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Dossiê Cartografias ambientais do Rio Grande do Norte

Os recursos hídricos do Rio Grande do Norte: uma análise da vulnerabilidade territorial ao colapso no abastecimento de água

Les ressources hydriques du rio Rio Grande do Norte: une analyse de la vulnérabilité territoriale à une crise de l’approvisionnement en eau.
The hydric resources of Rio Grande do Norte: an analysis of territorial vulnerability to collapsing in water supply
Adriano Lima Trolei et Bruno Lopes da Silva

Résumés

Cet article propose une discussion expliquant comment la structure des ressources hydriques actuelles, représentées par ses éléments naturels et techniques, a caractérisé le processus d’approvisionnement humain face à la sécheresse vécue durant les dernières années ainsi que la vulnérabilité consécutive à un stress hydrique au Rio Grande do Norte. À partir de ce scénario et de plusieurs éléments naturels et techniques présents dans chaque municipalité, des faiblesses hydriques potentielles ont été identifiées avec les variables suivantes : précipitation, bassin versant, système aquifère, réseau d’adducteurs, niveaux des réservoirs, utilisations des camions-citernes et situation de l’approvisionnement.  La contribution théorique conceptuelle a été construite à partir de trois axes thématiques : la structure des ressources hydriques, les potentialités et les faiblesses ainsi que les vulnérabilités à un stress hydrique. La partie empirique a été faite, entre 2015 et 2017, à travers l’élaboration d’une banque de données basée sur les éléments naturels et théoriques des ressources hydriques du Rio Grande do Norte. Ces données ont été obtenues auprès des organismes publics suivants : Institut du développement durable et de l’environnement (IDEMA), Agence nationale des eaux (ANA), Secrétariat de l’environnement et des ressources hydriques du Rio Grande do Norte (SEMARH), Département national des œuvres contre la sécheresse (DNOCS), et Compagnie des eaux et des égouts du Rio Grande do Norte (CAERN). Avec l'objectif d’estimer la vulnérabilité au stress hydrique de chaque municipalité du Rio Grande do Norte la méthodologie utilisée est celle proposée par CrepaniMedeiros, Hernandez Filho et al (2001), intégrant les variables et les catégories de vulnérabilités puis les classifiant à partir de l’Unité Territoriales de Base (UTB) en trois niveaux : Unités de basse, moyenne et grande vulnérabilité à un stress hydrique. Au Rio Grande do Norte, le résultat de l'analyse intégré des variables, c'est caractérisé par deux seuls niveaux : 20 municipalités situées dans les régions du littoral est et du centre-nord ont présenté un niveau moyen de vulnérabilité tandis que 147 municipalités ont présenté un niveau de grande vulnérabilité à un stress hydrique. Ce résultat démontre que le Rio Grande do Norte comporte un niveau élevé et critique a un stress hydrique. Par rapport à ce contexte, il est suggéré aux gestionnaires de penser au territoire d’une forme intégrée et systémique, considérant l’interrelation des éléments naturels et techniques de chaque système d'approvisionnement d’eau.

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Texte intégral

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Crédits : Hervé Théry 2015

1A relação entre estrutura hídrica e seus elementos naturais e técnicos com vistas à melhoria tanto do funcionamento de sistemas de abastecimento de água quanto de processos de irrigação ocorre há vários séculos. No tocante à realidade atual, essa relação tem se mostrado cada vez mais presente, principalmente em regiões semiáridas como o Nordeste Brasileiro. Apesar do avanço da técnica, a disponibilidade hídrica dessa região depende basicamente da regularidade das chuvas, que, em períodos de seca prolongada, se mostra perversa sob o ponto de vista de atender as necessidades básicas da população.

2Um dos estados que mais tem sido afetado pela seca é o Rio Grande do Norte (RN), o que pode ser constatado ao identificar os baixos volumes de água existentes nos seus principais açudes e barragens. Nesse artigo, busca-se analisar como a estrutura dos recursos hídricos associada aos elementos naturais e técnicos existentes tem caracterizado o processo de abastecimento humano frente à seca dos últimos anos e a consequente vulnerabilidade de colapso hídrico entre 2015 e 2017.

3O aporte teórico conceitual foi construído a partir de três eixos temáticos: a estrutura dos recursos hídricos, as potencialidades e fragilidades e a vulnerabilidade ao colapso hídrico. A construção empírica ocorreu através da elaboração de um banco de dados de 2015 a 2017 sobre os elementos naturais e técnicos dos recursos hídricos do Rio Grande do Norte. Esses dados foram obtidos junto aos seguintes órgãos públicos: Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente – IDEMA, Agência Nacional de Águas – ANA, Secretaria de Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte – SEMARH, Departamento Nacional de Obras Contra a Seca- DNOCS e Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte – CAERN.

4Com o objetivo de estimar a vulnerabilidade ao colapso hídrico de cada município utilizou-se a metodologia proposta por Crepani, Medeiros, Hernandez Filho et al (2001), que integra variáveis e categorias de vulnerabilidade e as classifica a partir de Unidade Territoriais Básicas (UTB) em três níveis: Unidades de baixa, média e alta vulnerabilidade ao colapso hídrico.

5A estrutura dissertativa dessa discussão pauta-se em três seções temáticas: a primeira aborda os recursos naturais hídricos e sua estrutura, a segunda apresenta potencialidades e fragilidades hídricas e a terceira trata da vulnerabilidade ao colapso hídrico de cada município.

A estrutura dos recursos hídricos no Rio Grande do Norte

6O RN, assim como outras unidades federativas da região Nordeste, apresenta algumas especificidades climáticas que influenciam diretamente na dinâmica dos recursos hídricos. Uma dessas peculiaridades diz respeito às variações da precipitação pluviométrica ao longo das diferentes regiões do estado, caracterizando a existência de quadros climáticos extremos, sobretudo no que concerne ao binômio seca - baixa pluviosidade - e chuva - alta pluviosidade (Travassos, Souza & Silva, 2013).

7Uma das formas de se identificar esses quadros extremos de precipitação é através da utilização de isoietas, tal como foi proposto pela ANA (2016), expressa na figura 1:

Figura 1: Isoietas de precipitação média do Rio Grande do Norte (de 1977 a 2006)

Figura 1: Isoietas de precipitação média do Rio Grande do Norte (de 1977 a 2006)

Fonte: Agência Nacional de Águas (ANA, 2016).

8De acordo com a figura 1, percebe-se a existência, na escala regional, de três subdivisões pluviométricas. Na região litorânea leste do estado, há o predomínio de áreas de maior índice pluviométrico que variam entre 1200 e 1600 mm. Uma pequena parte dessa região também apresenta índices que variam de 800 a 1200 mm. Tal região, juntamente com o extremo oeste do estado, é a que apresenta os maiores valores pluviométricos. Já nas áreas central e oeste do RN, o índice médio pluviométrico varia entre 400 e 800 mm, representando 75% do seu território.

9Destaca-se que o índice pluviométrico é um dos elementos fundamentais para se definir uma zona climática. Partindo dessa perspectiva, o IDEMA (2015), identificou no território do estado cinco tipos de climas, sendo eles: de natureza úmida (Úmido; Subúmido; Semiúmido), e de natureza árida (Semiárido; e Semiárido Rigoroso), o que reflete sua dualidade pluviométrica (seco-chuvoso). O que diferencia os climas úmidos dos climas áridos é o excedente de água nas suas respectivas regiões de atuação, uma vez que nas áreas de predominância de umidade, mais precisamente no litoral leste e no extremo oeste do estado (que correspondem a 25% do território do RN), há um excedente de água que varia de 150 a 1000 mm. Por outro lado, os outros 75%, os quais englobam a parte central, parte da região oeste e o litoral setentrional, apresentam características áridas e semiáridas. Trata-se de áreas que apresentam um excedente inferior a 40 mm de água, que dura no máximo dois meses, no primeiro semestre do ano (IDEMA, 2015).

10Essa variabilidade das condições climáticas no RN interfere na disponibilidade hídrica do estado como um todo, seja das fontes superficiais e/ou subterrâneas. Entende-se como disponibilidade hídrica “uma vazão de alta garantia no tempo, ou seja, uma vazão que estará acessível na grande maioria do tempo, mesmo em períodos secos” (ANA, 2016, p. 23).

11No caso das fontes subterrâneas de água, a sua recarga tem como elemento estruturante a regularidade do regime de precipitação. No RN há um total de cinco sistemas de aquíferos (figura 2) e cada um possui características específicas quanto à disponibilidade hídrica.

Figura 2: Sistemas de aquíferos do Rio Grande do Norte

Figura 2: Sistemas de aquíferos do Rio Grande do Norte

Fonte: Agência Nacional de Águas (ANA, 2016).

12De acordo com a figura 2, existem os aquíferos Açu, Barreiras, Aluvião, Jandaíra, e Cristalino. Em relação ao aquífero Açu, a sua constituição é predominantemente arenosa, apresentando arenitos grossos, médios, e finos. Esse aquífero proporciona uma descarga total da ordem de 45,9 x 106 m³/ano, a qual pode ser mantida nesse mesmo nível ao longo de 20 anos de exploração, podendo até produzir vazões da ordem de 400 m³/hora. (Vasconcelos, 2006).

13O aquífero Barreiras, por sua vez, “apresenta-se, sob o ponto de vista litológico, bastante heterogêneo, envolvendo desde arenitos pouco argilosos a conglomeráticos, até argilas” (Lucena, Rosa Filho & Bittencourt, 2004, p. 21). Segundo os autores suas vazões explotáveis podem chegar a valores que variam de 5 a 100 m³/hora. Porém, considerando o seu elevado ritmo de exploração, aliado a irregularidade pluviométrica, estima-se que por volta do ano de 2025 já apresentaria sinais de esgotamento, o que exigiria a prospecção em outros aquíferos (Costa, 2000).

14Já o aquífero Aluvião é uma fonte de água subterrânea e ocorre em faixas de largura entre 50 e 400 m ao longo do leito de rios. Sua recarga se dá de duas formas: através das precipitações e por meio do próprio fluxo superficial dos rios nos períodos de cheias. Poços tubulares nessa área podem produzir vazões de até 12 m³/hora (Vasconcelos, 2006).

15O aquífero Jandaíra, constituído por calcários cinzas e cremes, margas, siltitos, folhelhos, argilitos e dolomitos, é importante por sua disponibilidade hídrica (Vasconcelos, 2006). Apresenta vazões que variam de 10 a 100 m³/hora, sendo que os maiores valores se concentram nas áreas mais próximas da faixa litorânea setentrional (Melo, 2006).

16Já o aquífero Cristalino ocupa a maior extensão territorial do estado, tendo sua composição geológica relacionada às rochas do embasamento cristalino. Funcionalmente esse aquífero é limitado tanto em quantidade, pois suas vazões variam de 2 a 16 m³/hora, quanto em qualidade, uma vez que a água captada apresenta elevado teor de salinidade (Vasconcelos, 2006). Essa característica dificulta o uso para abastecimento humano, uma vez que para o processo de dessalinização é necessário o investimento em equipamentos específicos, elevando o custo da mesma e o volume dessalinizado é limitado por cada equipamento.

17Segundo Melo (2006), esses cinco sistemas de aquíferos são utilizados principalmente para o abastecimento humano e para a prática da irrigação de culturas agrícolas. É nesses afloramentos que as bacias hidrográficas recebem recargas de águas subterrâneas, o que tende a influenciar no regime pluvial ao longo do tempo.

18Assim, torna-se necessário contextualizar o território do RN do ponto de vista hidrográfico, identificando as diferentes bacias existentes, tal como mostra a figura 3.

Figura 3: Bacias hidrográficas do Rio Grande do Norte

Figura 3: Bacias hidrográficas do Rio Grande do Norte

Fonte: Secretaria de Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte (SEMARH, 2017).

19A figura 3 apresenta 14 áreas drenadas por rios principais e seus afluentes, chamadas bacias hidrográficas. Além dessas, possui outra categoria de drenagem que são as faixas litorâneas de escoamento difuso, caracterizadas como filetes de água que afloram na zona costeira e escoam em direção ao Oceano Atlântico (SEMARH, 2017).

20Com relação às bacias hidrográficas, percebe-se que apresentam magnitudes espaciais diferenciadas. Dentre as de maior abrangência territorial de área drenada, duas se destacam no contexto do estado: a bacia do rio Apodi/Mossoró e a bacia do rio Piranhas/Açu. Vale lembrar que elas drenam principalmente as áreas localizadas nas regiões Oeste e Central do RN, respectivamente, sendo de extrema relevância para as populações que habitam essas regiões. Além disso, desaguam no Oceano Atlântico, no litoral norte do estado, sendo caracterizadas de natureza exorreica, uma vez que suas águas são direcionadas para fora do continente (França, 2015).

21As outras bacias de menor extensão territorial de área drenada deságuam no litoral Leste do estado, tais como as bacias do rio Boqueirão, rio Punau, rio Maxaranguape, rio Ceará-Mirim, rio Doce, rio Potengi, rio Pirangi, rio Tairi, rio Jacu, rio Catu, rio Curimatau e rio Guajú. Dentre essas áreas de drenagem fluvial, destaca-se a principal bacia da capital do RN, chamada de Potengi, que percorre vários territórios antes de desaguar na cidade de Natal, servindo como mecanismo de comunicação e uso fluvial com o Oceano Atlântico.

22Já as 08 faixas de escoamento difuso encontram-se localizadas nas regiões litorâneas Norte e Leste e também direcionam suas águas para o Oceano Atlântico. As faixas de escoamento difuso não apresentam áreas de drenagem delimitadas por divisores de água e cursos hidrológicos morfologicamente definidos por meio de vales, montantes e jusantes, porém são de elevada relevância para o abastecimento humano (SEMARH, 2017).

23 Essa estrutura caracterizada por bacias hidrográficas e escoamentos superficiais permite um fluxo de água que retroalimenta os sistemas de abastecimento do estado. Uma das estratégias técnicas utilizadas para promover a reservação dessas águas em pontos específicos do território estadual foi a construção de açudes e barragens (Soares, 2013), identificados na figura 4.

Figura 4: Principais reservatórios do Rio Grande do Norte

Figura 4: Principais reservatórios do Rio Grande do Norte

Fonte: Secretaria de Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte (SEMARH, 2015).

24Dos diversos reservatórios do tipo açudes ou barragens existentes no RN, foram selecionados os 12 principais, que apresentam maior capacidade de reservação de água. Como mostra a figura 4, esses reservatórios são os seguintes: açude Gargalheiras (Acari); açude Inharé (Santa Cruz); açude Itans (Caicó); açude Mendubim (Açu); açude Pataxó (Ipanguaçu); açude Pau dos Ferros (Pau dos Ferros); açude Poço Branco (Poço Branco); açude Sabugi (São João do Sabugi); açude Santa cruz (Santa Cruz); açude Trairí (Tangará); e barragem Armando Ribeiro Gonçalves (Açu, Ipanguaçu, Itajá, São Rafael, e Jucurutu), (DNOCS, 2015).

25Esses 11 açudes e a barragem foram construídos estrategicamente com a finalidade de abastecimento humano e uso agrícola dessas e de localidades adjacentes. Destaca-se que os açudes menores têm como área de influência o município onde estão situados, uma vez que nem sempre a capacidade que possuem pode ser utilizada para abastecer municípios vizinhos. A única exceção é a barragem Armando Ribeiro Gonçalves, que por ser o maior reservatório do estado, acaba tendo capacidade para abastecer os municípios de Açu, Ipanguaçu, Itajá, São Rafael, e Jucurutu (DNOCS, 2015).

26Vale ressaltar que nem todos os municípios do estado têm seus territórios abrangidos pela área de influência de um reservatório, tampouco possuem um sistema de abastecimento de água eficiente, com reservatórios de grande capacidade volumétrica, que forneça água de qualidade e quantidade suficientes para sua população. Quando se constata esse quadro, uma das alternativas adotada por vários governos do RN é a construção de sistemas de adutoras que transportam água para as regiões afetadas pela crise hídrica (SEMARH, 2017). A territorialidade desses sistemas técnicos de adutoras pode ser observada na figura 5.

Figura 5: Sistema de Adutoras do Rio Grande do Norte

Figura 5: Sistema de Adutoras do Rio Grande do Norte

Fonte: Agência Nacional de Águas (ANA, 2016).

27Analisando essa figura, é possível identificar um total de 17 adutoras. Esse sistema técnico tem como função transportar água de uma localidade para outra, seja através de pressão atmosférica (declividade do terreno) ou via bombeamento. Apesar de possuírem essa funcionalidade técnica comum, apresentam diferenciações no que tange às suas formas espaciais.

28Segundo informações da ANA (2016), pode-se concluir que as 17 adutoras apresentam quatro tipos específicos de formas: dendrítica; ramificada; retilínea; e sinuosa (Corrêa, 1989; Tsutiya, 2006). Algumas dessas adutoras podem apresentar duas ou três formas associadas ao longo de sua estrutura territorial.

29Com formato dendrítico há a adutora Monsenhor Expedito, caracterizada por apresentar uma rede que se desenvolve a partir de um núcleo central. Com a forma retilínea há as adutoras de Maxaranguape, Acarí-Currais Novos, Pureza-João Câmara, e Boqueirão-Jandaíra. As adutoras Pedro Velho-Nova Cruz, Guamaré-Macau, e Boqueirão apresentam forma sinuosa. Há também adutoras de formato sinuoso e aspecto ramificado, como a do Médio Oeste e a de Santo Antônio-Espírito Santo. O que predomina no RN são as estruturas de adução ramificadas, tais como Alto Oeste, Santa Cruz do Apodi-Mossoró, Jerônimo Rosado, Sertão Central Cabugi, Extremoz, Piranhas-Caicó e Serra de Santana.

30É importante destacar que a variação das formas das adutoras pode estar relacionada a vários fatores, como a distância entre os pontos de adução, a geomorfologia do terreno e o número de localidades a serem atendidas. Além disso, a questão temporal também influencia, pois adutoras construídas em épocas passadas são dotadas de estruturas técnicas diferentes, com funcionalidades bem específicas. Já as adutoras mais modernas permitem uma variação maior em suas estruturas, além de apresentarem diferentes funcionalidades.

31Nesse sentido, para entender as condições hídricas e de abastecimento de água do RN é preciso que se considere uma conjuntura de fatores, tanto de ordem natural quanto de ordem técnica. Os fatores de ordem natural envolvem níveis de precipitação e umidade, o armazenamento subterrâneo de água (aquíferos) e as bacias hidrográficas. Já os de ordem técnica compreendem os níveis dos açudes e barragens, as adutoras e o uso de carros pipas. Dessa forma, para a análise das potencialidades e fragilidades hídricas de um local, faz-se necessário uma abordagem funcional e integrada de todos esses aspectos.

Potencialidades e fragilidades hídricas do Rio Grande do Norte

32As potencialidades e fragilidades hídricas existentes em cada território do RN revelam uma condição individual e própria que se reflete social e economicamente em cada município. Nesse sentido, segundo Santos e Silveira (2008), um território pode apresentar potencialidades e ser caracterizado como um espaço luminoso, e fragilidades e ser caracterizado como um espaço opaco. Nesse contexto, o que definiria conceitualmente as potencialidades e as fragilidades hídricas de um território?

33As potencialidades hídricas - pontos luminosos de um território - se caracterizariam pelo conjunto dos recursos naturais e estruturas físicas cujas condições oferecem segurança hídrica para a população atendida. Contraditoriamente, as fragilidades - espaços opacos de um território - representam uma situação cujos recursos e estruturas não oferecem a segurança hídrica para o pleno desenvolvimento de uma determinada população.

34 No contexto dos recursos hídricos do estado, quais situações caracterizam um cenário de potencialidades e um cenário de fragilidades? Para alcançar a resposta desse questionamento, torna-se necessário uma análise integrada das condições territoriais que influenciam seus recursos hídricos, considerando tanto os elementos naturais quanto os técnicos. Um dos elementos naturais que potencializa a questão hídrica do estado, são os aquíferos e estes podem ser classificados segundo sua tipologia hidrogeológica como Cárstico, Fraturado e Poroso, espacializados na figura 6.

Figura 6: Tipologia hidrogeológica dos sistemas de aquíferos do Rio Grande do Norte

Figura 6: Tipologia hidrogeológica dos sistemas de aquíferos do Rio Grande do Norte

Fonte: Agência Nacional de Águas (ANA, 2016).

35Dos três tipos de aquíferos, dois tem a capacidade de armazenar grandes quantidades de água e de proporcionar maior capacidade para prospecção de poços tubulares, são eles o Poroso e o Cárstico. Os aquíferos do tipo Poroso são formados principalmente por rochas sedimentares, que possuem inúmeros espaços vazios que armazenam água em volume considerável. Os vários poros dessas rochas permitem a circulação de água em várias direções, contribuindo também, para o processo de recarga do próprio aquífero (Guerra e Guerra, 2008). Segundo Melo (2006), as taxas de recarga desse tipo de aquífero no RN são superiores a 10% ao ano, principalmente no contexto da formação barreiras.

36Segundo Guerra e Guerra (2008), os aquíferos do tipo Cárstico são formados por rochas calcárias e, em função da dissolução desse tipo de rocha, há a formação de verdadeiros rios subterrâneos. Dois exemplos que se destacam são os aquíferos Jandaíra e Açu por apresentarem potências hidrológicas que podem chegar a 100 m³/hora de explotação (Melo, 2006).

37Já o aquífero Fraturado caracteriza-se como um elemento de fragilidade hídrica, devido à sua constituição geológica, com formações do tipo cristalino aliado aos solos poucos profundos e à baixa capacidade de infiltração. Consequentemente, os poços perfurados nesses locais apresentam vazões muito baixas, além do alto teor de salinidade da água (Montenegro & Montenegro, 2012).

38Além dos aquíferos, as bacias hidrográficas e os seus respectivos reservatórios também são elementos de grande potencial hídrico do RN. A figura 7 apresenta os principais reservatórios, suas áreas de influência e as bacias que os alimentam.

Figura 7: Bacias Hidrográficas, reservatórios e áreas de influência do Rio Grande do Norte

Figura 7: Bacias Hidrográficas, reservatórios e áreas de influência do Rio Grande do Norte

Fonte: Secretaria de Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte (SEMARH, 2017).

39A análise da figura 7 nos permite identificar que os 12 principais reservatórios estão associados a cinco bacias hidrográficas, dentre as quais se destacam a Bacia do rio Apodi/Mossoró e a bacia do rio Piranhas/Açu, pois são as maiores em área drenada, com 14.276 km² e 17. 498, 5 km², respectivamente, e responsáveis por concentrar o maior número de reservatórios (SEMARH, 2017).

40Na bacia do rio Apodi/Mossoró, há o açude Pau dos Ferros, com capacidade de 54.846 m³, e o açude do Saco com 120 m³. Já a bacia do rio Piranhas/Açu comporta um total de 6 reservatórios, incluindo barragens e açudes. São eles, o açude Mendobim, com capacidade de 76.349 m³; o açude Pataxó, com 15.017 m³; a barragem Armando Ribeiro Gonçalves, com 2.400.000.000 m³; o açude Sabugi, com 65. 335 m³; o açude Itans, com 81.750 m³; e o açude Marechal Dutra, com 44. 421 m³, (SEMARH, 2017).

41Com relação aos açudes Inharé e Santa Cruz, ambos recebem água das bacias hidrográficas dos rios Potengi e Trairí. A área drenada por essas bacias equivale, respectivamente, a 4.093 Km² e a 2.867,4 km², sendo que boa parte da água drenada por essas duas áreas fica reservada nos 5.159 m³ do açude de Inharé e nos 776 m³ do açude Santa Cruz (SEMARH, 2017). Já o açude Poço Branco tem como bacia hidrográfica contribuinte a do rio Ceará-Mirim, a qual tem uma área drenada de 2.635,7 km² e seu reservatório possui uma capacidade total de 135.160 m³.

42No total, o RN tem mais de 40 reservatórios que possuem capacidade de armazenagem de água de 4.289.280.000 m³. Segundo Montenegro e Montenegro (2012), boa parte desses reservatórios foram construídos decorrente das políticas de açudagem do governo federal desenvolvidas nas décadas de 1930 e 1960, cujo objetivo principal era o de armazenar água para ser utilizada nos períodos de estiagem, tanto para o abastecimento humano quanto para a dessedentação de animais e irrigação de culturas agrícolas.

43Contudo, a existência desses elementos naturais e técnicos distribuídos espacialmente sobre o território não garante o atendimento das necessidades básicas da população que vive em suas proximidades se seus níveis de reservação não estiverem satisfatórios. Objetivando discutir tal temática elaborou-se uma cartografia (figura 8) que representasse os níveis de reservação dos principais açudes e barragens do RN referente ao período de Junho/ Outubro de 2017.

Figura 8: Níveis dos principais Reservatórios do Rio Grande do Norte em 2017

Figura 8: Níveis dos principais Reservatórios do Rio Grande do Norte em 2017

Fonte: Secretaria de Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte (SEMARH, 2017).

44A figura 8 permite identificar um cenário de grandes preocupações, à medida que 10 dos 12 maiores reservatórios do estado encontram-se com seus níveis de reservação abaixo de 15% de sua capacidade. Somente dois açudes de pequena expressão - açude Mendobim e açude Pataxó - estão com seus níveis de reservação com 50% e 73,72%, respectivamente. Além da grande demanda por água, as barragens e açudes são afetados pelos baixos índices de precipitação e de umidade, decorrentes das secas dos últimos anos, e pelas elevadas temperaturas que provocam grandes perdas de volume da água para a atmosfera.

45Segundo Bezerra (2002), na zona climática do semiárido norte-rio-grandense, os índices de precipitação anual não ultrapassam os 800 mm e as temperaturas são elevadas, variando entre 23 e 27º C. Por esse motivo, nessa zona climática do estado o número de horas de exposição à radiação solar é elevado, algo em torno de 3000 horas por ano, o que contribui para elevar as taxas de evapotranspiração e negativar os níveis de balanço hídrico dos reservatórios durante boa parte do ano.

46Vale ressaltar que o quadro de fragilidades se torna mais grave ainda quando um município ou região com essas características climáticas não é atendido por nenhum sistema de adutoras.

47A extensa rede de adutoras se constitui em outra potencialidade hídrica do Rio Grande do Norte. As adutoras em operação possuem uma extensão de mais de 1600 km de tubulações e atendem a 106 municípios do estado, o que em termos populacionais equivale a uma demanda de 1.200.000 consumidores. Tal processo configura-se através da exploração e uso dos recursos hídricos mediante a implantação de sistemas técnicos de transporte de água (CAERN, 2017). Nesse contexto, destaca-se que parte da rede de adutoras ainda está em fase de obras e outra parte apenas está projetada, conforme apresentado na figura 9.

Figura 9: Situação operacional dos sistemas de adutoras do Rio Grande do Norte

Figura 9: Situação operacional dos sistemas de adutoras do Rio Grande do Norte

Fonte: Agência Nacional de Águas (ANA, 2016).

48Analisando a figura 9 percebe-se que das 17 adutoras, 14 estão em funcionamento, 01 está em obras (a adutora Santa Cruz do Apodi-Mossoró) e 02 estão em fase de planejamento (a Maxaranguape e a Boqueirão-Jandaíra). O funcionamento das adutoras tem relevância fundamental na melhoria do abastecimento de água de vários municípios do estado, mesmo em regime de rodízio, em razão da seca dos últimos anos. Sem a disponibilidade técnica desse objeto “a adutora”, inúmeras localidades estariam em estado de colapso hídrico. Outro aspecto de análise que merece destaque refere-se a conclusão da obra da adutora Santa Cruz do Apodi-Mossoró, que consolidará a rede de adutoras do Alto-Oeste e de Jerônimo Rosado formando uma rede técnica densificada sobre o território com a possibilidade de remanejo de água para dezenas de municípios, atendendo assim milhares de pessoas.

49Outra ação estratégica alternativa adotada nos últimos anos para amenizar os efeitos da crise hídrica vivida no RN é o uso de carros-pipa para abastecer as cidades, tal como mostra a figura 10.

Figura 10: Municípios do Rio Grande do Norte atendidos pela operação carro-pipa

Figura 10: Municípios do Rio Grande do Norte atendidos pela operação carro-pipa

Fonte: Governo do estado do Rio Grande do Norte (2017).

50Dos 167 municípios, 65 tem seu sistema de abastecimento de água complementado pela atuação de carros-pipa, como demonstra a figura 10. Essa estratégia tem sido desenvolvida no âmbito da Operação Vertente, coordenada pelo Exército Brasileiro (Governo do Estado do Rio Grande do Norte, 2017). De acordo com Santos, Matos e Alvarenga (2012) essa operação tem sido colocada em prática sempre em períodos de estiagem, tal como tem acontecido em boa parte do território norte-rio-grandense, onde o suprimento de água tem sido comprometido em função das irregularidades na precipitação; onde os níveis dos reservatórios encontram-se em situação de criticidade; e em localidades em que não existem adutoras ou não há água disponível nas redes existentes. A utilização de carros-pipa é um indicador de colapso hídrico e de calamidade pública nos municípios do RN e nesta situação encontram-se quase 40% da população do estado.

51Aliado aos efeitos da estiagem e ao consequente e frequente uso de carros-pipa, vários municípios do estado apresentam sistemas de abastecimento de água em mau funcionamento. Segundo dados da ANA (2016), tal processo que identifica esse cenário no território está especializado na figura 11.

Figura 11: Situação do abastecimento de água do Rio Grande do Norte

Figura 11: Situação do abastecimento de água do Rio Grande do Norte

Fonte: Agência Nacional de Águas (ANA, 2016).

52A figura 11 permite identificar que mais da metade dos municípios estão em situação de baixa garantia hídrica, cuja distribuição de água para a população fica suspensa durante vários dias. Nessa situação estão principalmente os municípios das regiões Oeste e Centro-sul do estado. Os municípios que estão em situação oposta (abastecimento satisfatório), são aqueles localizados no litoral setentrional Norte, onde a distribuição de água acontece de forma plena. Em situação intermediária (ampliação do sistema produtor) encontram-se aqueles municípios que já apresentam sinais de colapso, com falta de água durante algumas horas, sendo necessário o uso de rodízios no abastecimento.

53Esses problemas conjugados evidenciam os efeitos da seca e a possibilidade de colapso no suprimento de água em vários municípios do estado. Amenizar a fragilidade hídrica demanda um conjunto de ações de caráter ambiental, político e econômico que nem sempre estão articuladas.

54Nesse contexto, o território norte-rio-grandense apresenta áreas com potencialidades e fragilidades hídricas. Identificar essas diferenças é de suma importância para a caracterização da vulnerabilidade territorial de cada município, assim como para a tomada de decisão em relação ao planejamento territorial dos recursos hídricos do estado.

Vulnerabilidade territorial e colapso hídrico

55A caracterização de um cenário de vulnerabilidade se dá a partir de um conjunto de fatores de diversas naturezas e dimensões que envolvem indivíduos, níveis de análise, instituições e territórios. No caso do território, a definição da sua vulnerabilidade se dá em função do arranjo dos seus elementos naturais e técnicos, ou seja, da forma como esse território responde aos efeitos de determinados fenômenos estruturais e conjunturais (Cunha, Jakob e Hogan et al 2004).

56Em relação ao território do RN, definido politicamente a partir de 167 municípios, tem predominado nos últimos 07 anos um quadro de estiagem prolongada, responsável pelo agravamento da funcionalidade do sistema de abastecimento de água de várias localidades. Segundo a ANA (2016), o cenário de colapso hídrico tem se instaurado em vários municípios, haja vista que os sistemas de abastecimento não têm funcionado com sua capacidade operacional total, inviabilizando assim a segurança hídrica da população, não atendendo suas demandas básicas diárias.

57Essa situação de colapso hídrico em vários municípios revela uma das marcas deixadas pela territorialidade da seca no estado. Diante das fragilidades hídricas identificadas até aqui, questiona-se: qual a vulnerabilidade territorial do RN ao colapso hídrico? Com o objetivo de encontrar respostas para essa pergunta, utilizou-se a metodologia desenvolvida por Crepani, Medeiros, Hernandez Filho et al (2001), a qual trata do zoneamento e classificação de vulnerabilidades a partir da utilização de Unidades Territoriais Básicas (UTB). Tal proposta metodológica estima a vulnerabilidade territorial ao colapso hídrico de cada município do estado entre 2015 e 2017, a partir da análise de um conjunto de variáveis de caráter natural e técnico descritas na tabela 1.

58A estimativa da vulnerabilidade territorial do presente estudo ao colapso hídrico considerou seis variáveis, que a partir de uma análise integrada, tendo como escala espacial o município (a Unidade Territorial Básica), apresentou graus de fragilidade diferentes, caracterizados na tabela 1. Tais graus variam entre 1 e 3, sendo que os valores próximos de 1 indicam menor fragilidade ao colapso hídrico; valores próximos de 2, uma fragilidade intermediária; e os valores de maior fragilidade se aproximam de 3 (Crepani, Medeiros, Hernandez Filho et al 2001). A obtenção dos valores finais de vulnerabilidade foi calculada através de uma média aritmética dos graus de fragilidade das seis variáveis analisadas. Vale lembrar que algumas variáveis não possuem três categorias, o que não altera a estimativa final de vulnerabilidade a medida que a aplicação e valoração das categorias de análise são iguais para todos os municípios.

Tabela 1: Variáveis para estimativa da vulnerabilidade territorial ao colapso hídrico

CATEGORIAS DE ANÁLISE

GRAUS DE FRAGILIDADE AO COLAPSO HÍDRICO

Tipologia hidrogeológica dos Aquíferos

Predomínio do Poroso

1

Predomínio do Cársico

2

Predomínio do Fraturado

3

Condições climáticas

 

Predomínio da unidade

1

Predomínio do semi-úmido

2

Predomínio da aridez

3

Situação dos níveis dos reservatórios

 

Acima de 50 % da capacidade total

1

Entre 20 e 49 % da capacidade total

2

Entre 0 e 19 % ou não possui reservatório

3

Funcionamento dos sistemas de adutoras

 

Funcionamento pleno

1

Funcionamento alternado

2

Situação de colapso ou não é atendido por adutora

3

Abastecimento com Carro-Pipa

 

Não atendido pela operação

1

Atendido pela operação

3

Situação do sistema de abastecimento de água urbano

Abastecimento satisfatório

1

Ampliação do sistema produtor

2

Baixa garantia hídrica

3

Fonte: Elaborado pelos autores com base em Crepani, Medeiros, Hernandez Filho et al (2001)

59Quanto à classificação dos níveis de vulnerabilidade, esta foi construída a partir da integração das variáveis e das características de cada município. Essa classificação varia de zero a 1,0 conforme a tabela 2.

Tabela 2: Classificação dos níveis de vulnerabilidade

NÍVEIS DE VULNERABILIDADE

INTERVALO DE CLASSE

Baixa

0,0 – 0,3

Média

0,4 – 0,6

Alta

0,7 – 1,0

Fonte: Elaborado pelos autores com base em Crepani, Medeiros, Hernandez Filho et al (2001)

60Com base na tabela 2, os níveis de vulnerabilidade ao colapso hídrico dos municípios do RN podem variar entre Baixa, Média e Alta, com intervalos regulares definidos.

61A representação espacial das variáveis analisadas permite identificar diferentes territorialidades e seu nível de vulnerabilidade, com base nas potencialidades e fragilidades de cada uma das 167 Unidades Territoriais Básicas (UTB). Nesse contexto, a figura 12 mostra a vulnerabilidade ao colapso hídrico no RN, a partir da integração das variáveis descritas na tabela 1.

Figura 12: Vulnerabilidade ao colapso hídrico no Rio Grande do Norte

Figura 12: Vulnerabilidade ao colapso hídrico no Rio Grande do Norte

Fonte: Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte (IDEMA, 2015); Governo do estado do Rio Grande do Norte (RN, 2017); Agência Nacional de Águas (ANA, 2016); Secretaria de Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte (SEMARH, 2017).

62Na figura 12 é possível identificar a existência de apenas dois níveis de vulnerabilidade (média e alta) ao colapso hídrico no RN.

63As 20 Unidades Territoriais Básicas que apresentaram média vulnerabilidade ao colapso hídrico concentraram-se em duas áreas específicas do estado e representam 12% dos municípios: o litoral Leste, em uma área que se estende aproximadamente de Pedro Velho a São Bento do Norte, e parte na região centro-norte do estado. No contexto litorâneo destacam-se os municípios de Pedro Velho, Baia Formosa, Vila Flor, Tibau do Sul, Vera Cruz, Nísia Floresta, Parnamirim, Extremoz, Maxaranguape, Taipu, Pureza, Touros, São Miguel de Touros, Pedra Grande, Parazinho, João Câmara e São Bento do Norte. No que diz respeito a região centro-norte, destacaram-se os municípios de Açu, Ipanguaçu e Serra do Mel.

64Os municípios em situação de média vulnerabilidade se configuraram a partir de um equilíbrio entre potencialidades e fragilidades hídricas. Para tanto considerou-se: áreas de aquífero Cárstico ou Poroso, que são estruturas geológicas que armazenam boa quantidade de água; zonas climáticas de média ou alta precipitação e umidade, predomínio de clima úmido e ou semiúmido; reservatórios de grande porte para o armazenamento de água, desde que estejam com níveis acima de 50% de sua capacidade; funcionamento do sistema de adutoras; e situação do sistema de abastecimento de água minimamente eficiente, onde não é necessário o uso de carros-pipa para complementar este serviço.

65Já as UTB que apresentaram alta vulnerabilidade ao colapso hídrico compreendem todos os outros 147 municípios do estado, o que representa 88% das unidades existentes. Tal resultado mostra que o RN apresenta um quadro de elevada criticidade ao colapso hídrico.

66Os municípios em situação de alta vulnerabilidade se configuraram a partir de um predomínio de fragilidades hídricas. Para tanto considerou-se: áreas de aquífero fraturado, que são estruturas geológicas que armazenam pouca água; zonas climáticas de baixa precipitação e umidade, predominando a aridez; reservatórios com baixo nível de reservação; rede de adutoras inexistente ou em estado de colapso; e sistema de abastecimento de água ineficiente, onde é necessário o uso de carros-pipa para complementar este serviço.

67Diante do exposto, fica claro que os cenários de média e alta vulnerabilidade ao colapso hídrico servem de indicador para a tomada de decisões governamentais no sentido de minimizar os problemas relacionados ao processo de abastecimento de água. Portanto, dentro desse contexto, duas questões se sobressaem: a redução dos níveis de precipitação, que representa o input de água na estrutura hídrica do estado, e os problemas de gerenciamento e manutenção dos sistemas de abastecimento de água. Tais questões requerem dos gestores públicos a realização de uma gestão integrada.

Considerações finais

68A estrutura hídrica e de abastecimento de água do RN é composta por um conjunto de elementos, tanto de ordem natural quanto de ordem técnica. Os de ordem natural envolvem níveis de precipitação e umidade, o armazenamento subterrâneo de água (aquíferos) e as bacias hidrográficas. Já os de ordem técnica dizem respeito aos níveis dos açudes e barragens, ao funcionamento das adutoras e ao uso de carros-pipa. Destaca-se que esses elementos serviram de referência para a definição das variáveis de estudo.

69Constatou-se que essa estrutura hídrica ao longo do território do estado apresentou potencialidades e fragilidades referentes aos seus elementos naturais e técnicos. Nesse sentido, a identificação dessas diferenças, a partir da integração das variáveis definidas, foi de suma importância para a caracterização da vulnerabilidade hídrica de cada município. O resultado dessa análise identificou a existência de dois níveis de vulnerabilidade (média e alta) ao colapso hídrico no período de 2015 a 2017.

70Vale ressaltar que esse cenário está em consonância com o argumento defendido por Travassos, Souza & Silva (2013), segundo os quais boa parte dos estados nordestinos apresentam quadros extremos de precipitação. No caso da análise realizada, afirma-se que as condições extremas ou adversas abrangem não só a precipitação, mas também o funcionamento de todos os demais elementos naturais e técnicos que compõem a estrutura hídrica do RN, que ao serem estudados de forma sistêmica permitem identificar as diferenças territoriais e seus níveis de vulnerabilidade ao colapso hídrico.

71Assim, com o objetivo de melhorar a gestão dos recursos hídricos para se reduzir os inúmeros cenários de alta vulnerabilidade sugere-se que os gestores pensem o território de forma integrada e sistêmica, considerando a inter-relação dos elementos naturais, sociais e técnicos de cada sistema de abastecimento de água dentro do território do Rio Grande do Norte.

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Table des illustrations

Titre Figura 1: Isoietas de precipitação média do Rio Grande do Norte (de 1977 a 2006)
Crédits Fonte: Agência Nacional de Águas (ANA, 2016).
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Titre Figura 2: Sistemas de aquíferos do Rio Grande do Norte
Crédits Fonte: Agência Nacional de Águas (ANA, 2016).
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Titre Figura 3: Bacias hidrográficas do Rio Grande do Norte
Crédits Fonte: Secretaria de Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte (SEMARH, 2017).
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Titre Figura 4: Principais reservatórios do Rio Grande do Norte
Crédits Fonte: Secretaria de Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte (SEMARH, 2015).
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Titre Figura 5: Sistema de Adutoras do Rio Grande do Norte
Crédits Fonte: Agência Nacional de Águas (ANA, 2016).
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Titre Figura 6: Tipologia hidrogeológica dos sistemas de aquíferos do Rio Grande do Norte
Crédits Fonte: Agência Nacional de Águas (ANA, 2016).
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Titre Figura 7: Bacias Hidrográficas, reservatórios e áreas de influência do Rio Grande do Norte
Crédits Fonte: Secretaria de Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte (SEMARH, 2017).
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Titre Figura 8: Níveis dos principais Reservatórios do Rio Grande do Norte em 2017
Crédits Fonte: Secretaria de Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte (SEMARH, 2017).
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Titre Figura 9: Situação operacional dos sistemas de adutoras do Rio Grande do Norte
Crédits Fonte: Agência Nacional de Águas (ANA, 2016).
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Titre Figura 10: Municípios do Rio Grande do Norte atendidos pela operação carro-pipa
Crédits Fonte: Governo do estado do Rio Grande do Norte (2017).
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Titre Figura 11: Situação do abastecimento de água do Rio Grande do Norte
Crédits Fonte: Agência Nacional de Águas (ANA, 2016).
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Titre Figura 12: Vulnerabilidade ao colapso hídrico no Rio Grande do Norte
Crédits Fonte: Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte (IDEMA, 2015); Governo do estado do Rio Grande do Norte (RN, 2017); Agência Nacional de Águas (ANA, 2016); Secretaria de Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Rio Grande do Norte (SEMARH, 2017).
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Adriano Lima Trolei et Bruno Lopes da Silva, « Os recursos hídricos do Rio Grande do Norte: uma análise da vulnerabilidade territorial ao colapso no abastecimento de água »Confins [En ligne], 34 | 2018, mis en ligne le 05 avril 2018, consulté le 10 décembre 2024. URL : http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/confins/12901 ; DOI : https://0-doi-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/10.4000/confins.12901

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Adriano Lima Trolei

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Bruno Lopes da Silva

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