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Pesca e perfil socioeconômico dos pescadores artesanais da fronteira setentrional do Brasil: a comunidade pesqueira de Oiapoque, Amapá

La pêche et le profil socio-économique des pêcheurs artisanaux de la frontière nord brésilienne : la communauté de pêcheurs d'Oiapoque, Amapá
Fisheries and socioeconomic profile of artisanal fishermen on the northern border of Brazil: the fishing community of Oiapoque, Amapá
Viviane V. de V. Amanajás

Résumés

La recherche a été réalisée dans la région transfrontalière du Brésil avec la Guyane française, dans l'état d'Amapá, où les pêcheurs artisanaux de la municipalité d'Oiapoque ont leurs zones de pêche envahies par divers acteurs. La recherche décrit et analyse 10 questions: aspects historiques, rôle des femmes, nombre d'enfants et avenir de la pêche, âge et temps de travail, formation, migration, composition du revenu, organisation de la pêche et professions. La méthodologie était quali-quantitative (2013 à 2014), avec observation directe, 177 questionnaires, entretiens et cartographie. Les résultats ont montré l'importance du territoire pour la communauté, le travail de la femme, la scolarité et la variété des emplois, la forme d'organisation du travail qui s'étend au social, la distribution des revenus selon les acteurs et la conscience environnementale du groupe. L'information socio-économique produite est pertinente, car ce sont les communautés qui subissent l'impact de la mondialisation, avec la diminution, la concurrence et la banqueroute de la ressource halieutique.

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Texte intégral

1O ambiente costeiro traz consigo grupos sociais, carregados de identidades e cultura, aspectos com os quais se identificam, que denotam a importância do modo de vida no mar mais do que na terra. “São construções ancoradas em história e em constante evolução” (PÉRON; RIEUCAU, 1996, p. 14).

2Nesse contexto a pesca artesanal do Amapá, uma das principais fontes de proteína na dieta alimentar do ribeirinho, corresponde a mais de 90% de toda a captura efetuada nas áreas costeiras do estado, utilizando em grande parte mão de obra familiar (SILVA et al., 2016). Em Oiapoque os pescadores comercializam parte da produção no mercado local e grande parte com os atravessadores, que comercializam com “municípios paraenses (Santarém, Óbidos, Monte Alegre, Alenquer, Prainha e outros) e municípios amazonenses (Maués, Coari e outros)” (SILVA; DIAS, 2010, p. 50), além de São Paulo, Belo Horizonte e João Pessoa.

3A pesca em Oiapoque é relevante pela tradição, economia local, potencial para a exportação e diversidade haliêutica (PEZZUTO, 2015). Porém, concomitante a pesca há a preocupação com a redução do pescado, em razão da invasão de frotas de outras regiões do país e de outros países.

4Assim as justificativas para esta pesquisa são: Retratar os aspectos socioeconômicos do pescador e seus familiares, possibilitando uma reflexão e tomada de consciência sobre a atividade e suas transformações ocorridas ao longo dos anos; embora a pesca artesanal integre dimensões ambientais, políticas, biológicas, sociais e econômicas (FORST, 2009), os valores socioculturais da pesca têm sido subestimado no manejo costeiro (KHAKZA; GRIFFITHC, 2016); e, várias comunidades de pescadores estão em declínio ou em perigo de extinção devido a várias causas naturais, antropogênicas (KHAKZA; GRIFFITHC, 2016) ou pela exploração do mercado, o que resultará na perda de parte da história viva e herança autêntica (JACOB; WITMAN, 2006).

Localização da área de estudo

5A área de estudo localiza-se no estado do Amapá/Brasil, no município de Oiapoque, porção nordeste da América do Sul (Figura 1) e partilha uma fronteira de 665 km com a Guiana Francesa. Oiapoque (03° 49' 29" N; 51° 49' 05" O) se localizada às margens do rio Oiapoque e possui uma área de 22.625,3 Km², equivalente a 15,8% do total territorial do Estado, com população de 24.892 hab. em 2016.

Figura 1 - Mapa de localização do município de Oiapoque.

Figura 1 - Mapa de localização do município de Oiapoque.
  • 1 Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Estado do Amapá.

Fonte: SEMA1 (2003). Elaboração Viviane Amanajás (2017).

Metodologia

6A metodologia é descritiva-exploratória de natureza quali-quantitativa com uso de métodos estatísticos. A coleta de dados ocorreu de 09/2012 a 05/2014. E incluiu: pesquisa bibliográfica e documental; consulta ao Ministério da Pesca (MPA/AP) e a Colônia de Pescadores do Oiapoque (CPOZ-03); trabalho de campo; aplicação de formulário (12/2013 e 05/2014); observação direta; análise estatística; e, elaboração de mapas.

7O estudo considerou a população N= 619 pescadores (MPA/AP, 2012), com intervalo de confiança de 95%, margem de erro de + 5, proporção de 20%, e amostra de n= 177 formulários aplicados.

Resultados e discussão

8É reconhecido as dificuldades na coleta e análise de dados sobre a pesca artesanal no mundo inteiro, passando pela ausência de equipe treinada em estatística, escassos centros de pesquisa, ausência de agentes de campo para a coleta das informações de desembarques, metodologias de coleta diferenciadas (MILES, 1985). Dificuldades essas que variam de acordo com país e região. Essas dificuldades geram estatísticas de pesca totalmente inadequadas, defasadas ou inconstantes. O Brasil não é diferente desse contexto. “A pesca artesanal sofre de uma carência, generalizada, de informações biológicas e, especialmente, socioeconômicas” (ALVES DA SILVA et al., 2009, p. 533).

9Os entrevistados correspondem a 28,6% da população total de pescadores de Oiapoque. Estes pescadores chegaram a região de Oiapoque no século 20, praticando uma pequena pesca costeira caracterizada como "nômade" (LAVAL, 2016). Era uma pesca praticada por habitantes do Pará. Em 1940 estes pescadores estabeleceram-se na foz do rio Cassiporé (AP), criando a vila do Taperebá (Figura 2).

Figura 2 – Mapa com a localização da Vila do Taperebá e a migração para o município de Oiapoque.

Figura 2 – Mapa com a localização da Vila do Taperebá e a migração para o município de Oiapoque.

Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

10A Vila era formada por habitantes das regiões costeiras e estuarinas da Amazônia: Calçoene, Amapá, Bailique - no Amapá; e Marajó, Afuá e Belém - no Pará (CRESPI; LAVAL; SABINOT, 2014). Em 1980 houve a criação do Parque Nacional do Cabo Orange (PNCO) na região onde a comunidade habitava. Após a criação do PNCO os pescadores permaneceram no local, mas depois de 10 anos viram-se obrigados (devido as regras do Parque) a migrar. O local escolhido para a mudança foi a sede de Oiapoque (Figura 3).

Figura 3 – Área urbana do município de Oiapoque com a localização das áreas de concentração dos pescadores.

Figura 3 – Área urbana do município de Oiapoque com a localização das áreas de concentração dos pescadores.

Fonte: SEMA (2003). Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

11Na figura 3 apresenta as áreas de concentração da pesca. Na área leste tem-se a concentração de moradias dos pescadores, a proximidade ao rio, aos pontos de desembarque, aos pontos de abastecimento de combustível e a colônia de pesca. Na área oeste tem os desembarques e abastecimentos de embarcações de outros estados, gerando uma tensão entre os pescadores das duas áreas.

  • 2 O MPA criado pela Lei 11.958/2009, para formular a política de desenvolvimento da pesca e aquicultu (...)

12A infraestrutura da cidade de Oiapoque (figura 3) é modesta, dispõe de escolas em todos os níveis de ensino (embora nenhuma com formação em pesca), posto de saúde, polícia, etc. Há carência na oferta de serviços e produtos na cidade, mas não compromete atividade da pesca, os pescadores não necessitam vir a capital para comprar equipamentos ou insumos. Entretanto, sentem falta de órgãos públicos de apoio a pesca, como a Marinha no Brasil e o MPA2.

13Dentre os entrevistados observou-se a predominância masculina na atividade (92%), reforçando o papel tradicional da pesca onde o homem é o principal gerador de renda. Mas, embora as mulheres pescadoras tenham sido minoria (n=14), não significa que não é atuante na atividade. Durante o período de campo foi observado que a família dos pescadores, em especial as esposas, atuam na pesca com outros papéis: desembarque, beneficiamento do pescado (filetar, salgar e secar) e as vezes na comercialização do pescado no mercado local, cumulando com as atividades domésticas. Esta realidade se reproduz em países como Índia, África, Chile, Argentina, Peru, França, Canadá e Uruguai (MANESCHY, SIQUEIRA; ÁLVARES, 2012).

14A maioria das mulheres ocupam postos informais e não são remuneradas pelas atividades que desempenham na pesca, embora contribuam com a renda familiar. As mulheres pescadoras desta pesquisa, são aquelas que embarcam com seus maridos (57%) como parte da tripulação ou sozinha com uma tripulação contratada (36%). Das mulheres embarcadas 57% são donas da própria embarcação. Isto significa que homens e mulheres interagem com o recurso e que o papel da mulher dentro da pesca deve ser revisto, já que participam da atividade produtiva, independentemente de estarem embarcadas, e por isso devem ser reconhecidas na divisão do trabalho.

15Dos entrevistados 50% tem 2 filhos. Os demais: 21% não possui filhos e 29% tem de 3 a 5 filhos. A maioria (79%) não deseja que seus filhos sigam a profissão (Gráfico 1). Para o futuro dos filhos almejam o estudo (25%), pois assim terão uma oportunidade de vida melhor, com emprego fixo e mais conforto.

Gráfico 1 – Porcentagem das motivações dos pescadores artesanais de Oiapoque quanto a vontade de que seus filhos sigam a profissão de pescador.

Gráfico 1 – Porcentagem das motivações dos pescadores artesanais de Oiapoque quanto a vontade de que seus filhos sigam a profissão de pescador.

Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

  • 3 O estudo de Cavalcante (2011) considerou amostra de 36 pescadores (n=256).

16O tempo de trabalho (Gráfico 2) na pesca dos entrevistados variou de 1 a 60 anos. O maior tempo de exercício na pesca foi para a classe com até 25 anos (77%) na profissão, refletindo a experiência do pescador e a estabilidade na profissão. De acordo com Cardoso (2005) no município de Barcelos, no rio Negro, o tempo médio na profissão é de 20,9 anos, diferenciando-se e demostrando que existe variação na média de tempo na pesca nas regiões da Amazônia. A classe etária há uma proporção entre os grupos de 31 a 40 anos (28%) e 41 a 50 anos (30%), semelhante ao estudo de Cavalcante3 (2011). A classe etária de menor representatividade é a de 25 anos (7%), apontando uma dificuldade da pesca em arregimentar jovens para a profissão. A idade avançada é comum na pesca de pequena escala, mesmo em países desenvolvidos como o Japão (TZANATOS et al., 2006), onde poucos jovens se interessam pela pesca (Gráfico 2).

Gráfico 2 - Porcentagem por idade e tempo de trabalho na pesca dos pescadores artesanais do município de Oiapoque.

Gráfico 2 - Porcentagem por idade e tempo de trabalho na pesca dos pescadores artesanais do município de Oiapoque.

Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

17A escolaridade dos pescadores (Gráfico 3) é baixa, 88%, considerando: fundamental incompleto, fundamental completo e sem instrução. Revelando uma dificuldade do grupo para se encaixar no mercado de trabalho. O baixo grau de instrução na pesca é uma realidade comum (BHUYAN et al., 2016; PEIXER E PETRERE JR., 2009) no âmbito local, regional e global. Esporadicamente a Marinha do Brasil ministra curso em Oiapoque para condutor de embarcação.

Gráfico 3 - Porcentagem do nível de instrução dos pescadores artesanais do município de Oiapoque.

Gráfico 3 - Porcentagem do nível de instrução dos pescadores artesanais do município de Oiapoque.

Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

18No Amapá existem dois cursos direcionados a pesca, um na capital Macapá (Engenharia de pesca da Universidade Estadual do Amapá); e outro no município de Santana, município vizinho a capital do Estado (técnico de pesca e Aquicultura). Durante a pesquisa somente uma pessoa declarou frequentar uma dessas instituições. Isto devido à dificuldade de deslocamento de Oiapoque a Macapá, que se dá por estrada parte asfaltada e não asfaltada (figura 4), cujas viagens no verão (de junho a novembro) demoram de 6 a 10 horas e no período de chuvas (de dezembro a maio) podem chegar a até dois dias.

Figura 4 – Fotos no período chuvoso, localizados no trecho da rodovia (BR-156) que liga a capital Macapá ao município de Oiapoque, estado do Amapá, Brasil, fevereiro de 2017.

Figura 4 – Fotos no período chuvoso, localizados no trecho da rodovia (BR-156) que liga a capital Macapá ao município de Oiapoque, estado do Amapá, Brasil, fevereiro de 2017.

Fonte: A: Pacheco (06/03/2017), B: Santiago (06/06/2014); C e D: Alves (11/03/2017a).

19Conjuntamente investigou-se o aspecto migratório dos pescadores, que relataram ser algo comum dentro da pesca, que embora tradicional é dinâmica, se referindo a adaptabilidade da atividade em diferentes contextos. Reconhecendo que o sistema de pesca de pequena escala está envolvido em processos de grande escala muito além do local.

20A migração na comunidade pesqueira de Oiapoque é alta, 81% (144) dos pescadores migrou. Desse grupo 43% (Gráfico 4) migrou mais de uma vez e 36% migrou uma única vez. Estas migrações deram-se no âmbito municipal, estadual, interestadual e internacional. Com migrações temporárias ou de longo prazo, em distâncias curtas ou longas. Constatou-se que é um movimento que se reproduz por várias gerações.

Gráfico 4 - Porcentagem do número de vezes que os pescadores artesanais do município de Oiapoque migraram.

Gráfico 4 - Porcentagem do número de vezes que os pescadores artesanais do município de Oiapoque migraram.

Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

21Questiona-se os motivos que o provocam a migração, são eles: pressão demográfica, dificuldade de acesso à terra, dificuldade em se equipar e comercializar produtos de pesca, a deterioração das condições econômicas no lugar de origem (DURAND; LEMOALLE; WEBER, 1989), dificuldade em se incluir no mercado de trabalho, em busca de qualidade de vida, baixa renda, falta de oportunidade para os filhos, conflitos (WEIGEL, 1985), questões ambientais, quanto a exploração excessiva do recursos pesqueiro (FAO, 2016), competição com frotas comerciais ou estratégia de pesca (TIETZE, 2016), a variabilidade geográfica e temporal do pescado (CURY; ROY, 1987). Sobre isto, os entrevistados declararam migrar a procura de pescado (64%), pois nos seus locais de origem o pescado já estava difícil. E 33% migraram quando crianças acompanhando os pais pescadores; ou já adultos para vir trabalhar com os pais; ou acompanhando os patrões nas embarcações e em busca de uma condição financeira melhor. E 3% não respondeu.

22Caracterizando essa migração dentro da comunidade de pesca de Oiapoque identificou-se a origem dos pescadores. Entre os migrantes 97% são da região Norte, distribuídos: 53,1% do Pará; 40,1% do Amapá; 4,5% do Maranhão e 1,7% do Ceará e Piauí. Identificou-se migração internacional proveniente de São Jorge (0,6%), município pertencente a Guiana Francesa.

  • 4 O termo pescador nômade foi introduzido por Durand, Lemoalle e Weber (1989).

23A partir da identificação da origem desse grupo de pescadores espacializou-se a migração em direção a Oiapoque, permitindo a validação da frequência deste evento na pesca. Observou-se migrações diretas (figura 5), aquelas que o pescador migrou uma única vez; e a do pescador “nômade4” (figura 6), aqueles que migraram várias vezes até que se fixaram, neste caso em Oiapoque, local em que encontraram condições pesqueiras para a sobrevivência.

Figura 5 – Mapa das migrações diretas (migrou uma vez) dos pescadores artesanais do município de Oiapoque.

Figura 5 – Mapa das migrações diretas (migrou uma vez) dos pescadores artesanais do município de Oiapoque.
  • 5 Disponível: < https://goo.gl/upmZzp>.

Fonte: IBGE5 (2014); BRGM (2003); Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

24Com a espacialização dos pescadores “nômades” (figura 6) além de verificarmos o ‘caminhar’ desse pescador por diversas cidades até sua chegada a Oiapoque, identificamos a abrangência das regiões, que se diferenciam das migrações diretas que ocorrem predominantemente na região norte.

Figura 6 – Mapa das migrações dos pescadores nômades (migraram várias vezes) da pesca artesanal do município de Oiapoque.

Figura 6 – Mapa das migrações dos pescadores nômades (migraram várias vezes) da pesca artesanal do município de Oiapoque.

Fonte: IBGE (2014); BRGM (2003); Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

25A partir dos locais de migração desse pescador espacializou-se a densidade e a média por ano de migração por lugar. Com isso examinou-se o tempo médio em que as migrações iniciaram em direção a Oiapoque. Sete anos foram identificados (Figura 7), destes os mais acentuados foram: as migrações do Pará, em 1973, com média em 1995; as migrações dentro do Amapá com média em 1991; e o Maranhão também em 1999. Isso leva a conjectura que estes são os anos em que se iniciou a dificuldade em capturar o pescado nesses lugares. Silva et al. (2016) relata, ainda que não aprofundado, a presença de embarcações pesqueiras do Pará na costa do Amapá. Nogueira e Chagas (2011) estimam essa presença paraense na costa amapaense em 2800 embarcações e estima-se que mais de 54 mil toneladas de peixe deixaram o Amapá em 2013.

Figura 7 – Mapa da densidade de pescadores migrantes da pesca artesanal do município de Oiapoque.

Figura 7 – Mapa da densidade de pescadores migrantes da pesca artesanal do município de Oiapoque.

Fonte: IBGE (2014); BRGM (2003); Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

26Outra característica comprovada é a tradição herdada dos mais velhos, por intermédio de mitos e símbolos. Referindo-se ao repasse de conhecimento de pais para filhos, onde aprendem a profissão com algum familiar, normalmente o pai, e assim mantêm viva a tradição. Em Oiapoque 74% declarou ter aprendido a pescar com algum parente, sendo: pai (50%), tios (9%), irmão (5%), marido (4%), avô (3%), primo (1%), cunhado (1%), padrasto (1%) e sogro (1%). Retratando a forte participação familiar na atividade. O aprendizado com outros pescadores representou 20%. E 6% não respondeu.

27O aprendizado do pescador com um familiar integra a ida ao mar, a elaboração e uso de instrumentos de pesca, conhecimento das espécies e das zonas de pesca. No caso de Oiapoque 68 % aprendeu com a família a pescar, além de confeccionar, usar e consertar redes. Fortalecendo a tradição e apresentando uma atividade complementar (confecção e manutenção de redes) a renda deste pescador.

  • 6 O Bolsa Família é um programa de combate à pobreza e à desigualdade no Brasil. Previsto pela Lei Fe (...)

28Dos entrevistados 100% declararam que vivem da pesca, sendo a principal ou única fonte de renda para alguns. A renda do pescador é acrescida por outras fontes: programas de assistência financeira (seguro defeso - 88,3% e bolsa família6 - 11,7%) e outros trabalhos, exercidos em paralelo a pesca ou integralmente durante o período de defeso.

  • 7 O seguro defeso foi estabelecido pela Lei no 10.779/2003, para a concessão do benefício de seguro d (...)

29O seguro defeso7 criado em 1992 funciona como uma assistência financeira no período em que o pescador é proibido de pescar, ficando sem o seu sustento. É uma forma de preservar espécies do ecossistema brasileiro durante o período de reprodução (período de defeso) dos peixes e contribuir para a sustentabilidade do uso dos estoques pesqueiros.

30O período de defeso para a maior parte do Brasil vai de 01/11 a 28/02 do ano seguinte. Entretanto, há variações devido as regiões e as espécies. No Amapá o período vai de 15/11 a 15/03 do ano seguinte (Portaria IBAMA nº 48/2007). O valor do seguro corresponde a um salário mínimo (SM) vigente, no caso R$ 937,00 reais (US$ 285,62 dólares). É uma renda temporária para o pescador.

31Durante o seguro defeso 50,3% dos entrevistados declarou continuar pescando e justificaram esta ação alegando que: desconhecem a lei do defeso; conhecem mais não recebem, logo não se sentem obrigados a preservar o período; conhecem a lei e recebem o seguro, porém acham o valor muito baixo para garantir seu sustento; que pescam somente para a subsistência, pois não guardam economias do período que podem pescar sem restrição. Esse comportamento foi relatado por Andrade e Midré (2011) quando investigou a degradação do recurso pesqueiro pela alta intensidade de pesca na Guatemala. Situação semelhante ocorreu na região do Pacífico Báltico, com o Bacalhau explorado mesmo no período da proibição (ALMQVIST, 2017).

32Além de continuar a pescar, eles desempenham outras atividades que na sua maioria são ofícios que aprenderam com os pais ou trabalhando como ajudantes, sem uma formação profissional formal e representam 59,9% dos pescadores. As profissões desempenhadas concomitantes com a pesca, durante o defeso ocorrem de forma integral. Além da profissão de pescador possuem uma, duas ou três ofícios que desempenham à medida que surge a oportunidade de trabalho. Esta realidade também é observada no Nordeste da Nigéria, onde menos de 5% dos pescadores tem a pesca como sua única fonte de renda (NEILAND et al., 2000).

33As profissões são diversas, e não possuem função definida, são profissões operacionais. Profissões que refletem a apropriação por processos de experiência profissional. As profissões identificadas foram organizadas em grupos: diversas e voltadas à pesca (Tabela 1).

Tabela 1 - Atividades remuneradas desempenhadas pelos pescadores artesanais de Oiapoque.

Tabela 1 - Atividades remuneradas desempenhadas pelos pescadores artesanais de Oiapoque.

Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

34Para entender os ganhos financeiros do pescador é importante compreender a organização de trabalho na pesca. Referindo-se as funções desempenhadas dentro da embarcação, pois é a partir dela que se compreende a renda e o funcionamento da pesca. A organização do trabalho na pesca funciona como uma forma de organização social. Desta forma identificou-se cinco funções: comandante, encarregado, proeiro, gelador e cozinheiro (Tabela 2). Essas funções se reproduzem em outras partes da Amazônia, por vezes com maior número de funções (FARIA JR.; BATISTA, 2006).

Tabela 2 – Funções desenvolvidas pelos pescadores artesanais de Oiapoque.

Tabela 2 – Funções desenvolvidas pelos pescadores artesanais de Oiapoque.

Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

35A maioria dos pescadores de Oiapoque desempenham as cinco funções: comandante, encarregado, proeiro, gelador e cozinheiro. Esta característica é importante na hora de conseguir o emprego, pois como a tripulação de uma embarcação não é fixa, significa que a cada ida ao mar uma nova tripulação é formada implicando em mudanças de embarcação e de função. O que vai dizer a função que vai ocupar é a disponibilidade do momento. Isto não acontece com dono de embarcação, pois quando ele contrata tripulação, ele mantém a mesma função para si, além do que, ele acumula funções. Dos pescadores somente os geladores mantém a função. Embora exista funções distintas no momento de puxar a rede com o pescado todos os tripulantes da embarcação ajudam. Normalmente a embarcação conta com quatro tripulantes, o que significa que eles cumulam função, variando de acordo com o tamanho da embarcação.

36Conforme a função do pescador é o pagamento. Ele é feito de duas formas em dinheiro ou em pescado. Assim, de acordo com os valores declarados nas entrevistas, calculou-se um intervalo de ganho por função (Tabela 3).

Tabela 3 – Faixas de renda (R$) por viagem dos pescadores artesanais de Oiapoque.

Tabela 3 – Faixas de renda (R$) por viagem dos pescadores artesanais de Oiapoque.

* Os valores mudam dependendo de que função o proprietário ocupa, quando o mesmo acompanha a embarcação.

Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

37Os pescadores não possuem uma renda fixa, varia de acordo com: a quantidade de viagens, da captura de pescado, do porte da embarcação, do número de tripulantes, da função ocupada e do mercado quanto a comercialização. De fato, eles têm uma participação no ganho com a pesca, mas para isso, por vezes, se sujeitam a trabalhar sem remuneração visando o ganho futuro. E assim vão acumulando dívidas que ficam para serem pagas na próxima viagem.

38O número de tripulantes em uma embarcação pode ser reduzido a apenas dois, quando o proprietário acumula funções (piloto, encarregado e cozinheiro). Nesta situação, “este agente múltiplo executa uma atividade que lhe permite maximizar os rendimentos derivados do setor e monopolizar o mercado” (FARIA JR.; BATISTA, 2006, p. 135). Nessa forma social de organização do trabalho é importante esclarecer que a presença familiar é muito forte, as vezes três gerações acompanham uma viagem. Dos pescadores entrevistados 57,6% declarou ter membros da família participando da pesca. Seguindo a lógica do agente múltiplo, quanto mais funções forem desempenhadas por familiares maior será seus rendimentos. Realidade também observada na baía de Guaratuba no Paraná, onde 60 % dos pescadores tem a participação familiar na atividade (CHAVES; PICHLER; ROBERT, 2002).

39Quando observamos a renda do pescador por período de atividade no mar e por período de defeso (Gráfico 5) nota-se que das cinco funções somente três delas ganham acima de dois salários mínimos: o comandante (28,8%) e o gelador (9%); o encarregado (31%) ganha acima de 4 salários mínimos. Já o proeiro (39%) e o cozinheiro (4%), a princípio, ganham menos que um salário mínimo. Enquanto que no período do defeso, o proeiro e o cozinheiro relativamente melhoram a renda para um salário mínimo, as demais funções pioram o seu ganho de 4 ou 2 salários mínimos cai para 1.

Gráfico 5 – Comparação da renda dos pescadores entre o período de atividade pesqueira e o período de defeso dos pescadores artesanais de Oiapoque.

Gráfico 5 – Comparação da renda dos pescadores entre o período de atividade pesqueira e o período de defeso dos pescadores artesanais de Oiapoque.

Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).

40Mas de fato o que ocorre no defeso em relação ao ganho bruto desse pescador é que a renda dele só cai. Pois deve-se considerar que em Oiapoque a média de viagens ao mês é 2. Logo essa faixa de valores de ganho pode ser dobrada, considerando que os valores se tratam de uma média. Então, mesmo as categorias com menor rendimento (proeiro e cozinheiro) acabam recebendo no período efetivo de pesca um pouco mais que um salário mínimo. No defeso 49,7% dos pescadores de Oiapoque param de pescar.

Considerações finais

41A pesca artesanal em Oiapoque é caracterizada pela presença da mulher nas pescarias, seja formalmente nas embarcações ou informalmente nas contribuições com o beneficiamento do pescado. Logo, deve ser revisto a questão da mulher na pesca no sentido de formalizá-la na profissão, inclusive dando a ela o direito de contar tempo de serviço para aposentadoria e a receber o seguro defeso.

42A baixa escolaridade dos pescadores requer atenção, no sentido de elevar a instrução para facilitar ao pescador conhecer a legislação, lutar pelos seus direitos e aproximar-se do poder público no sentido de buscar desenvolvimento para o setor.

43A percepção dos pescadores de Oiapoque é que a pesca é uma atividade árdua, quase que sem futuro, em razão da competição pelo recurso que está aumentando, principalmente com a migração crescendo em direção a região. Isto é comprovado quando a maioria dos pescadores almeja que seus filhos não sigam a profissão da pesca. A migração dos pescadores para Oiapoque é forte, principalmente do Pará, e tem se ampliado. É importante ser analisada pois abre espaço para a presença ou ampliação de conflitos dentro do grupo pesqueiro, além de comprometer a sustentabilidade dos recursos haliêuticos.

44Em Oiapoque a pesca é uma atividade familiar, assim como em outras regiões da Amazônia, da qual todos que participaram dependem integralmente dela. Sendo importante tanto para o pescador e sua família quanto para o comércio local que se beneficia dessa renda.

45A existência de atividades econômicas paralelas é expressiva para a complementação da renda. O auxílio financeiro do programa bolsa família não foi considerado expressivo. Diferente do seguro defeso, o qual a maioria recebe. Mas, observa-se que o período do seguro defeso para os pescadores é um período de fragilidade financeira, mas que revela a preocupação do pescador com o meio ambiente, principalmente dos pescadores que param de pescar durante o defeso. Atribui-se a preocupação com a sustentabilidade do recurso pesqueiro é atribuída a tradição que o pescador possui. Tradição obtida a partir da apropriação social desse espaço que é simultaneamente um ato cultural e também produtivo.

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Bibliographie

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Notes

1 Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Estado do Amapá.

2 O MPA criado pela Lei 11.958/2009, para formular a política de desenvolvimento da pesca e aquicultura. Extinto pela Lei nº 13.266/2016. Recriado pela Lei n.º 13.502/17.

3 O estudo de Cavalcante (2011) considerou amostra de 36 pescadores (n=256).

4 O termo pescador nômade foi introduzido por Durand, Lemoalle e Weber (1989).

5 Disponível: < https://goo.gl/upmZzp>.

6 O Bolsa Família é um programa de combate à pobreza e à desigualdade no Brasil. Previsto pela Lei Federal nº 10.836/2004.

7 O seguro defeso foi estabelecido pela Lei no 10.779/2003, para a concessão do benefício de seguro desemprego.

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Table des illustrations

Titre Figura 1 - Mapa de localização do município de Oiapoque.
Crédits Fonte: SEMA1 (2003). Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-1.png
Fichier image/png, 780k
Titre Figura 2 – Mapa com a localização da Vila do Taperebá e a migração para o município de Oiapoque.
Crédits Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-2.jpg
Fichier image/jpeg, 272k
Titre Figura 3 – Área urbana do município de Oiapoque com a localização das áreas de concentração dos pescadores.
Crédits Fonte: SEMA (2003). Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-3.jpg
Fichier image/jpeg, 352k
Titre Gráfico 1 – Porcentagem das motivações dos pescadores artesanais de Oiapoque quanto a vontade de que seus filhos sigam a profissão de pescador.
Crédits Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-4.png
Fichier image/png, 49k
Titre Gráfico 2 - Porcentagem por idade e tempo de trabalho na pesca dos pescadores artesanais do município de Oiapoque.
Crédits Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-5.png
Fichier image/png, 18k
Titre Gráfico 3 - Porcentagem do nível de instrução dos pescadores artesanais do município de Oiapoque.
Crédits Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-6.png
Fichier image/png, 37k
Titre Figura 4 – Fotos no período chuvoso, localizados no trecho da rodovia (BR-156) que liga a capital Macapá ao município de Oiapoque, estado do Amapá, Brasil, fevereiro de 2017.
Crédits Fonte: A: Pacheco (06/03/2017), B: Santiago (06/06/2014); C e D: Alves (11/03/2017a).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-7.png
Fichier image/png, 556k
Titre Gráfico 4 - Porcentagem do número de vezes que os pescadores artesanais do município de Oiapoque migraram.
Crédits Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-8.png
Fichier image/png, 16k
Titre Figura 5 – Mapa das migrações diretas (migrou uma vez) dos pescadores artesanais do município de Oiapoque.
Crédits Fonte: IBGE5 (2014); BRGM (2003); Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
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Titre Figura 6 – Mapa das migrações dos pescadores nômades (migraram várias vezes) da pesca artesanal do município de Oiapoque.
Crédits Fonte: IBGE (2014); BRGM (2003); Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-10.jpg
Fichier image/jpeg, 240k
Titre Figura 7 – Mapa da densidade de pescadores migrantes da pesca artesanal do município de Oiapoque.
Crédits Fonte: IBGE (2014); BRGM (2003); Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-11.jpg
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Titre Tabela 1 - Atividades remuneradas desempenhadas pelos pescadores artesanais de Oiapoque.
Crédits Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-12.png
Fichier image/png, 32k
Titre Tabela 2 – Funções desenvolvidas pelos pescadores artesanais de Oiapoque.
Crédits Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-13.png
Fichier image/png, 63k
Titre Tabela 3 – Faixas de renda (R$) por viagem dos pescadores artesanais de Oiapoque.
Légende * Os valores mudam dependendo de que função o proprietário ocupa, quando o mesmo acompanha a embarcação.
Crédits Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-14.png
Fichier image/png, 20k
Titre Gráfico 5 – Comparação da renda dos pescadores entre o período de atividade pesqueira e o período de defeso dos pescadores artesanais de Oiapoque.
Crédits Fonte: Dados de campo, 2013-2014. Elaboração Viviane Amanajás (2017).
URL http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/docannexe/image/15619/img-15.png
Fichier image/png, 35k
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Pour citer cet article

Référence électronique

Viviane V. de V. Amanajás, « Pesca e perfil socioeconômico dos pescadores artesanais da fronteira setentrional do Brasil: a comunidade pesqueira de Oiapoque, Amapá »Confins [En ligne], 37 | 2018, mis en ligne le 04 octobre 2018, consulté le 07 décembre 2024. URL : http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/15619 ; DOI : https://0-doi-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/10.4000/confins.15619

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Auteur

Viviane V. de V. Amanajás

Doutoranda em geografia de Le Mans Université e Universidade Federal do Ceará, vivi_amanajas@yahoo.com.br

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Droits d’auteur

CC-BY-NC-SA-4.0

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