madeira ou do processado – pranchas e tábuas - seja por via terrestre ou fluvial.
43No estado do Amazonas não há linhas férreas, apenas projetos, sendo que, para a construção de uma ferrovia, um dos primeiros requisitos que precisa ser atendido é ter densidade de carga, algo que não possui, e a demanda existente já é deslocada pelos rios, como no caso da Hidrovia do rio Madeira e a Hidrovia Solimões-Amazonas, ou ainda pelas rodovias e aeroportos.
44A distribuição espacial dos aeródromos no Amazonas (Fig. 9) corresponde à presença de cidades sedes municipais e de estruturas militares, como os Pelotões Especiais de Fronteira-PEF, alguns, como os aeródromos da faixa de fronteira, são de uso militar, enquanto outros, como o aeroporto de Tabatinga, possuem uso civil-militar (OLIVEIRA NETO; NOGUEIRA, 2018).
Figura 9. Aeródromos no Amazonas.
45O segundo elemento técnico que permitiu a integração da Amazônia foi o transporte aéreo, inicialmente feito por empresas, como Panair e Cruzeiro do Sul, e o Correio Aéreo Nacional-CAN que estruturavam rotas áreas operadas com aviões que permitiam pousar nas águas, algo que permanece até os dias de hoje, com pequenas aeronaves.
46Se de um lado o transporte de passageiros ocorre com voos não diários para o interior do estado, por outro lado, o transporte de carga aérea entre as cidades de Manaus e São Paulo ocorre com voos diários, pois o produto transportado permite rentabilidade às empresas, mesmo com a despesa do frete aéreo.
- 19 O Aeroporto Internacional Eduardo Gomes é um dos 4 que mais movimenta cargas aéreas do Brasil.
47O transporte aéreo dentro do estado do Amazonas está centrado em apenas sete rotas aéreas (Quadro 5), e, em outra escala regional, a cidade de Manaus19 possui voos constantes para as cidades de Belém, Boa Vista, Porto Velho e Rio Branco, e na escala nacional e internacional com voos constantes, partindo de Manaus com direção para Brasília, São Paulo, Fortaleza, Rio de Janeiro, Miami e Portugal.
Quadro 5: Rotas aéreas no Amazonas
Trecho
|
Distância em linha reta em km**
|
Tempo de Viagem
|
Preço*
|
Passagem em dólar
|
Empresa aérea
|
Manaus-São Gabriel da Cachoeira
|
836
|
2h 03 min
|
651,17
961,17
|
172,72
254,95
|
MAP
|
Manaus-Eirunepé
|
1162
|
2h 27 min
|
700,00
941,00
|
185,67
249,60
|
MAP
|
Manaus-Carauari
|
788
|
2h 03 min
|
661,00
960,00
|
175,33
254,64
|
MAP
|
Manaus-Lábrea
|
703
|
1h 50 min
|
521,00
971,00
|
138,19
257,55
|
MAP
|
Manaus-Coari
|
364
|
57 min
|
331,00
507,00
|
87,79
134,48
|
MAP
|
Manaus-Parintins
|
365
|
57 min
|
281,17
501,17
|
74,58
132,93
|
MAP
|
Manaus-Tefé
|
522
|
1h 17 min
|
291,00
668,17
|
77,18
177,23
|
MAP
AZUL
|
Manaus-Porto Velho
|
760
|
1h 25 min
|
346,00
1000,00
|
91,77
265,25
|
GOL
AZUL
LATAM
|
Manaus-Tabatinga
|
1107
|
1h 50 min
|
313,00
1013,00
|
83,02
268,70
|
AZUL
|
Manaus-Santarém
|
587
|
1h 15 min
|
269,00
1836,00
|
71,35
487,00
|
GOL
LATAM
|
Manaus-Belém
|
1300
|
2h
|
212,00
726,00
|
56,23
192,57
|
GOL
LATAM
|
*Os valores foram obtidos nos sites no dia 25 de outubro de 2018: Map, Azul e Decolar, foi realizada a pesquisa de voo de ida entre os meses de out até fev. ** Distância obtida no Google Earth. Únicas cidades que possuem diários dentro do estado e para Tabatinga.
- 20 “As companhias aéreas (...) abrem linhas aéreas para destinos em que o fluxo de passageiros é sufic (...)
48Sendo de relevância substancial, o transporte aéreo entre as cidades e vilas continua atendendo, de forma reduzida, a população, já que algumas particularidades, como dispersão, ausência de infraestruturas nos aeródromos e a baixa renda, tornam-se entraves para o deslocamento aéreo ou até mesmo a criação de rotas aéreas20. Além disso, as passagens custam três vezes mais que o valor de um deslocamento fluvial ou rodoviário.
- 21 Bertha Becker, Wanderley M. da Costa e Francisco de A. Costa.
49A continuidade da integração da Amazônia ainda vigora por meio de políticas territoriais que têm como proposta a materialização de sistemas de engenharia nessa região. Obviamente, que essa atuação estatal se alterou ao longo desses 80 anos de pensamento geopolítico, não desenhando mais grandes sistemas de engenharia atrelados a projetos de povoamento, mas almeja-se reforçar a integração regional já existente a partir dos rios, das rodovias já construídas e dos aeródromos já existentes. O que aparece como novo nessa integração é a inserção de novas técnicas e redes, como a fibra óptica, redes de energia elétrica e infovias, permitindo fluidez de informações e integração energética regionais, propiciando movimentação de dados nas instituições e disponibilizando serviços para a sociedade. Enfim, conforme já apontavam os autores21 do CGEE (2009), observa-se a necessidade de capilarizar as redes de transportes com conexões com os grandes eixos já estruturados, propiciando fluxos com segurança e inserção social com a conclusão dos projetos das demais infraestruturas de pequeno porte.
50O estado do Amazonas possui uma excepcionalidade referente ao transporte de cargas e de pessoas, pois dispõe de uma rede urbana conectada pelos rios, mas, ao mesmo tempo, pouco articulada pela ausência de viagens diárias dos barcos regionais e dos voos, além de dispor uma rede rodoviária, que conecta apenas uma parcela das cidades do estado.
51Nos quadros apresentados, pode-se constatar além da variante tempo, a distância e o valor. Pode-se notar, ainda, que as operações das rotas ocorrem com a predominância de uma ou duas empresas, caracterizando um regime de monopólio e duopólio, este é instituído pelo Estado durante a regulamentação da atividade de transporte de passageiro, principalmente pelos modais terrestre e aéreo, enquanto que, no fluvial, as rotas são operadas por vários barcos regionais e expressos, não se diferindo, porém, pelo arranjo espacial formado com rotas pré-estabelecidas, dia e horário de saída, locais de parada, pontos de apoio e de comercialização de passagens.
52A organização espacial dos transportes representa uma projeção social, que tem como motor as dinâmicas da própria sociedade, constituindo-se em um fluxo oriundo de diversos anseios, sejam eles econômicos, políticos, sociais e culturais. Contudo, outro catalizador dessa organização é instituído nos territórios, pelas corporações e pelo Estado, inicialmente pelo uso das infraestruturas construídas pelo Estado, sendo este um dos produtores do espaço, que materializou uma rede pretérita de circulação. O uso dessas infraestruturas pelas corporações pode criar diversos arranjos espaciais distintos nos eixos de circulação, tendo como princípio fundamental o movimento das mercadorias, para fins de rotação e de obtenção de lucros.
53A circulação e os transportes, seja no modal rodoviário, fluvial ou até aéreo, possui uma articulação direta entre os objetos presentes no território e que foram frutos de uma acumulação desigual ao longo do tempo. Essas localizações pretéritas, como as infraestruturas fixas, acabam por condicionar os novos processos, que passam a ser instituídos, tanto pelas demandas regionais, quanto nacionais ou internacionais. Observa-se essa conjuntura multiescalar presente na Amazônia e no estado do Amazonas, seja pelos rios, com a navegação diversificada de embarcações que atendem os circuitos da economia, seja com o transporte rodoviário, que também está inserido nessa dinâmica, principalmente no transporte de carga.
54Seja no transporte aéreo, fluvial ou rodoviários, pode-se observar que todos esses meios possibilitam o deslocamento de pessoas, contribuindo, positivamente, para o estabelecimento das interações sociais e espaciais. E, mais ainda, em ambos os casos, os veículos, as embarcações e as aeronaves também transportam cargas, em volumes fracionados, favorecendo, de um lado, o atendimento as demandas de consumo; e de outro, possibilitando uma rentabilidade para as empresas proprietária dos equipamentos rodantes.